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montesclaros.com - Ano 25 - domingo, 24 de novembro de 2024
 

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Mensagem: A PARTIDA DE “SEU” GODOFREDO
HAROLDO LÍVIO
Noel Rosa, o filósofo do samba, entre dois copos de chope, disse que a saudade não tem cor. Isso nos faz lembrar que o baiano-montesclarense Godofredo Guedes, o artista que descobriu a cor da saudade, está partindo para Belo horizonte, pois sentiu a necessidade de galgar as alturas, voar em céus mais amplos, onde a linha do horizonte não seja tão próxima como em Montes Claros. Durante vinte e sete anos, GG viveu, pintou, entalhou, solou e compôs aqui na terra. A sua partida, portanto, representa uma perda para a cidade, pois o seu talento versátil já havia sido incorporado ao património cultural do lugar. Já era considerado bem público de uso comum do povo, tal como a Praça da Matriz ou a capela dos Morrinhos, que cantara e decantara em suas telas famosas. Realmente, o vazio da ausência de GG só encontraria fato análogo no desmonte dos Morrinhos.
O pintor privilegiado, que soube interpretar a alma das ruas, das casas coloniais e das igrejas centenárias de Montes Claros do passado, em busca de novo clima, trocou o ambiente provinciano de nossa comunidade pelo brilho e pelo fausto espiritual que encontrará, por perto, na Capital da formosa província de Minas. Lá, nas galerias de arte, onde pontificam os grandes mestres da pintura mineira, GG finalmente encontrará o seu habitat, o lugar que sempre mereceu, para cultivar a vocação. O baiano de Riacho de Santana desde criança sentiu o chamado da Arte universal. Meninote ainda, meteu-se no mundo das tintas e das notas musicais. Aprendeu a manejar o pincel sozinho, sem auxílio de terceiro. Ainda de calça curtas, fez a decoração da sacristia da gruta de Bom Jesus da Lapa. Chegando a necessidade de ganhar o pão de cada dia, GG aprendeu prática de farmácia, com um seu parente, médico baiano formado em Paris. Como os livros de Química fossem todos escritos em francês, GG não teve outro caminho senão que aprender, sem mestre, o idioma de Balzac.
Sentindo-se solitário na Pintura, aprendeu a tocar e dominou três instrumentos musicais: violão, saxofone e clarineta. Já construiu, em seu atelier, dois instrumentos de grande porte: uma marimba e um piano. Parece brincadeira, mas o homem não sabe tocar piano. Construiu os instrumentos na esperança de ter um pianista em casa. Os garotos, no entanto, o decepcionaram. Gostam mesmo é do violão.
Não negam, assim procedendo, sua origem da Boa Terra.
Na célebre época da construção da Central rumo a Monte Azul, GG dedicou-se à música das dez da noite às cinco da manhã. Tocava tanto no fidalgo Clube Montes Claros como nos cabarés afamados da zona boémia, dos quais o romancista carioca Marques Rebello disse que ferviam como os night-clubs da Broadway.
Mesmo fugindo de nós, Godofredo Guedes já estava fixado na História local, por ter esbanjado aqui vinte e sete anos de inteligência, beleza e emoções.
Seus quadros a óleo ornamentaram muitos lares da cidade, suas estatuetas estão por toda parte, aqui, ali, alhures no Brasil. Sua valsa Saudade da Bahia percorreu o País, como se fosse de autor desconhecido, muito antes do samba homónimo de Dorival Caymmi. Dificilmente se poderá falar de Montes Claros sem mencionar o nome de GG. É uma verdadeira associaçãp de odeias: um homem que se doou a uma cidade; a cidade que admira seu valor de artista.
Agora, Godofredo partiu e nos deixou. Deixou a poeira e o sol abrasador do sertão; foi viver no asfalto.
Quem se candidata a pintar as ruas de Montes Claros?
(O Jornal de Montes Claros, 26/03/63)

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