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montesclaros.com - Ano 25 - sexta-feira, 22 de novembro de 2024


Raphael Reys    rphaelreysmoc@yahoo.com.br
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Por Raphael Reys - 10/4/2012 09:17:22
A história do menino pelau

Como até as pedras se encontram, estive no Quarteirão do Povo para dois dedos de prosa com a dupla dos setentões dessemelhantes de Moc City. Um, o lobo urbano Ronaldo Toffani, cobra mais do que criada na escola da vida. O outro, um exemplo de cidadania e de honradez, o pecuarista e cinéfolo Gegê Gomes.
Ronaldo, o mestre da ironia, cuca leve, dolce far niente (boa vida), pé de pano estilo canastrão de Roliude. Emérito dom Juan de alcovas tropicais, consolador de mal amadas e mal casadas, herdeiro natural e adepto da Lei de Gerson. Sempre vestido elegantemente. Como todo bom filho de Figueira, católico de dia, macumbeiro à noite.
Quando interage com algum interlocutor deixa transparecer na expressão, uma môfa!
Carrega no pescoço um patuá feito em Nazaré das Farinhas na Bahia e no bolso das calças bem talhadas uma reza de São Cipriano, fechando o corpo contra bala de namorado, noivo, amante fixo ou marido ciumento.
O outro, criador de gado da mais alta supimpitude, filho de família tradicional, mui digno executivo da Fazenda Larga onde a fartura é tanta que colonião dá mais alto que telhado de casa e caititus anda em bando e são abatidos de porrete. Mantém sempre na face um sorriso dócil e conciliador, que é a sua marca registrada.
Embora tenha nascido em berço de ouro se comporta e se veste com parcimônia. Polido, discreto, cortez, profundamente religioso. Chega a ser um simplista.
Tete a tete comigo, esses dois ilustres montes-clarenses, tão diferentes em personalidade o que reforça o dito da canção portenha: cada qual com o seu cada qual. Ou, cada alma com a sua missão.
Se algum dia, as companhias cinematográficas Metro Goldwin Mayer ou mesmo, como bem diria o saudoso Lezinho Lafetá, a Vinte Tê Agâ Centuri Fé Ô Xis, viessem a Moc City fazer uma longa metragem sobre a nossa verve campesina teriam dificuldades estruturais para compor o elenco, tal o farturão de artistas...
Acontece que aqui só tem estrela, galã de primeira e para fazer papel de bandidos e demais coadjuvante teria que vir gente das cidades vizinhas. Exceção do Brejo das Almas que, como em nossa urbe, só tem cabeceira.
E para concluir a crônica ao bom estilo Withimiano, uma história da mais pura poesia interiorana. Conta o nosso Gegê Gomes, que no início dos bons anos 50, quando ele ainda era um galalau, dona Yolanda, sua vizinha na rua Doutor Veloso lhe narrou à história do menino Pelau.
Acontece que o infante tinha um passarinho de estimação que veio a morrer de morte morrida. A cena final do filme tupiniquim é o garoto com o pássaro em de cujus na mão e no maior chororó. Outro menino, seu vizinho empático, para consolá-lo teria dito: Chora não Pelau que ele foi para o céu!.
O apelido Pelau dado pelo pai do curumim fora copiado de um personagem extraído das páginas de Camões.
E como diria o saudoso montes-clarense Deca Rocha:
- Nós aqui da roça, somos curraleiros, mas somos chiques!


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Por Raphael Reys - 2/4/2012 17:14:21
Novas rosas literárias no Jardim Acadêmico

Boca da noite encantada sob a límpida amplidão da Chapada de Figueira. Mercúrio na cúspide do céu, inspirando as letras e Vênus, em sintonia, emanando as artes no Centro Cultural Hermes de Paula onde está sendo formada a Academia Feminina Montesclarense de Letras.Dia Nacional e Internacional da Poesia!Serão conduzidas aos portais internos do sacro colégio: Cláudia Veloso Colem, Nayara Maciel do Carmo e Lara Araújo. Carmem Netto Vitório, nomeada correspondente e a grande homenageada da noite solene, a educadora Isabel Rebelo, uma guerreira fundadora da Fafil, raiz e base de onde surgiu a nossa universidade.Júpiter e demais deuses, empáticos, a tudo assistiam do Olimpo, enquanto a escritora Gloria Mameluque presidia a academia com as imortais, envergando a pelerine, emoldurada por uma rosa violeta e uma pena.A egrégora do ambiente combinava a fragrância das colônias com o natural voilá das acadêmicas, enquanto Nancy Andrade discursava sobre a mulher atual, suas conquistas e liberdade de expressão. Lembrou a magia feminina dos Orixás.A escritora Maria Câmara encerrou os discursos e foi efusivamente aplaudida em sua fala.A cantora Ana Luiza brindou a todos, com espirais sonoras extraídas do romantismo de Whitney Heppner, acompanhada pelo tecladista Tiago.Senhoras, meninas, mães, avós e bisavós, elegantemente vestidas. A escritora Mara Narciso, adornada em negro, combinando com os seus cabelos; Márcia Yellow, sempre ao sabor do vento, com um coque blond; e Virgínia de Paula, meditativa, em um costume de seda estampada.Muitos abraços, beijos, congraçamentos, comprimentos, sorrisos, lágrimas de contentamento, alegrias, clicadas pela mídia e pelas famílias das acadêmicas e homenageadas presentes ao evento.E viva os que promovem a educação e a cultura dos nossos Montes Claros!


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Por Raphael Reys - 19/3/2012 14:08:35
A ESCOLA DO GIBI.

Nos bons anos 60 e parte dos 70, o bar do Haroldo, fincado na esquina das ruas Corrêa Machado e Melo Viana, no Bairro Morrinhos, era o point da rapaziada e da turma de capoeiras. Muita cachaça curraleira, cerveja casco verde e os famosos Pfs e tira gostos de galinha caipira. Além do caprichado tempero, o molho e as mandingas do citado mestre cuca, sempre atraíram muitos clientes.
Lá no bar, a galera pulava e se assanhava como uma farândola de diabretes, quando havia jogo de futebol entre Cruzeiro e Atlético. As turmas de torcedores rivais se peiteavam, mostrando faixas e cartazes com slogans alusivos à contenda, cantando refrões provocativos. Era o maior auê!
Dentre os personagens mais animados, se destacava o Tipuka. Tipo exótico, conversa arrastada, mãos tortas, corpo torto, parecendo cavalo de umbanda incorporado na Escora. A bem da verdade, era cobra criada, um servente de pedreiro da turma do mestre de obras Roberto Pimenta, o maior 171 do pedaço. Esse criou fama como o mais esperto de Moc City. Dava uma de menino de creche para poder sobreviver.
Bem próximo dali e no passeio em frente ao Cine Ypiranga, trabalhava uma grande turma de engraxates com suas caixas características. Dentre muitos, Geraldo dos Beiços, Nego Tó, Luiz Pinguelo, João Finin, Artur Cegão, Carlai, e o memorável Nau Faquir, morto tragicamente no mundo do crime.
Como ferramentas de trabalho, pastas Nugett, escovas, flanelas e a tinta Fenomenal, usada para mudar a cor dos sapatos.
Por qualquer alegria ou fraco motivo baixava o santo na rapaziada. Aí todos enchiam a cara, engrossando a turma dos torcedores do Atlético, no Bar Destak da carnavalesca Dona Linda e os cruzeirenses, no Bar do Haroldo.
A galera daqui sempre foi muito criativa, unida, e como a alfabetização não chegou para todos os moradores da comunidade, apesar do progresso da nossa urbe, nasceu entre os frequentadores dos bares e do cinema, uma escola diferenciada. A Escola do Gibi!
A alfabetização era feita através do manuseio de revistas em quadrinhos e pela leitura dos que eram alfabetizados, com a memorização das falas dos personagens, textos e imagens pelos demais, surgindo, então, entre os aficionados por revistas em quadrinhos, os alunos do Gibi.
Clubes idênticos, onde ocorria a troca de revistas e o aprendizado somente da leitura, funcionavam também à porta dos cines Fátima, Lafetá e Coronel Ribeiro.
Como a didática ministrada à porta do cine se dava com os participantes em pé na calçada, desenvolveu-se somente a leitura e não a escrita. Nessa galera, figuravam alfaiates, aprendizes, serventes de pedreiro, operários, mestres de obra e serviço, artesões.
Nessa fase a bela professora Estelita Cardoso moradora da rua Melo Viana, matriculou uma boa parte da galera na distante Escola Vila Telma. Funcionava numa tapera com paredes de adobe, coberta de folhas de coqueiro a luz de gás e o sacrifício era irem a pé à noite com quase uma hora de percurso. Conseguiu alfabetizar centenas de jovens do Bairro Morrinhos e adjacências. A diretora do educandário coberto de palha era Maria da Glória Xavier.
Todo sacrifício em prol da educação dos jovens da comunidade! Aperfeiçoaram a leitura, aprenderam a escrita, matemática, geografia, história e os primeiros rudimentos de Moral e Cívica.
Dentre muitos, Pacuí, Pipiu, Lika Alfaiate, Cláudio, Aroldin, Lianão, Marquinho Kiko, Zé Maria, Eustáquio Perneta, Padeça, Hildebrando de Zefira, Zeca de Dona Linda, carregando o botijão na bicicleta cargueira. Lá estavam, além de muitos outros não citados, traídos pela memória e a nossa lembrança.


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Por Raphael Reys - 13/3/2012 17:50:26
UM PODEROSO OLHAR FEMININO.

Na mostra Olhar Feminino aberta no Centro Cultural de Montes Claros, tanto a aura reinante era da mais pura suavidade, como as obras expostas pelas artistas plásticas convidadas viajavam com o anjo diáfano de Felicidade Silveira, o cubismo de Eunice Ferreira, o tom colonial de Feli Lopes, a intensa tierra siena em pigmentos naturais da bela Márcia Prates ao gato Ne Blue de Guilemina Lúcia.
Zebras estilizadas entre a Medusa com cabelos de Anay Kondra de Adriana Freitas. Em prece, o Povorello de Angela Maia ao painel Mulheres Poderosas do anjo urbano Conceição Melo. Tudo clicado e iluminado pelo spot, organizado pela competente diretora Rita Maluf, vestida em um rendão branco com seus olhos de mistério, potencializados por uma sombra violeta.
Silvana Mameluque, toda sex appel, vestida para matar; Márcia Prates, em seda com motivos orientais e Maiza Rodrigues, a grande homenageada da noite, representando a mulher guerreira do Norte de Minas. Foi aplaudida e ganhou um enorme buquê de flores.
Márcia Yellow, felizmente voltou ao seu charme original, deixando a roupagem de A Estrela Sobe! Desfilava pelo salão em verdadeiro glamour. Uma tentação! Belezura PO, para a sustentabilidade das almas presentes.
No ar, a mistura harmônica das fragrâncias emanadas pelas colônias francesas, ao som doce de um violino que emitia espiral sonora de valsas dolentes. Agradáveis ao forno alquímico dos corações presentes.
Dado ao flagelo dos moto-assaltantes entregues ao insano jogo de rollerball pelas nossas ruas, notava-se a ausência de jóias nas beldades...
Uma noite de puro romantismo, sentimentos entre amplexos, ósculos e flertes trocados entre os presentes. Uma verdadeira nouvelle vague. A mais pura extensão sensorial...
Como a noite era de magia e com as almas femininas doando compaixão, encharquei-me de ternuras. Realizei o sonho em abraçar e beijar os cabelos de Felicidade Patrocínio, uma alma em enlevo. Márcia Yellow clicou o momento. Dei um abraço acochado e beijei os olhos inflamados da jornalista Sara Pará. Matei a vontade!
Das elegantes senhoras que estavam acompanhadas pelos respectivos maridos, beijei elegantemente as mãos. O que vale é a intenção.
Fui para os braços de Morfeu, o deus do sono, com a minha pobre e carente alma entre feliz e atormentada. Sonhei estar na Riviera Francesa em um enlace com a Brigitte Bardot! Quem não pode, pode sonhar!


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Por Raphael Reys - 6/3/2012 09:29:46
PURA CURRALEIRAGEM!

Zé Amorim contava um “causo” com sua verve em dramatizar pequenas tragédias do cotidiano, quando Toninho Rebello que participava da conversa o interpelou: “Porque os Amorins são todos assim conversadores e espirituosos?” Zé respondeu, na bucha: “Porque somos cópia do nosso pai, Pedro Montes Claros.”.
A bem da verdade, os Amorins são como mala de mascate. Vivem de tampa aberta e se enquadram no dito de Maria Célia: o “modus vivendi” de cavalgar sem arreio.
Apaixonado por fitas de faroeste, Zé chegou ao cine Montes Claros trazendo na garupa da moto BSA Lazinho Pimenta, para assistirem ao longa metragem “Era Uma Vez no Oeste”. Silêncio na platéia, Jacó botou o rolo para correr.
Na cena de abertura, o “cowboy” chegou a San Juan de La Puente, no Novo México, como se não quisesses nada e tocando uma gaita harmônica de boca, no bom estilo romântico. Desceu na plataforma, consertou o chapéu e deu uma cubada nos “paus mandados” do chefão que traziam os embornais de milho 44.
Desceu atento com uma bruaca de couro sobre o seu tórax, ocultando o Colt 44, de olho nos três bandidos na plataforma que o esperavam montados em seus cavalos, para enviá-lo à cidade dos pés juntos a mando do bandidão local.
O pistoleiro quebra faca do chefão adiantou a montaria e foi logo aplicando o maior agá, temendo que a vítima desconfiasse de algo, pelo fato de não terem trazido um cavalo sobressalente para transportá-lo.
- Na pressa, nós esquecemos de trazer o seu cavalo, companheiro. Mais na frente tem um bom de sela.
Como todo artista, o “cowboy” foi logo respondendo: “Não precisava, pois já já vão sobrar dois!”.
Sacou o Colt e meteu um peteleco bem no meio da testa de cada um dos bandidos!
Nessa altura do filme, Zé Amorim já suando a gola da camisa Volta ao Mundo, deu um pulo da cadeira e cheio de alegria gritou com sua voz de trovão: “Êita caboclo”! Já vou embora, Lazinho. Com a morte desses três F.D. P., pra mim o filme já valeu o que paguei!...


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Por Raphael Reys - 28/2/2012 15:58:40
RUBENS, O COMANDANTE ROXO.

Embora a aparente nobreza do nome, o nosso herói torto, quase nada tinha em virtudes. Baixote, tampa de binga, branco cadavérico, pintado como surubim. Os cabelos eram revoltos e a mirada de sampaku. Olhos de peixe morto.
Criado nas sarjetas e becos da metrópole. Ex-policial civil, ex-informante e outras escusas atividades de corredor. Terminava sempre expurgado das funções, dado a sua verve bandida. Morávamos próximos. A maioria dos demais vizinhos o evitavam.
Quando policial era um mestre em forjar flagrantes para incriminar alguém. Visado por muitos, usava um tresoitão vela, número de série raspado. Por índole, era vingativo e dado a maldades, embora fosse chegado a poucos que o tratavam com consideração e atenção.
Daí a nossa ligação ter sido cordial. Quando nos encontrávamos, trocávamos sempre dois dedos de prosa!
Ele era cobra das ruas, sabia das coisas, conhecia todo tipo de malandragem, um 171 urbano. Quando alguém planejava executar algum crime de vingança contra um desafeto, consultava-lhe. Ele armava o modus operandi da ação criminosa, sugeria a rota de fuga, forjava o álibi.
Por aderência cármica, casou-se com uma cria das sarjetas. Ex-garota de programa, com longa ficha criminal e histórica exógeno. Agressiva e ousada. Foram morar com duas velhotas solteironas, tias da sua cara metade. Essas viviam de aposentadorias e aluguéis de imóveis localizados no centro da cidade.
Quando os dois estavam de cara cheia, proclamavam em alto e bom som, esperarem o dia em que as tias otárias batessem a caçoleta. Eles ainda iam se dar bem!
Boca da noite, formava-se próximo a sua residência um ajuntamento de usuários e neófitos da cannabis. Era a reunião da Santa Federação dos Diambeiros. O produto visado para consumo especial, um alcalóide originário do chamado Triângulo da Maldita e conhecido como diamba roxa.
Quando ia pintar algum lote no pedaço, o Rubens era contratado para organizar e monitorar um grupo de até vinte utentes. Vestia a roupagem de comandante do barco da meia-noite. Traçava a logística do roteiro a ser seguido. Uma jornada arrepiante.
Formada a equipe, ele dava as palavras de ordem. Usava a avenida que beirava o Rio Parnaíba, do lado maranhense, na vizinha cidade de Timon. Iniciava a rota quase sempre às 22 h. Como bom condutor, campeava o gado humano do cabeçote trincado.
Como a droga dessa espécie produzia no usuário um efeito que durava em torno de oito horas, ele cuidava para que ninguém se desgarrasse da trupe. Era o arcano da noite de fantasias.
Seis da matina, todos com o guengo já arejado, faziam a reentrada na capital pela ponte de ferro.
Ao bom estilo delivery, o capitão da nau dos insensatos, entregava cada um dos seus comandados de porta em porta.


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Por Raphael Reys - 21/2/2012 19:19:19
CAFÉ DA DAMIANA

O cômodo feito de adobe, coberto com rústicas e velhas telhas, em oposição às estruturas de alvenaria da modernidade. Fincado com o costado do Mercado do Cajueiro, rua São João, centro da Capital, em Teresina (PI). Mais parecia uma câmara de retificação dos Hades.
No lance interior e posto no vão central, havia uma mesa de madeira com cadeiras de metalon enroladas em espaguete de plástico. Onde se tomava as cinco da matina o cafezinho fumegante, uma boa dose de cachaça Mangueira com tira-gosto de siriguela, acompanhados com a mística dos dois dedos de prosa.
À esquerda, penducavam três surradas redes nordestinas que serviam de cama para a tríade de habitantes. A líder Damiana, sua irmã gêmea uni vitelina Cosmiana e o ancião seu Firmo. À direita, um fumarento e improvisado fogão de lenha produzindo chamas e picumãs pendentes do teto. Um tambor de metal de 200 litros era o reservatório da água trazida do logradouro em potes, postos na ródia.
Tábuas sobre caixotes serviam de armário e guarda-roupas. Quem é do beco, assimila as configurações do beco.
Chegadas à metrópole nos idos da migração dos anos 40, oriundas do interior campesino, com suas roupagens de inocência e subserviente religiosidade, logo encontraram os arcanos das esquinas e quebradas da urbe panificadora. Foram logo induzidas a um lupanar da exótica rua Paissandu.
Como tinham o temperamento recluso, assustadas fugiram da vida noturna. Montaram uma cobertura de palha em um lote vazio, chumbaram latas de 18 litros com barro e forjaram um fogão. Toscos bancos de madeira serviam de mesa e assento. Ganhavam a vida vendendo prato feito, pinga, refrigerantes e cervejas, postos em tambor com gelo e serragem.
Afetivas e cuidadosas com a nova clientela de mecânicos, operários braçais, pessoal do caís do rio Parnaíba próximo, mariposas, cafetões, gente da fauna local. Logo alguém instalou energia elétrica e comerciantes doaram uma geladeira alemã.
Nos anos 90, na segunda morada nos Cajueiros, já há quarenta longos anos atendiam a feirantes, vizinhos, passantes e funcionários da Secretaria de Segurança Pública, vindos da Praça Saraiva.
Desde cedo já dava para saber, em primeira mão, das tragédias e desatinos da noite. Assim, víamos o nascer do inclemente sol dos trópicos escutando o trinado dos galos de campina em um viveiro próximo.


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Por Raphael Reys - 17/2/2012 10:07:03
DENÇO, ROUXINOL E AMARELÃO.

Batizado Lourenço, Denço nasceu nas águas de março, abençoado por São José e sob a proteção das almas ciganas. Um king curraleiro, filho do gênio da humanidade.
Cedo ainda, recebeu de sua avó, a velha Belmira Rezadeira, benzeções, contra-mandingas e as artes do catimbó. A matriarca era filha de escravos livres, nascida no final da era dos oito, na Cachoeira do Jaguar. Bahia de todos os Orixás.
Intuitivo, logo percebeu que os animais domésticos falavam a sua própria maneira. Bastava para isso, assuntar a sua linguagem corporal e a expressão dos olhos, janelas da alma.
Tinha o Amarelão, um cão mestiço de estimação que vivia na larga, a rolar na beira de currais e a lambuzar-se de lama nos córregos. Passava horas deitado no chão de terra batida da cozinha, na casa do patrão, a escutar o pipoco das brasas e as chamas da madeira que queimava no fogão de lenha.
Vivia espreitando o gato manhoso que se aquecia nas cinzas do borralho e a escutar os dois dedos de prosa das comadres e compadres, sempre de caneca esmaltada na mão esperando um gole de café moído no pilão e adoçado com rapadura. Amarelão aprendera a sentir as intenções dos humanos pela janela dos seus olhos.
Denço era alma liberta das coisas e peias do mundo. Vivia mergulhado em seu universo interior. O barro do qual foi constituído, fora avivado pelo vento doce do astro Taunay.
Sabia fazer reza catimbozeira, ficar oculto de alguém, passar em chuva sem se molhar. Afugentava cobras, escorpiões e marimbondos. Quando desafiado por algum menino desafeto rezava no pisado. O dito tropicava e batia as fuças no chão.
Assobiava e cachorro bravo vinha de mansinho lamber o couro das suas alpercatas.
Rouxinol, seu burrico branco, quase albino, mais parecia um unicórnio tupiniquim.
Aos onze anos, viajando pelas escarpas da Serra da Jaguatirica, em noite de chuva pesada, caiu em uma enorme fenda entre os paredões das rochas. O Cavaleiro da Lança Negra viera buscá-lo. Ele havia terminado a sua missão na terra.
Com ele caíram Rouxinol e Amarelão, que também estava na garupa. Bem que no dia anterior tivera um presságio. Perdera a sua medalha de São José e o coração pediu-lhe que adiasse a viagem.
Denço, Rouxinol e Amarelão foram-se ajuntar à boa alma da Belmira Rezadeira que cantava ponto na Roda de Aruanda, no Oráculo de Oxalá.


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Por Raphael Reys - 8/2/2012 08:09:38
O HERÓI DO BAIRRO SÃO JOSÉ OU OS GUERREIOS DE AGAMENON

Nos nossos Montes Claros tem de tudo, no mínimo uma versão diferenciada dos fatos. Cidade pólo, com população constituída na sua maioria de gente oriunda de outras cidades do Norte de Minas, muitos vieram para construir o futuro, estudar em nossas escolas, faculdades, conseguir trabalho nas nossas indústrias e comércio.
Como o mundo é composto, também aqui chegaram alguns para fazer e falar de guerra. Falo de dois cidadãos que se apresentavam como ex-combatentes.
Um deles, pequeno proprietário rural no município, movido pela alma da cachaça ingerida, pinta e porte de artista italiano, topete de galã, corpo musculoso. O outro, um magro amarelo por puro exercício de bazófia, medroso e sensível, construiu uma torre de marfim para nela se abrigar, defendendo-se dos males da vida.
O primeiro, no início dos anos 80 a pinga curraleira levou para os Quintos dos Hades; o segundo mui digno profissional liberal, hoje já aos 93 anos, balançando na sua rede de varanda no Bairro São José vive contando as suas notáveis façanhas na Segunda Grande Guerra Mundial.
O ex-combatente com pinta de artista (o primeiro citado), já saudoso, nos anos 70 frequentava restaurante de minha propriedade na Praça da Catedral (centro comercial). Quando chegava, a galera que bebia, fazia uma rodinha em volta, para sugar sua verve. Ele abria a caixa de ferramentas... Tome bala, tome baionetada em traseiro de comedor de chucrute!...
Caía dentro da bocada das trincheiras e matava adoidado os Hans e Fritz do Führer!
Como já havia adquirido habilidade na arte da narrativa, imitava teatralmente o som do matraquear das metralhadoras, o pipoco dos obuses e o ricochete das balas. Os aficionados faziam perguntas pertinentes para potencializar a ação. Dava gosto vê-lo narrando.
Um dia chegou um chato de galocha, desses funcionários de cartório que vive com a cara cheia, invejoso com o sucesso do nosso guerreiro e o ameaçou de processo por se apresentar, falsamente, como um heróico ex-combatente. O herói sumiu do mapa.
O outro herói/agamenon de guerra, oriundo da campesina Pedra Azul, continua vivo entre nós e zangado, relatava que, como ardoroso combatente, mudava rumos de batalhas. No curso da guerra, no teatro de operações, foi incorporado a um submarino da Marinha de Tio San, como operador de periscópio e, posteriormente, artilheiro de torpedos. Os seus disparos foram tão certeiros que fez um enorme estrago na armada de Hitler. Segundo ele, a Gestapo, a terrível polícia alemã, seletivamente negociou através da Cruz Vermelha a libertação de duzentos prisioneiros aliados em troca dele, o Porreta Artilheiro Montes-clarense Roedor de Pequi, para que, simplesmente fosse mandado de volta à terra do fruto amarelo, da Viriatinha, dos falsos ricos que andam de pernas abertas e da semântica libidinosa!
Complementada a negociação, e feita a troca, equilibrou-se a ação da Marinha do Eixo e a dos Aliados no palco das operações marítimas, e só assim a guerra no ficou pau a pau nos oceanos...
Ele ainda está por aqui entre nós, dando o seu passeio de leve no bairro, tranquilamente na sua cadeira de balanço lubrificando o seu mosquetão Mauser de estimação, afiando a baioneta matadeira de alemão, contando os buracos de bala no seu capacete de aço e mostrando a lista de baixas produzidas graças a sua incrível pontaria, além dos nomes dos navios abatidos pelos torpedos por ele lançados. Por conta da sua competência incomum, sempre acerta na mosca e, até hoje, estando no quintal da sua casa, para manter a forma, vez por outra abate um gavião que ousa fazer um rasante nos céus do Bairro São José...


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Por Raphael Reys - 2/2/2012 07:35:03
BOÇALIDADE

Reminiscências extraídas da nossa memória seletiva, a qual foi condicionada por manipulações do marketing religioso; versando sobre os fatos geradores da morte e crucificação de Jesus o Cristo, e que retornam a minha mente estimulada pelos sentimentos despertados, pelo período da Semana Santa.
Os registros iniciaticos dos Essênios relatam que: o mal compreendido e impopular Judas Iscariotes era na verdade um guerrilheiro, e membro atuante da contra resistência Judia. Um Maqui! Infiltrou-se aos seguidores de Jesus imaginando ser o mestre amado, um pretenso político com o objetivo de ser mesmo o rei dos Judeus.
Isso ocorreria com a queda das forcas de ocupação. Mas ao saber que, o mestre e o seu reino não eram deste mundo, fez o que faria qualquer quinta coluna: Partiu para a eliminação do empecilho, via delação. O que deu para a arvore deu também para o machado!
Idem, Idem, para Barrabás chefe da Contra-resitência do braço armado e retaliador dos Judeus. Um Robim Wood de então, que após uma reunião ultima com os lideres Judeus, e informados do reino dos céus, ficou decepcionado. Foi usado no julgamento, estrategicamente. Visavam desestimular os seguidores de Jesus. Os romanos sabedores dos fatos estratégicos, o eliminaram.
Fizeram como fazem as autoridades políticas dominantes de qualquer tempo da historia. Manipulam os fatos e as informações.
Ainda retrocedidos no tempo, e já nos Montes Claros de 1940, quando o nosso popular Leonel Beirão, que na época chefiava a turma conhecida como, os Quebra Pau, unidade paramilitar montada para garantir a segurança da cidade, durante o período da Segunda Grande Guerra patrocinou a seguinte cena cômica.
A unidade, tornada então retaliadora caçava pelas ruas da cidade, de forma subjetiva (impulsionados pelo efeito da cachaça ingerida em demasia) e, impunemente, estrangeiros, quaisquer que fossem aqui residentes, ou mesmo de passagem, para interrogá-los, já que certamente eram espiões e entregá-los, a autoridade imaginaria e supostas.
Armados de facão, porretes e garruchas, os da patrulha, a portas do Hotel São Jose exigiam a descida de um hospede estrangeiro residente na casa. Era um caixeiro viajante de origem judia, que informado dos fatos, desceu ate a porta de peito aberto. E aqui vai o dialogo travado entre ele e Leonel Beirão:
Leonel – (apontando à garrucha) Têje preso!
Judeu - (sem entender, por estarem àqueles homens bêbados) Por quê?
Leonel – Caçamos os inimigos dos Aliados!
Judeu - (pondo a mão no coração) Eu sou judeu e os meus patrícios estão sendo caçados pelos Nazistas, os senhores deveriam ter vindo aqui para me prestar solidariedade. Nos também somos aliados!
Gaiato bêbado – (enquanto Leonel baixava a 380`) Foram os judeus que mataram Jesus!
Leonel – (apontando novamente a garrucha) Têje preso!
Judeu - (estupefato) Mas isso foi há 1940 anos.
Leonel – (garrucha em riste) Não interessa, estou recebendo a queixa agora! Portanto acompanhe-me em nome da lei!
Este diálogo, que veio a fazer parte do folclore Montes-clarense, e por si só explica os efeitos do preconceito induzido à mente por vias subliminares.


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Por Raphael Reys - 27/1/2012 09:19:11
ASSOVIANDO BOLERO

Cowan, 1979. Zé Amorim, então diretor da indústria cerâmica andava de um lado para outro no pátio, arrancando os fios dos cabelos, cheio de preocupações. O forno contínuo estava parado há quinze dias. Produção zero, caixa em vermelho!
Uma engrenagem vital para o funcionamento do forno estava quebrada. A Retifica União avaliou o estrago e sugeriu enviar a mesma para São Paulo, onde havia mais recursos.
O Zé andando pra lá e pra cá, no pátio da Cowan, quando recebe a visita de Tico Lopes, notando a cena de sofrimento procura ampara o amigo desolado.
Toma a cena e fala: calma, Zé! Dê tempo ao tempo. Tudo vai se resolver. Já que o prejuízo é inevitável relaxa e toma uma Viriatinha vai comer uma farofa de galinha caipira na Zinha, aí em frente. Muda de ares e vai dar tudo certo!
Zé, moralmente severo, olha acusatoriamente para o Tico, aquelas alturas meio hippie, vestindo calças jeans rasgadas e sentencia ao bom estilo Amorim-Curraleiro:
Eu não sei é como você não endoida seu F.D.P! Andando para cima e para baixo com essa bolsa de couro de homossexual pendurada à tiracolo e cheia de fitinhas frescas. Cordãozinhos atravessados e babilaques. Cabelo iêiêiê... e cheirando à vodka.
Completando a sentença amorinciana o Zé conclúi: Tem trinta e cinco peões há quinze dias assoviando bolero no pátio! Eu to é lascado! E você desfilando com essa bolsa viadeira!...
Tico leva o Zé para passear no Mercado Municipal, visando desanuviar a cabeça do homem de negócios. O Zé sai à procura de laranja flor, sua paixão. Logo depara com um bruaqueiro rebuçando a beirada de um saco de aniagem cheio das laranjas.
Por cima do monte ensacado, três laranjas descascadas e com o tampo superior cortado e pendente. Zé arranca os tampos e, com avidez, suga as laranjas uma a uma deixando só a bucha. Ato seguinte cospe teatralmente os caroços retidos na sua boca, um a um, numa pontaria certeira, os lançando na lata de lixo.
O Tico pergunta três vezes: Tá doce? Na quarta vez que pergunta, o Zé responde: só falta uma mão de cinza e um tacho de cobre seu F.D.P!...


70203
Por Raphael Reys - 23/1/2012 13:53:26
CALÇA RASGADA

Diz Homero na Oitava Ilíada que: “Os deuses tecem infortúnios para que às futuras gerações não falte o que contar!”
Para que os negócios da Cerâmica Cowan andassem nos conformes, a empresária dona Célia Machado nomeou o mui digno Zé Amorim gerente geral e deu-lhe a necessária carta branca para ele segurar as rédeas na cabeceira.
Mão de ferro, severo ao extremo embora de fino trato e até mesmo amável com as pessoas, o Zé não admitia nada fora dos eixos.
Certa tarde quente e com a baixada refrescada pelos ventos de agosto, uma forte rajada bateu abruptamente a porta do gabinete do Zé travando a fechadura, tendo a chave caída do lado de dentro da sala estando o Zé do lado de fora supervisionando a empresa.
Foi, nesta hora, chamado urgente pelo Tonim da Cowan, que informava estar à patroa já nervosa, querendo, insistente e impacientemente falar com ele.
Como o aparelho telefônico de baquelita ficava dentro da sala do Zé Amorim, Tonim, preocupado com o nervo da enfezadíssima patroa, açulou o nosso Amorim que aflito, esbaforido, inventou de saltar pela alta janela para resolver a situação emergencial. Desajeitado, como sempre, e com o esforço inusitado, rompeu a costura dos fundilhos da calça, tornando explicitamente visível a sua branca cueca da marca Torre.
Ao telefone, madame instruiu o Zé para esperá-la à porta principal da cerâmica, pois logo mais passaria apressadamente de carro pela avenida, rumo ao Parque de Exposições e precisa falar-lhe. Que o Zé a aguardasse de pronto, no ponto combinado como sem falta!
Estando com os fundilhos à mostra o Zé “pregou” o traseiro na cadeira do seu gabinete evitando o ridículo ao se levantar, e instruiu o Tonin receber e convencer a patroa a entrar, e diante do seu momentâneo impedimento se dirigir até o seu gabinete.
Zé Amorim sentadíssimo na cadeira, eis que chega dona Célia que se postou em pé, no centro da sala. Tonim e Fernando Cezar Amaral, de “voyeurs”, só assuntando, doidos para ver no que ia dar de hilário. Estranhando que o seu gerente, sempre educado e solicito não a recebesse condignamente, não oferecendo nem ao menos uma cadeira para sua chefa tomar assento, ela chamou o Zé no curé.
- Veja Zé! Você está estranho hoje! Pálido, suando em bicas e com o traseiro pregado direto nessa cadeira! Não me recebeu à porta, como de costume, não me convidou para tomar assento e nem ofereceu a água gelada e o cafezinho na bandeja de prata! Deu para ser mal educado, agora? Está andando com más companhias? Nem de longe demonstra um comportamento que se espera de um filho de Pedro Montes Claros, um saudoso cavalheiro!
Tonim e Fernando se deliciavam com sorrisos irônicos pelo sufoco do amigo, o Zé, mesmo com o traseiro desapetrechado. Suava frio, dona Célia não ia embora e o vento de agosto insistia em entrar pelos fundos da sua calça de linho S120 branco, feita pelo alfaiate J.Pandu (o Craque da Elegância), ameaçando expor à vista e à galhofa o cuecão botão de pressão!
Não houve jeito! O Zé teve que relatar o ocorrido e a patroa enviou o seu motorista até a casa do Zé na Rua Altino de Freitas, no centro, para trazer uma calça reserva.
Essa nova peça, mais adequada, pois de tropical inglês, confeccionada pelo famoso Jerry Ronaldo, o “Agulha de Ouro Frufru”.


70127
Por Raphael Reys - 20/1/2012 10:31:34
CHOFER DE PRAÇA

Em meados de 1950, falava-se em chofer de praça e a profissão conferia status, já que o número de veículos em circulação pela urbe era reduzido e os profissionais de praça botavam banca!
O povo era pouco desenvolvido e andar de carro considerado quase viver uma aventura! Daí, alguns chofers se tornaram verdadeiros don Juans. O fato se dava porque algumas senhoras casadas traídas, para se vingar dos maridos procuravam um chofer para fazê-lo, dado à mobilidade que o veículo conferia além do natural e conveniente álibi de tratar-se de uma passageira...
Predominavam os veículos importados, verdadeiras relíquias do romantismo. Packard, com Elpídio Dourado, Ford Sedan, com David e Mário, Oldsmobile com Geraldo Colares e Osvaldo Preto e Chevrolet, com Zé Antônio.
Um Buick, com Jaime Estopa Suja e Júlio Antonio. O Ford Cupê 46 de luxo, com Leopoldo. Depois veio Gê Sanfoneiro com seu Ford Preto e a paixão pela música Asa Branca, cantada por Luiz Gonzaga.
Levando os nossos passageiros a passeio, sempre bem vestidos, dispunhamos, ainda, de João Brejeiro, com um Mercury, Leví Cheiroso e seu Sedan Chevrolet Passeio, além de Marquinhos, Pedro Vieira, Hélio de Rocha, Zé de Juca.
Havia, também, José Antônio, pai de Pedro Cantinflas, Zezinho Preto, Leví, Mário Nortista, Ferreirinha com suas cólicas de matar e Isauro, sempre muito alegre, que colecionava guarda-chuvas esquecidos e cantava Ave Maria em vez de buzina.
Alguns dirigiam caminhões, como o L -16, o V- 8 e o Bulldog.
Logo chegou a modernidade e Mariano era instrutor de direção, profissão que exerceu por cinqüenta anos. Aí vieram os Aero Willys, as Rural Willys, Os Galaxies, os Simca Chambords, as Pick Ups, e os Renault Dauphines, apelidados de “leite Glória”, pois desmanchavam sem bater... Seguiram-se os Gordinis e seus “40 HP de emoção”, época em que a população já tinha acesso a financiamentos e o chofer de praça passou a ser conhecido apenasmente como motorista de táxi.
Dentre os instrutores de direção, destacavam-se ainda Alcebíades e Moacir.
Quem conservava no capricho um carro romântico era Jair Amintas e sua Baratinha Alemã. Dominguinhos Braga tinha um Impala, Oscar Gabriel o Cadillac Rabo de Peixe, Leví Daltro um Simca Chambord e Romeu o seu luxuoso Willys Itamaraty.
Aos demais chofers do passado, que não citamos por lapso de memória, ou por falta de espaço, recebam aqui as nossas desculpas com carinhosa homenagem.


70110
Por Raphael Reys - 16/1/2012 09:11:24
171 DO VENTO QUENTE

O pastel, essa guloseima fantástica, nos foi trazido a este rincão tropical pelos nossos irmãos portugueses, nos primórdios do século XVIII. Os espertos japoneses tomaram por conta à mística e se travestiram de chineses, criando, assim, um marketing para o produto.
Pastel tem de todo tipo, tamanho e sabor! Aqui nos Montes Claros, cidade pólo do Norte de Minas na atualidade globalizada, o mais famoso é o pastel curraleiro do Café Galo, do empresário e lobista Jadir Rodrigues.
O saudoso ex-alcáide, Marão Ribeiro era um viciado em pastel. Quando estava no point, saboreava para mais de vinte, tomando cafezinho com leite!
A iguaria é servida com todos os tipos de recheio, tamanhos, feitos com diversas modalidades de óleos e frituras. Tem aquele grandão, especial para enganar gulosos seletivos. Esse, o pastel 171, só tem tamanho e nenhuma qualidade.
Na minha infância, as famílias serviam o pastelão. Assado ao forno em uma grande forma de alumínio e recheado com a mais autêntica galinha caipira. Adorávamos e comíamos de dar tristeza...
Como o matuto é tido como cabra esperto e cheio de treitas, conforme a sabedoria popular enquanto enrola o cigarro de palha, pensa em como enganar um otário boteniqueiro, no antigo Mercado Municipal, onde hoje se situa o Shopping Popular. Lá, o capiau aplicava na clientela.
Um deles, colocou um cartaz na entrada do seu bar. O reclame dizia que encontrasse recheio no pastel, ganhava um prêmio em dinheiro, na hora, de 200 duzentos cruzeiros!
Como a população dos anos 50 era ordeira, a palavra de um homem tinha o seu valor e fio de bigode servia de aval. Os inocentes, futuros logrados, faziam fila para degustar a iguaria recheada de vento quente.
O esperto comerciante, cujo nome omitirei, pois os familiares ainda vivos apresentam comportamento agressivo, encheu por muito tempo os bolsos de grana e a população a pança de vento quente!
Como diz o dito popular que castigo pega malandro o pasteleiro passou a encher o pandú de cachaça branquinha no ambiente de trabalho. E essa marvada não perdoa! Botou guenga por conta e passou a pagar rodadas de bebidas para amigos diletantes de copo e de cruz. A grana que entrava era tanta que chegou a se candidatar a cargo letivo
Morreu doido, bêbado, asilado, pescoço descascando e pés inchados. Sozinho em uma cama nos fundos da sua nova espelunca!


70083
Por Raphael Reys - 10/1/2012 17:49:10
ALTA VELOCIDADE

Transcorria o ano de 1976 nos folclóricos Montes Claros. Terminada a construção da BR 135, ainda sem a camada asfáltica, e os acidentes se sucediam; dada à poeira que se fazia, provocada pelo trânsito constante de veículos, indo e vindo rumo à Capital. A imprudência imperava, na emoção em se usar o novo.
Walduck preparara uma viagem a Belo Horizonte em uma caminhonete importada. O motorista escolhido fora Lincol Mesquita, conhecido corredor e maluco por emoções. Na ocasião insistiram em levar o Zé Amorim, com o restante da turma para que a viagem e a estada na Capital fossem agradáveis e divertidas.
Zé recusava-se a ir, alegando que não viajava com doido no volante. A turma, entretanto já combinara em não ceder, e acabaram por levá-lo, mesmo contra a sua vontade, já que sabia do risco que se fazia numa viagem daquelas. Referindo-se a Lincão, disse: Esse homem é um horror! Um perigo para a vida de um pai de família! Amorim desconhecia que Lincol já houvera alterado o velocímetro do carro, para que na leitura, mostrasse uma velocidade superior a real, tudo no intuito de provocar medo no Zé, que temia por correrias em estradas de terra.
Logo que saíram da cidade, o velocímetro marcou cem quilômetros. Todos olhavam disfarçadamente, e notaram já os primeiros sinais de contração facial do Zé. - Cento e vinte - alguém falou, já provocando: Olha, Walduck, a velocidade desse carro, é possível isto numa estrada desta? . Os dedos do Zé já penetravam no estofamento do banco, se agarrando. Cento e quarenta – Veja Walduck, que absurdo este rapaz correndo! – Walduck respondeu, - Eu já botei mais do que isto, e não aconteceu nada. O suor escorria pela testa do nosso saudoso Zé, ensopando a camisa. Os seus pés, torcidos. Mordia os lábios! Mas permanecia calado! – Cento e sessenta, disse alguém - Este carro vai capotar. Walduck respondeu – Eu, já botei cento e oitenta, e o bicho agüentou!
As provocações continuavam e o Zé, gélido de terror, suava as bicas, mas permanecia calado, evitando provocar os presentes, e os mesmos por inconseqüência, incentivarem ainda mais à correria.
Veio a provocação final! - Walduck falou... Bota duzentos Lincão que eu garanto! Se tiver problemas, eu aparo o cavaco! – O Zé explodiu!... - Manda botar trezentos, carroceiro! Já estou vendo a manchete no Jornal do compadre Jair Oliveira. Empresário morre na estrada que ajudou a construir! . Corpo de comerciante é encontrado a cento e trinta metros do local do sinistro. Viúva reconhece o cadáver do marido, pela arcada dentária. . . Demais ocupantes, viram mingau.
Logo a seguir, tiveram que parar o carro. Ninguém mais se agüentou de tanto rir.
O resto da estada em Belo Horizonte foi uma tragicomédia. Não conseguiram fazer nada. Era só lembrar do Zé e rolar de rir...


70044
Por Raphael Reys - 4/1/2012 13:17:08
BICICLETA SUECA “FAIADÊRA”

Florianópolis, Ponte Pênsil, 1973. Lincão Mesquita, ferido gravemente por disparo de arma de fogo de grosso calibre, em incidente de rua. Operado, por sorte, por uma equipe de especialistas que coincidentemente ministravam um Congresso Internacional de Cirurgia e Reconstituição na cidade.
O paciente em estado crítico, mas já teimosamente sentado à cama. Ney Mesquita, seu pai, emocional como era, estava em depressão. Encorujado e chorando a um canto do quarto. Inconsolável!
Recebe a visita inesperada de uma turma de montes-clarenses pesos pesado. Walduck Wanderley levou um magote de notívagos objetivando dar apoio moral e curraleiro ao amigo Ney. Dentre outros, o cavaleiro da verve Zé Amorim, Dácio Cabeludo, Mamoeiro, Tião do Banco, Zé Paraíso, citando apenas os cabeceiras.
Por milagre de Deus, a turma compareceu sóbria, em respeito à gravidade do quadro apresentado. Sentados, decentemente, ao lado do convalescente pitombado, quando uma tremenda loura, a Miss Santa Catarina, namorada da feliz vítima, deu entrada no quarto vestindo uma curtíssima mini-saia. Modelo Mary Quant, o chique da época!
Moda quente que expunha as suas calibradas coxas. A todo o momento abaixava-se, para limpar a secreção que saia do nariz do namorado, ocasião em que deixava à mostra a calcinha, à vista dos demais.
Exibia o seu volumoso traseiro modelo Deustschland, o que era apreciado com gosto pelo esquadrão de raparigueiros presentes. Ney, alheio à cena erótica, chorava copiosamente, quando Zé Amorim o chamou a um canto da sala, mas ainda ao alcance dos ouvidos atentos de Walduck.
Buscando consolar o depressivo, o nosso Zé, filósofo da vida e psicólogo das fatalidades do cotidiano, falou: para de chorar Ney! Esse fiduma égua do seu filho não vai morrer não! Ele tem o corpo fechado! Deixa de chorar e aprecie o panorama dessa bunda branca à sua frente, caboclo! Se esse cara tivesse que morrer, já tinha morrido. Bala dundun mata na hora.
Continuou a terapia de consolação, mantendo a mão sobre o ombro do choroso pai da vítima: Desanuvia a cabeça homem! Quando você chegar a Montes Claros compra uma bicicleta sueca ‘faiadêra”, daquelas com problema na corrente e na catraca.
Concluiu as observações falando: toda vez que você lembrar da pitombada que esse animal levou e do panorama dessa bunda branca, suba a ladeira do Alto São João com a bicicleta chiando rock... catrak...vupt...catrak...corrot...catrakt! Escorregando o pedal, “faiândo” e você suando frio!
Respirou teatralmente como um ator de estúdio curraleiro e concluiu a seção de psicologia aplicada, suspirando fundo abrindo os braços espaçosamente e sentenciando: quando você chegar ao Parque de Exposições, já terá esquecido a pitombada deste fiduma égua presepeiro. Vai se lembrar somente do panorama desse traseiro alemão, que está balançando pra lá, e pra cá!


69943
Por Raphael Reys - 26/12/2011 08:30:21
TÁBUA DE PIRULITO

Transcorria o ano de 1956, e o saudoso comerciante, o popular Zé Amorim, o mais notável e elegante da estirpe Amorim, resolveu fazer parte da turma de rapazes que aquela época usava possantes e grandes motos importadas.
Da galera de então, Heber Rêgo e o próprio Zé, Carrim e Luiz Benhur, Sargento Moura do TG 87, José Maria Relojoeiro, Júlio e Waldim. Cavaleiros da terra de Figueira que usavam motos BSA, ROYAL, e JAWA,
Zé como era caprichoso, desmontou a sua moto e mandou cromar as partes metálicas na oficina Niquelagem de João. Aproveitou e mandou dar acabamento nos puxadores e esquadrias das janelas da sua casa paterna.
Terminada a empreitada e estando tudo nos trinques, encomendou ao Baiano Branco oxidar o seu Colt Cavalinho 38, ficando, assim, como rezava a moda masculina da época do Romantismo.
Passado trinta dias e depois de seis idas e vindas à empresa niqueladora, o Baiano, entregue ao doce ofício de tomar todas as cachaças Viriatinhas que encontrasse, enrolava o Zé, dizendo: volta amanhã que estará pronta e não enche o saco!
Numa tarde ensolarada de um dia de cão, Zé entrou na niquelagem pisando alto, suando as bicas, com o colarinho da camisa Volta ao Mundo ensopado e a jugular prestes a estourar e falou: volto amanhã às 16 horas seu gambá. Se o revólver não estiver pronto, você vai se ter comigo. Após a sentença saiu batendo os pés no assoalho.
No dia e hora marcados, o Zé entrou e, batendo com a mão no balcão de encomendas disse: estou aqui caboclo! Cadê meu pau de fogo oxidado! Baiano Branco que naquele dia havia extrapolado nas doses de cachaça, já com o pandú cheio, respondeu: espera um pouco, seu apressadinho!
Sem que o Zé o visse, levou as seis balas 38’ no torno, extraiu as cabeças com um alicate, diminuiu consideravelmente a pólvora da munição, apertou a entrada com uma fita, municiou a arma e, em seguida saindo ao salão falou, já apontando o trabuco carregado com balas de festim para o assustado Zé: toma aqui seu apressadinho desaforado!
Disparou os seis tiros no apressado. O Zé caiu esticado no salão, e enquanto os presentes gritavam: Baiano matou o Zé Amorim! O Zé só conseguiu balbuciar: Minha boca está embolando o cuspe!
O nosso herói quando viu que ainda não havia morrido, saiu às pressas em direção à sua casa, entrou correndo e à vista da mãe, abriu a camisa teatralmente arrancando os botões de madrepérola e exclamou novamente: me fizeram de tábua de pirulito mamãe, olhe só a bagaceira!


69891
Por Raphael Reys - 19/12/2011 13:58:14
UM CLIMA DE CAVALO MANSO

3h30, finalmente saio do leito após uma noite insone. Vagando com o fluxo do Euripo, em uma transição entre os atributos da mente de vigília e os atalhos do inconsciente freudiano. Cai sobre a nossa urbe uma chuvinha fina e curraleira.
A aura do espírito natalino cria corpo de fraternidade universal, nesse mundo de corações partidos. Sopram os primeiros ventos benfazejos para aliviar as angústias dos entes humanos.
Plugado ao fone de ouvido, escuto Koko Taylor em um dueto com BB King em Someting You Got. As espirais do metal ferido comprimem o meu emocional e dão um ritmo de cavalo manso. Tudo fica como dantes no Quartel de Abrantes!
Os arcanjos aproveitam o tempo de amor universal que paira sob a terra e emitem os seus mantras e sopram um vento suave com cheiro de flor de marcela. Como a vida é bipolar; Lusbel, o Esplendoroso, um arcanjo decaído e usando o seu livre arbítrio, planeja nos seus boqueirões magnéticos tomar de assalto o nosso planeta.
O Ebanon 636, Terra. Mundo experimental e de atualizações das almas criadas. Inaugura mais uma faculdade para ensinar sofismas políticos e aprimorar a arte da heurística. Visa com isso influenciar a mente dos mandatários da banda podre que usam a mídia para lavagem cerebral dos ouvintes incautos.
A Festa do Pequi traz um pouco de alegria e incita os nossos sucos gástricos!
As hostes da abnegada Legião de Maria passaram a noite em missão socorrista. Amparavam os oprimidos, deprimidos, desamparados, carentes de amor e demais infelizes desse mundo globalizado. Todos eles são filhos do mesmo Deus.
O crack, barato sintético, ameaça dominar o quengo mole dos humanos. Os Homens de Negro, na contraparte da força, sorriem às bandeiras despregadas da escravidão mental produzida pela mídia marrom. Estilo Macunaíma.
O Hades continua profundo e em círculos. Lá, no fundo profundo, tripudia no portal uma bandeira com os dizeres: o estandarte do inferno avança!


69863
Por Raphael Reys - 16/12/2011 10:12:30
UM CLIMA DE CAVALO MANSO

3h30, finalmente saio do leito após uma noite insone. Vagando com o fluxo do Euripo, em uma transição entre os atributos da mente de vigília e os atalhos do inconsciente freudiano. Cai sobre a nossa urbe uma chuvinha fina e curraleira.
A aura do espírito natalino cria corpo de fraternidade universal, nesse mundo de corações partidos. Sopram os primeiros ventos benfazejos para aliviar as angústias dos entes humanos.
Plugado ao fone de ouvido, escuto Koko Taylor em um dueto com BB King em Someting You Got. As espirais do metal ferido comprimem o meu emocional e dão um ritmo de cavalo manso. Tudo fica como dantes no Quartel de Abrantes!
Os arcanjos aproveitam o tempo de amor universal que paira sob a terra e emitem os seus mantras e sopram um vento suave com cheiro de flor de marcela. Como a vida é bipolar; Lusbel, o Esplendoroso, um arcanjo decaído e usando o seu livre arbítrio, planeja nos seus boqueirões magnéticos tomar de assalto o nosso planeta.
O Ebanon 636, Terra. Mundo experimental e de atualizações das almas criadas. Inaugura mais uma faculdade para ensinar sofismas políticos e aprimorar a arte da heurística. Visa com isso influenciar a mente dos mandatários da banda podre que usam a mídia para lavagem cerebral dos ouvintes incautos.
A Festa do Pequi traz um pouco de alegria e incita os nossos sucos gástricos!
As hostes da abnegada Legião de Maria passaram a noite em missão socorrista. Amparavam os oprimidos, deprimidos, desamparados, carentes de amor e demais infelizes desse mundo globalizado. Todos eles são filhos do mesmo Deus.
O crack, barato sintético, ameaça dominar o quengo mole dos humanos. Os Homens de Negro, na contraparte da força, sorriem às bandeiras despregadas da escravidão mental produzida pela mídia marrom. Estilo Macunaíma.
O Hades continua profundo e em círculos. Lá, no fundo profundo, tripudia no portal uma bandeira com os dizeres: o estandarte do inferno avança!


69785
Por Raphael Reys - 7/12/2011 09:02:34
BALCÃO DO BAR DO CAPA V

Na manhã de hoje se faz um clima romântico. Chuvinha fina, entremeada de um sol malemolengo, com o baticum frenético das motos, verdadeiros cavalos de aço urbano que estrepitam suas ferraduras em um curso frenético de Rolerball. Chegam os primeiros notívagos do dia neste outono ainda imprevisível.
Zé do Gás, boêmio habitual, trás uma gamela com ovos cozidos. Quebra as primeiras doses de branquinha desdobrada e se espocam as borbulhas das louras espumantes e batizadas. A emoção é como um barril sem fundo: jamais se encherá.
Em espirais metálicas, Roberto Carlos canta os males do amor. A galera lê e comenta os tablóides dos periódicos com manchetes de corruptos, modelos femininas à venda e muita tragédia de suburbanos e minorias raciais.
No trecho onde se situa o Bar do Capa, surge a primeira moradora de rua exalando bodum, álcool e desespero. São os arcanos e duendes da modernidade globalizada. O planeta gira doidamente, a lusitana roda em seu sincronismo dervixe e os arcanos negociam o nosso carma no Tribunal de Aragana!
A bebida inebria os sentimentos e expele supostamente os ratos que habitam os esgotos do nosso inconsciente freudiano.
De mão em mão circulam as primeiras notas de cinqüenta reais recebidas na tarde anterior pelos pedreiros, mecânicos e demais oficiais artífice da prestação de serviço. Compram pão, leite, macarrão, carne e tomam cachaça batizada.
Semblantes se descontraem. Há um sofrer sem se dar conta e um dejá vu oculto no inconsiderado. Celulares tocam em expressivas espirais metálicas irrompendo no insólito, enquanto trinados digitais imitam pássaros já quase extintos.
Chegam as entregas de mercadoria oriunda dos armazéns de atacado em clima de cavalo morno. Avós passam carregando os netos para a escola e compram pacotes de alimentos industrializados.
Ninfetas com seus blue jeans e seus sonhos de trabalho e formação escolar passam pelo passeio.
Haroldo do Destak, chegado pela madrugada, vindo da Bahia de Todos os Orixás vem prestar cumprimentos a amigos de copo e de cruz. Avalia a bitola física de cada um dos presentes e nos brinda com a sua verve.
Espirais de fumaça, vindas de cigarros Paraguay trazem o cheiro da química mortal.
Bacana toma a sua segunda dose do dia e cochila no balcão, pescando uma piaba no grande rio do sono.
Pelo fone de ouvido, amorteço a minha alma plástica com o som de Koko Taylor cantando All Your Love. Um doce e urbano lamento vestido com a alma negra do blues...


69714
Por Raphael Reys - 28/11/2011 09:46:56
BALCÃO DO BAR DO CAPA IV

No bar, com seu universo de puro encantamento, tudo e todos se planificam. Sexta feira de manhã chuvosa, clima de final de semana, Zé do Gás chega e diz para o jornalista Reginauro Silva, que clicava os personagens do pedaço: Sonho com você quase todos os dias!
Capa, atrás do balcão, pergunta na bucha: E, por acaso, Reginauro é marca de cachaça? Vaguim pega o maior porre, cambaleia penducando o equilíbrio e os boteniqueiros o conduzem na sua bicicleta dando uma de transbebum. É a Fraternidade das Santas Almas do Boteco...
A Rádio 93 FM toca Cabedal em Flor e os donos de cabeças de touro do pedaço tomam mais uma das desdobradas Pé de Cova e Pêra Preta, ambas fubuias dos alambiques de tronco com gambá do povoado de Ermidinha.
Danilim Pisca ingere a primeira do dia, estala os dedos e diz: Senti firmeza! Logo fica tonto e sai relando a pintura da parede. Rodolfo Repórter esquece o envelope no batente da porta e Edmilsom Peneirão dá uma de enfermeiro fazendo um curativo com papel higiênico e fita adesiva no Show de Gole, que caiu e relou o braço.
A galera do bar combina um amistoso de futebol no campo do Ferro, contra a galera do Bar do Preto do João, logo ali perto na Avenida Bomfim. Para reforçar o plantel a turma do Preto contrata Zé Gota, Soin, Zé Pereba e Nilsinho Bagaço.
O vidraceiro Tafarel surge com sua recente careca usando um boné com pastilhas de espelho. Todo translúcido! Geraldo toma várias fubuias, fica tonto, se abraça a uma garrafa de licor de pequi e sentencia: Vou beber dessa aqui agora!
Como o salão do boteco é palco de vividas tragédias e comédias, Ro Besouro abre a sua caixa de ferramentas. Atormentado pelos males do amor, tirado a imitar Zezé de Camargo canta a toda altura: É o amôôôôô!...
Emboramente o enlevo de tanto romantismo, Rô abre demais a boca, a dentadura lhe cai no chão e ainda empena a haste!
Assim, não há tatu que agüente, né gente?...


69690
Por Raphael Reys - 25/11/2011 10:45:36
RITOS DE PASSAGEM... RELATÓRIO FINAL!

Como o canto do cisne é mavioso e longo, vai aí o relatório final dos meus já badalado Ritos de Passagem.
O retrato na lápide de mármore carrara será um pop art feito pela blondi Letícia Laz.
A terapeuta Maristela Kosinski, que tem uma anja de guarda polaca, fará o ensaio sobre a minha personalidade, ressaltando o traço emocional e a minha queda por mulheres de olhos mágicos. A poetisa Dóris Araújo fará um performance declamando os meus ritos.
O escritor e poeta Felippe Prates, o querido amigo do peito, meu guru e mestre/literato, um globtroter, com o seu grande coração de Rei Lear fará a crônica daquele momento, recheada de emocionalidade e dando uma bronca! O jornalista Paulinho Narciso, olhará para o cenário tupiniquim e dirá, ao seu jeito: É isso mesmo, esse menino?
Um bolachão de acetato com Roberto Carlos cantando Canzone per te. Para que possa me trazer a recordação daquela morena capricorniana que deflagrou as minhas emoções
A escritora Karla Celene com a sua graça e leveza dançará no salão um pas de deux com a sua alma gêmea Roberto, e o maestro Armênio Graça executando no piano de cauda O Bolero de Ravel.
Às guenguenzagens postas dentro do caixão de quinta categoria, que, de tanto peso já corre o risco de soltar o fundo, se acrescente ainda uma reza catimbó, de linha branca de Mãe Maria de Codó.
A presença do renegado Chiquinho Soldado, um paraibano acunhado, desertor das fileiras da PM, companheiro de viagens em serviço pelas tantas quebradas do Maranhão, Piauí. Passamos e escapamos de trizidelas de estrada; alegrias bebendo cachaça Mangueira e tiquira, aplicando quiriquitas em bares e lupanares, dançando forró, contando bravatas. Sorrindo a bandeira despregada!
Afinal, a alma serve mesmo é para os vãos dos andares da vida!
O mestre Luiz Federal do Cajueiro (se ainda estiver nesse mundo doido), com a sua verve de contador de causos e relatando as suas aventuras pela Terra de Iracema, região onde as mulheres mantêm acesa a libido mesmo depois dos sessenta na radiola.
A presença de uma lavadeira de roupas do Barra do Corda, no Maranhão, gigantes de ébano descendentes da Mãe África, com seus olhos azuis, resultado da miscigenação de negro, índio, franceses e holandeses. Um verdadeiro encanto exótico e tropical na Terra de Macunaíma.
E por cima da fuleiragem, botem um balaio com cagaita, marmelada de cachorro, panã, gabiroba, araçá, um tijolo de doce de buriti, outro de casca de laranja e uma caixa de fósforos cheia de carrapatos daqueles pequenos só para recordar da verve libidinosa do saudoso topógrafo Zé Sales (o devagar) e suas invenções eróticas.
Ele despejava os carrapatos na sua pele e pedia a parceira para catar um por um.


69648
Por Raphael Reys - 21/11/2011 11:00:29
171 PÁSSARO PRETO

Padre D`Ontonho, cabelos alourados já grisalhos, pinta de artista italiano, era filho de mãe baiana de Nazaré da Farinha e pai marinheiro alemão escorraçado, desses que deixavam um filho em cada porto.
D`Ontonho, fora criado nas cercanias do Mercado Modelo, cenário farto de aprendizado de 171, chavetas e contra-chavetas urbanas.
Quando novo de batina, era o terror das alcovas das suburbanas mal amadas. Como deitava e rolava nos lençóis, criou má fama. O Senhor Bispo o transferia de urbe para urbe, visando lhe dar canseira. Terminou indo, em definitivo, para o povoado de Amargosa, um interior bravo.
Logo que criou corpo, tirou da caixa de ferramentas o 171 emprestado. Diariamente aplicava a dois fieis, ovelhas selecionadas abastadas, a igual quantia de cinquenta cruzeiros em cada um. Na mais pura giriguitazem baiana!
Na hora do golpe, chegava na pressão, com a bíblia debaixo do braço e ia logo aplicando o bate seco: “ Compadre! O senhor tem duas de cinqüenta para trocar por uma de cem?” Na ocasião da aplicação do agá levava a mão cheia de anéis ao bolso, para que a vítima presumisse que lá estava o dinheiro.
O pato trazia as duas células de cinquenta, ele apanhava uma só e dizia: “Olha! Mudei de idéia. Não vou mais precisar trocar! Vou levar só esta perna e, logo amanhã, te devolvo!”
Amarrava no rabo do veado e adeus, neca de pitibiribas!...
Com essa operação, amealhava diariamente em torno de cem reais, direto para a sua poupança, lhe rendendo uns três mil reais por mês.
Posudo e metido a juiz, dava uma de conciliador entre partes adversas. Aplicava a lei do perdão para ambos e cobrava do devedor, ou do autor, uma quantia por ter evitado demanda judicial!
Mané de Juca, enrolado por um rabo de saia campesino e estando caído de bolso, aplicou em uma rés de um vizinho. Vendeu o produto do furto para o açougueiro e gastou a grana em presentes e adulos para sua prenda.
Como a noite tem mil olhos e mil ouvidos, o mal feito caiu na boca pequena. D`Ontonho chamou o malfeitor na igreja e exigiu que o mesmo se declarasse culpado perante todos os fieis presentes, inclusive o fazendeiro lesado. Alegou que, assim feito, Deus o perdoaria, além da urbe e do lesado.
Na missa de domingo, na hora do sermão, Mané já pronto para fazer a sua confissão, de esguelha viu o cabo e os três soldados do destacamento local entrando sorrateiramente à paisana. Logo sacou que o padre havia vendido a sua rendição para puxar o saco do fazendeiro.
Acontece que no banco à sua frente estavam sentadas três crianças do cabelo alourado. Ergueu a voz e disse, bem claro: “Gente, o padre D’Ontonho me pediu que eu fizesse uma confissão em público, e em seu nome e que só assim ele seria perdoado. Esses meninos galegos aqui na minha frente são filhos dele!”
Armada a confusão, enquanto o pau comia na igreja de D`Ontonho, Mané deu no pé, gramando o beco!


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Por Raphael Reys - 15/11/2011 10:21:53
RITOS DE PASSAGEM... COMPLEMENTO

Dado à exiguidade de espaço na minha crônica Ritos de Passagem, publicada recentemente na mídia local, em que trato do meu projetado e alegre funeral, redigi este complemento.
Naquela oportunidade, pretendo ser clicado pela suave Silvana Mameluque, pois só ela sabe tirar um pedaço das almas dos que são focados. Então, já serei um de cujus e o meu espectro emocional estará vagando alhures em frente ao portal de Dite, nos Hades, bradando: Ó vós que aqui estais, perdei todas as esperanças!
Que se acrescente ao fundo do ataúde, transformado em pequena biblioteca funérea/ambulante, o monumental Grande Gatsby. As cartas do Apóstolo Paulo às comunidades, um exemplar do Zend Avesta, o Livro Tibetano dos Mortos (que será apenasmente o meu GPS na jornada zinfática) e Inocência, de Taunay.
Transcrições de poemas de Florisbela Spanka; o Vestido de Noiva, do anjo pornográfico Nelson Rodrigues. Uma Kata curta de samurai da dinastia Odo (estive encarnado na época, por lá).
O meu Radar de Sétimo, do Povo Jaguar. A almofada do Sekinah do Oráculo, onde, de joelhos e sob a pressão da ponta da espada do Hierofante apontada contra o meu peito proferi o juramento de honra e recebi o meu nome iniciático a palavra de passe da Legião de Benefactor.
O clip que os Equitumans implantaram na minha arcada dentária e a bala 44 amassada no botão de aço da jaqueta do blue jeans, posto ali graças à intuição de minha mãe saudosa e que desviou a trajetória do impacto do que seria a minha morte física. A fantasia transparente de Bruxinha Malvada que aquela blond boazuda usou na nossa primeira noite de luxúrias tropicais...
Como sou epidérmico e sensível, um acetato de Mercedes Soza cantando Volver a los dezessete. Um dvd de Ernesto Borgaine interpretado em 11 Minutos. Gerinha Português narrando as sua valentias e bazófias. Presentes ao exótico e libertário evento, quero o sorriso doce e a aura de encantamento da artista plástica Felicidade Patrocínio.
O compositor e roqueiro Eltomar Santoro, cheio de goró, abraçado ao nosso poeta urbano Aroldo Pereira, mestre e mentor do Psiu Poético, cantando a saga das Damas do Bonfim, a nova versão do épico dos lupanares. Uma garrafa de Jack Daniels, uma água tônica de quinino com limão curraleiro e cubos de gelo de côco verde...
De Teresina, capital do Piauí, virão Géda de Federal e Carimbó Maluco, mestres benzefalas e Capitães da Guarda do Congo, para fazerem a percussão de Aquarela Brasileira. Eles aparam qualquer cavaco no coro do tambor. E que tragam na bagagem Jean Cantor, um bebum que compôs a música enredo da Escola de Samba Unidos da São João, onde foi homenageado como O Mineiro do Cajueiro.
Reinaldo Sanchez tirando espirais sonoras em blues de um pedaço de cano galvanizado, preso à concha de uma das mãos.
E para marcar a lembrança da primeira peruca de touro que recebi de uma namorada no calor dos meus dezessete anos, na Fazenda Cabeceiras a música de Lenon e Lílian que, desolado, cantei sob a tenda da amplidão:
“Rasgue as minhas cartas e/não me procure mais/assim será melhor meu bem/o retrato que lhe dei/a inda tens eu sei/mas se quiser... devolva me/deixe me sozinho/por que assim/eu viverei em paz...”
Nada como recordar um infortúnio...
Gravada a fogo na lápide de mármore Carrara, a transcrição do e-mail que a minha musa me enviou enchendo-me de prazer... Písciano considere-se um homem de sorte. Você acertou o meu lado doce de mulher e de luxúria...
Isso dito, sacramentou-se ad perpetum o meu savoir faire et vivre com a difícil alma das mulheres e seus interiores, plenos de desconhecidos e surpreendentes oceanos de pura magia!



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Por Raphael Reys - 11/11/2011 07:58:08
OS MÁGICOS OLHOS E AS CORES DE CONCEIÇÃO MELO

Serafins do Quarto Céu de Beatrice espargiam prana sobre as alegres cores da mostra da artística plástica, no Centro Cultural Hermes de Paula. Pura feminilidade, ventos em Astro Taunay, tons que lembram a mística de Matisse. A mestra vestia um quase transparente negro com variações de verde folha.
Um arrepio! Um luxo sobre aquele manequim escultural, um contentamento e os mistérios de mulher revelados nas suas telas.
Ela, como uma deidade do Olimpo, com a sua doce alma refletida através dos seus bonitos olhos. Um universo translúcido em fractais. Deus-Pai em sua onipotência, ao criar as mulheres belas e as artistas no seu Nicho de Nodim, na fronteira de Manifesto com o Imanifesto, às vezes exagera e propicia uma overdose. E viva o delírio dos urbanos!
Os presentes e eu, um vil mortal de alma bandida sorvendo o instante embriagador proporcionado pelo Joy de Vivre da musa sagitariana e sua mostra de arte.
Um magnetismo no salão de eventos com lindas mulheres enviadas pelos arcanos da arte, elegantes senhoras, celebridades, higt soçaite e a geração pão com cocada enchendo tudo de vitalidade. Um colírio para os olhos e um descanso para nossos corações.
Dos oráculos de Mercúrio, veio à jornalista Angelina Antunes, um sonho de morena, a aura de encanto de Silvana Mameluque que clicava tudo, tirando um pedaço das nossas almas. Luiz Carlos Novaes, senhora e filha, de chapéu e sem suspensórios.
Do portal das artes plásticas no Norte de Minas foram enviados Carlos Muniz, Felicidade Patrocínio (risonha e límpida), Afonso Belão - de suspensórios e chapéu mafioso- e outros ícones. Belezuras PO se fizeram presentes.
Dona Yvone Silveira, presidenta da Academia Montes-Clarense de Letras, a matriarca e hierofante de todos nós. Os escritores Petrônio Braz e senhora, Mara Narciso e filho com sua aura de bem com a vida, Karla Celene e a sua alma gêmea, Roberto. Outros mais estiveram an passant.
O elegante jornalista João Jorge e o seu sorriso de pura bondade distribuindo alegria para todos e apresentando a mostra. Presente também o decano dos jornalistas montes-clarenses, Magnus Medeiros e a sua nobreza de coração.
O escritor e poeta Aroldo Pereira, mentor do Psiu Poético e o compositor e roqueiro Eltomar Santoro, o mestre que cantou a saga das Damas do Bonfim.
O salão fervilhava de colecionadores, donos de galeria de arte, compradores. Tudo o que a Conceição Melo produz vira ouro.
Durante a notável mostra da artista, os Céus de Yemanjá deram um banho de fina chuva benfazeja na terra de Figueira o que potencializou a doçura do evento.
Fui clicado téte-a-téte com o rosto coladinho à face de beleza clássica da artista e próximo as janelas translúcidas, portal de um oceano onde quem ousar mergulhar, fará uma viagem sem volta.
E viva essa diva dos olhos mágicos!


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Por Raphael Reys - 3/11/2011 09:06:07
TERCEIRO ALMOÇO CURRRALEIRO

Com o Restaurante La Traviata em tarde de glamour, a Praça Savassi, sofrendo reformas e uma romântica e fina poeira nos fazendo dar espirros. Nossos corações fibrilando em frenesi e a junção da galera da República do Pequistão e as feras urbanizadas das Alterosas.
Santos anjos campesinos de barro torpe e filhos do dragão que cospem fogo! Na egrégora da descontração 9/16 PO, Coronel Tininho com sua doce Carine, o casal 20, Chico Ornellas e Raquel com seu panamá. Cynthia Bernis, a sardenta dos mágicos olhos azuis, paramentada pelo gostosão do pequi, Eduardo Lima e pelo seu ex Ademir Fialho. Ela chegou escorrendo gotículas de chuva pelo seu pescoço venuziano.
Paulinho Priquitinho, o sumido, elegantemente vestido, o escritor Leonardo Campos, o melhor especialista em louras poposudas da terra de Figueira. Os jornalistas Tião Martins do Hoje em Dia com a Genoveva Ruisdias, velhos amigos do Gatos e Gatas.
A Mulher ao Avesso, a escritora Cláudio Cardoso com seu olhar magnético e sua doçura, assim como Leonardo, autografando suas obras. O chame explosivo da musa Vera Rita, com o seu sorriso capricorniano de rasgar a alma. Ela tem overdose de paixão pela vida e pelo amor. En Passan, e com sua mirada de fada tropical, Cláudia, irmã de Murilo Antunes.
Ausentes de corpo, porém presentes em espírito Mary Alckmin, Tomm Maia. Quase chegaram Waldemar Euzébio com Renata Pelatti, Murilo não foi avisado e o escritor Augustão Bala Doce, molhando os seus documentos íntimos nas salgadas águas da Bahia de Todos os Santos.
Das montanhas geladas da Cortina Dàmpezzo na Itália e em espirais sonoras pelo telefone, Fernanda Belotti com seu sorriso que cura todos os males.
O scothc rolou, o Romãozinho da Savassi foi liberado e a galera picou o pau. Dois dedos de literatura, cultura! Caímos na larga do mundo e falamos até da vida alheia que é da conta de Raimunda e todo mundo. Falamos de alcovas e mesmo de sexo explícito. Na mesa tinha três especialistas práticos...
Falei da beleza do texto da escritora Mara Narciso. Sorrimos à bandeira despregada, libertamos os bichos que estavam escondidos nos porões do inconsciente quixotesco. Fluíram narrativas impublicáveis.
Deu coceira na libido da roça e aí foram relatados velhos amores. Corpos se buscavam em amplexos e ósculos úmidos de puro contentamento. Rolaram químicas de novos amores, todo mundo abraçou e beijou todo mundo. Uma puta fraternidade dos roedores de pequi e os bichos urbanos.
Recebi o selinho mais desejado da minha vida e saí pisando em ovos! Posto que o amor, apesar de ser infinito é chama. O próximo será no fim de novembro.
Quero morrer doce!


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Por Raphael Reys - 27/10/2011 08:40:00
RITOS DE PASSAGEM

Quando eu finalmente deixar este mundo bipolar, concluída em parte, ou em seu todo a minha missão, quero de sentinela no velório uma comitiva de amigos diletantes e lindas mulheres...
Paulinho Relojoeiro, o globtrotter do Quarteirão, com seu indefectível órgão eletrônico de quinta categoria executando a sua composição maior Li, Li, Li, na versão inglês e cantando com voz amacarronada, Só para ironizar a dita morte tão temida...
O notável escritor Augusto Vieira Neto, vindo das Alterosas, suando muito, a relatar a nossa última farra na noite belo-horizontina. As noitadas de tango que curtimos na Boate Papillon, com as Mariposas da Noite. E que deposite no ataúde uma garrafa de Viriatinha, das antigas...
Presente Tico Lopes, o venerável mestre benzefala, imitando respectivamente, Zé Amorim e Joanir Maurício, dobrado sob peso do trabuco na cintura. E que fale também de Darço Cabeludo e comande um lundu com a participação de todos os presentes...
Um côco de Zezinho da Viola, Samys Dave Junior sapateando a operata Porgy and Bess, Virgínia de Paula, uma bruxa charmosa, a relatar e lamentar que eu era um ser trágico e infantil... O poeta Felippe Prates, gentil, alardeando as minhas qualidades literárias...
Quero um cartão com uma mancha do batom carmesim da jornalista Genoveva Ruys e que esteja apenas escrito... Ele era lacônico! Uma lingerie negra de alguém que não direi o nome, puro encantamento, de quem mereci e a mim me dedicou um enorme carinho, enchendo a minha pobre alma de absoluto contentamento!...
Estarei usando uma camisa Prist listrada, um Sumer de linho S120 branco, sapato Sacatamachia de verniz e no bolso um lenço de organdi, tocado pela fragância do perfume Amariage, de Givenchy, usado por Letícia. Insisto, que haja, na ocasião, a presença de várias lindas e charmosas mulheres...
Os olhos azuis de Cynthia Bernis, a expressão magnética e embriagadora de Cláudia Cardoso, a misteriosa mirada de Denise, as fantásticas janelas da alma de Conceição Melo e de Márcia Prates...
Flavão Andrade na cabeceira da mesa de comando da Rádio www.pequi.net, executando a trilha sonora das exéquias em espirais metálicas. O solo da bateria de Sinatra em Homem do Braço de Ouro, Ray Charles cantando a sua versão de Eleanor Rugby, o álbum Sgts. Peper, Cauby Peixoto, interpretando, teatralmente, Conceição e Nelson Gonçalves em A Camisola do Dia... Koko Taylor em seu canto do cisne em Old Scholl, Chet Baker encantando com These Foolish Things. Waldemar Euzébio solando Malquenã, Geraldo Maurício, o Nenzão no seu pinho, em Garota de Ipanena e outras bossas do Beco das Garrafas...
E ao baixar à campa, que se ouça um solo no metal de Mardem Barros, em Sumertime...
Dentro do ataúde, confeccionado em tábua de caixote apanhado em porta de loja, vários objetos: um isqueiro Romson, uma carteira de cigarros Columbia, o meu Colt Cavalnho 38, o cordão de São Francisco e o patuá de Sete Nós da Roda de Aruanda, do gongá de Mãe Meninha do Cantois, ou um amuleto benzido por Didi, Afô de Ofonjá...
Forrando o fundo do dito Paletó de Madeira, quero a trilogia de Platão, o Germinal de Zola, os Manuscritos das Leis de Nodim, O Caminho do Meio, de Láo Tse, A Cidade de Nove Portas, de Sidharta, Gautama, o Gitá de Vhyasa. As Estâncias de Dzian, de Blavastsky, O Deserto dos Tártaros, de Buzzate, As Folhas da Relva, de Whitman...
E ao singrar o Letes, a bordo do barco de Caronte, quero ler os ensaios de Lampedusa sobre os Stean of Consciense de Joyce e, de quebra, o seu Leopardo...
Poemas de Tagore, O Corvo de Baudelaire e a epopéia Navio Negreiro de Castro Alves; O.Henry, Jack London, as Vinhas da Ira, de Steinberg, o América, de Kafka, as fábulas de Esopo, as narrativas de Kipling...
Por fim, quero uma cópia da Carta do Apóstolo Paulo a Rufo, bispo de Tortosa em que ele relata o trecho de uma confissão feita ao Criador : “Senhor! A minha alma voltou-se para o chão!”...
Deixo este mundo de manifestações e, embora seja uma alma/instrumento, busquei tão somente a Sustentabilidade...


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Por Raphael Reys - 18/10/2011 10:17:26
BALCÃO DO BAR DO CAPA III

Domingo chuvoso, sete da matina no Bar do Capa. Seis notívagos junto ao balcão curtem o som do álbum Ao Vivo com Tatuí, de Pena Branca e Branca e Tatuí. Degustam, dignamente, uma cachaça curraleira com rusarô, que Fogueteiro trouxe das barrancas do Velho Chico.
Ele tenta negociar cem garrafas do produto com o proprietário do exótico balcão, que, em decorrência da experimentação, já quebrou a ficha, tomou muitas e conversa abobrinha. Clientes soltam foguetes para comemorar a água mandada por São Pedro.
A música caipira flui em espirais sonoras, violando os corações, formando uma egrégora de alegria e descontração. Após a segunda dose tomada, regurgitam o retrogôsto da marvada PO. Sou convidado a sentir o oroma da boa pinga. Arrepio os pelos do braço e sinto defluxos às carradas!
Um apaixonado platônico toma a sua cana caprichada. Estala os dedos, corre água nos olhos. Vai até a porta da lanchonete próxima para sacar o bumbum gelatinoso da garçonete gostosona passante. No balcão, formam-se por similaridade de sentimentos compartilhados entre o boteniqueiro e o notívago Cloves, a dupla Cebolinha e Capa.
A galera sorri às bandeiras despregadas, ao me ver redigir essa crônica no bar, nessa manhã de Baco Tupiniquim. Um ébrio penduca o equilíbrio no batente do átrio do bar/oráculo. Olha para a tenda da amplidão nevoada desse domingo e, assim como Calderon de La Barca, se faz a famosa pergunta: Es la vida, um sueño?!
Entram as primeiras senhoras que compram o indefectível pacote de macarrão para o almoço domingueiro em família. A Comunidade Terapêutica do Bar do Capa, já excitada pelo álcool, pulula no salão, como uma farândola de diabretes.
Batem os pés no piso do salão e as mãos, sincronizadamente, no rítmo da música! A alegria é flagrante!
Luizim Cacete chega. Vira uma dose caprichada, medida na risca do copo americano. Passantes com suas sombrinhas multicoloridas cruzam o passeio com destino à missa dominical. Enquanto a Turma da Cebolinha Verde já curte a quarta dose...
Há um generalizado gosto de cabo de quarda-chuva nas bocas. Corre a notícia de um striking na orla fluvial do rio Vieira e um velho ébrio aparece no janelão do casarão colonial. Declama com toda ênfase as primeiras estrofes do épico Navio Negreiro, de Castro Alves.
O mundo gira, a Lusitana roda. Há, no ar, há um sofrer sem se dar conta, um padecer sem se entender o por quê....
Um rato travestido no inconsciente coletivo da galera mostra a sua roupagem de Dragão da Maldade Contra O Santo Bebum.


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Por Raphael Reys - 7/10/2011 19:04:59
JOANIR

1957. A terra de Figueira comemorava o seu Centenário e como uma das atrações principais houve apresentação do sanfoneiro Sivuca. A propaganda do evento artístico chegou até o nosso Joanir Maurício, pintor, caçador de mocós, sanfoneiro dos bons, seresteiro.
Ao receber a notícia do evento e por não conhecer o artista contratado, Joanir, consertando o chapéu Ramenzon XXX na cabeça ao estilo cowboy, desconsiderou. Torceu o nariz e falou: Quem? Sivuca! Mais quá!
Em cima do seu cavalo alazão, corpo torto pelo peso do Smith and Wesson 38, reafirmou a sua superioridade de sanfoneiro sobre o tal de Sivuca.
Ao interlocutor que ressalvava as qualidades do artista visitante disse: sou mais eu! Além de sanfoneiro sou desenhista, pintor, caçador dos bons e marceneiro. De um pedaço qualquer de madeira bruta faço um sanfoneiro marca Sivuca, com um pé de bode na mão!
Já ia rompendo quando voltou e completou o seu raciocínio: debaixo da minha sanfona de oito baixos eu respeito somente Luiz Gonzaga e olhe lá!
Dona Estela, sua esposa, que assistia ao diálogo, deu-lhe um ingresso para o show, caso ele resolvesse ir ver o tal de Sivuca.
No dia do espetáculo, boca da noite Joanir já tomava a sua Viriatinha quando deu a sapituca de ver o tal de sanfoneiro falado. O céu tinha cara de chuva e Joanir montou no seu fiel alazão, vestiu a capa Colonial três Coqueiros, calçou a sua bota Agabê, consertou o pau de fogo no currião e partiu.
Andando no seu pisadô manso, característico dos Mauricio, chegou ao Cine Montes Claros onde já acontecia o show perto do encerramento do mesmo. Tomou, sorrateiramente ao seu modo, o rumo dos fundos do palco, levantou discretamente uma beirada da cortina e se pasmou.
Sivuca, encerrando o show e para delírio da platéia que o aplaudia de pé, tocava no teclado da oito baixos os nomes das pessoas que eram lançados pela platéia. Dedilhava como os diabos e fazia a sanfona falar o que quisesse.A galera pulava como uma farândola de diabretes!...
Acabrunhado com o que viu, Joanir botou a sua sanfona no saco e gramou o beco de volta para casa.
Ao chegar em casa, apanhou a sua oito baixos, botou em cima de um velho pilão de madeira no quintal, tacou querosene no instrumento e ato seguinte efetuou seis disparos certeiros.
O fogaréu torrou a sanfona que chiava emitindo sons fantasmagóricos e desarmônicos.
Em seguida, o nosso Joanir tirou o chapéu em sinal de respeito ao sanfoneiro nordestino e encerrou aí a sua carreira de tocador de oito baixos tupiniquim...



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Por Raphael Reys - 1/10/2011 14:39:32
BALCÃO DO BAR DO CAPA II

Uma velhinha, vinda de Grão Mogol para exames médicos, apanha o moto-taxi do Geraldão Durães, que tomava uma crua no balcão. Rodou hospitais e laboratórios. Ao retornar ao ponto, agradeceu e foi saindo de fininho.
Geraldão, que estava doido para tomar uma gelada com o polpudo pagamento daquela corrida, foi logo dizendo: “Olha o pagamento, minha senhora!” A anciã, esperta, aplicou o 171 urbano. Mostrou a sua carteira de passe livre e disse: “Tenho mais de 65 anos! Não pago transporte, moço!”
Já Virgilão, um notívago posudo e malhado chega ao bar com as mangas da camisa arregaçadas para exibir os seus volumosos bíceps e dar uma sugesta na galera que habitualmente toma umas no balcão. Fez pose, tomou duas e ao sair à porta, levou o maior susto.
A malandragem de plantão nas proximidades não respeitou a exibição e, carteando marra, surrupiaram a sua bicicleta modelo 1967.
Na verdade, aqui no Bairro Morrinhos prevalece à máxima que é lei das ruas: “Malandro é malandro, Mané é Mané.”
Zé do Gás é um freqüentador do Bar do Capa. Ao longo do dia chega de tempos em tempos, pede uma branquinha e se justifica: “Bota essa, Sorin, que é para eu varrer o quintal!” E toma outras para se barbear, almoçar, espantar a tristeza, esperar a patroa chegar e mais outra antes de dormir...
Já o Bacana chega ao bar, sempre de mansinho. Pede uma dose da cachaça conhecida como Chorona. Na segunda lapada já está às lágrimas. João do caminhão, conhecido como Trovão Azul, chegou, bebeu várias e viajou até a localidade de Mandacaru.
Foi dar uma de zagueiro contratado, astro da pelada da roça. Mas, logo cometeu uma infração grave. O árbitro curraleiro que apitava a partida aplicou-lhe o competente cartão amarelo. Inflamado pela mística da alma da cachaça ingerida, Trovão tomou os cartões do juiz e lhe deu um vermelho. Em seguida, ainda botou Sua Senhoria para correr, ameaçando-o de lhe enfiar os cartões no forever!...
Sorin, o cabeludo gerente do balcão do Capa, vez por outra dá uma sapituca. Para manter o moral no pedaço, fala grosso. Abre os braços teatralmente e dá conselhos para os notívagos, pra Deus, Raimunda e todo mundo!
Como é sortudo, vez por outra abocanha um terno no jogo do bicho e fica estribado.


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Por Raphael Reys - 26/9/2011 16:46:15
FRINGE BENEFITS

Ser cronista é padecer de prazer e de surpresas no paraíso terrestre. Curtir o puro contentamento em ter como colegas de ofício o diletante e magnífico amigo Augusto Vieira Netto, nosso tão querido Bala Doce, o premiado jornalista Alberto Sena Batista, o gentleman e globetrotter Felippe Prates, sempre vigilante, candente nas broncas e nos elogios que, como o poeta Virgílio, me guia nos Hades do oráculo de Mercúrio.
É ser lido todas as manhãs por Tininho Silva, o sensorial bluzeiro de bem com a vida, o inteligente Geraldo Prates, pelos olhos verdes de pecado de Márcia Prates, ter como webmaster da República do Pequistão o competente Rogério Borges. Haja coração!
Ser cronista é sofrer de encantamento em escrever de parceria com a doce beletrista Virgínia de Paula, curtindo a sombra e os duendes irlandeses de um final de tarde na ramada do seu romântico casarão, palco de notáveis e inesquecíveis acontecenças de ontem e de hoje. É admirar os olhos de Virginia, que ficam ainda mais lindos quando brilham de alegria, emboramente neles sempre presentes um leve, charmoso e fugidio traço de ironia que a deixa, de óculos, simplesmente encantadora. É dela me despedir beijando as suas mãos macias, delicadas, a evolar um leve traço de Nuit de Noel!
É estar na redação do jornal e ter a coragem de mirar no fundo dos olhos fatais da editora Jerúsia Arruda e poder suplicar pelos seus abraços. É poder ter o carinho da poetiza Dóris Araújo e a satisfação de ler diariamente os textos inteligentes e precisos da escritora Mara Narciso. Ela escreve sem medo e com o coração aberto!
Ser cronista é abrir a caixa de mensagens bem cedo e se deliciar com um recado da escritora Cláudia Cardoso, reclamando por não ter lido uma postagem minha no facebook, como café da manhã! Cláudia me faz contar os minutos que levo redigindo o texto enquanto escuto, nos fones de ouvido, Ray Charles cantando “Alone In The City”.
É contar, nas cálidas manhãs, com o coração leonino e inflamado da jornalista Genoveva Ruiz a me enviar um beijo...
Saber que, um dia, poderei ver de perto os olhos lindos de Maristela Kosinvsky, de Letícia e, ao contemplá-los, aplaudi-los, enquanto ainda encarnado nesse delicioso mundo de provas e expiações; o talento e a beleza de Raquel Cruzoé, que lê os meus mal alinhavados textos e me dá a maior força.
Ser cronista é ter como nova amiga leitora, a leveza blondi e o sorriso angelical de Vanessa Leite que irá ler esse postado!
Poder contar, enquanto cantam os galos, com a curtição nos meus escritos da beleza morena de Ana Paula!
E ainda tem gente que considera esse mundo ruim e doido.
Ser doido é ser cronista e se deliciar com toda a maravilhosa verve do dia a dia. Certamente, o profissional da crônica quando “bate o pacau”, parte dessa é para uma pior, pois o melhor está aqui!
PS - Ser cronista é acreditar naquele trecho de uma rumba caribenha, que fala sobre os instrumentais para se alcançar a felicidade: “uma escalera grande, outra chiquita”!
Néco, néco, Papai do Céu! Deixa eu ficar nesse mundão doido...


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Por Raphael Reys - 22/9/2011 14:29:59
NAS RUAS DA VIDA

Alguém chegou a dizer que quem vive nas ruas tem a sua liberdade, em um mundo aparentemente sem cancelas, mas também sofre os castigos que lhe são inerentes. E quando o corretivo chega, o cidadão chia que nem roda de carro de boi...
A escritora Helena Parente afirma que a rua e aqueles que nela habitam, são dirigidos pelo governo ou pelo destino. É carma ou dharma. Fica por conta dos encontros que lhe reservam o destino e o inusitado.
A alma se delicia com o prazer proporcionado pela liberdade e sofre com os augúrios da dor, pois a existência e tudo que a faz são bipolares em constituição.
A literatura cria um universo próprio, vestindo esses aventureiros com roupagens romanescas e nos fazendo até invejar suas trajetórias e aventuras pelas diversas quebradas da vida. No fundo da alma, todos nós temos esse lado imponderado, bandido, de destino incerto, fugidio.
É o que nos sobrou de atávico das heranças trazidas da vivência nas savanas. O andante das vias é uma alma filha da luxúria e escrava do prazer. O álcool leva-o a julgar-se absoluto e por ser um voyeur, busca compreender as almas em suas manifestações.
O peregrino é um psicanalista do absurdo. Um faz de tudo que não se apega a coisa alguma.
A vida das alamedas é um mundo de paixões, medos, obsessões. O imprevisto e o insólito esperam em cada esquina ou encruzilhada. São movimentos, contrastes, luz e sombra. À noite, surgem os seus arcanos e mistérios desconhecidos. As paredes têm ouvidos e na escuridão mil olhos observam.
Por estar fisicamente exposto será quase sempre julgado pela subjetividade dos que o apreciam. O nômade das ruas vê o lado explícito e sofre a ação dos que passam centrados na suposta normalidade.
Quem vive ao Deus dará, sente o gozo do momento e a relaxação que se segue às superações das armadilhas vencidas. O existir pelas ruas e pela noite é um exercício pleno de oposições ao racional. Suores, excessos, delírios e uma corrida cega. Procura-se o lado mágico e o impossível.
A jornada do aventureiro é um prolongamento doentio, vazio. A busca da morbidez é adequada aos que vivem da e pela sarjeta.
Esse andante inesperado tem, entretanto, um lado superior, genial, pois com suas empatias e emocionalidades absorve e perdoa os males do mundo. À bem da verdade, vive buscando entender a alma e os seus propósitos e, como se fora o único ser vivente, ou sobrevivente, faz parte de um mundo repleto de contempladores.
Vive cada dia como se fosse o último e busca uma entropia em que todos e tudo se fundirão em um só instante do incondicional.
A vida, para ele, nada mais é se não um pensamento mágico e fugaz.


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Por Raphael Reys - 15/9/2011 08:22:30
NA VIA HARMÔNICA

Um jovem casal de funqueiros trafega pela avenida abraçadinhos e borbulhando como champagne em taça flute. Vão inexoralvemente dar nos costados do Lago Lesis. Reinaldo Sanchez faz uma concha com as mãos. Sopra o duto e imita o som do corneto na ópera.
A maestrina Clarisse Sarmento solfeja um trecho de uma ária de Puccini. Geraldo Maurício Nenzão, abre a caixa de reminiscências e sola no pinho Doralice. No etéreo, bem acima de nossas cabeças, Walmor de Paula, repousando no Terceiro Céu de Beatrice, imita Noel Rosa. Canta Conversa de Botequim, enquanto às ágeis mãos do estenógrafo Julião Prates garante a percussão batendo com os dedos no tablado da mesa do bar.
Há uma extensão sensória entre a consciência manifesta e os desejos que ficaram irredutivelmente fixados na memória, num clima de fad-aut, um desfazer em emoções sublimadas, uma angústia em perceber que a qualquer momento pode se dissolver.
Chet Baker arranha um bolachão de acetato dos anos 50 sob o céu de Dallas e um instrumentista mórbido dedilha, ao piano, Eleonor Rubby. Duas almas gêmeas se encontram nos Jardins de Nayades. Entrelaçam-se, bailam e terminam por volitar sob um bosque de azaléias.
Na Avenida Coronel Prates, Virgínia de Paula repousa a sua suave cabeça pensante num travesseiro de alvas plumas de ganso; logo, apenasmente, sonha estar transfixando a via demarcada da Abbey Road. O pêndulo de aço carbono do Big Ben, penduca o equilíbrio entre a direita e o levemente dextro-convexo.
No tanque do jardim, numa colônia, há um cardume de trutas multicoloridas. Produzem um feito caleidoscópio na minha retina. Pito um cigarro turco e bebo uma água tônica com limão e gelo. Na mesa da birosca de luxo, notívagos diletantes degustam uma garrafa de Santa Rosa. Tira-gosto: torresmo de papada de porca curraleira e lingüiça no palito com cobertura de povolone.
A escritora Mara Narciso surge como uma brisa suave. Veste um blue jeans, sapatilha de lona china chique. Está radiante! Os seus olhos brilham refletindo a sua alma sensível.
Lembra uma adolescente em domingo de sol.


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Por Raphael Reys - 8/9/2011 14:33:41
TOM

Rebento da terceira geração dos Amorim, eis que nos chega à verve de Marco Antonio, o Tom Amorim. Baixote, tampa de binga, rechonchudo (é um glutão), mais parece um lutador de sumô. Esperto que nem coelho joga nas dez e bate com vara de duas pontas! Cobra criada no burburinho da nossa urbe.
Elegante, posudo, como o seu tio Bem Pau Véi, traja sempre um bom terno e carrega uma vistosa valise de couro, tipo capitão de indústria. Andar apressado, gestos súbitos, olhar atento.
Teatral e tragicômico! É um descendente do patriarca Pedro Montes Claros.
Rompante e decidido, não despacha para o bispo. Tem a resposta sempre na ponta da língua e a sua missa é de corpo presente. Do seu avô, só não herdou o gosto de cavalgar em cavalos de raça pelas nossas ruas de antanho, calçadas em paralelepípedos.
Por onde anda, Tom Amorim é reconhecido e festejado. Conhece todo mundo. Quando chega, se bem recebido, abre a sua caixa de ferramentas e conta uma história engraçada, imitando o seu saudoso tio Sinval.
Se a galera o trata com alguma gozação ou disfarçada ironia, retruca a carta na hora. Em cima do pedido! Manda o interlocutor para os Quintos do Érebro de Dante!
Abaixo, um diálogo de sua mãe, dona Dinha Amorim e Quintiliano Maia, em visita à casa do nosso herói:
- Êita Quintiliano! Já cansei de pedir a esse povo do Lanchão para não servir tanto sanduíche para o Marco Antonio!
- Mas, por quê, gente?
- Ora, ele não tem bitola para comer tanto!


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Por Raphael Reys - 5/9/2011 08:23:32
AINDA FALANDO DOS ANJOS

Falando dos anjos, Veríssimo disse: “antigamente era mais fácil. Os anjos apareciam para as pessoas e lhes diziam o que fazer; ou o que ia lhes acontecer. Hoje, o anjo da anunciação não passaria do interfone do prédio. Quem é?”
“Eu sou o anjo do Senhor e...
Quem?
Um anjo do Senhor e trago...
Não é daqui não.”
Greeley disse-nos que, no outono, há quatro tipos de anjo: um padre, um psiquiatra, um policial e um amante. Pois foi um desses anjos que segurou o incêndio da escola Nossa Senhora da Graças, em Chicago, em 1958. Michelle McBride, uma sobrevivente, afiançou que também um deles a inspirou a escrever o livro “O Fogo Não Morrerá.”
Esses santos anjos criados pelo Senhor são assim. Quando menos se espera, lá estão eles, de novo. Encontrei, certa vez, um pedaço de papel escrito a lápis na Praça da Matriz. Continha uma oração dirigida a São Miguel, este um arcanjo e pedia que o mesmo nos defendesse na batalha contra o demônio, que nada mais é do que Luzbel, o esplendoroso, um arcanjo decaído, um ser celeste que, ao exercer o seu livre arbítrio, contestou a existência do Pai, dá para imaginar. Uma criatura contestando o seu criador. Pois foi assim!
Imagine só o troar da dita batalha, na imensidão do cosmo.
Nobres senhores e senhoras, Ana Maria achava que o seu anjo era mulher, mas, ao escrever um poema, disse assim:
- Príncipe de Vênus, me envolva nas solitárias noites de revolta/Príncipe de Vênus me acompanhe...
Uma questão de sintonia.
José Martinho de Melo relata que Felipe Semmelweis, o descobridor da assepsia, era um anjo disfarçado, pois impediu que a febre puerperal proliferasse, obstando a vinda de mais almas ao mundo de Deus, em missão.
Ontem, dormi pensando no anjo de guarda de Gisele Bunchen, que fez o que fez por ela, e ainda a levou ao Xingu, para receber um descarrego através da pajelança. Veja bem como são eles.
Aqui nos Montes Claros, Olindina, minha saudosa sogra, me disse que viu e conversou com um anjo, que parecia com sua avó, e que retornou em sonho e lhe ensinou onde encontrar Paulo Pereira, o seu irmão perdido em l938, no interior da Bahia, na grande migração, e que esse mesmo anjo lhe ensinou a voar quando estivesse dormindo.
Meu amigo Felippe Prates (hoje residindo na Barra da Tijuca) tem um anjo que adora um porre de scoth. Gosta, também, de uma boa cachacinha Santa Rosa, na garrafa arrolhada e de uma noite de tango em um lupanar, desde que a parceira seja capricorniana morena e dos olhos verdes!
Já o escritor e notívago Augusto Vieira Neto, o Bala Doce, ou Bala Brando, como se diz no facebook, piloto noturno com milhares de horas de vôos pelos caminhos diletantes de Baco e Vênus, tem um anjo de guarda que é atleticano!
Comenta-se nos bastidores musicais do Norte de Minas, que Tico Lopes já há muito tem acesso ao seu anjo guardião, um “Deimon”, recebendo do mesmo, instruções sempre precisas, de como bater na pele do tambor.
Eu, particularmente. Às vezes, faço uma tremenda confusão na minha cabeça latina. Fico sem saber se nós somos sombras e eles os originais, ou se somos verdadeiros e eles, imaginários.
Em 1976, dormitei debaixo de uma marquise, no Jardim Baccachere, em Curitiba. Num fim de tarde chuvosa, percebi a presença do meu anjo de guarda. Perguntei-lhe, então, assim como o fez também Calderon de La Barca:
- Es la vida, suenõ?
E, na mesma ocasião, solicitei que ele me instruísse na decodificação do Shefer Yethzherar, o livro da criação, que contém os segredos da Cabala e, consequentemente, a teoria da mecânica do cosmo.
Encerrando a crônica, relato o que disse o anjo da guarda ao poeta Guilherme de Almeida;
- E quando o homem, resgatado da cegueira, puder ver Deus num simples grão de argila errante, terá nascido neste instante a mineralogia derradeira...


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Por Raphael Reys - 27/8/2011 19:49:56
NOIR.DOC... SOB A PROTEÇÃO DOS ANJOS

Mais um entardecer imprescindível de puro encantamento nos Montes Claros, chapada do Arraial das Formigas, pisada por Gonçalves Figueira. O mundo gira globalizado, as lan houses, estão entupetadas de gente navegando no virtual. Surgem os notívagos com seus amigos diletantes.
Nivaldo Tip Top, no seu bar, prepara uma cheirosa carne de sol, servida com feijão tropeiro, mandioca da Lagoinha e farinha Morro Alto. Beto Rocha toma uma loura estupidamente gelada com amigos na mesa externa. Peré Novais, Denarte Dávila e Nazareno Dias devoram um grande prato de lingüiça no balcão interno, “quebrando” uma Viriatinha corada.
Augusto Vieira Neto, o Bala Doce, narra para Reinine, uma história do poeta Cândido Canela, seu pai. Na mesa, Virgínia de Paula e Márcia Yellow, que fotografa tudo.
Seresteiros amadores acompanham em coro o Grupo de Seresta João Chaves, que encanta e enleva no salão térreo do Automóvel Clube em noite de lançamentos e recordações mágicas, tão caras e tão gratas à nossa lembrança...
Muitos dos presentes destramelam suas almas e choram na pura emoção.
Dona Fina de Paula, emboramente os seus mais que 90 anos, firme e inspirada, ao microfone canta afinadíssima, dando a sustentabilidade do magno evento. Dona Yvonne Silveira, aos 96, acompanha e aplaude com prazer, irradiando alegria em seu sempre belo rosto.
Puro encantamento!
Terezinha Jardim canta como um rouxinol, sob o acordes do cavaquinho de Mafalda.
Na mesa central, a família Chaves, comandada pela divina Lola, participa da cantoria e das comemorações.
Há uma aura suave que cobre a noite trazendo às nossas almas sofridas pelos embates da urbanidade opressora, o doce alento que nos leva a sonhar acordados. Alguns casais dançam embevecidos. O grupo canta, canta e encanta com as modinhas de ontem, revivendo sucessos e inesquecíveis momentos dos tempos das vovós e dos vovôs.
Cai sobre a turma uma onda mágica. Rasgando o peito, oferecem a performance uníssima!
O scotch rola solto, nas versões on the rocks e cowboy, do bufê requintado e farto muito bem servido pelo pessoal de Joãozinho Prates.


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Por Raphael Reys - 24/8/2011 08:01:58
Nenén de Pain

Haroldo Santos, também chamado pelos íntimos de Neném de Pain, ou Haroldo da Escola de Samba, era gerente do bar Destak na rua Melo Viana, aqui nos Montes Claros interior das Minas Gerais. Solteirão convicto e, fiel devoto de São Jorge Guerreiro.
Portava sempre na carteira ou no bolso do paletó, um santinho do seu protetor, na sua imagem lunar, entre crateras e a chuchar o feroz dragão com sua lança pontiaguda. Realizava as suas obrigações com o santo, acendendo as suas velas, e executando os rituais no seu sanctorum doméstico. Sarava! Meu santo Orixá.
Como é afro descendente, desde a tenra infância esteve ligado aos mandingueiros, terreiros, candomblés, amolôcôs, terecôs e bocas de cabaça que abundam neste Norte de Minas. Recebeu o seu Exé em um terreiro de Umbanda de Manhinha de Biriba em Livramento, na Bahia.
Lá não se dava importância à decisão Papal em se deletar o santo guerreiro da hierarquia celestial, atitude tomada pelo Vaticano em represália ao aumento de fé nas raízes afro, pelo Brasil de meu Deus!
Certa feita, juntamente com colegas de serviço e seus respectivos familiares, fretaram a baixo custo um velho caminhão Doge Cara Chata usado para carregar toros de madeira. O veículo os levaria morro acima. Iam para uma tradicional festa de santo na roça.
A dita elevação, só era vencida de Toyota com chassi modificado e caminhão modelo “toco” com correntes de aço nas rodas dianteiras, isso dado ao aclive e respectivo declive íngreme e constante que se fazia até o platô e vice-versa, alem do solo arenoso e escorregadio. Era uma via dantesca!
Às três da tarde terminada as festanças de roça, retornaram as origens. “Desciam morro abaixo no Cara Chata quando o motorista sentindo o frio provocado pelo óleo do burrinho mestre do freio que escorria no seu pé direito botou a cabeça para fora da boleia e gritou a pleno pulmão:” pula todo mundo que o caminhão está sem freio!”“
Todos pularam menos o Neném de Pain que permaneceu com os braços apoiados no Santo Antonio da carroceria. Entre os que saltaram para o chão, braços e pernas quebrados, pescoços torcidos, mortos e feridos.
O caminhão tendo só o nosso “Neném de Pain” como viajante se enganchou no primeiro barranco à direita do morro, levantando poeira. Nosso herói desceu da carroceria sem qualquer arranhão, e, ato seguinte, sacudiu o pó da roupa.
“Seguindo o dito de Shakespeare: cada terceiro pensamento passa a ser sobre nossa sepultura, um colega de viagem, irritado com o braço quebrado gritou para ele em represália:” você não pulou por que sua lesma?”No que ele retrucou: “sou devoto de São Jorge Guerreiro”!” O outro rebateu: “que F.D.P. de santo é esse que seguro caminhão Cara Chata sem freio, ladeira abaixo?”.
Neném de Pain tranquilamente tirou o santinho de papel do bolso do paletó mostrando-o ao interlocutor, identificando, assim, São Jorge Guerreiro, o protetor da sua devoção.
Acontece que na gravura exibida estava só o pesado dragão soltando fogo pela boca. O cavalo e o popular São Jorge, já haviam caído no bengo desde o grito de alerta do motorista, por via de dúvidas...
A boca era por demais quente, até para santo guerreiro!


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Por Raphael Reys - 19/8/2011 08:14:57
Só um 38

Nos bons anos 60, mestres no ofício em mecânica de autos da nossa urbe formaram uma Santa Federação dos Bons de Gole. Todos eles galãs de subúrbio e namoradores de jardins e praças.
Da emérita trupe tupiniquim, dentre muitos figuravam Dim Lampião - o valente -, Zé Augusto, Valdemar Peça Fina, Ivan Chulé - o indefectível -, Milton, João Isca e o notável Marcha Lenta.
Essa galera prestava serviços profissionais nas concessionárias da Ford do Seu Quinzim, Somar de Ubaldino Assis e na Willys Overland, do querido Geraldo Cursino. Ao longo das jornadas etílicas e de alcovas, outros diletantes apareciam, inclusive Pinga, chofer de praça com o seu bem cuidado Odsmobille.
Pululava preferencialmente na Praça da Matriz, footing das domésticas e suburbanas, onde encontravam farto repasto amoroso. Eram tempos românticos, de namoro com mãos dadas e beijinhos roubados...
Aquecidos os corações masculinos e sempre por volta das 23 horas, Dim emitia um assovio convencionado e a galera da graxa partia para os finalmente na Boate Maracangalha, oráculo de Anália com suas damas da noite e perseguidas profissionais.
Lá, o bolero rolava solto. Pares desfilavam ao som do conjunto musical animado pelo acordeom de Osias, a bateria de Zé Toco e a voz do rouxinol Din Canga.
Certa noite e ainda estando na Praça da Matriz, nossos “pastores da noite” se lembraram da festa de casamento dos irmãos Lúcio e Luciano, que comemoravam as bodas com suas esposas, também irmãs. As festividades ocorreriam logo mais na Malhada Santos Reis.
Lá, era uma comunidade conhecida pelos seus valentes e destemidos murrões da roça, onde pontificavam Negão da Titia e muitos outros integrantes da fauna local.
Dim Lampião sugeriu, então, que todos fossem às festas. Vai aí o diálogo:
- Peça Linda! Vamos logo para a Malhada que hoje tem a festa dos casamentos dos irmãos com as noivas irmãs!
- Não dá não, Dim! Lá é lugar de gente valente e perigosa demais!
Dim, chegando ao pé do ouvido do interlocutor, ponderou:
- Mas você não está levando um revolver na cintura?!
- To, sim, moço! Mas é só um 38!
Na Malhada de antanho, estranhos no ninho só eram respeitados se carregassem pra cima de uma Cintura Noventa e duas automáticas 45!


68461
Por Raphael Reys - 10/8/2011 07:52:20
Balcão do bar do Capa

Zé Pêra, emérito motorista de transportes coletivos toma todos os dias, religiosamente, umas e outras no Bar do Capa, confluência das ruas Clemente Martins com General Carneiro, no bairro Morrinhos. Volta e meia dá uma tirada digna de nota.
O médico que o atendeu no PSF, recomendou-lhe, dado à fragilidade temporária da sua saúde, que parasse de tomar bebidas alcoólicas. De volta ao bar, bateu no balcão e fez o pedido: “Me dá uma cerveja sem álcool!” Em seguida, complementou: “E bota uma pinga para acompanhar!”.
Um companheiro seu que lá estava tomando umas branquinhas, ao vê-lo pedir a pinga e sabedor das recomendações médicas, contou a sua prescrição: “Pois, comigo, o homem mandou moderar. Tomar uma pinga antes do almoço e outra antes da janta. Mas, como eu não entendi direito, passei a tomar uma garrafa de pinga antes do almoço e outra antes do jantar...”.
Douta boca da noite, estando o salão do bar sempre cheio, um notívago bebia umas e outras quando viu o seu médico parando o carro à frente, numa mercearia. Como o doutor lhe prescrevera um regime, gritou todo siligristido: “Doutor! Posso comer ovos?” Que lhe respondeu, na bucha: “Taca o pau!”.
Outro freqüentador que andava passando do limite no gole foi chegando e o Capa o advertiu: “Você está bebendo cachaça demais, companheiro!” Resposta: “Nem demais, nem de menos!”.
Chega mais um companheiro de copo já bastante chumbado e para puxar conversa foi logo comentando o que fizera no dia: “Gastei mais de cem reais! Paguei o IPVA do meu barraco!”.
Já o freguês da branquinha conhecido no trecho como Silicone, mui digno aposentado, de amores novos com uma morenaça que mora no pedaço e objetivando dar conta da escrita na alcova, seguiu o conselho de outro notívago e, para aumentar a potência, tomou indevidamente o medicamento Pramil.
Endureceu, mas foram as pernas!
Outro ilustre exemplar do trecho chegou cheio de paixão. Bebeu umas malditas e se pôs a cantar sucessos antigos de Roberto Carlos: ”Estou amando “locaumente” a namoradinha de um amigo meu...”


68411
Por Raphael Reys - 5/8/2011 08:03:26
Entardecer na Avenida

O segurança do Capo desce da caminhonete blindada portando uma pistola PT40 e dois pentes reservas nos coldres em ambas as axilas. O seu patrão se prima na máxima romana “Si vis pacem para bellum”. O contato transfixa o vão da avenida pitando um cigarro paieiro com cheirosa raiz de carapiá.
Em contrapartida, Maria Luiza Telles lavra em seu oráculo uma crônica que fala do amor universal. Um bêbado passa penducando o equilíbrio e diz que o mundo é composto. O criador em atividade no Nicho de Nodim, executa em essência as bipolaridades que logo se manifestam em aspecto trino.
Os arcanjos da Unidade Estrela Candente, guerreiam com as hostes de Lusbel no nosso cobiçado Sistema de Havona. O barraqueiro da esquina espia a saia cotó da garota suburbana, que inicia o seu trotoir numa noite de surpresas cármicas.
O fluxo das águas do Euripo deságua na contramão do Aqueronte e balança perigosamente o barco de Caronte, que transporta almas em retificação.
O cheiro do pão batizado com permanganato sai da chaminé da padaria e irrita as narinas dos transeuntes incautos que circulam no entardecer deste friorento mês de julho. Aroldo Pereira declama “O Corvo”, de Baudelaire” e a sua quase careca reflete as luzes de néon da fachada do portal de eventos.
Estevim continua entocado estrategicamente e o inspirado poeta Georgino Junior sai finalmente do seu quarto de fundos, onde escreve um romance erótico leve. Wanderlino Arruda lavra a lauda da sua milésima palestra mantendo a sua métrica virginiana. Contempla pela enésima vez a beleza dos olhos de sua Olímpia.
Miguel de Ducho passa exibindo o seu fisique du role de boxeador cucaracho. Fala sobre filosofia platônica e bate no couro esticado do bongô um bolero antigo.
Montes Claros entardece. Acontece uma cena explícita no Trevo do Sion: um executivo trincado contrata uma garota da noite e juntos viajam para Laquesis.
Armando Cabeceira Mardem extrai da alma de metal do seu saxofone, com enlevo, nada mais nada menos que “Summertime”...


68259
Por Raphael Reys - 21/7/2011 15:01:40
Balcão do bar da capa

Zé Pêra, emérito motorista de transportes coletivos toma todos os dias, religiosamente, umas e outras no Bar do Capa, confluência das ruas Clemente Martins com General Carneiro, no bairro Morrinhos. Volta e meia dá uma tirada digna de nota.
O médico que o atendeu no PSF, recomendou-lhe, dado à fragilidade temporária da sua saúde, que parasse de tomar bebidas alcoólicas. De volta ao bar, bateu no balcão e fez o pedido: “Me dá uma cerveja sem álcool!” Em seguida, complementou: “E bota uma pinga para acompanhar!”.
Um companheiro seu que lá estava tomando umas branquinhas, ao vê-lo pedir a pinga e sabedor das recomendações médicas, contou a sua prescrição: “Pois, comigo, o homem mandou moderar. Tomar uma pinga antes do almoço e outra antes da janta. Mas, como eu não entendi direito, passei a tomar uma garrafa de pinga antes do almoço e outra antes do jantar...”.
Douta boca da noite, estando o salão do bar sempre cheio, um notívago bebia umas e outras quando viu o seu médico parando o carro à frente, numa mercearia. Como o doutor lhe prescrevera um regime, gritou todo siligristido: “Doutor! Posso comer ovos?” Que lhe respondeu, na bucha: “Taca o pau!”.
Outro freqüentador que andava passando do limite no gole foi chegando e o Capa o advertiu: “Você está bebendo cachaça demais, companheiro!” Resposta: “Nem demais, nem de menos!”.
Chega mais um companheiro de copo já bastante chumbado e para puxar conversa foi logo comentando o que fizera no dia: “Gastei mais de cem reais! Paguei o IPVA do meu barraco!”.
Já o freguês da branquinha conhecido no trecho como Silicone, mui digno aposentado, de amores novos com uma morenaça que mora no pedaço e objetivando dar conta da escrita na alcova, seguiu o conselho de outro notívago e, para aumentar a potência, tomou indevidamente o medicamento Pramil.
Endureceu, mas foram as pernas!
Outro ilustre exemplar do trecho chegou cheio de paixão. Bebeu umas malditas e se pôs a cantar sucessos antigos de Roberto Carlos: ”Estou amando “locaumente” a namoradinha de um amigo meu...”
Raphael Reys


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Por Raphael Reys - 1/7/2011 15:12:37
A CIRANDA DOS IBEJÍS

Não são histórias de fantasma no sentido verdadeiro, mas uma coletânea de fatos que nunca tiveram explicações satisfatórias. R. Kipling.

Em 1904, quando se mudou para Burwash em Sussex, na Inglaterra, R. Kipling escreveu o conto Eles, O escritor indiano encontrava-se perdido com o seu carro em uma estrada e em busca de informações deparou-se com o sítio dos Howkin, que ficava em um morro na extremidade do distrito. Lá encontrou vários fantasmas. Uma velha cega duas crianças brincalhonas e uma gorda chamada Madehurst.
Dizem que ele escreveu essa história por ter lembrado-se do fantasma da sua filha Josephine, que falecera em 1899 e que volta e meia aparecia na sua casa. A nossa história abaixo, acontecida aqui nos Montes Claros, fui testemunha dos fatos e da via de fato e como os mesmos não tiveram explicações satisfatórias, assim como o escritor indiano os relata em crônica para a posteridade.
A coluna dos pequenos seres se formava sempre que a menina com a sua boneca de pano subiam à trilha do Morro do Jason do Caldo de Cana, na sua pequena fazendinha na Vila Oliveira, aqui nos Montes Claros até alcançar, no alto de um pequeno descampado, uma plataforma. Em 1995, entrevistei-a, juntamente com o seu pai, encarregado da fazenda e um vaqueiro cambono (médium masculino que não incorpora e exerce a função de conversar com as entidades incorporadas em outro médium presente) todos eles testemunhas dos fatos para-normais.
Ela tinha, então, seis anos, olhos grandes e brilhantes, era uma capricorniana cheinha, morena, os cabelos cortados tipo pastinha. O seu semblante irradiava; parecia um pequeno anjo do Senhor!
Ela era a figura central dos fatos extra-sensoriais, que aconteciam no morro; tinha também insights nos quais prescrevia remédios de ervas naturais, para cura de males físicos. Por uma tarde, acompanhado dos três, escutei os relatos, e percorri os locais onde ocorriam os fenômenos. O pai, buscando descobrir para onde ia à menina, passou a segui-la, e a viu subindo o morro, com a sua boneca de pano pendurada pelo braço, e os pequenos seres; todos vestidos de branco, almas de crianças (Ibejís), que iam engrossando a fila, à medida que ela subia o morro, rumo à plataforma.
Chegando ao alto, formavam roda, cantavam e dançavam, brincavam de pega, de cabra-cega, a menina e os pequenos seres vindos do mundo espiritual imediato.
Ao terminar a brincadeira, iniciavam a descida e a coluna, de maneira inversa, ia-se desfazendo. Na fazenda, havia uma construção antiga que fora usado como senzala. Local de castigos de escravos, na era dos oito. Ora servia de depósito e havia sido usada também para trabalhos de mesa branca, onde o dono da casa, médium de incorporação, assim como o encarregado, recebia as almas dos escravos mortos por lá, e que voltavam para serem doutrinados pelo vaqueiro cambono, já que pai da menina ficava incorporado.
Feita a doutrinação e a desobsessão, as almas dos escravos eram levadas para as mansões espirituais (Casas Transitórias). Todo o ambiente da fazenda emanava um ar de magia: a disposição dos acidentes geográficos, o córrego cristalino e borbulhante, com águas curativas, a plantação de cana-de-açúcar. Ao trafegar pela propriedade, tinha-se a impressão de se estar sendo observado.
Aquelas crianças que apareciam no morro eram antigos moradores do local, da época da escravidão, e que haviam sido impedidos de brincadeiras e folguedos, pelos donos da terra, e agora voltavam para brincar; acompanhando a energia da menina da boneca de pano. Esta relatava que os cânticos das crianças eram feitos em dialeto Ioruba. Voltavam para cobrar o que lhes foi negado.
Um elo transcendental com o passado distante.
No conto Eles, descrito no início da crônica, R. Kipling fez esses versos:

Vocês meninos, vocês meninas, venham brincar.
A lua brilha, que claro luar!
Larguem a ceia, larguem a cama,
Venha junto correr na grama!
Subir na escada, descer na parede-.


67994
Por Raphael Reys - 18/6/2011 15:43:53
O mundo é composto!

Homero relata que os deuses tecem desventuras para que os homens, nas gerações vindouras, tenham o que contar. Arremata o corretor Geraldo Mundial que o mundo é composto. Tem que ter de tudo um pouco.
Aqui em Montes Claros, terra do fruto amarelo e capital da recente República do Pequistão, acontecem coisas que até Deus duvida!
O grupo musical Prego de Linha, nos bons anos 70 foi animar um evento na vizinha cidade de Glaucilândia. Durante a viagem, encheram o pandú de cachaça branquinha. Chegaram ao destino campesino pela manhã, vestidos à moda hippie, recendendo a aroma de baú velho, cheios de babilaques e rumaram para uma escola pública onde solicitaram na Secretaria uma sala para a turma de bebuns dar uma morgada antes do show. Como dizia o saudoso Zé Amorim: “roncavam e babavam feito porcos”. Logo, chegaram à escola algumas professoras que desconheciam a cessão da sala para servir de dormitório aos músicos.
Ao se depararem com aquela corja de cabeludos roedores de pequi, bufando e empestilando de bodum o ar que respiravam os justos, chamaram um policial para botar ordem na casa e escorraçar aquelas figuras xexelentas e indesejáveis!
Chegou um policial militar, ajumentado no tamanho e nos gestos. Aproximou-se daquele que roncava mais alto e deu uma bicuda com o bate-bute na sola do pé do infame, totalmente entregue aos braços de Morfeu.
Como dizia Shakespeare, o pesadelo tem nove potros. O agredido abriu os olhos supondo ser aquela uma fase dantesca e onírica do sono e foi logo indagando: “Está dando um baculejo xará? Tô tendo uma visão, meu camarada!...”.
Tomando consciência de que a via de fato era real e em cores, foi logo falando em cima do pedido: “Dá uma olhada na minha brisa, cara! Vê se eu to dando alguma bobeira e saca direitinho, meu!”.
Aí o militar perguntou o que eles estavam fazendo ali deitados, esparramados de todo jeito em uma escola pública. O interpelado respondeu na bucha: “Nós estamos na maior, Ceará! Todo mundo caído de bolso!...”.
Em seguida, vendo o músico Tico Lopes deitado ao seu lado com os olhos esbugalhados de terror, falou no ato: “Veja só, cara! Quando vi esse meganha ajumentado me chutando, pensei que estava fazendo a maior viagem a Katmandú!”.
E arrematou, finalizando: “É... Parece que a morgada deu o maior bode!”.


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Por Raphael Reys - 14/6/2011 09:46:58
VENTO QUENTE

O pastel, essa guloseima fantástica, nos foi trazido a este rincão tropical pelos nossos irmãos portugueses, nos primórdios do século XVIII. Os espertos japoneses tomaram por conta à mística e se travestiram de chineses, criando, assim, um “marketing” para o produto.
Pastel tem de todo tipo, tamanho e sabor! Aqui nos Montes Claros, cidade pólo do Norte de Minas na atualidade globalizada, o mais famoso é o pastel curraleiro do Café Galo, do empresário e lobista Jadir Rodrigues.
O saudoso ex-alcáide, Marão Ribeiro era um viciado em pastel curraleiro. Quando estava no point, saboreava para mais de vinte, tomando cafezinho com leite!
A iguaria é servida com todos os tipos de recheio, tamanhos, feitos com diversas modalidades de óleos e frituras. Tem aquele grandão, especial para enganar gulosos seletivos. Esse, o “pastel 171”, só tem tamanho e nenhuma qualidade.
Na minha infância, as famílias serviam o pastelão. Assado ao forno em uma grande forma de alumínio e recheado com a mais autêntica galinha caipira. Adorávamos e comíamos de dar tristeza...
Como o matuto é tido como cabra esperto e cheio de treitas, conforme a sabedoria popular enquanto enrola o cigarro de palha, pensa em como enganar um otário boteniqueiro, no antigo Mercado Municipal, onde hoje se situa o Shopping Popular. Lá, o capiau aplicava na clientela.
Um deles, colocou um cartaz na entrada do seu bar. O reclame dizia que encontrasse recheio no pastel, ganhava um prêmio em dinheiro, na hora, de 200 duzentos cruzeiros!
Como a população dos anos 50 era ordeira, a palavra de um homem tinha o seu valor e fio de bigode servia de aval. Os inocentes, futuros logrados, faziam fila para degustar a iguaria recheada de vento quente.
O esperto comerciante, cujo nome omitirei, pois os familiares ainda vivos apresentam problemas psiquiátricos, encheu por muito tempo os bolsos de grana e a população a pança de vento quente!
Como diz o dito popular que castigo pega malandro o pasteleiro passou a encher o pandú de cachaça branquinha. E essa, não perdoa! Botou guenga por conta e passou a pagar rodadas de bebidas para amigos diletantes de copo e de cruz.
Morreu doido, bêbado, asilado, pescoço descascando e pés inchados. Sozinho em uma cama nos fundos da sua espelunca!


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Por Raphael Reys - 8/6/2011 09:19:15
A FALTA QUE NOS FAZ.

Os sabores, coisas e sons dos Montes Claros dos ainda românticos anos 50, seus caprichos e o seu comércio com atendimento próprio de compadres e comadres.
A geração moderna, comedores de carne de gado confinado encharcado de química e de petiscos industrializados não se deliciarão com o sabor da galinha caipira, na bacia de alumínio do bar do Calisto, o borbulhante guaraná Antarctica acompanhado do pastel delicioso da Leiteria Celeste, de Zé Priquitim, o café da manhã com o biscoito de farinha de Zim Bolão.
Não jantaram o Baião de Dois de Miguelzinho, na Mineira, o filé A Parmegiana do Restaurante Palhoça, a feijoada do Baiano, a carne de sol de João no Bar do Toco e nem se deliciaram com a surpresa de comer o pastel recheado de vento quente do Bar do Tiano nem saborearam a Vaca Preta com canapés de Josias Loyola, na Cristal nem comeram o PF de Leopoldo Cozinheiro.
Triste é morrer sem sentir o sabor do churrasco de Leon, o caldo de cana de Jason, a cachaça fubuia de Zé Saruê, o PF suculento de Pedro Granadeiro no mercado sem comerem como sobremesa de uma talhada de geléia do Artur. Não verá a paciência de Calisto Souza servindo cafezinho e nem verão Zezinha vendendo bilhetes, e cafezinho padrão em cima de um caixote de madeira.
Mais triste ainda é morrer sem no sábado tomarem o erótico caldo de mocotó da Natália, sem a farofa de jurubeba, de Jacinto Cozinheiro, o mexido de feijoada do Restaurante Intermezzo, também conhecido como Roupa Velha, que tinha até prego de tábua de chiqueiro misturada nos seus componentes, acrescido do torresmo crocrante de Juvenal. Deixaram de saborear a carne de sol no boteco de Pedro de Capitão Enéas, não comeram o PF da Zezé à porta do bar de Zé Saruê.
Não verá a catrumama bicicleta sueca de Adão Padeiro, entregando o pão alemão da Padaria Santo Antonio, no lusco-fusco das manhãs. Não comerá da pizza, no restaurante do Mário Torino, tomando uísque Cavalo Branco. Sem provar os roletes de cana caiana na talisca de bambu, ou pirulito de rapadura na tábua furada.
Não saberá das aventuras da Agulha do Gera, o requebro de Nilsinho, o tango da meia noite na Papillon de Afrânio, nem verá a esplendorosa beleza de Etelvina, dançando bolero na boate Maracangalha sob o prisma da luz vermelha e o efeito multicolorido das bandeirolas no teto. Não conhecerá os encantos de Kama-Sutra e as delícias de mil e uma noites, da alcova de Maria Bocaiúva e os seus olhos de mistério.
O cheiro do Rodoro de metal, no lenço nem ouvirão a voz de Dincanga embriagado cantando, Aurora de Flor nem apreciará O sex-appel de Boneca desfilando serelepe nas noites tupiniquins, a cachaça Subejo de dona Nieta, na casa Minas Gerais nem verão o seu efeito colateral fazendo Geraldo Tatu cantar o Hino Nacional de trás-prá-frente.
Uma caderneta de fiado, no Armazém Globo de Antonio Barreto e o picolé de groselha e água do Bar Sibéria. Jaú da Pensão, falando dentro dos ouvidos dos burros carregados com bruacas de rapadura e amarrados à porta do Mercado Municipal.
Não verá o seu avô amolando navalha Solinger na tira de couro e nem sentirão o perfume Nuit de Noel da sua avó, o vestido tomara-que-caia, amarrado com arame no busto, o maiô Catalina e as divinas coxas de Marta Rocha, nem ouvirá Cauby Peixoto cantando...

Conceição/ eu me lembro muito bem/ vivia no morro a sonhar/ com coisas que o morro não tem/ foi então/ que lá em cima apareceu/ alguém que lhe disse a sorrir/ que, descendo à cidade, ela iria subir/ se subiu/ ninguém sabe, ninguém viu/ pois hoje o seu nome mudou/ e estranhos caminhos trilhando/ só eu sei/ que tentando a subida desceu/ e agora daria um milhão/ para ser outra vez/ Conceição...


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Por Raphael Reys - 2/6/2011 17:16:09
Um olho fechado, outro aberto!

1957, Montes Claros aguardava ansiosa a comemoração do seu Centenário. O historiador Hermes de Paula organizava tudo, com a preciosa e decisiva ajuda do jornalista Newton Prates, pai do nosso poeta, cronista e grande amigo Felippe Prates, enquanto o alcáide Geraldo Atayde e o engenheiro Joaquim Costa tomavam as providências necessárias para deixar nossa cidade nos trinques.
Dom José Alves, o saudoso bispo, andava de lá para cá arrumando as igrejas quando recebeu a visita de Monsenhor Gustavo, a serviço. O mesmo relatou-lhe, assustadíssimo, que o forro da Matriz estava dando uns estalos gigantescos e aterradores, como se fosse desabar, fazendo gelar os corações!
Visando viabilizar a segurança do templo para as festividades próximas, o nosso bispo, em um momento de má inspiração, mandou chamar o mestre de obras Roberto Pimenta, cobra mais do que criada da Rua Melo Viana, para fazer o orçamento do conserto do teto da igreja.
Roberto se encontrava na ocasião dependurado com um papagaio enorme no banco de Seu Calixto, o Banco Comércio, já em vias de protesto. Sorrateiramente, como convinha a um mala sem alça, o citado mestre de obras, após afetada, posuda e meticulosa verificação, condenou o telhado e apresentou um orçamento bastante exagerado, visando forrar, de vez, os bolsos de grana e quitar o débito bancário.
Ato seguinte, aterrorizou o bispo com sua exagerada narrativa ficcional descrevendo um inevitável e próximo acidente com o desmoronamento do telhado, se a obra não fosse realizada com toda urgência, certo que o céu arriaria em cima das cabeças dos fieis em dia de missa com a igreja lotada! Como Kipling, narrou uma cena dantesca, cheia de dezenas de cadáveres entre os escombros! Simplesmente aterrorizante!
Chegou mesmo a prever magotes de pobres almas desencarnadas ali vagando no “post mortem” pelas escarpas dos Hades, no barco de Caronte do Rio Letes e até alguns deles, dado à vida pecaminosa, padecendo horrores na câmara de retificação da Judeca, mais conhecida como o terrível Sétimo Círculo do Érebro!
Dom José, de imediato, contratou o serviço. Ao iniciar a “necessária” e tão urgente reforma, tudo já sob controle, o empreiteiro Roberto levou em sua equipe de trabalho, alguns amigos igualmente malas, todos especialistas em aplicação de vários tipos de 171. Selecionou seis malacaus dos Morinhos: Chicão, Zé Mota, Zé Pedro, o valente Arnaldo da Hora, o ferreiro Tonicão e o farrista Aldair, esse último o único que ainda está vivo, mas já prestes a ser despachado aos zinfa...
Mantendo sua equipe cheia de goró, fartos tira-gostos de bucho e cigarros a vontade, incitava-os a subir e descer forro abaixo da igreja sempre arrastando pesos inúteis, retirando picumãs, restos de telhas, jogando-os para cima e baixo com estardalhaço, caindo mesmo sobre o altar pedaços de sarrafos, terças, caibros, pregos, caibral, etc. Ferramentas batiam no piso com grande barulho, dramatizando ainda mais o instalado clima de terror, o que era reforçado pelos gritos de ordem emitidos pelo “competente” mestre de obras, numa autêntica pantomima...
Terminada a obra, na hora do acerto, Dom José, bastante desconfiado de estar sendo vitima de um 171 urbano, quitou o pagamento do trabalho com o conteúdo de dois sacos de aniagem cheios de células mofadas, rasgadas, amareladas e remendadas com fita adesiva. Refugo de muitos anos de óbolo oferecidos por caridosos e espertos fiéis.
O empreiteiro Roberto livrou-se do pepino quitando a divida, ao forçar o banco a receber aquela bagaceira como pagamento, sob a cínica alegação de se tratar de “dinheiro bento e sagrado”!
Os bancários Bida e Luizão, coitados, emboramente inocentes nessa parada, é que ficaram com a rabuda de contar, colar e etiquetar as mal cheirosas notas...


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Por Raphael Reys - 29/5/2011 12:02:50
MONTESCLAREADAS

Nos anos 50, meninos viviam soltando arara na Praça Coronel Ribeiro, ou tomando um Guaraná Brotinho no bar de Nelson Vilas Boas. Lá, o notável professor Pedro Santana bebia a sua cerveja casco verde e falava de filosofia platônica. Sempre bem vestido, sorriso comedido, gestos largos e teatrais.
Pela rua Doutor Santos, passava os blocos de carnaval de rua com Dona Afra Bichara fantasiada de baiana, estilo Carmem Miranda. Nos salões do Clube Montes Claros, a foliona Nice David desfilava como a Rainha do carnaval de Montes Claros. Lazinho Pimenta comandava o grito carnavalesco gritando: “Evoê foliões!”.
As festas de santo e de fogueira na casa de Malaquias Pimenta eram a bossa do momento. Mesa farta e uma pinguela feita de tronco de árvore servindo como ponte para a travessia até o Roxo Verde. Meninos e meninas liam o Almanaque Biotômico Fontoura, que ganhavam na farmácia de Cica Peres.
No bar do Tiano, no Mercado Municipal, escutávamos uma vitrola RCA VICTOR tocando em um bolachão de acetato Cauby Peixoto cantando... “O amor é uma pérola rara/e tem a cor de um rubi...” Comíamos um pastel recheado só de vento quente e degustávamos o indefectível picolé gororoba de groselha (água pura!) do Bar Sibéria, enquanto Biô Mia e Carlúcio Ataíde tomavam uma cerveja casco escuro.
Afonso Salgado bebia e o seu cavalo o vigiava pela janela, Dulce Sarmento tocava elegantemente em seu piano de cauda, Bigode de Arame passava arredio rumo ao seu quarto nos fundos do Cine Coronel Ribeiro.
Maria Babona pedia esmola pelas ruas carregando um filho no colo!
Tuia, o folclórico escravo ainda vivo, era visto chupando bico no seu quarto de madeira na redação do Jornal de Montes Claros. A elegância de Benedito Gomes, João Ataíde, João Chaves e Píndaro Figueiredo vestindo ternos de linho S 120 branco. João Chaves de gravata borboleta e Píndaro com sapato bico fino duas cores, faziam sucesso.
Havia as bolachas tipo pastilha da padaria de Seu Tota, que grudavam no céu da boca, em frente ao estúdio de Godofredo Guedes. Na época, Patão era chamado Pé de Pato e Hélio Notinha já aplicava chaveta com figurinhas carimbadas.
Degustávamos os deliciosos salgados de Dona Zeny Priquitin, as caçarolas italianas de Duca e Nazaré. A laranjada queimadinha com bicarbonato ao lado da loja do russo, de Joel Stark.
As brincadeiras de Estrac Deixa, as brigas de rua com a turma de Odorico Mesquita no centro, de Zé Doido e Capa Preta na Igrejinha, Gabilera no Alto São João e Tatá Aquino na Rua Belo Horizonte. As guerras com caroço de mamona, estilingue feito de borracha de câmara de ar de bicicleta sueca.
Os roletes de cana caiana, as bicicletas novas na loja de Waldir Macedo, o álbum de fotografias com capa de madeira com a gravura de capa... Bem me quer, mal me quer...
A alegria das bolas G18 de capota e as peladas no campo de lama da rua Germano Gonçalves, briga com o time do Alto São João, Cinzano tomado escondido às margens do rio do Melo. Canivete Corneta, isqueiro Ronson, alparcatas Roda, pente Flamengo, Gumex no cabelo, corte Príncipe Danilo, óculos modelo Ronaldo, camisa Prist, botinha solado “new life” e o barulho sincronizado do motor do Simca Chambord. Um relógio Tissot Militar, meias Lupo, lança perfume Rodoro de metal, Aqua Velva no rosto, cheiro de sabonete Madeiras do Oriente. Camisas de gola buclê e banlon, garotas desfilando com modelos Bangu, picolés Esquibon da caixinha, a marchinha de carnaval... “Chiquita Bacana/lá da Martinica/se veste com uma casca de banana nanica/não usa vestido/nem mesmo calção...” E as balas de chocolate do bar de Adail Sarmento...


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Por Raphael Reys - 22/5/2011 15:30:02
O BODE DE CHICO PRETO

Desmamado em um catimbó do Maranhão, o citado caprino foi trazido como encomenda a nossa urbe, para servir aos ritos do Vodu da casa de santo do babalorixá Chico Preto.
Criado a pão de ló e com todo dengo que compete o seu “status”, tem a cama em que dorme dentro de uma camarinha. Como já participou de muitos e tantos ritos de Ebó, adquiriu a “subjugação” do ente chefe da casa.
Volta e meia e estando fora da função ritualística, apronta e faz bagunças na circunvizinhança do Bairro Doutor João Alves. Quando está na baixa veia libidinosa caprina, bota gente prá correr!
Certa feita, carente de mimos degustativos e melindres, o bode de Chico Preto, como é também chamado, foi parar em uma frutaria localizada na Ponte Preta (sob a linha férrea). Não sendo ente humano e como não carrega dinheiro de qualquer espécie, chegou na maior cara dura subiu na banca e devorou maçãs, peras e outras gostosuras.
O proprietário, sabedor das artes da além fronteira de onde o invasor é originário, tomou cuidado. Defendeu-se, colocando uma cesta de frutas em definitivo à entrada. Nela afixou uma placa: “Repasto do Zebedeu!” Ficava assim posta e em definitivo, para quando bem o aprouvesse e a sua disposição, a refeição “light” do respeitado personagem de chifres citado...
O fato mais notório, entretanto, se deu em uma boca de noite de um “Sabatto” na casa. O gongá preparado para a função, a hierarquia a postos, filhos e filhas de santo na roda quando entra um evangélico bramindo uma bíblia e ameaçando parar com tudo.
Desafiou o chefe do culto a lhe provar que aquelas almas invocadas existissem, produzindo uma manifestação. Uma via de fato!
O babalorixá exigiu respeito à casa, ao culto, ao livre arbítrio religioso, aos símbolos autorizados e registrados, o que eles representavam, aos presentes e convidados da noite.
O invasor, entretanto, estava possuído da macaca urbana, coceira no “fiofó” e não deu bola para o que disse o xerife da casa.
Mestre Chico acabou aceitando o desafio. Mandou buscar o Bode Zebedeu na camarinha e o colocou em frente ao desafiante. Ato seguinte iniciou o diálogo:
- Se o bode conversar racionalmente, o senhor se dá por satisfeito e vai embora, evitando até que eu perca a paciência e lhe dê uma vassourada na cabeça?
O enfeitado invasor, fazendo boca de muxoxo e ar de môfa replicou, em resposta: “Prá mim, está de bom tamanho!”
Ato seguinte, o caprino, atuado pela entidade do Ebó, ficou em pé sobre as patas traseiras, tomou uma postura arrogante e disse rilhando os dentes: “Se você demorar mais um minuto aqui, vou comer o seu terno engomado como sobremesa, seu palhaço enfeitado!”
O mijo quente e ácido, aliados a dejetos líquidos jorrou pernas abaixo do invasor, numa cena grotesca e laxativa!
Temido por uns, evitado por outros, quando circulava no bairro Doutor João Alves e adjacências, capitaneando e desfilando com um seleto séquito de quinze fêmeas popusudas.
Como era cabeceira e posudo “rompia na frente” do séquito, com seu grande e enrolado par de cifres. Abria caminho e provocava arrepios!
Certa feita resolveu bagunçar o coreto. Entrou em um armarinho próximo ao terminal Rodoviário e para pirraçar um comerciante, que era um tremendo chato de galocha, mastigou uma peça de roupa do mostruário.
O homem estava num dia de cão, com a bílis a flor da pele e, enfurecido, apanhou o treisoitão. Saiu porta afora e, espumando de ódio, despejou a carga de balas no famoso caprino de Ebó. Pois as seis pitombas de chumbo quente caíram sem força aos pés do bicho batizado no Vodu...
Dizem os iniciados nos ritos afro/catimbós que a grossa corda de sisal usada para amarrar o bode Zebedeu no pegí, durante os rituais, fora confeccionada nos Hades. Isso mesmo que os senhores leram: nos Hades! O artesão que a trançou é o mesmo que fez a corda que amarra o barco de Caronte às margens do Rio Letes.
Daí dá para ver que o bode não era pouca coisa!


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Por Raphael Reys - 17/5/2011 17:10:28
A Rua Melo Viana e suas atrações

O nome da rua teve origem em 1930, dado ao atentado, que teve como vítima, o então vice-presidente da República, Melo Viana, que aqui tombou baleado, batizando com sangue a via pública.
Artéria principal e símbolo do bairro Morrinhos, alma de capoeira, de samba, de malevolência, de sobrevivência e de malandragem.
O point era o bar Destak, ou bar de dona Linda, na confluência com a Rua Corrêa Machado. À sua porta reuniam-se a galera do morro, os capoeiras, os malandros e os sambistas, profissionais liberais, gente para dois dedos de prosa e mesmo a turma que rodava na pesada, tinha livre trânsito por aqui!
Considerando a via em sua extensão, de extremo a extremo, no começo, o bar de João da Hora, local de valentes. A seguir, o carteado do Hotel de Pedro Nu, o Bandeira 2, bar diuturno, escola de malandragem, quartel general de 1.7.1. Damas da noite, gente do beco e cavaleiros das sombras.
Pano verde de fichas, de tacos, de caçapas. Cobras, agás, otacílios e patos barrufados.
Transposta a via férrea, marco divisor do centro da cidade com o bairro Morrinhos, o Bardonato, com excelente tira-gosto e malandros escolados de plantão e grana emprestada a juros.
O gelado Caldo de Cana do Jason, a serraria do construtor Levi Pimenta, o salão dos Macaúbas, onde Zezinho barbeiro aprendeu a aplicar agamenon de sofredor. O café de Jorge, o taciturno, o homem que ganhou três vezes o primeiro prêmio da loteria federal e vende cafezinho requentado.
Na esquina, o bar do Amélio, onde o Negão Torresmo quebrava tudo, ele consertava, o Negão quebrava novamente. A galinha caipira no molho do bar do Cícero, o Destak de dona Linda, sede da Escola de Samba Destak. No balcão, Haroldo, Betim, e Zeca.
O gongá de dona Zefíra, suas magias e a carpintaria de seu Ernesto Zangado, sempre pronto a dar uma bengalada em quem o importunasse. Tem a sapataria e estúdio fotográfico do Var.
O salão Ruas, da família do saudoso Tone Barbeiro, a serralheria do seu Bil, o armarinho de dona Olindina com o gabinete dentário de Antonio Souza que anestesiava os pacientes com reza brava. O gongá de Belmira Rezadeira com suas benzeções e contra-mandingas e a bola de cristal de dona Lozinha.
O armarinho de dona Zó, seus parceiros de carteado e no alto da rua o cabaré de Pedrelina, os terrenos de Cizino o barraco de Manoel Quatrocentos, o homem da ferrada. A caixa dágua da cidade e a igrejinha colonial.
Resta esclarecer que as famílias tradicionais do morro, são ordeiras e estão por aqui a mais de setenta anos. A malandragem é obra dos estranhos que migraram, notadamente após o prefeito Toninho Rebello ter trazido nos anos 70, por força dos seus ofícios, as casas de tolerância do centro, para as nossas ruas.
Por aqui passaram blocos caricatos: o Feijão Maravilha, o Hong Kong do Negão Torresmo, a Escola Destak e a exótica gangue do Desaba. Assim como os freqüentadores das noites de luxúria do Cabaré de Zé Coco.
Perto, a funerária da família Beirão, quartel general da Boneca de Leonel.
Em 1970, o alcaide Toninho Rebello construiu o Mercado Municipal Sul, em 1978 o empresário Paulo Narciso instalou a Rádio São Francisco de Assis, 93 e 98 FM e logo veio a Intertv concessionária do canal 4.
O “boom” era o PF no bar do Haroldo, no Mercado Sul, o sortido do saudoso mestre Leopoldo já aos noventa anos de idade, o tira-gosto de Zeca, com o seu samba de mesa e serestas românticas. Escutar a percussão de Roy e tomar uma cachaça curraleira.
Atualmente a moderna padaria Sabor Caseiro, com um sortimento de delícias ao seu paladar, o bares de Vinin e João com a cerveja gelada nos fins de semana e o estúdio de Marquinho do Destak, sede da turma G4.


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Por Raphael Reys - 5/5/2011 18:13:17
CHAUFEUR DE PRAÇA

Em meados de 1950, falava-se em chaufeur de praça e a profissão conferia status já que o número de veículos em circulação pela urbe era reduzido, e os profissionais de praça, botavam banca!
O povo era pouco desenvolvido e andar de carro, considerada uma aventura!Daí, alguns chaufeurs se tornaram verdadeiros don Juans. O fato se dava porque toda senhora casada que queria se vingar do marido procurava um chaufeur para fazê-lo, dado à mobilidade que o veículo conferia além do natural e conveniente álibi de tratar-se de uma passageira...
Predominavam os veículos importados, verdadeiras relíquias do Romantismo. Packard, com Elpídio Dourado, Ford Sedã, com David e Mário, Oldsmobile com Geraldo Colares e Osvaldo Preto e Chevrolet, com Zé Antonio.
Um Buick, com Jaime Estopa Suja e Júlio Antonio. O Ford Cupê 46 de luxo com Leopoldo. Depois veio Gê Sanfoneiro com seu Ford Preto e a paixão por Asa Branca e Luiz Gonzaga.
Levando os nossos passageiros sempre bem vestidos para passeio, João Brejeiro com um Mercury, Leví Cheiroso com uma Sedã Chevrolet Passeio, Marquinhos, Pedro Vieira, Hélio de Rocha, Zé de Juca.
Havia também José Antonio, pai de Pedro Cantinflas, Zezinho Preto, Leví, Mário Nortista, Ferreirinha com suas cólicas de matar e Isáuro, sempre muito alegre, que colecionava quarda-chuvas achados e cantava Ave Maria.
Alguns dirigiam caminhões como o L -16, o V- 8 e o Buldog.
Logo chegou a modernidade e Mariano era instrutor de direção, profissão que exerceram por cinqüenta anos. Aí vieram os Aero Willys, as Rural Willys, Os Gálaxies, o Simca Chambords, as Pic Ups, os Dauphines, apelidados de leite Glória, pois desmanchavam sem bater... Os Gordinis, e a população já tinham acesso a financiamentos e os chaufeurs, passaram a ser chamados de motoristas de táxis.
Dentre os instrutores de direção, destacavam-se ainda Alcebíades e Moacir.
Quem conservava carro romântico era Jair Amintas e sua Baratinha Alemã, Dominguinho Braga e o Impala, Oscar Gabriel e o Cadilac Rabo de Peixe, Leví Daltro e o Sinca, Romeu e o seu Itamaraty.
Muitos outros chaufeur que não citamos, por lapso temporário de memória, ou por exigüidade de espaço, as nossas desculpas e o nosso respeito.


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Por Raphael Reys - 10/4/2011 16:25:27
SALVADOR II

Lembramo-nos, ainda, que o nosso Salvador (a grafia correta do seu nome era Yechuá), descrito na crônica postada anteriormente, era um judeu fugido da Gestapo de Hitler, aqui chegado no início da Segunda Grande Guerra, nos idos de 1939, era um mau jogador de damas e gamão. Quando perdia a partida se irritava e acabava desacatando o opositor. A galera levava isso na esportiva e jogava com ele era mesmo para irritá-lo e desafia-lo, homem frontal em tudo que fazia.
Gostava de tomar uma boa pinga da região, que servia para seus convidados acompanhados de um bom tira-gosto de berinjela assada e grão de bico. Dos hábitos adquiridos na vivência no deserto, sempre fervia a água para o chá ou café duas vezes.
Demonstrando a sua enorme resistência e força física, a fim de intimidar vizinhos inoportunos batia a cabeça no poste de iluminação, naquela época feito de madeira. Fazia isso repetidas vezes até que a lâmpada afrouxasse e caísse no chão, o que era festejado por ele e pela meninada que acompanhava a proeza.
Salvador era um alfaiate de mão cheia. Fabricava edredons, colchas, além de paletós e blazers. Costurava tudo à mão, com agulha e linha, para ele uma terapia, pois gostava de ficar a sós com seus próprios pensamentos.
Freqüentava o Bar Viena, de Willi, ponto de encontro dos estrangeiros residentes na nossa urbe. Lá, tinha uma mesa cativa que era chamada de “ONU”, local em que debatia com amigos inclusive política internacional, muitas vezes na companhia do judeu marroquino Willi, austríaco, Jonhy Koravisky, polonês, Jaroslav Rosulek, de nacionalidade russa, dentre outros.
Quando o assunto era a Segunda Grande Guerra, clamava por vingança e lamentava não ter tido a oportunidade de matar o carrasco Mengele com as suas próprias mãos, exibindo-as crispadas e trêmulas de emoção.
O advogado e escritor Leonardo Campos, neto de Sica Perez de quem Salvador era amigo íntimo, freqüentava a casa do nosso herói africano e, habitualmente, comprava os seus Lps, verdadeiros bolachões de acetato que ali eram comercializados, resultado de acertos de alugueis atrasados com alguns inquilinos de seus prédios comerciais no centro da cidade. Comerciantes que vendiam discos e costumavam saldar os débitos utilizando-os como moeda


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Por Raphael Reys - 5/4/2011 16:19:01
SALVADOR

O seu nome verdadeiro era Yoshua Rabib Perez, um judeu marroquino, vindo para o Brasil em 1939 durante a Segunda Grande Guerra, fugindo da Gestapo. Aqui chegou abarrufado de grana e se associou a outra família de semitas que tinham loja de móveis.
Foi morar na Rua Marechal Deodoro onde adquiriu um conjunto de 10 casas residenciais e uma grande propriedade urbana onde hoje está localizado o nosso Mercado Municipal e a área comercial em volta do mesmo.
Dotado de temperamento explosivo, aguerrido e sincero, logo entrou em desacordo com muitos inquilinos. Acabou fechando as casas e ocupando, pessoalmente, a primeira delas. Por toda a vida manteve fechados os imóveis.
Casou, constituiu família, desquitou, a família foi morar em Belo Horizonte e ele arranjou outra companheira. A sua moradia era simples, móveis toscos, apenas o essencial para viver. De hábitos frugais e disciplinados, habitualmente modestos.
Estatura média, caucasiano, careca, olhos esbugalhados, Salvador era ossudo e musculoso. Em Marrocos, onde nasceu e morou, foi de tudo: pastor de ovelhas, transportador de água potável pelo deserto. Dado a seu temperamento combativo, logo se alistou na Legião Estrangeira.
Personalidade explícita, não despachava para o bispo. A sua missa era de corpo presente. Falava o que tinha de falar, na bucha. Daí ser evitado pela maioria das pessoas.
Como fora criado no deserto, aprendeu com beduínos a arte de fazer chás, infusões, remédios naturais, além da aplicação de massagem e a prática de ventosas. Tratava a todos, sem custos, a quem o procurasse.
Meninos, moradores na proximidade enchiam a sua casa para assistirem à aplicação dos copos quentes no corpo dos pacientes. Era hilário. Alguns gritavam, urravam e chegavam mesmo a verter urina pernas abaixo, “sentindo” uma dor imaginária...
Mestre cuca de mão cheia e bom de anzol, era requisitado por empresários e políticos locais para tomar parte em grandes pescarias, quando, após tomar umas cervejas se emocionava e tocado pela saudade do rincão natal cantava e declamava poemas de amor ao estilo campesino.
No quintal de sua casa, havia um pomar de frutas cercado apenas de arame farpado, sempre visitado pela meninada vizinha que surrupiava o produto para deleite da pança e a alegria em ter desafiado aquele pequeno, valente e irritado gigante do deserto...
Tico Lopes, ainda infante e aproveitando as sombras da tarde, um dia lá subiu em um pé para retirar duas mexericas. Salvador já estava de campana montada para surpreender os pequenos gatunos e com uma espingarda polveira municiada de sal grosso, num tiro certeiro acertou os fundilhos do nosso homem show e mestre benzefala.
Ao ver a queda do pirralho no solo e escutar a gritaria da “vítima”, Salvador vibrou de satisfação, incitando o seu cão ao ataque:
- Acertei o F.D.P.! – Pega Tupã e acaba de matar!
Felizmente, a não ser o bom tempo em que Tico ficou sem poder sentar, não houve maiores conseqüências e nosso querido artista e “show man”, aí está vivo e fagueiro, com mais esta boa história para contar...


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Por Raphael Reys - 2/4/2011 06:55:52
MONTESCLAREADAS

Nos anos 50, meninos viviam soltando arara na Praça Coronel Ribeiro, ou tomando um Guaraná Brotinho no bar de Nelson Vilas Boas. Lá, o notável professor Pedro Santana bebia a sua cerveja casco verde e falava de filosofia platônica. Sempre bem vestido, sorriso comedido, gestos largos e teatrais.
Pela rua Doutor Santos, passava os blocos de carnaval de rua com Dona Afra Bichara fantasiada de baiana, estilo Carmem Miranda. Nos salões do Clube Montes Claros, a foliona Nice David desfilava como a Rainha do carnaval de Montes Claros. Lazinho Pimenta comandava o grito carnavalesco gritando: “Evoê foliões!”.
As festas de santo e de fogueira na casa de Malaquias Pimenta eram a bossa do momento. Mesa farta e uma pinguela feita de tronco de árvore servindo como ponte para a travessia até o Roxo Verde. Meninos e meninas liam o Almanaque Biotômico Fontoura, que ganhavam na farmácia de Cica Peres.
No bar do Tiano, no Mercado Municipal, escutávamos uma vitrola RCA VICTOR tocando em um bolachão de acetato Cauby Peixoto cantando... “O amor é uma pérola rara/e tem a cor de um rubi...” Comíamos um pastel recheado só de vento quente e degustávamos o indefectível picolé gororoba de groselha (água pura!) do Bar Sibéria, enquanto Biô Mia e Carlúcio Ataíde tomavam uma cerveja casco escuro.
Afonso Salgado bebia e o seu cavalo o vigiava pela janela, Dulce Sarmento tocava elegantemente em seu piano de cauda, Bigode de Arame passava arredio rumo ao seu quarto nos fundos do Cine Coronel Ribeiro.
Maria Babona pedia esmola pelas ruas carregando um filho no colo!
Tuia, o folclórico escravo ainda vivo, era visto chupando bico no seu quarto de madeira na redação do Jornal de Montes Claros. A elegância de Benedito Gomes, João Ataíde, João Chaves e Píndaro Figueiredo vestindo ternos de linho S 120 branco. João Chaves de gravata borboleta e Píndaro com sapato bico fino duas cores, faziam sucesso.
Havia as bolachas tipo pastilha da padaria de Seu Tota, que grudavam no céu da boca, em frente ao estúdio de Godofredo Guedes. Na época, Patão era chamado Pé de Pato e Hélio Notinha já aplicava chaveta com figurinhas carimbadas.
Degustávamos os deliciosos salgados de Dona Zeny Priquitin, as caçarolas italianas de Duca e Nazaré. A laranjada queimadinha com bicarbonato ao lado da loja do russo, de Joel Stark.
As brincadeiras de Estrac Deixa, as brigas de rua com a turma de Odorico Mesquita no centro, de Zé Doido e Capa Preta na Igrejinha, Gabilera no Alto São João e Tatá Aquino na Rua Belo Horizonte. As guerras com caroço de mamona, estilingue feito de borracha de câmara de ar de bicicleta sueca.
Os roletes de cana caiana, as bicicletas novas na loja de Waldir Macedo, o álbum de fotografias com capa de madeira com a gravura de capa... Bem me quer, mal me quer...
A alegria das bolas G18 de capota e as peladas no campo de lama da rua Germano Gonçalves, briga com o time do Alto São João, Cinzano tomado escondido às margens do rio do Melo. Canivete Corneta, isqueiro Ronson, alparcatas Roda, pente Flamengo, Gumex no cabelo, corte Príncipe Danilo, óculos modelo Ronaldo, camisa Prist, botinha solado “new life” e o barulho sincronizado do motor do Simca Chambord. Um relógio Tissot Militar, meias Lupo, lança perfume Rodoro de metal, Aqua Velva no rosto, cheiro de sabonete Madeiras do Oriente. Camisas de gola buclê e banlon, garotas desfilando com modelos Bangu, picolés Esquibon da caixinha, a marchinha de carnaval... “Chiquita Bacana/lá da Martinica/se veste com uma casca de banana nanica/não usa vestido/nem mesmo calção...” E as balas de chocolate do bar de Adail Sarmento...
São tijolinhos que construíram uma edificação de nome “saudade”!


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Por Raphael Reys - 24/3/2011 15:22:14
Outro final de tarde

Trafego "en passant" pela Avenida Sanitária e já ocorre o lusco-fusco do entardecer. A boca da noite tem uma atmosfera própria de permeio ao clima abafado que a envolve. Acontece sem um significado maior quanto ao poder dissolvente do tempo.
Pela borda da esquina próxima aparece o crepúsculo morno e sedutor como as mãos de uma mulher. Nas calçadas, estacionamentos, bares, restaurantes da moda já há uma suspeita de frenesi. Pelas ruas passam condutores apavorados, caronas tensas ora estáticas ora se balançando como o boneco João Bobo.
Janelas estão abertas ao hiper-realismo que proporciona a noite. Já circulam seres em busca de um calor e conforto etílico. Temporariamente reconfortante.
Através da transparência da porta de vidro do salão de eventos vejo os pigmentos naturais em uma tela de Márcia Prates. A arte sugere uma mística mexicana de Frida e uma eventual magia de Somoza.
Sinto olhos atentos a observar a minha frágil alma plástica através da janela dos meus olhos com olheiras. Um sorriso de um quase afeto e um instante surreal. Doris Araújo traz na cabeça uma tiara de flores artificiais e multicoloridas e canta uma rima poética.
Luis Carlos Peré com sua bolsa de “jaberrou” e o boa praça Reinine Canela, assinam a noite com um sorriso de bem com a vida. Teo Azevedo musica e metrifica os poemas esquecidos do bardo João Chaves: Moreninha, Triste Recordação e Divino Mestre.
O sax Stein de Armando Cabeceira Marden Barros, chora lágrimas de metal e deixa ver e ouvir “Stella by star ligth”. Coloca a minha pobre alma plástica a navegar em blues...
Tininho Silva de cachecol e chapéu malandro com seu sorriso mafioso escuta Astrud Gilberto cantar Doralice em um bolachão de acetato 38 rpms, sob o solo do saxofone de Stan Gets.
Pela avenida, ganidos de freios, reclames de camelôs e buzinas estridentes se misturam aos sorrisos afrescalhados e gestos leves de duas bibas que fazem trotoir na via quase expressa. Meus olhos acompanham o gingado de um bumbum que passa saracoteando sob a amplidão das estrelas.
A noite tem mil olhos e as paredes mil ouvidos e o côncavo insiste em buscar o convexo!


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Por Raphael Reys - 16/3/2011 16:00:13
Rio Serraria

Transcorria o abastado ano de 1968 e no bairro São José onde morávamos vadiávamos em turmas de adolescentes em incomensuráveis festas as quais eram realizadas na maioria das vezes na laje da casa de Durval Durães e Margarida Barbosa. Os piqueniques nos fins de semana aconteciam em nossa fazenda no Rio de Peixe, às margens do São Lamberto.
As caçadas e pescarias que fizeram história eram sempre nos fins de semana e feriados prolongados tendo como palco a fazenda de Tião Souto e Onofre Espírito Santo, no município de Jaiba.
Íamos os casais de namorados e éramos recebidos por Onofre, nosso vizinho de bairro aqui nos Montes Claros e companheiro de trecho, aventuras e dois dedos de prosa à beira das fogueiras.
Tempos de fartura, de Jovem Guarda, de Beatles.
As armas e a tralha de pescaria eram transportadas na caminhonete de Waltim Coutinho, um cabeceira sempre à frente nas aventuras. Companheiro de toda hora, Walter estava presente e a disposição para o que desse e viesse.
Na viagem, passávamos pela fazenda de Mário do Umbigo, irmão do prefeito de São João da Ponte, onde curtíamos o dia com mesa farta boas cachaças, muita conversa jogada fora e exercício de tiro ao alvo com revólveres, atividade que o Mário adorava! Hoje o local é o povoado de Marilândia, em sua homenagem.
À porta da fazenda de Tião Souto, duas lagoas garantiam a fartura com marrecos, ariris e patos em abundância. Muita mata fechada, pastagem de colonião para o gado de corte, um calor sufocante que propiciava até gestação de mula.
O Rio Serraria é formado de três cursos secundários de águas e estando no alto do morro, dava para vislumbrar as margens do velho Chico, ao longe.
Rio de águas fortes com corredeiras, pescaria difícil usando redes e melhor ainda com o uso do anzol com caçote para apanha dos dourados nas corredeiras. Grande quantidade de cobras venenosas descendo o rio fazia com que se tivesse um atirador de plantão posicionado em uma elevação. Uma cartucheira Boito 16 mocha sempre pronta para o disparo certeiro de Onofre, exímio atirador.
Certa tarde, um fazendeiro vizinho mandou uma encomenda solicitando o abate de uma vaca. Queria o fígado inteiro e uma banda da criação, pois estava para receber a sua família que residia em Belo Horizonte naquele feriado longo.
O fígado e a banda dianteira foram postos em sacos de estopa e amarrados na garupa de um cavalo. O vaqueiro encarregado da entrega refugou a viagem já na boca da noite, alegando o perigo de se deparar com uma onça na campana, mas acabou indo, pois não havia outro peão disponível no momento.
Não deu outra! Em certo trecho beirando a cerca, com precaução, a pintada deu o pulo e arrancou os sacos com a carne, deixando o traseiro da montaria rasgado pelo sulco das suas garras afiadas.
O vaqueiro conhecedor do terreno saltou da montaria, pulou a cerca sob a luz da lua e se refugiou em uma pequena ilha, no centro do rio.
Tarde da noite saímos montados a cavalo com uma patrulha organizada. Pela manhã o localizamos e o avistamos todo enregelado nas folhagens da pequena ilha. Deu trabalho para tirá-lo de lá. O homem estava em pânico e recusava-se a dispensar a segurança do local.


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Por Raphael Reys - 10/3/2011 14:33:02
O mundo é composto!

Homero relata que os deuses tecem desventuras para que os homens, nas gerações vindouras, tenham o que contar. Arremata o corretor Geraldo Mundial que o mundo é composto. Tem que ter de tudo um pouco.
Aqui em Montes Claros, terra do fruto amarelo e capital da recente República do Pequistão, acontecem coisas que até Deus duvida!
O grupo musical Prego de Linha, nos bons anos 70 foi animar um evento na vizinha cidade de Glaucilândia. Durante a viagem, encheram o pandú de cachaça branquinha. Chegaram ao destino campesino pela manhã, vestidos à moda hippie, recendendo a aroma de baú velho, cheios de babilaques e rumaram para uma escola pública onde solicitaram na Secretaria uma sala para a turma de bebuns dar uma morgada antes do show. Como dizia o saudoso Zé Amorim: “roncavam e babavam feito porcos”. Logo, chegaram à escola algumas professoras que desconheciam a cessão da sala para servir de dormitório aos músicos.
Ao se depararem com aquela corja de cabeludos roedores de pequi, bufando e empestilando de bodum o ar que respiravam os justos, chamaram um policial para botar ordem na casa e escorraçar aquelas figuras xexelentas e indesejáveis!
Chegou um policial militar, ajumentado no tamanho e nos gestos. Aproximou-se daquele que roncava mais alto e deu uma bicuda com o bate-bute na sola do pé do infame, totalmente entregue aos braços de Morfeu.
Como dizia Shakespeare, o pesadelo tem nove potros. O agredido abriu os olhos supondo ser aquela uma fase dantesca e onírica do sono e foi logo indagando: “Está dando um baculejo xará? Tô tendo uma visão, meu camarada!...”.
Tomando consciência de que a via de fato era real e em cores, foi logo falando em cima do pedido: “Dá uma olhada na minha brisa, cara! Vê se eu to dando alguma bobeira e saca direitinho, meu!”.
Aí o militar perguntou o que eles estavam fazendo ali deitados, esparramados de todo jeito em uma escola pública. O interpelado respondeu na bucha: “Nós estamos na maior, Ceará! Todo mundo caído de bolso!...”.
Em seguida, vendo o músico Tico Lopes deitado ao seu lado com os olhos esbugalhados de terror, falou no ato: “Veja só, cara! Quando vi esse meganha ajumentado me chutando, pensei que estava fazendo a maior viagem a Katmandú!”.
E arrematou, finalizando: “É... Parece que a morgada deu o maior bode!”.


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Por Raphael Reys - 8/2/2011 07:51:44
NO QUINTAL!

Lá pelo meio dos anos 80, Ricardo Popó assumiu a direção do Restaurante Quintal, sucedendo ao restauranteur Ênio.
Uma nova fase no etílico espaço diuturno de Moc City. Com o novo dono, veio junto às armas e bagagens a cachorrinha Pretinha, guardiã do pedaço. Mostrando serviço, ela não deixava estranhos adentrarem no recinto.
Nessa fase da noite montes-clarense é que começou a formação das chamadas mesas de diretoria, que agrupavam turmas de amigos. Costume que se estendeu até os dias atuais. Outra moda da época eram as chamadas listas dos ônibus dos chatos de galocha, uma invenção do saudoso Afonsinho.
Nelas, os nomes dos freqüentadores da casa, em uma projetada viagem, dispunham apenasmente de passagem de ida. O destino e parada final, sempre era tenebroso: Biafra, Guiné Bissau, interior do Piauí ou a cidade de Andirobal dos Crentes, no Maranhão. Chegavam ao requinte de colar foto dos participantes em uma maquete!
Dentre muitas mesas de diretoria, havia a de Marão, nosso querido prefeito. Nela, figuravam Odorico Mesquita, Cláudio Athayde, Cabeludo, Antonio Abreu, Geraldo Renã, Vicente Pãozim, Waltin, Pancho, Tico Lopes e muitos outros.
Da fáuna que circulava entre as mesas, tinha um jornaleiro mudo e Maçarico Santiago, vendendo suas rifas ilustradas e bilhetes de loteria.
O notável esculápio, poeta e escritor João Vale Maurício, um freqüentador, lá tomava o seu uisquinho. “Enxaguava o peritônio” e, relaxado, dizia: “Mais tô numa tranqüilidade!...”
Como os tempos ainda eram românticos, um final de tarde adentrou ao recinto um estranho. Pediu licença para subir no pé de carambola. Arrancou dois frutos maduros, sentou-se à sombra da árvore e os degustou chorando.
Indagado pelos presentes sobre o motivo daquelas lágrimas, relatou que ali, naquele local e em outros tempos, ocorreu o primeiro encontro com a sua mulher amada. E justo ali, naquela mesa, comeram carambolas e juraram amor eterno!...
Veio a mão do destino e a musa o abandonou ao Deus dará! Aquele momento de recordação era muito importante para ele...


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Por Raphael Reys - 2/2/2011 09:50:40
MONTESCLAREADAS

Nos bons 1960 vivíamos na larga e ainda não tínhamos a dita dura a endurecer nossas vidas. Leonel Beirão, empresário no ramo de funerária e reclames, cabo eleitoral e lobista político do PSD, a agitar pela cidade, notadamente onde houvesse aglomeração falando de política. Seu universo!
Ai, ele encontrava repasto grosso, entrava na briga por votos para o seu candidato e quase sempre o embate terminava em ameaças ou em via de fato. Acontece que Leonel não despachava para o bispo. A sua missa era de corpo presente!
Cabo eleitoral era propagandista dos reclames com sua famosa Boneca de Leonel. Era também garoto propaganda de uma cervejaria que promovia a venda de casco verde. Convidava os populares a beber de graça com ele e o botequineiro recebia de paga do fabricante duas garrafas por cada garrafa consumida na mesa, ou no balcão do estabelecimento.
Quando embriagado, falava aos gritos e chamava a atenção de todos pela sua boca porca. Como a sua funerária atendia a todos os convênios em voga, muita gente morria de inveja em vê-lo com os bolsos cheios de grana. Resultado do seu trabalho honesto!
Os invejosos e inimigos políticos, conhecedores do seu estopim curto e temperamento irritadiço, para aporrinhá-lo aplicavam trotes telefônicos às altas horas da noite, o acordando e o açulando, ao descobrir o mico.
Ligavam e quando ele atendia perguntavam: defunto sente frio? A resposta era sempre um impropério, seguido de um repertorio de palavras não publicáveis. Doutas feitas, perguntavam: defunto na janela molha a rua? Ai, ele dizia o que o defunto molhava na mãe do interlocutor...
Numa noite, o cão estava solto e após uns dez trotes Leonel atendeu a mais um telefonema e já enraivecido respondeu: é do Corpo de Bombeiros! Um instante de silêncio, e do outro lado, em espirais metálicas: aqui é que é do corpo de bombeiro! Quem fala aqui é o Tenente Felix! Deu qüiproquó com as resposta de Leonel.
Logo Leonel nomeou Dim Lampião para atender à noite evitando o estresse e a insônia provocados pelo desgaste dos trotes. Houve um telefonema a meia noite e Dim negociava um caixão de luxo com um suposto comprador que a pedido do mesmo, acordou Leonel para dar o desconto final. Do outro lado do fio a voz aplicou um trote.
Leonel arrebentou o telefone e foi para a cama já com insônia. Na manhã seguinte, ao abrir as portas da funerária, uma senhora do povo o esperava e foi logo falando: Vim aqui pedir um enterro de graça, para um menino de uma vizinha que não tem condições de custear as despesas.
Leonel, coçando a cabeça respondeu: na hora de fazer o menino vocês não me chamam. Na hora que morre é Leonel que enterra de graça!


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Por Raphael Reys - 26/1/2011 15:31:47
Apenas um final de tarde

Num final de tarde, circulo como um cronista voyeur pelos fundos da Cooperativa e vejo sentado num banquinho no janelão do Bar Sibéria o boa Praça João José, tomando uma gelada e degustando como tira-gosto um morango curtido na cachaça branquinha. O agrônomo Reinaldinho, que é dos Viriato e o arquiteto Cascão, que é dos Mota, comem espetinhos feitos no capricho.
Mais adiante, Arnaldo Brant, sério como sempre, fala de gado nelore e Wanderley Lopes conta o causo de João de Quirino, quando encontra Sinval Amorim depois de longo tempo sem se verem: “Uai compadre! Pensei que ocê já tinha queimado o fuzil...”
Wilsinho, sentado à porta do hotel, dialoga com o pecuarista Manoel do Bandeira 2. Gesticula, rilha os dentes e fala mal do atual sistema político. Uma discussão sem fim e tudo fica como dantes no quartel de Abrantes...
O empresário “cash and hand” Antonio Barreto, passa miudinho, no alto dos seus noventa anos, dirigindo um carro zero sem placas. Onofre Burarama trafega sempre com seu sorriso conciliador e de paz. Gerinha Português, uma lenda viva, vocifera impropérios, fala de Schmidt and Wesson e de bala dundum.
Mostra o seu braço costurado como uma colcha de retalhos e o tórax, cheio de pitombadas. Lincão Mesquita, quase não circula mais pela city. Deixou a barba (já grisalha) crescer ao estilo profeta do milênio e agora navega no Facebook escrevendo reflexões e saudades.
Patrícia de Paula, morando nas Alterosas com os seus olhos lindos e de puro encantamento, agradece o abraço que mandei. Geraldim Alcântara (completadas 73 bem vividas primaveras), cabelo pintado na cor prata, avisa que às 7 horas da noite já estará dormindo. Gosta da companhia de Morfeu, o deus do sono e dos cansados.
Voltou dos States trazendo uma câmara digital para Arnaldo Maravilha e ainda toma café com beiju e pita um cigarro de palha industrializado.
Chico Lopes, o conhecido cirurgião plástico, cheio de energias, fala das suas esculturas em cerâmica e apresenta uma tela em art naife com um gato estilizado. Aroldo Pereira, calvo como um personagem mágico de uma história infantil, circula apressado preparando o seu Psiu Poético.
Luiz Carlos Novaes, o Peré, recém chegado das férias, um pouco mais gordo e todo queimado de praia, mantêm o sorriso e já toma uma branquinha de leve.
Jerry Alfaiate continua se recuperando em casa e o tititi da galeria esquenta com Zezão Relojoeiro e Juninho de Salvador (esse é dose)
(Têm o sorriso torto de gato que comeu o canário do vizinho). Zé Mariani (já recebida a herança tão esperada) circula com os seus olhos esbugalhados procurando alguém, como agulha em palheiro, para conversar miolo de pote.
Zizi Rocha anda pelo Quarteirão do Povo com o manequim em postura dextro-convexa, lançando interjeições com a sua voz taquara rachada. Zé Romualdo, vestindo uma boa camisa de seda, passa com os seus 85 anos e é só alegria de viver.


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Por Raphael Reys - 25/1/2011 13:18:18
MARIANA

Somente agora, neste janeiro quase imprevisível de sol claro e águas esparsas é que fiquei conhecendo, bem de perto, os doces olhos de Mariana! Ela bem poderia se chamar Maria Clara, em contraposição à sua irmã Ana Clara, mas ficou bem assim como Maria Ana...
Rostinho redondo de lua, bem parecida com o pai, Tico Lopes.
Mediana, alva, cabelos negros azeviche, olhar atento e contemplativo, tem uma voz agradável, levemente rouca, sonora, quase introspectiva.
A vibração da sua fala se estende e penetra nos nossos corações. Veterinária por formação profissional é militante protetora dos animais. Lida com um abrigo para os nossos irmãos cães e gatos e para não dizer que não falei de flores... Mariana é devota do “povorelo” Francisco de Assis.
Assim, poderia ter o nome de Maria Clara, homenageando Santa Clara, irmã de Francisco, o santo protetor dos animais.
Vim conhecê-la melhor pela rede facebook, onde fala de emoções e dos nossos irmãos cães e gatos... Propõe, mesmo, junções de amor entre estes seres.
No pé esquerdo, mostra orgulhosa uma tatuagem de três estrelas com as leras MEL, como se fora uma retribuição de tanto amor que recebe. Dorme com Mel enrolada na sua perna, por cima da tatuagem com seu nome.
Levei Mariana para conhecer os ritos iniciáticos no Vale do Amanhecer, sob as bênçãos de Francisco de Assis o “Povorelo”. Sem o querer, agora ela é prata da casa.
Ao chegar ao templo, foi recebida pela energia da lua cheia, manipulada no ritual de Alabá. Ficou tonta ao sentir tanto alento e ver pela primeira vez as Ninfas missionárias Ciganas e Nitiamas com suas indumentárias multicoloridas.
Pensou se tratar de ternos de catopés e acabou recebendo as bênçãos do povo oriental. Lá, reviu vários amigos e fez novas amizades. Assustada, não bebeu das águas da cachoeira de Iemanjá.
À benção Mariana, filha de meu amigo Tico Lopes, Maria Ana, tão clara como Clara de Jesus.



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Por Raphael Reys - 21/1/2011 05:58:36
PELO TELEFONE!

Com o advento da famigerada repressão de 1964, vários cidadãos montes-clarenses, embora inocentes, foram denunciados por dedos duros locais. Uma parte se refugiou em locais distantes e não sabidos. Dentre eles, o notável comerciante Rui Pinto.
Na toca da Quinta Coluna e saudoso do arroz com pequi, cachaça Viriatinha e dos amigos de copo e de cruz, deu um interurbano para o Bar do Zimbolão, point no centro comercial, pedindo notícias. Vai aí o diálogo esclarecedor:
- Alô! É o Zim Bolão? – Sim! – Quem fala aqui é o Rui Pinto. Fale baixo aí viu! – Certo! Pensei que você tinha morrido caro amigo! – Não, tô vivo! Como vão todos por aí? E a turma? - Tá tudo sem novidades. Mas, onde é que você está mesmo? Rui, desligando o telefone: – Sai fora!!!!
Belém, garçom do restaurante Intermezzo, atende ao telefone:
- Restaurante Intermezzo! – Bom-dia, senhor! – Aqui é da Fábrica de Cimento! Bené, respondendo sem entender: – Aqui é do Intremezzo, mesmo!... E desligou. Era a secretária da empresa, objetivando contratar, para o staff, um almoço comemorativo do aumento de produção da indústria cimenteira.
O empresário e deputado estadual Lezinho Lafetá, atendendo ao telefone à entrada do seu Cine Teatro Fátima: – Alô! Donde fala? – É do Cine Fátima! - Quem ta falando? – É Lezinho. – Qual o filme de hoje, seu Lezinho? – É A Ponte do Rio Que Cai!...
Doutra feita, no dia da inauguração do seu cinema, lia num cartaz exposto à entrada do salão o nome do filme e o nome da companhia produtora do mesmo, à medida que informava aos espectadores que telefonavam: - Alô. É do Cine Fátima. Quem fala é Lezinho! – Qual o nome do filme de hoje, seu Lezinho? – O Cristo de Bronze! – E é bom mesmo? – É bom, demais! É da Vinte Têagá Centúri Fê Ó Xis!...
Sabedor de que o empresário do ramo de funerária, Leonel Beirão de Jesus, era irritadiço e tinha o estopim curto, a galera batia um fio: – Alo! – É da Funerária Leonel Beirão? – É! – Quem fala? – É Leonel! - Me diga, seu Leonel: defunto sente frio? – Quem sente frio é a P.Q.P. seu F.D.P!
Filomeno Bida, saudoso corretor de imóveis, que havia viajado até de disco voador, passando pelo Quarteirão do Povo, atende um telefone-orelhão que chama insistentemente. Era uma pessoa de São Paulo, que ligava aleatoriamente, buscando contatar o próprio Filomeno Bida para negócios.
- Alô! – Esse telefone é no centro de Montes Claros? – É! – Aqui é de São Paulo. Estou precisando urgente entrar em contato com um corretor de imóveis conhecido como Filomeno Bida. O Senhor o conhece? – Está falando com o próprio!


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Por Raphael Reys - 15/1/2011 05:35:02
MOMENTOS CAMPESINOS

Os fazendeiros, coronéis e manda-chuvas do Brejo das Almas, vez por outra promoviam uma festança para a população.
O ponto alto do evento popular era a uma missa celebrada pelo Padre Augusto. Gente local em uma grande fila com mães e rebentos para receberem o sacramento do batismo. Os coronéis e fazendeiros quase sempre eram os padrinhos. Muitos dos quais o próprio e omisso pai da criança a ser ungida...
Chegou a vez de certa menino e o pároco que checava a lista e fazia a chamada para a pia bastimal, perguntou: Qual o nome do moleque? – Fulano! – E o nome do pai ? A mãe vacilou, pois o gerador legítimo era o padrinho que se encontrava ao lado.
O sacerdote irritado com a demora da resposta açula a mãe: “Qual é o nome do pai do menino?” O fazendeiro/pai/enrustido, que atento assistia ao diálogo apertou o braço do oficiante e rilhou entre dentes: A sua missão é batizar e não ficar perguntando coisas indiscretas! – Batiza logo, siô!
O seguinte da fila era um menino de cor. Racista e estando irritado com a interferência do coronel, o padre perguntou à mãe: Qual é o nome do negrinho? – Primo! - Qual é... Nome de negro é Ambrósio! Em seguida, anotou no batistério: Ambrósio.
O menino, personagem do primeiro batizado ficou conhecido como Antonio Branquinho. Já adulto e dono de terras, consta que foi pressionado por conhecido fazendeiro e grileiro de propriedades rurais. Num bate boca acirrado com o invasor, partiram para a via de fato e Antonio lhe meteu uma cadeirada.
Dizem os comentários à boca pequena, que o nosso Antonio, em razão do acontecido, foi vítima de uma emboscada, tendo sido assassinado pelo pistoleiro Chico de Bela.
Já o Zé Braga, sacristão de Aparecida e estando a igreja abandonada após quatro anos de inatividade, organizou uma festa religiosa com celebração de missa. Ao acender as velas do altar, o calor gerado pôs para correr os escorpiões que infestavam a madeira oca e um bitelo lacrau, fugindo do calor, subiu pela sacristia. Assustado, Padre Gangana gritou: Mata o bicho, Zé! Supondo tratar-se do habitual, na hora Zé apanhou o cálice de vinho da sacristia e entornou...
Douta feita, o dito sacerdote não compareceu para celebrar uma missa encomendada por Capitão Enéas. Padre Silvério o substituiu. O capitão mandou assar uma pequena leitoa para presentear o zangado Gangana.
Visando a entrega do petisco suíno, o Capitão chamou Zé da Serra, sapateiro por disfarce e pistoleiro por direito e que se encontrava mais próximo. Vai aí o diálogo dos dois: Zé, você conhece o Padre Gangana? – Não, mas já tô com raiva dele!


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Por Raphael Reys - 10/1/2011 07:12:46
ROQUE BRAVO

Roque tinha a aparência de um guerreiro mongol, corpulento, barriga grande e dura, bigode assustador ao estilo mexicano, braços grossos, e andava e gingava como um lutador de sumô. A sua cara fechada impunha respeito. Dava medo à primeira vista.
Trabalhava na expedição da Fábrica de Cimento, onde circulava impune, sem ser cobrado. Na fila marcando o ponto, passava sozinho, ninguém ousava esbarrar no gigante. Dele contavam-se histórias de valentia e brabeza, de coragem suposta.
Citava-se ter ele em certa ocasião, amarrado a sua família na cerca de arame que circundava o seu barracão, tendo ainda os espancado, a golpes de pirata.
Um exercício de sobrevivência de um bruto, que com isto mantinha os seus vizinhos afastados, todos o temiam.
No pátio da expedição, só fazia o que queria; dormia após o almoço sem ser incomodado pelos chatos de plantão: Entretanto, a carreira do cavalo é curta! João Bosco o escolheu para ser o primeiro carregador de vagões no pátio de manobras e embarque, recém-inaugurado.
Treinaram bastante o movimento de apanha dos sacos na esteira rolante e o empilhamento dos mesmos nos vagões, que à tarde, esquentavam a mais de quarenta graus. Só foram escolhidos os fisicamente fortes. O serviço exigia.
Roque, entretanto, era um frouxo disfarçado! Aquela cara era para afastar os possíveis agressores, pois o homem era um frouxo que havia construído uma torre de marfim, em que se escondia de possíveis e imagináveis situações embaraçosas. Ao ser convocado, sentiu o drama e tentou sair fora, mas não conseguiu. Havia sido escolhido para servir de exemplo para a peãozada. A sua sorte estava lançada.
Nos primeiros vinte minutos de ensaio carregando sacos de cimento saídos da bica ainda quente a quarenta e cinco graus ambiente, Roque ficou tonto em vez de voltar após o empilhamento saiu pela porta lateral do vagão, que era usada para ventilação tombando, a grande altura no vazio e no pátio o seu corpanzil. Arrebentou-se todo. O homem não era nada do que se mostrava!
Desmoralizada a aura de valente, no dia seguinte, ao entrar na fila para marcar o ponto, o Willian da cantina, que vinha logo atrás, passou a mão no traseiro do Roque e ele, para surpresa de todos, que aguardavam uma reação violenta, disse: queta com isso moço! - deixa de passar a mão no meu traseiro - não brinca que eu não gosto!
Estava destruída a torre de marfim! Daí para frente à gozação foi tanta que não respeitavam nem mesmo a sua marmita de comida. O Roque não teve saída! Pediu demissão e se mandou da cidade.


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Por Raphael Reys - 3/1/2011 14:50:23
A VERVE DO ZÉ AMORIM

1970. Um bando de meninos pestinhas dos pés rachados, oriundos da favela que se formava nas olarias do bairro Interlagos, praticava danações nas imediações do trevo da Cowan. Dentre as traquinagens prediletas estava a de quebrar o vidro do medidor de energia da Cerâmica Cowan.
Zé Amorim, então diretor comercial da empresa, irritado com o constante repeteco do fato, quebra, conserta, quebra, conserta, desabafou com Diu Colares: “Se eu pegar um menino desses, vou cortar de gilete e botar de molho na água com sal!” Pura valentia inofensiva de um ótimo coração...
Quando era proprietário do restaurante Espeto de Ouro, Zé observava o notívago Daço Cabeludo saborear uma lauta refeição. Terminado o repasto, Zé chama o garçom Belém e solicita limpar a mesa. Logo ao verificar que não haviam sido deixadas sobras de comida, rilha os dentes, dizendo: “O fdp não deixou nada nem para o risoto”!...
Até o início dos anos 60, o nosso herói não conhecia nenhuma estrada asfaltada. Viajando com o empresário Moacir para Salvador e já próximo à capital baiana, se deparou com uma pista pavimentada. Zé pediu parada, desceu, agachou, tateou com a mão a “beira” do capeamento asfáltico e disse jocoso: “Êita fita isolante de primeira!...”.
Nos idos dos anos 70, o agrimensor Paulo Moreno estava por cima da carne seca e guardava dinheiro na gaveta do seu escritório. Sabedor do fato, o Zé foi acompanhado de Quintiliano Maia para verificarem a veracidade da informação. Lá chegando, sacaram os pacurús de notas enquanto ouvia o Paulo relatar o seu sucesso profissional e uma projetada viagem de férias ao exterior.
Para homenagear as “presenças”, o agrimensor pediu à sua secretária que servisse café capuchino aos visitantes. Aí, o Zé Amorim chamou Quintiliano à parte e falou a baixa voz: “Quem diria hein Maia! Um fdp desses, um “medidozinho de lotes” botando banca de rico!...”.
Internado para uma cirurgia no Hospital Santa Terezinha e já estando devidamente raspado e higienizado para o ato, recebe a visita de Iô Higino. À sua maneira particular, teatral e tragicômica, o nosso Amorim faz uma descrição da sua impressão a se ver nu, em pé e todo depilado na genitália: “Fiquei parecendo uma garrafa em pé”!
Recém casados, dois pombinhos tomavam sorvete na Cristal. Ao ver a cena romântica o Zé os abraçou por trás e falou no ouvido do marido: “Se você falhar, nego veio, eu mando te castrar!”.
Convidado para passar o fim de semana em uma mansão do megaempresário Walduck Wanderley, Zé, sentado confortavelmente em uma sala, observava pelo janelão de vidro várias modelos contratadas que se divertiam nuas na piscina. Walduck chega à porta e fala: “Vamos almoçar Zé!” – “Agora não, chefe! Só daqui a pouco, pois na situação que eu estou não dá para descruzar as pernas!...


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Por Raphael Reys - 31/12/2010 13:35:03
O NARIZ DE MADEIRA

Dentre as inúmeras serventias do nariz, uma delas está a de cheirar o fruto do cerrado, o pequi. Aqui em Montes Claros, certamente o lugar onde o notório nasal se faz mais atuante. A nossa marca registrada, a boçalidade campesina, nos induz a viver na lei do simulacro.
Na porta do extinto Bar do Edson Barrão, no centro comercial da cidade tinha rico que dizia criar 5000 cabeças de gado, entretanto, não tinha grana para pagar a conta do açougue na esquina de sua casa e nem o cafezinho que bebia no balcão do bar.
Outro bazofista desfilava com calça de veludo, botas Agabê cano longo, chapéu de massa aba larga, canivete na cintura, talões de cheques (sem fundos, ou sem folhas) sobressaindo no bolso da camisa e, vez em quando sumia do mapa! Internava-se em hospital psiquiátrico na grande BH. Endoidava por não ter como pagar o que consumia.
A o caso famoso de um notório tocador de saxofone, que em 1962, partiu de mudança definitiva para o USA, onde participaria do circuito internacional do jazz, Saint Luiz, Nova Orleans. Foi tocar com Gato Barbiere, a bossa nova de Stan Gaets, e para acompanhar Ray Charles, na montagem de Eleanor Rigby.
Pensávamos nele a navegar in blues ao longo das margens do Rio Mississipi.
Mandava notícias de supostos festivais na Europa, consertos do seu Jazz-band na animada Chicago. Na verdade a quarenta e quatro anos tocou como músico de intervalo em botecos, restaurantes, e quebradas noturnas da grande BH. Donde nunca saiu mais gordo! Deixou a nossa usina de sonhos, a fabricar e ver navios!
Casais programavam e projetavam a vista de todos, e em lugares da moda, férias na Europa, e passavam em fazendas de conhecidos ainda no Norte de Minas. Voltavam queimados do sol tropical de um país grande e doido, e falavam nas praias da Grécia, quando estavam na roça em Miralta, na Ermidinha...
Relatavam terem estado na bucólica Jerez de La Frontera, na Espanha. Na verdade, trocavam Paris por Patís, Londres por Lontra, Japão por Japonvar.
Estes hábitos de falsos coloridos pavônicos ainda imperam na nossa city curraleira, Capital Internacional do Pequi. A maioria aqui vive de roupagens fabricadas para vestir o ego. Sofismo e prática da erística (A arte de vestir e conduzir inverdades).
Alguns dizem ter mudado para BH, onde compraram a vista um grande e luxuoso dúplex (que se encontra sempre em reforma) em bairro nobre. Outro dia descobriu-se um desses por uma manobra do acaso. Localizado com a família no final do Bairro Céu Azul, morando em barracão de fundos, onde ensina violão para suburbanos. Quando estão por aqui, vestindo ainda as roupas que guardaram dos tempos das vacas gordas, deitam falação de dinheiro e mais dinheiro.
Quando estão de passagem e perguntados onde estão os seus veículos importados, respondem que os deixaram na revisão nas concessionárias especializadas em Curvelo.
São os Narizes de Madeira dos Montes Claros! De férias, para votarem, festas de Agosto, rapidamente acompanhando algum velório familiar; cressem o nariz de madeira e contam vantagens extraídas de suas imaginações. (saíram do mato, mas o mato ainda não saiu deles). Como a maioria hoje em dia vive de simulação, há uma tolerância recíproca entre os que praticam o exercício de alongar o nariz, e os que estão aprendendo ou se adequando à arte.
Alguns são tão bons, que tomam até dinheiro emprestado em agências de bancos locais, e os coitados dos avalistas pagam à conta nas ultimas, com terra desvalorizada, as quais foram recebidas como herança. Quase sempre produtos de espúrio.
Viva a curraleiragem!


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Por Raphael Reys - 26/12/2010 09:19:08
A ARTÉRIA

Nos anos 50, Montes Claros era uma mistura de romantismo da roça, personagens do coronelismo, política de currais, medo, preconceito e subserviência religiosa. A Rua Doutor Santos, o centro nervoso da área comercial, destacava-se como a principal via de circulação da cidade, por aonde todos iam e vinham.
Pavimentada em parte com paralelepípedos, que permitiam o estrepitar dos cascos das cavalgaduras rumo ao Mercado Central, por ela trafegavam deselegantes Ford Bigode e suas buzinas fon-fon, Virgínio Preto montado em algum alazão, Neco Santa Maria e os seus óculos modelo Ronaldo, João Athayde, sempre apressado, elegantemente vestido com terno de linho branco S-120, Deba de Freitas, destemido e temido coronel político, dono de muitas terras e currais. Muitas pessoas, ao vê-lo na rua, por respeito e temor mudavam de passeio. A qualquer hora, não se sabe vindo de onde, podia irromper um tiroteio entre componentes de partidos rivais ou pistoleiros a serviço dos mesmos.
Vei da Lilí e Ezupero ferrador, o famoso Bigode de Arame, eram os representantes da fauna campesina, quando as crianças ainda beijavam a mão dos coronéis em sinal de respeito!
Pela via circulava o hoteleiro Juca de Chichico, com panca de artista de Roliude, alegre, brincalhão. A garotada, ao vê-lo, gritava: “como vai, seu Juca!” Com gestos engraçados, ele respondia: “que aperta e não machuca!” Também Manoel Quatrocentos, com sua caminhada curta, gestos rápidos, raciocínio preciso, sempre vestindo roupas de muitas cores, meninos com suspensórios e meninas de boina nas suas bicicletas suecas.
Quando chovia, caminhões atolavam no lamaçal da Praça Coronel Ribeiro, um pouco acima. Aos domingos, desfilavam elegantes senhoras com xale preto no ombro, portando terços de prata e missais, nos seus longos e elegantes vestidos confeccionados em tecido estampado da Bangu, no atelier de Mercês Prates, o “must” da época, dona da Imperial Lojas.
Elas usavam grandes brincos balangandãs, broches e pulseiras em côco e ouro, num contraste com a rapaziada do Bairro Sessé, hoje Santo Expedito, passando descalços e com os pés rachados.
Teresinha Bom Bril, bonitinha e espalhafatosamente trajada “à moda” dos grandes salões das metrópoles, na versão tupiniquim, caminhava por toda a extensão da rua, distribuindo simpatia e atraindo clientes para o seu lupanar de luxo.
Em cada esquina, grupos de conhecidos trocavam dois dedos de prosa. Apreciavam os pastéis da Leiteria Celeste e bebiam cerveja casco verde no bar do Nelson Vilas Boas.
Viam-se caboclas com seus cabelos espichados à base do pente de ferro, esquentado com um aparelho de solda conectado à energia elétrica, ou mesmo no braseiro. Sem contar Leonel Beirão, com sua charanga e a grande boneca, fazendo reclame, que assustava a meninada.
Duas vezes ao ano, um ringue de madeira era armado na Praça Coronel Ribeiro para o festival de lutas de boxe. Na refrega principal, brilhava nosso Leônidas Halterofilista, enfrentando Lero Reis, o Gigante Branco, vindo do Rio de Janeiro. Nas preliminares, apresentavam-se lutadores novatos que criavam o clima e ajudavam a esquentar o ânimo da platéia.
No bar de Tiano, na esquina do Mercado Municipal com a Praça Doutor Carlos, uma velha eletrola RCAVictor de corda, movida “à manica” (manivela), tocava canções de Chico Viola, Dalva de Oliveira, Emilinha Borba e tangos de Gardel, enquanto cabos eleitorais do PSD e do PR tentavam conquistar novos eleitores.


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Por Raphael Reys - 21/12/2010 11:30:23
DOIS CÃES DA ROÇA

Diz o dito popular, que o cão é o melhor amigo do homem. O poetinha Vinicius de Morais, emérito notívago e apreciador de um bom scotch, fazendo uma analogia entre o cão e o uísque afirmava que o uísque é um cão engarrafado... Já Jack London, o famoso escritor norte americano do início do século passado, escreveu “O Apelo da Selva”, uma homenagem a um cão de nome Bruck.
Conto aqui um “causo” de um cão nascido na Tiririca e que era a própria malandragem canina. Criado em porta de boteco da roça, conhecia as treitas e suas adaptabilidades. De nome Xexéu, era branco e preto, orelhas murchas, mestiço. Meio pedra, meio tijolo! De tão sabido que era, dormia como coelho, com um olho aberto, outro fechado.
Cachorro glutão, sendo o seu dono sovina, se mantinha de barriga cheia surripiando ovos caipiras no quintal da casa. Dava o maior prejú para o roceiro, que andava atrás de solução para acabar com a mania do Xexéu em comer ovos.
Certa feita, um amigo de copo e de cruz lhe ensinou uma maldade para ser feita com o cão que levaria à solução do problema. Consistia ela em manter o animal trancafiado por um dia e uma noite sem alimentação. Findos os quais, se ferveria um ovo inteiro que seria servido ao animal, em seguida, ainda soltando fumaça.
O dono sovina, seguindo instruções do amigo malvado, ofertou o ovo em ebulição ao seu cão que o abocanhou. Ato seguinte segurou-lhe as mandíbulas forçando, assim, o Xexéu a queimar a goela.
Esperava, com essa rude lição, que o bicho viesse a partir de então, a ter medo de ovos, cessando, portanto o seu prejuízo financeiro. Um ledo engano, pois mais dia menos dia e os ovos continuavam sumindo!
O roceiro montou uma campana próxima aos ninhos das suas penosas e logo que escureceu, viu o Xexéu se aproximando de fininho. Chegou ao pedaço, cubou a redondeza e como tudo parecia sob controle, agachou-se e passou a soprar o ovo mais próximo de sua grande boca faminta...
Na outra amostragem, o Antônio da veia Pulú foi visitar o seu amigo Ambrósio, a quem não via há muito tempo. Chegou à cancela de entrada da propriedade e bateu palmas. Logo o cão Fedegoso acordou de sua madorna e correu ao seu encalço na maior velocidade e cheio de valentia.
Prudentemente, o Antônio subiu em cima da cerca. O Ambrósio veio correndo e vendo o compadre naquela situação vexatória, iniciou o diálogo:
- Pode descer daí, compadre, que o Fedegoso é capão!
- Eu não estou com medo dele me comer não, compadre Ambrósio! Estou com medo é de ele me morder!
Nós somos da roça, mas somos chiques!


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Por Raphael Reys - 14/12/2010 16:04:16
ÊITA, CABOCLO!

Volta e meia vem à baila histórias e causos do saudoso cavaleiro da verve, o sempre bem lembrado Zé Amorim. Autêntico filho dos nossos Montes Claros, capital da recém criada República do Pequistão.
Desta feita, a lembrança é do querido empresário Armando Barros, cidadão porreta e emérito, da nobre estirpe dos Barros e filho desta terra de Figueira. Relata-nos ele que Samir, para não viajar sozinho até a casa do seu irmão em Ilhéus (BA) e objetivando que a jornada fosse prazerosa, convidou e levou junto às armas e bagagens o nosso saudoso Zé Amorim.
Lá chegando, para bem receber o alegre convidado, foi preparada no capricho uma pituzada à baiana. Zé, como era caboclo de hábitos chapadeiros, ficou enfunada à mesa, contemplando aquela iguaria estranha à sua interpretação visual, paladar e olfato.
Notando a catopezada do nosso Zé e para potencializar o apetite do mesmo, Samir incitava o convidado a devorar o prato. Zé, emburrado, e o anfitrião logo açulou: “Não vai comer não, capiau de Montes Claros? Deixa de ser besta e come logo! Vâmo jacú! Deixa de ser jurão! Um prato beleza desses e você com xibungagem!”
Ferido nos brios montes-clarenses, o Zé retrucou em cima do pedido: “Isso aqui no prato tá parecendo é plástico, seu ariri! Macho da minha terra come é arroz com pequi, carne de sol e andu. De sobremesa, doce de cagaita! O resto, é bestagem!”
Quando era gerente da Cowan, o Zé, vez por outra se dirigia ao Palácio da Borracha, do empresário português Armando Barros, seu amigo, para dois de prosa. Ia comprar correias e demais artigos necessários à sua indústria cerâmica.
Desta feita, em pleno mês de junho, um frio chapadeiro de rachar o cano e o Zé se queixando da inclemência do clima. Armando, como fora criado nas intempéries climáticas da Europa, alegava que, independente do tempo, por hábito, tomava diariamente banho frio.
Ao saber da extravagância, Zé retrucou:
- Êita, caboclo! Pois lá em casa nós tomamos banho é com a água fervendo! Sai tanto vapor que, tem dia, que o poste de luz em frente chega curvar!


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Por Raphael Reys - 7/12/2010 08:58:08
João Doido

O personagem era contínuo da agência do Banco do Brasil na nossa urbe. Tipo bastante popular, cheio de vontades próprias, emérito pescador. À bem da verdade a pescaria era o seu universo.
Dono de um nariz arrebitado, posudo, andava de peito estufado, pisando alto e dava pouca ou nenhuma atenção ao mundo à sua volta. Julgava-se absoluto! Volta e meia tomava umas e outras e aprontava com borra. Era a sua marca registrada.
Certa feita arrumou uma pescaria e levou amigos de copo e de cruz para uma lagoa na fazenda de Crispim da Rocha. Entrou cerca adentro sem pedir licença, a cachaça correu solta e, não demorou, o bando de notívagos pescava e avacalhava o ambiente se postando nus.
Como a lagoa era de águas límpidas e sendo a fonte de abastecimento da propriedade veio um serviçal apanhar água. Ao se deparar com a cena daqueles homens nus e temeroso de sofrer alguma agressão, retornou sem encher o carote de madeira.
Sabedor dos fatos, Crispim apanhou uma carabina e botou ordem na corja de pelados. Mandou que eles se escafedessem de suas terras. Acontece que a lagoa fazia divisa com uma fazenda vizinha, de outro proprietário. Sabedor dos fatos, João, desaforado como era, pulou a cerca com os companheiros.
Para irritar o fazendeiro e já que não mais estavam em suas terras, continuaram a esculhambação. Dançavam despidos e pulavam como em uma farândola de diabretes.
Como o destino é irônico, na segunda-feira seguinte, Crispim da Rocha procurou o José Alves, gerente do Banco do Brasil, visando obter um grande empréstimo rural.
Sendo o gerente novo no pedaço e sabedor do conhecimento do João Doido sobre as fazendas da região, o chamou para prestar informações pertinentes à propriedade do cliente solicitador.
Ainda injuriado pela suposta desfeita na lagoa, João baixou a sola na avaliação e desclassificou a fazenda e o cliente. Revelado o fato, Crispim o procurou na agência exigindo explicações, já que as suas terras e pastagens eram das melhores na região.
Indagado, João Doido como era irônico e debochado riu do fazendeiro e falou: “Você manda na sua fazenda. Aqui no banco mandamos nós!” Deu o maior quiproquó!
Noutra pescaria, tendo como companheiro de aventuras Carlúcio Atayde, chegando próximo ao barranco do rio, viu um pequeno jacaré que dormia ao sol. João preparou a Kodak e posicionou Carlúcio para clicar o instante. Ato seguinte montou nas costas do bicho. O jacaré, assustado, desceu barranco abaixo e jogou o João em uma moita de espinho agulha.
Ficou mais furado do que tábua de pirulito...


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Por Raphael Reys - 2/12/2010 14:19:32
SEGURA ESSA!

Nos bons 1965, o valente Leônidas, um destemido comerciante de peles de animais silvestres reinava como valentão na terra de Figueira! Um metro e 80 de músculos adquiridos na fisiocultura com halteres. Prática essa que lhe rendeu a lenda de modelo másculo, de então.
Calça apertada, camisa preta comprida, empunhadeiras de couro cravejadas com metal alpaca nos pulsos, botinha importada, olhar desafiador e impune. Metia medo nos passantes do Mercado Municipal, onde tinha o seu comércio clandestino de peles e animais.
Como era um fanfarrão protegido de uma autoridade pública e no exercício de sua bazófia botava todo mundo para correr. Era só tomar umas e o bicho pegava! Certa feita foi contratado por um empresário proprietário do imóvel onde se encontrava instalado o restaurante da rodoviária.
Severino, um nordestino o inquilino, que explorava o ponto mediante contrato estava ficando rico de tanto movimento. O dono do imóvel queria dobrar o aluguel na marra, mas o contrato o impedia. Mandou o valentão dar um susto no comerciante, prevendo que o mesmo ficaria com medo e entregaria o imóvel.
Munido de uma metralhadora Ina, enrolada em um saco de estopa e posto na bagageira da bicicleta sueca, o valentão parou à porta do restaurante, desembrulhou a metralhadora e chamou o comerciante pelo nome. Como as paredes eram de espelho, o homem viu a arma apontada, abaixou-se e gramou o beco.
O valentão para completar a história ao bom estilo hollyhwoodiano deu uma rajada de balas nos espelhos. Ato seguinte, quando viu a besteira que havia cometido, se refugiou na sua casa à rua Belo Horizonte 413, confluência com a rua Coronel Antonio do Anjos.
Um efetivo policial militar deu cerco ao imóvel e um sargento ao megafone pediu a rendição do acusado e a entrega da arma de uso exclusivo da PM. O homem cercado, além de valente era esperto. Apanhou uma onça viva que estava em cativeiro em uma jaula no quintal da sua casa e levou-a para próximo da porta de entrada, já entreaberta.
Anunciou a sua rendição, mas exigiu que os policiais abaixassem os fuzis. Abriu a portinhola da jaula e cutucou o traseiro da pintada com o cabo de uma vassoura.
A bicha feroz pulou para fora, deu uns altíssimos esturros e afugentou o efetivo que bateu em retirada em decorrência do inusitado da ação!
A rua ficou forrada de fuzis e capacetes e a meninada que aplaudia da esquina correu com mijando de medo, pernas abaixo! Foi um festival grotesco e laxativo!
O animal assustado foi se esconder em uma mata que ficava nos fundos da sede do DER, no Bairro São José próximo. Chamado, o comerciante Waldir Macedo, caçador profissional, preparou a sua matilha de cães de caça, e ajuntou amigos caçadores. Deram o cerco à pintada, os cachorros uivando, acuando e quando o animal moveu-se recebeu uma saraivada de tiros de espingardas Boito 16 e carabinas do papo amarelo, morrendo, sem chance.
Nós somos da roças, mas somos chiques!


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Por Raphael Reys - 27/11/2010 14:24:09
PELOS MUITOS CAMINHOS DAS ALTEROSAS

Dia17 de novembro de 2010. Percorremos as vias de BH para exames cardiológicos no Laboratório de Marcapasso do HC. Monitoramento sob a batuta da simpática doutora Licia Valadares e equipe nota dez do referencial consultório. Alberto Sena e Sílvia me receberam no seu apê no Santo Antonio.
Quarta braba, tardinha, a chuva deu uma trégua e saboreamos um café ligth com pães integrais e outros mimos. Esquecemos o fator tempo e o dois dedo de prosa correu até altas horas. Anos 60, as praças rococós, o footing com suas beldades e galãs.
Causos da nossa infância mágica o encanto dos Montes Claros de antanho e sorríamos às bandeiras despregadas. Falamos da mídia escrita da terra de Figueira, o Jornal Montes Claros e o mestre Osvaldo Antunes que formou uma esplêndida geração de jornalistas: Robson Costa, Lindenberg, Paulinho Narciso, Alberto Sena entre muitos.
Alberto falou sobre os anos 80 e suas matérias que entusiasmaram a muitos, levando-os, com sucesso, à campanha da lei de preservação do pequizeiro. Na divulgação e sustentação do tema, Luiz de Paula, Teo Azevedo, Darcy Ribeiro, Cândido Canela, Hermes de Paula e a palavra final de Antonio Gonçalves do IBDF.
Falamos da literatura de João do Rio em sua obra “Dentro da Noite” e” Histórias de Amor”, de Rubem Fonseca. Alberto lembrou sua última entrevista com Darcy Ribeiro, cheia de calor humano e da verve escrachada do ilustre escritor.
Na quinta, saboreamos um delicioso almoço preparado no capricho por dona Sílvia. Comentamos o novo álbum “Match”, de Mateus Duarte, filho de Alberto que reside em Curitiba.
Viajamos no tempo e nos recordamos dos personagens populares que pululavam e coloriam as ruas da nossa urbe, os segredos da Terra de Figueira e as reportagens de então, incluindo as que não foram escritas ou publicadas.
Falamos da farsa da Revolução de 64, um engodo dos nossos generais aculturados pelo serviço militar Norte Americano e pela CIA.
Cutuquei a biblioteca do anfitrião e entre tantas e selecionadas obras deparei-me com uma edição antiga do ‘Livro de Areia”, do portenho Borges. Uma viagem fantástica ao universo da ficção e da metafísica.
Embora houvéssemos programado voltar de carona com o escritor Augusto Vieira Neto, um imprevisto de última hora nos privou da presença do Bala Doce nas comemorações dos cem anos de “Amo-te Muito”.


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Por Raphael Reys - 23/11/2010 19:27:51
NA ROCINHA...

Dentre as muitas atividades que produzem felicidade nesses Montes Claros, está a de passar uma tarde trocando dois dedos de prosa com o notável jornalista/empresário, Américo Martins Filho, em seu éden tropical, a agradável Fazenda Rocinha.
Ambiente de pura magia, entre árvores, plantas, pássaros que a todo o momento emitem miríades de trinados, valorizado pelo frescor da fonte e a incrível matilha de cães, os melhores amigos do homem. Dentre eles a cadela Branquinha, o carinho em quatro patas.
Mesa de reunião posta sobre a tenda da amplidão!
Fomos acompanhados do lendário repórter policial Zé Maria e tendo como guia nos caminhos da vida o escritor Petrônio Braz. Uma empreitada etílico/literária, regada a um bom uísque Passport e frios. O anfitrião, impecável, companheiro, alma aberta e coração incomensurável!
Ao servir o uísque, disse: “Sou vegetariano, mas bebo um bom uísque porque a bebida é vegetal!” Falou sobre as grandes frases e máximas e seus efeitos nas almas das pessoas. Logo uma guinada e surgem várias opiniões e debates sobre filosofias, crenças e mitos. Américo narrou a inquietude de sua alma e a busca filosófica.
Petrônio discursou sobre o conceito Deus, o Big Bang, a entropia do macrocosmo, enquanto desenhava gráficos elucidativos. Pura kabala! Debatemos o agnóstico, o uso da razão e descrevi uma tese de Konstantin Kristoff sobre a origem do universo. Descambamos mesmo para a metafísica judaica, enquanto Zé Maria, atento ao diálogo, dava o seu sorriso de gato que comeu o bicudo do vizinho.
Ameriquinho, como carinhosamente é chamado o extraordinário jornalista, descreveu as suas viagens culturais ao EUA e comentou o uso da prece como comunhão. Petrônio discorreu sobre o mito Jeová e a adoração do Bezerro de Ouro. Américo salientou a importância da aparição de Fátima e debatemos as bases do Cristianismo e as cartas do apóstolo Paulo nos anos 70 da nossa era. A importância da Bíblia (O Livro), como fonte de revelação e história. Aventamos sobre o efeito das crenças religiosas na mente humana. Tudo isso, enquanto a cadela Branquinha pulava de colo em colo e distribuía o seu carinho. Na pauta, comentou-se a falta que faz o escritor Georgino Junior nos meios culturais da terra de Figueira.
Entre filosofias, metafísica e mitos, o jornalista Zé Maria, como é repórter investigativo, passou a maior parte do tempo de olhos fechados ou fazendo disfarçadamente a leitura corporal dos filósofos da mesa. Pura técnica de campana policial. Usando o seu sexto sentido adquirido no campo profissional, acertava a toda hora o nome de quem chamava nos nossos telefones celulares.
Uma manhã/tarde memorável na aprazível Fazenda Rocinha, sorvendo a verve do homem/alma Américo Martins Filho. Marcamos outras reuniões de serviço.
Quem viver, verá!


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Por Raphael Reys - 19/11/2010 13:38:26
Jurãozada

Campesino aonde vai leva o mato junto. Ele pode até sair do mato, mas o mato não sai dele. Sempre apronta uma quando vai a Belo Horizonte. Andando em dupla ou mesmo participando de bando em algum buzu fretado. Quando chega à metrópole é logo notado, pois é um estranho no ninho.
Quase todo capiau dos nossos Montes Claros bistunta assistir um Cruzeiro e Atlético no Mineirão. Lá, acaba cometendo sempre uma presepada.
Carlão Alcântara, saudoso corretor de imóveis dessa terra de Figueira, bolsos abarrufados, levou o mestre de obras Roberto Lopes, cobra criada da Melo Viana, para assistirem o clássico. Terminada a partida, se desencontraram em meio à multidão deixando o estádio...
Capiau quando vai a Belô, tem que estar amarrado ao guia por uma embira! Perdido, Robertão saiu indagando de raimunda a joão, a tudo mundo: “Você viu o Carlão por aí? Aquele que freqüenta o bar do Zimbolão!”.
Por sorte, encontrou um montes-clarense já urbanizado. Pelo serviço de alto-falantes do estádio, Carlão foi localizado e o nosso Roberto pode retornar à habitual fuleiragem e ao 171 dos Morrinhos.
Noutra jurãozada, um trio de cruzeirenses: os saudosos Wanderley Fagundes e Lazinho Pimenta, acompanhados do novo carioca Odorico Mesquita. O mesmo Mineirão como cenário, o estigma da roça e o veículo estacionado do lado contrário à torcida cruzeirense. Destino projetado.
Ao encontrarem a galera azul encheram o pandú de cerveja e esgoelaram durante o jogo. Cruzeiro... Cruzeiro! Terminada a peleja, cadê achar o lugar onde deixaram estacionado o fusquinha!
Ficaram na murrinha até as quatro da matina e como só restou o carro deles no estacionamento, só então deu para retornar à Moc City, capital do Pequistão...
Já o desportista Xerife, integrava a comitiva do nosso querido Ateneu de Dona Albertina, que cedo chegou ao Mineirão e foram todos conduzidos para tomarem o desjejum.
Como havia duas filas distintas, uma para pessoas ditas normais, e outra para portadores de diabetes, chegando a vez do nosso Xerife na fila, o recepcionista fez a natural pergunta: “O senhor é diabético?”.
Imaginando tratar-se de uma gozação preconceituosa, típica das crias suburbanas da Capital de todos os mineiros, o nosso homem gol estrilou: “Qual é cara! – Que chave magra é essa! – Eu sou é Ateneu!...”.
Gente, nós não somos fácil! Só nos enfrenta quem agüenta...


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Por Raphael Reys - 12/11/2010 13:34:23
OS GUERREIROS DE AGAMENON

Nos nossos Montes Claros tem de tudo, no mínimo uma versão diferenciada dos fatos. Cidade pólo, com população constituída na sua maioria de gente oriunda de outras cidades do Norte de Minas, muitos vieram para construir o futuro, estudar em nossas escolas, faculdades.
Como o mudo é composto, também aqui chegaram alguns para fazer guerra. Falo de dois cidadãos que se apresentavam como ex-combatentes.
Um dele, movido pela alma da cachaça ingerida, pinta de artista da roça, topete de galã. O outro, por puro exercício de bazófia, medroso e sensível, construiu uma torre de marfim para nela se abrigar, defendendo-se dos males da vida.
O primeiro, no início dos anos 80 a pinga curraleira levou para os quintos; o segundo, mui digno profissional liberal, já aos 90 anos, balançando na sua rede de varanda no Bairro São José vive contando as suas notáveis façanhas na Segunda Grande Guerra Mundial.
O ex-combatente com pinta de artista, já saudoso, nos anos 70 era freqüentador do meu restaurante na Praça da Catedral. Quando chegava, a galera que bebia, fazia uma rodinha em volta, para sugar sua verve. Ele abria a caixa de ferramentas e tome bala, tome baionetada em traseiro de comedor de chucrute!...
Caía dentro da bocada das trincheiras e matava adoidado os Hans e os Fritz do Führer!
Como já havia adquirido habilidade na arte da narrativa, imitava teatralmente o som do matraquear das metralhadoras, o pipoco dos obuses e o ricochete das balas. Os aficionados faziam perguntas pertinentes para potencializar a ação. Dava gosto vê-lo narrando.
Um dia chegou um chato de galocha, invejoso com o sucesso do narrador e o ameaçou de processo por se apresentar, falsamente, como um heróico ex-combatente. Sumiu do mapa.
O outro, “from Pedra Azul”, ainda vivo e ainda zangado, relatava que, como ardoroso combatente, mudava rumos de batalhas. No curso da guerra, foi incorporado a um submarino da Marinha, como operador de periscópio e, posteriormente, artilheiro de torpedos. Os seus disparos foram tão certeiros que fez um enorme estrago na armada de Hitler. Segundo ele, a Gestapo, a terrível polícia alemã, seletivamente negociou através da Cruz Vermelha a libertação de duzentos prisioneiros aliados em troca dele, o porreta artilheiro montes-clarense, para que, simplesmente fosse mandado de volta à terra do pequi!
Complementada a negociação, equilibrou-se a ação da Marinha do Eixo e a dos Aliados no palco das operações marítimas, e só assim a guerra no mar ficou pau a pau...
Ele ainda está por aqui, tranquilamente lubrificando o seu fuzil de estimação, afiando a baioneta matadeira de alemão, contando os buracos de bala no seu capacete de aço e mostrando a lista de baixas produzidas graças a sua incrível pontaria, além dos nomes dos navios abatidos pelos torpedos por ele lançados. Por conta da sua competência incomum, sempre acerta na mosca e, até hoje, estando no quintal da sua casa, para manter a forma, vez por outra abate um gavião que ousa fazer um rasante nos céus...


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Por Raphael Reys - 8/11/2010 18:23:24
É GOL!
Fazendeiro, campesino, biótipo médio, amorenado, cabelo liso. Vestia sempre um terno de brim Triunfador amarelo, Chapéu Ramenzoni na cabeça, bota cano longo. Encoberto pelo paletó, um Smith and Wesson 38, cabo de madrepérola. Montado em seu cavalo alazão, esse era Simão Campos. O manda chuva de São João da Ponte nos anos 40, 50 e 60.
Criador de gado nelore de boa cepa, dono de grande fortuna e um sortido armazém tem tudo. Pai do ilustre político Olímpio Campos.
Na sua casa, na cidade, estrategicamente disfarçada no quarto, sala e escritório, uma boa carabina Winchester, Papo Amarelo, sempre municiada. Em cada cômodo restante, um treisoitão no ponto!
Certa tarde, no campo da cidade, os locais jogavam futebol tendo como adversário contumaz o time do Varselândia. Eternos rivais. Jogo empatado, final do segundo tempo e o ponta de lança do Varzelândia faz um tremendo gol. A torcida local invadiu o campo, cercou os adversários, ameaçaram o juiz.
Exigiam a anulação do gol.
Atraído pelo alarido, vem chegando à trote Simão Campos. Vai aí o diálogo travado entre ele e um torcedor próximo à cerca divisória do campo:
- O que é que está havendo aí, menino?
– É a torcida nossa que está querendo anular o gol na marra!
– E o que é que é esse tal de gol?
– E quando uma bola de couro passa entre dois paus fincados no campo.
– E a tal bola passou mesmo entre esses dois paus?
– Passou, sim senhor e então é gol!
O jogo terminou e o Varzelândia ganhou o campeonato!
Doutra feita, acompanhando o seu filho Olímpio em uma reunião para tentativa de coligação política com a oposição, visando um objetivo, a situação, com o ego inchado e em cima do sapato alto, não fechou acordo.
Já retornando, Olímpio diz:
- Mas que coisa, pai! Os nossos não aceitaram o acordo que era benéfico para as partes.
Simão, no alto da sua sapiência de vida sentencia:
- Eu bem que te disse que eles tinham supice!


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Por Raphael Reys - 1/11/2010 14:25:28
NOSSOS LOUCOS!


Diz a sabedoria popular que de palhaço, de rei, de médico e de louco, todos nós temos um pouco. Isto indica que a vida tem duas faces diversas.
Muitos são os autores falaram do tema da loucura ao longo da história. Guerra dos ratos e das rãs, o Mosquito, Ulisses e Grilo. E um ilustre desconhecido que escreveu o diálogo de um porco chamado Grúnio Corocotta.
Os loucos, ou tantãs, como eram chamados e ainda o são, povoaram a nossa infância. Barulhentos, apalermados ou agressivos, circulando no centro comercial, na Rodoviária e na Estação Férrea dos Montes Claros de antanho. Maria Babona, Requeijão, Galinheiro, João Doido, Geraldo Tatu, Sete Capangas, Beto Bruto, Requeijão, Alalaô, Mila, Maria Pé de Pão, Betão, Ariranha, Brucutu, Tião Cadê Meu Carneiro e tantos outros que me falha a memória.
Vieram trazidos de outras cidades, donde foram expulsos sem direitos e lançados nas nossas ruas. Sem piedade, como um lixo humano.
Muitos deles construíram, e mesmo fizeram parte da nossa história, alguns foram até eleitos para cargos públicos, de paletó e gravata. Povoaram de medos e temores a nossa infância. Pude compreendê-los ao ler o Elogio à Loucura, de Erasmo de Roterdã. Dei-me conta de que a insanidade mental pode ser sinal de genialidade, de coerência, e mesmo de sabedoria. Relata-nos Fromm: As vítimas de doenças mentais realmente arruinadas encontram-se entre os que parecem normais.
Os loucos vão da terra para a lua ao sabor das suas imaginações.
As janelas do meu inconsciente foram abertas ao ler as histórias fantásticas de Poe, e o poema épico dos tibetanos; As Estâncias de Dziam, em que consta a loucura do Criador, ao fazer manifestar e nos legar este planeta globalizado e insano, no qual habitamos em nome da evolução.
Eles, os chamados lelés da cuca, ficavam nas entradas das fazendas dos Montes Claros de antigamente enquanto transcorria a era do romantismo e eram considerados patrimônio da casa onde moravam. Podíamos vê-los desfibrando a tenra palha do milho para pitar o cigarro paieiro. Tomando café com rapadura no interior das cozinhas, onde escutavam, sem entender no racional das suas mentes, os relatos da vida íntima dos donos da casa, com suas loucuras e as máscaras de falsidade dos que se diziam normais.
Na reflexão dos Estóicos, entretanto, ser louco é deixar-se levar pelas emoções.
Pela doideira da vida, tentando dominar temores e medos, aprendi a decodificar as loucuras alheias, observando o semblante das pessoas. Erasmo diz que; tudo que o louco trás na alma está escrito no rosto.
Já adulto observo um mundo de loucos buscando um panegírico milagroso, Um planeta onde pululam dependentes exógenos, que carregam dentro de si a Bela e a Fera.
Uma geração entorpecida pela pedra e pelo pó, inebriada pelo álcool, sob o estupefaciente dos alcalóides, entupida de ansiolíticos e barbitúricos, construindo verdades falsas, aparências, e sob o calor das emoções efêmeras e das roupagens multicoloridas do Ego-Cambaleante.
Dormimos, enquanto a química dos medicamentos hipnóticos ingeridos nos conduz a portais dantescos, a realidades oprimidas pelo pensamento seletivo, a mundos construídos de bolhas coloridas. Bem razão tinha Calderon de La Barca, ao se perguntar: a vida, sonhos são?
A loucura é o boom de nossa civilização moderna e atormentada.
Encerro a crônica com a observação de Erasmo: A loucura é que governa a seu bel-prazer o universo.


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Por Raphael Reys - 26/10/2010 15:44:47
A BALADA DE GAU

Estatura alta, tez mulata, corpulento, musculoso, carrancudo e generoso, um galalau. De nome, Olegário Maciel, este era Gau. Amigo do peito e empregado da fazenda Lagoinha de propriedade de Biô Maia. Derrubava uma rês no muque!
Alpercatas de couro, canivete Corneta, palha macia e fumo de rolo goiano, um boque com acendedor de pedra e ferro, calças de Triunfador amarelo, camisas de riscadinho. Vestia-se sem cuidado, igual aos lírios do campo. Na bainha uma lambedeira 12.
No peito um patuá dependurado em um cordão de algodão com sete nós. Coisas de sua origem campesina e ligadas a ritos afros. Presente que recebeu quando menino de sua avó Belmira cadomblezeira.
Meio desligado das coisas deste mundo bobo, meio desatento. Seu espírito passeava no etéreo e ele caminhava na realidade opressora desse mundo doido. Empregado da Fazenda Lagoinha, Sancho Pança do Dom Quixote Biô (Gabriel da Silva Maia), proprietário das terras, assim era Gau.
Nos bons 1950 ele vinha à cidade buscar a menina Quita Maia (irmã mais nova de Biô) para passar uns dias na fazenda Lagoinha no Cedro. Imitando Ford Bigode, ele botava a cunhã pendurada na sua costa e saia com as mãos suspensas segurando um guidom imaginário e guiando feito carro pelas trilhas da Malhada, até a propriedade. Pisava tão macio que a menina chegava dormindo no destino.
Em 1965 com a venda das terras, seu único rincão, veio com o seu amigo e patrão, morar no apartamento de Quita Maia, já adulta e casada, na Rua Dom Pedro II, no centro de Montes Claros. Não ficou embora tivesse cama, mesa e banho. Detestava modernidades, não misturava o seu barro humano ao barro das gentes da cidade.
Chegou a comprar uma alpercata Roda para passear a noite com Biô no footing da Praça Coronel Ribeiro. Assustou-se com a mistura de aromas dos perfumes usados pelas meninas moças. Nuit de Noel, Lorigan, Chashemere Bouquet. Estava acostumado ao cheiro de suor e da brilhantina Glostora!
Na morada nova havia escadas e os botões do elevador para apertar. Ele não sabia mexer em botões! A solidão da urbe agregou à sua alma o peso da saudade. Quando se botava a beber a cachaça, sorvida na meiota, aliviava. Às vezes, duas meiotas. Era difícil subir todos aqueles degraus variando o guengo com os parietais pegando fogo e as pernas bambas.
O bom mesmo era morar no plano, no chão de Meu Deus, lá na Lagoinha, onde tinha canário cantador sob a amplidão dos céus, as lagartixas comendo inseto nas palhas.
A modernidade trouxe a telefonia automática e, com ela, o aparelho de baquelita preta da Siemens. Chamado para receber um comunicado do patrão, vindo em espirais metálicas pelo telefone e como o berço não lhe embalara a retórica, exclamou no dialeto pé-quebrado, estando espavorecido!
Ué! Como é que cabe seu Biô aqui dentro desse trem preto! Ato seguinte arrancou os tentáculos e artérias daquele monstro grudado na parede. E com sua violência em nome do pudor, quebrou tudo visando libertar o patrão, possivelmente espremido ali na barriga daquela instrumenga.
Voltou para a Fazenda Lagoinha e foi morar numa palhoça de taipa, um pau-a-pique com telhado de sapé e chão de barro batido no pé do morro Dois Irmãos, figura símbolo da cidade de Montes Claros. Debaixo da ramada, uma rede feita de palha de tucum, um toco servindo de banco um pilão velho e umas cabaças ocas. Morada de pequenos viventes da chapada!
Dizem que criou uma pendenga com o novo dono das terras!
Não tinha mais Biô para dois dedos de prosa, agora conversava com os duendes, com o espírito da serra e com o caipora das florestas. Assoviava para os fogo-pagô que pulavam no capim nativo e usando um apito de madeira imitava canário-pardo, sabiá, bicudo, e galo de campina, esse foragido da gaiola do vizinho. Pássaro trazido de Campo Maior no Piauí.
A noite se botava no sereno a escutar o choro da mata no anoitecer e o chiado do chocalho da cascavel marcando presença. Nos serrotes de pedra, uma lapa, morada de um gato maracajá que urrava imitando onça. Pura técnica de sobrevivência!
Assistia o sol nascer, via as sombras do lusco-fusco e as assombrações da chapada. Dizem que chegou a ver um Saci-Pererê de gorro vermelho pitando um cachimbo cotó.
Vento de agosto, o mês do desgosto. Uma lufada de ar atiçou uma faísca do fogão de barro e a Salamandra do pé da serra pôs fogo na palha do casebre.
Naquela noite, Gau, tinha tombado no chão de terra batida, vencido pela cachaça branquinha, saída da cabeça do alambique e ingerida sob a égide da tristeza. Há controvérsias!
E aí, foi fogo no lombo de Gau! Ficou que nem tição! Virou cinza. Retornou às cinzas de que viera e como uma Fênix, sua alma alçou vôo com as asas de Pteros.
Gigantes, efebos e homens-menino, quando morrem vão para o Olimpo.


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Por Raphael Reys - 23/10/2010 16:38:50
OS ÓCULOS DE ALARICO

Nos dourados anos de 1964, fim do Romantismo e início da Dita Dura, falecia no Brejo das Almas o abastado fazendeiro da região Prata, Chico Lima.
Alarico, emérito carcereiro local estava naquela fase de dar uma de autoridade e tomar todas as cachaças do mundo. Vivia rosnando que nem bicho felino. Inchava o tórax, andava de pernas abertas e por qualquer motivo “fofava” o Schmidt and Wesson 38.
A galera local evitava o confronto com a suposta ‘ortoridade” municipal. Coisa de campesinos...
Na hora do enterro do Chico Lima e à porta do campo santo, Alarico chegou cheio de goró e de razão. Postou-se exibidamente à frente do cortejo apoderando-se da alça da cabeceira do caixão, tomando o lugar que cabia aos parentes e aderentes do “de cujus”.
Metido à valente e parrudo, foi puxando o séquito rumo à morada final, destino projetado de todos nós. Na hora de baixar o féretro nos sete palmos cavados na terra bruta, ele tomou a frente para cumprimento da tarefa final. Passou uma corda em volta do caixão, apoiando os pés um em cada borda da cova e foi curvando o corpo e, conseqüentemente, o ataúde rumo aos finalmente. Rosnou, gemeu,fungou, babou e chiou que nem lenha verde, face ao esforço despendido.
Cumprida a tarefa tétrica e descomunal, endireitou o corpo e logo passou a emitir palavras de ordem: bafejos, interjeições e impropérios. Eis o falatório:
- Tava mesmo na hora de você ir! Também já estava todo esculhambado e de pernas abertas! Não servia mesmo nem para enxergar direito! Vai para o fundo do poço, que é melhor!
Os presentes estavam estupefatos e temerosos de se desencadear uma briga de socos e pontapés ali, naquele campo santo. Aí, um gaiato, que também estava com o pandú cheio de cachaça, chamou o carcereiro à razão. E disse:
- Cê ta ficando doido, Alarico! Onde já se viu esculhambar com um defunto desse jeito? – Vâmo respeitar a memória de quem merece!
Alarico esfregou os olhos e respondeu, em cima do pedido:
“Eu estava esculhambando era com os meus velhos óculos aro de tartaruga, que caiu no fundo da cova na hora que me abaixei para descer o finado! Aquela porquêra deve estar todo quebrado por baixo do esquife do compadre Chico Lima!”


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Por Raphael Reys - 18/10/2010 15:23:16
DIN BOLERO (atendendo a pedidos)

Batizado Waldir Alves, era conhecido na noite como “Din Canga”. Walduck Wanderley, companheiro de serestas e de noitadas, foi seu fã número um, o chamava de ”Din Bolero”. Sempre generoso, ajudou-o e o protegeu de todas as formas, tendo custeado seu enterro. Morava com sua mãe, dona Joana Pedro, na pensão da família na rua Altino de Freitas, centro da cidade de Montes Claros.
Mestre do tango na pista sintecada da boate Maracangalha, de boleros e rítmos tropicais, “crooner” com ou sem acompanhamento, possuía uma bela voz e foi uma atração da noite, vivendo em “dolce far niente” nos Montes Claros dos anos quarenta a oitenta.
Bom de bola na adolescência, jogou como centro avante no juvenil do Ateneu nos anos cinqüenta, sob o comando de Milton Ramos.
Era conhecido como O Rei do Rádio no programa de Alceu Queirós, da Rádio Sociedade Nortemineira-ZYD7, levado ao ar no Cine Ypiranga.
Nos anos 50, Din teve uma paixão platônica por Cecí, uma profissional do pecado e mestra da luxúria, a mais linda mulher que desfilava e trabalhava no Cassino Minas Gerais. Sob a permissão de João Pena, que assumiu a direção da casa depois de Sinval Amorim, Din Canga varou noites cantando “Aurora em Flor...”, homenageando a amada, mas não conseguiu amolecer seu coração. Dizia ela que não o queria como amante, namorado e nem mesmo com freguês! Imitava Cauby Peixoto, interpretando cálidas canções, enquanto sorvia doses generosas de “scotch”. Tudo em vão.
Abraçado aos amigos e habitués das rodadas no místico pano verde, curtia embriagado sua paixão, num atroz sofrimento por tanto desprezo. Nesse tempo, fins dos anos 50, o cassino já tomara uma característica de lupanar, perdendo o status de casa de jogo, criada por Sinval.
Tipo caucasiano, barriga proeminente, cabelo acaboclado, rosto de lua cheia, com papadas, vermelho pimentão, gestos largos e calculados, voz forte e persuasiva, Din jogava nas dez e batia com pau de dois bicos! Foi um autêntico boêmio.
Um mestre da sugesta, do contra-agá. Era bem recebido em qualquer ambiente, inclusive casas de família e sempre se dava bem. Chegava liso e voltava com grana no bolso.
Na sua caixa de ferramentas, tinha boa disposição para circular diuturnamente, alma escrava da luxúria, boca de glutão, verve inspirada, gargalhada sonora, garganta sempre pronta para cantar “Maria Helena”, pensando em Ceci. Mãos hábeis, para jogar sinuca e rodadas de baralho no cassino com amigos diletantes.
Deus Pai o mandou para o nosso meio e o próprio Deus Pai o levou, quando quis! Afinal, “cada alma que aqui vem, o faz em missão, cada qual com o seu cada qual!...”
Adotou como filosofia de vida, a frase escrita em letras garrafais na parede do salão da sinuca do Augustão: “A vida só é vivida, depois que você se envolve na vida de uma mulher da vida!”
E estamos conversados!
Nos mundos mágicos de meu Deus, onde ora Din Canga certamente habita, com sua alma alegre e vivaz, um dia nos receberá cantando: “Maria Helena és tu/ A minha inspiração/ Maria Helena vem ouvir meu coração/ Na minha melodia eu ouço a tua voz/ A mesma lua cheia há de brilhar por nós/ Maria Helena lembra do tempo que passou/ Maria Helena o meu amor não se acabou/ Das flores que guardei uma secou/ Maria Helena és a verbena que murchou ..”.


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Por Raphael Reys - 13/10/2010 13:46:43
O TECO-TECO INGLÊS

Agosto de 1960. Houve uma ventania de dar gosto nas chapadas de Coração de Jesus, terra do emérito Pedrim de Araujo e um Teco Teco transportando empresários ingleses faz um pouso mais ou menos forçado em uma estrada próxima à cidade.
O piloto deixara o seu mapa e plano de vôo na cidade de Barreiras- Bahia e pousara para viabilizar a sua projetada viagem. Estavam urrando de fome e sede, já às 3 da tarde e necessitavam encontrar alguém que falasse a língua da Rainha, tomar umas e beber várias cervejas casco verde. Afinal, ingleses são chegados e apreciam...
Se precavendo contra as intempéries da natureza, amarraram a leve aeronave com uma corda a um pé de mulungu. Rodaram a cidade toda sem encontrar um intérprete e foram parar na mesa de uma birosca do Mercado Público.
Enquanto tomavam umas e degustavam a contragosto o arroz com ovo servido na espelunca, espalhou-se pela cidade o boato de que aqueles estrangeiros eram compradores de fazendas e carregavam uma fortuna em dinheiro vivo, oculta, certamente, no estofamento ou em algum lugar do avião.
Logo logo alguém localizou um advogado que falava inglês, oriundo da Capital em viagem de negócios e o encaminhou até os filhos da Rainha, para entretê-los numa conversa bem demorada.
Com o boato da grana fácil, formou-se em pouco tempo uma corja de garotos pestinhas na praça central, prontos a executar uma ação retaliadora. Dentre eles, Walfrido, Nenego, Dêma Boca, Din Surubim, Raimundo Sete Voltas, Noca, Murilo, Biê e muitos outros.
Desamarram a aeronave, a empurraram e esconderam em um matagal próximo. Munidos de canivetes e facas rasgaram todo o estofamento e desmontaram o que foi possível em busca da cobiçada fortuna. Fuçaram tudo, no maior arregaço e nada encontraram.
Os ingleses, atônitos, após localizarem o Teco-Teco seqüestrado, registraram o boletim de ocorrência na Polícia, com o delegado Camilo Lelis, que partiu para as investigações. Localizou a farândola de diabretes e solicitou a presença dos seus pais e responsáveis na delegacia.
O pai do nosso Walfrido o encontrou jogando no campo de pelada e deu-lhe uma dura: “Nêgo, venha cá cabra safado!” Agarrou-o pelos cabelos e o conduziu até a presença da autoridade, entregando-o nas garras da lei.
Foi aplicada uma multa de trezentos contos em cada um dos participantes, mas, no frigir dos ovos, somente o pai do Walfrido (um pernambucano durão) pagou!
O delegado requisitou todo o estoque de esparadrapo do Posto de Saúde da cidade, utilizado para quebrar o galho, fazendo uma gambiarra no interior da aeronave. Os súditos de sua majestade, de cabelos arrepiados, voaram em direção a Moc City, Capital da Republica do Pequistão, onde aplacaram o estresse tomando uma providencial Viriatinha...


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Por Raphael Reys - 1/10/2010 18:16:07
GENTIL, QUINCAS E CASSIANO

Gentil Queiros, emérito fazendeiro e criador de gado de boa cepa no Rebentão das Veredas, tinha uma verve própria. Andava sempre bem vestido, com terno em cor clara, chapéu Panamá e uma boa botina Testa de Touro. No bolso trazeiro da calça, um amarrado de palha tenra, um naco de fumo de rolo e, na algibeira, um canivete Corneta amolado.
Abordado na rua por pesquisadores que perguntavam o que o entrevistado levaria na bagagem numa viagem para a lua, respondeu: “se desse para levar três pacotes de cigarro Roliude, três garrafas de pinga e três rameiras boa de cama, seria bom demais!”
Doutra feita, saiu para beber uísque Cavalo Branco com o amigo puritano Carlúcio Ataíde. Encheram o guengo em um bar do Alto São João. Dormiram escornados na mesa do bar e ao acordarem na plena atividade noturna do lupanar, se depararam com o vai e vem de damas da noite circulando pelo salão em trajes menores.
Carlúcio, assustado, pergunta: “Gentil do céu! – Onde é que nós estamos?” Gentil retruca, na bucha: “Onde nós estamos eu não sei, mas vou saber logo! – Só sei que aqui tá bom de mais!”
Já Quincas Queiros foi convidado por João Galo para servir de companheiro em uma viagem a Grão Mogol. Abastecido o veículo no posto do Armando Português, Quincas indaga: “De que vamos falar nessa viagem, João?” João sintetiza: “Da vida alheia, que é a melhor coisa do mundo compadre!” E durante o percurso tacaram o bambu em quem merecia!
Na volta, já entrando em Moc City e passando próximo ao mesmo posto de combustível, Quincas fala de súbito: “Virge, João! – Nós falamos de todo mundo e nos esquecemos de falar do Darcy!” João manobra o veículo e entra no posto. Em seguida, pede para completar o tanque.
Surpreso com a manobra súbita Quincas indaga: “Ué, João! Prá que abastecer se acabamos de chegar de viagem!” João Galo responde, em cima do pedido: “É para fazer nova viagem inteirinha falando só dele!”
Já Cassiano, grande criador de gado e ex-prefeito de Brasília de Minas, estava em uma roda de prosa com fazendeiros falando sobre o nascimento predominante de fêmeas nos rebanhos, diminuindo assim o lucro, que seria maior com novos machos.
Chegando sua vez de falar na rodinha, Cassiano afirmou: “Pois lá em casa o ano que nasce macho é só macho. O ano que nasce fêmea é só fêmea!” Um curioso, indagou: “E como é que você controla isso?” Cassiano retorna: “É fácil. Eu só tenho uma vaca no plantel...”


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Por Raphael Reys - 28/9/2010 15:32:40
BOCA DE MENTIRA

Segundo o poeta Ferreira Gullar, não se devem desmentir histórias inventadas, pois a fantasia excita bem mais do que a realidade. E o que é a verdade? Neste mundo grande e bobo de ilusões efêmeras a própria realidade é um engodo. Um jogo de fractais!
No pórtico da pirâmide de Guizé encontra-se gravado em baixo relevo o axioma: Decifra-me, ou devoro-te! E o escritor espanhol Calderon de La Barca pergunta: a vida, sonhos são? A vida é, portanto, um enigma. A mente humana é atraída pelo mágico, pelo transcendente e as nossas emoções são um joguete do nosso atávico e do que foi indevidamente codificado no subconsciente.
Sidney Miller relata que: metade de minha vida eu vivo, a outra metade me contam! A mentira e a fantasia produzem uma ação tão intensa que chega a criar e destruir mitos. Tenório Cavalcanti, notável político da baixada Fluminense de antanho, conta em suas memórias que: tudo o que fez para construir a sua aura de valentão e destemido foi projetado por ele mesmo, por antecipação, com intencionalidade.
Carregava o seu revólver com balas reais e de festim, alternadamente. Para dar o seu show e dizer que tinha corpo fechado na Bahia, apontava para um obstáculo e disparava acertando-o. Ato seguinte apontava e disparava com a bala de festim para a sua própria mão. Todo mundo acreditava! Gente é bicho besta. Diz um estudo que em cada 10 mil pessoas, uma só tem inteligência emocional e capacidade de pleno discernimento.
Dentre os boca de mentira da nossa terra, começando pelo cronista que escreve este texto tem de todo tipo. Alguns ouvindo de outro saem falando, outros dizem terem ouvido contar e vendem pelo mesmo preço que compraram, uns dizem terem ouvido e visto e por isso contam. Há os que ouviram no Café Galo no Kentura Kente ou na sauna do AC e só por isso saem contando.
Aqui na terra de Figueira tem local que só dá boca de mentira. A barraca do Ceará, na Praça da Matriz é freqüentada pelos mentirosos que têm a testa enfeitada. Na porta do Shoping Popular, encontramos pacientes geriátricos que tomam comprimido azul, sem efeito, e mostram os pacotes de preservativos. São os falsos roedores de pequi!
O antigo pátio da REFFESA tinha um Pedro que era campeão. De tanto mentir os seus lábios engrossaram e a sua boca ficou levemente torta. Os freqüentadores da porta da galeria gay no quarteirão fechado da rua Simeão Ribeiro, ouvem Jerry Alfaiate contar uma mentira e Zezão Relojoeiro desmentir e contar outra, ao mesmo tempo em que falam da vida de Paulinho Relojoeiro. Enquanto isso, Nenga Ourives rola de tanto rir.
Quase nos esquecemos de citar o próprio Paulinho Relojoeiro. Esse já desceu rio nas costas de jacaré, pilotou avião em parafuso e conversou com extra-terrestes no alto dos Morrinhos. O maior de todos, entretanto, é um moto taxista vendedor de lanches, da cabeça branca que tem apelido de fruta tropical e mora na Vila Guilhermina. Ele viaja de helicóptero com o governador, é assessor de Lula no Norte de Minas e supervisor do SINDACTA 1!
Nós temos história, somos da roça, mas, somos chiques!


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Por Raphael Reys - 23/9/2010 18:05:03
A LISTA

Em crônica recentemente publicada, citei alguns nomes dos montes-clarenses que serão convidados a integrarem a população da Banda Fofa, gente finíssima, após a esperada separação do planeta Terra em duas partes, conseqüente ao novo Big Bang, a formidável e fantástica explosão cósmica que, pelos registros de profetas, adivinhos e intelectuais, brevemente voltarão a acontecer.
A outra metade será a Banda Dura (contrário de Fofa).
Assim como fez o herói Tartaran no seu Tarascon, foram selecionados apenasmente os bons, os puros, filés e cabeceiras, a critério e ad referendum de uma Comissão de Notáveis.
Dom Denílson De Arruda e Cuba, naturalmente irá para alegrar a todos com o seu alto astral e a gargalhada sonora.
No bojo da nave transportadora, para cuidar da nossa TV, seguirá Felí Tupinambá, com a sua presença suave e o seu sorriso dócil. As charmosas artistas plásticas Conceição Melo e Márcia Prates, sagitariana e capricorniana, respectivamente, levarão cores, finesse e beleza para a nova Escola de Artes Andrey Kristoff.
Zezão Relojoeiro também vai, para comer mexido de feijoada e torcer pelo Atlético. Carneirinho e sua treita leve torcerá pelo Cruzeiro. Jerry Alfaiate e seus auxiliares “frufrus”, lançarão a moda de calça masculina sem pregas. Estevim será o editor de um jornal underground e fará oposição besteirol do tipo “Tem governo? Sou contra!”
A socialite Rita Maluf integrará o gerenciamento da iniciativa com sua elegância discreta, educação refinada e o sorriso angelical.
Haverá um Jardim Suspenso de rara beleza, onde se poderá conversar com as poetisas Dóris Araujo, Amelina Chaves, Karla Celene e muitas outras encantadoras intelectuais.
Ouviremos na Rádio Fofa AM/FM, as vozes dos Eduardos, Lima e Brasil, com comentários do velho “GD”. Zé Vicente fará o programa “Gente Fofa da Gente” e a escritora Maria Luiza Teles será a nossa conselheira para assuntos espiritualistas.
O poeta maior, Georgino George, será devidamente exorcizado e afastaremos da sua cola o “espírito da moita”, que há muito o persegue. Fernandinho Boca de Louvor, o único cabo eleitoral que irá só para botar fogo em toucinho na barroca.
O jornalista e gentleman Magnus Medeiros, coordenará a nossa embaixada, enlevando corações ao interpretar boleros e bossas dos anos dourados. Felipe Gabrich fará parte do rol.
Para cuidar bem da nossa saúde, levaremos de porteira fechada a equipe nota 10 de profissionais médicos, enfermeiros, auxiliares, técnicos, pessoal de serviço, preceptores, todo o staff do Hospital Universitário Clemente de Faria. Lá continuarão, com a mesma eficiência, a prestar os ótimos serviços de sempre.
Aroldo Pereira viajará após fazer implante de fios capilares, junto com o Mega Psiu Poético. Mirinha Maciel, como boa discípula de Whitman, cuidará da nossa sustentação ecológica. Levaremos os Grupos de Serestas João Chaves e Lola Chaves, para, como de hábito, nos encantarem com as canções e modinhas da nossa Terra.
Das Alterosas, viajarão os escritores Augusto Bala Doce Vieira, Mary Alckmin, Carmem Neto, Iara Tribuzzi, Tinin, Alberto Sena e para cantar as lindas composições de Godô, os Guedes Beto, Gabriel e Ian. Do Rio de Janeiro, levaremos Felippe Prates, Carlos Alberto Prates Correia e Paulo Henrique Souto.
Dentre muitos e muitos que certamente estarão a bordo em companhia dos selecionadíssimos passageiros da nave dos cabeceiras rumo à Banda Fofa, contaremos com a presença certa do jornalista Haroldo Cabaret, para, juntos, compormos a balada desses novos heróis.
Aviso aos navegantes: Já começou o peditório. Tenho sido procurado por pistolões buscando incluir pessoas não habilitadas a viverem na Banda Fofa. Em vão, sem a mínima chance, pois o critério seletivo baseia-se apenas e tão somente no alto merecimento das pessoas.
Portanto, como diria o saudoso coleguinha Ibrahim Sued: “Sorry, periferia! A Banda Dura os aguarda. De leve...”


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Por Raphael Reys - 20/9/2010 08:20:48
BOBEIRA...

Estimados leitores: Essas histórias a seguir, nos foram relatadas, confidencialmente, pelo boa praça Wilson do Destak. Notório mestre de baterias e carnavalesco. Segundo ele, George, emérito e dorminhoco comerciante, dono de uma bodega na Rua Melo Viana, é conhecido no trecho por vender café requentado, pão de doce, biscoito fofão e outros “gueguéus”. Expediente que mantém há 50 anos, ininterruptamente. Carrega em suas costas um estigma e um enigma. George já ganhou duas vezes o primeiro prêmio da Loteria Federal. Mesmo assim, volta e meia comete uma vacilação e cai do cavalo. A malandragem local sabe do lance do sono e não perdoa. Mais dia, menos dia e estão fazendo (operando) em cima dele, novamente. A bufunfa que ganhou na loteria sumiu! Ele não sabe para onde foi como foi e não sentiu nadinha. Só sabe que a grana sumiu. Escafedeu-se! Alguém aplicou nele tão bem aplicado que George nada notou durante o ato. Só deu conta do presépio, quando zerou o caixa forte. Já entregou tudo para Deus que é nosso Pai, tomar de conta! Dia desses, pescando uma piaba no balcão, na hora da sexta, já bambo de sono e para não dormir, ligou o rádio portátil, sintonizando no programa “Gente da Gente” do radialista Zé Vicente. Chegou um freguês, uma mala do pedaço, caído de bolso, sacou o vacilo, agachou na frente do balcão, não sem antes zerar o volume do papagaio elétrico e, então, imitando a voz de Zé Vicente, falou: “Prezados ouvintes da gente! – Em virtude da falta de energia programada, pedimos apagar o rádio por cinco minutinhos. – Findos os quais, solicitamos novamente a atenção dos amigos da gente!” George caiu no golpe do Malandro Morfeu. Aproveitou a pausa programada e tirou mais um cochilo longo. Não deu outra: o rádio mudou de proprietário e virou grana na receptação de plantão... Doutra feita, no mesmo horário da sexta tropical, chegou um vizinho, também vigarista e aplicador. Deu uma de abrir a boca bocejando. Sentou-se à mesa da birosca e fez um agá que estava morrendo de soneira àquela hora. George comeu a sugesta de “Indução e Empatia por Modorra”. Pescou uma enorme piaba no rio do letargo e quando acordou, havia desaparecido de dentro do balcão um saco de biscoito fofão, que abasteceria a espelunca por uma semana. Já Zeca do Destak, nascido e criado no meio da vadiação do Bairro Morrinhos, cobra mais do que criada no Butantã da rua Melo Viana, carnavalesco e atleticano doente, viajou para Bom Jesus da Lapa (BA). Objetivo: Cumprir promessa, visando com isso, lavar da alma os pecados cometidos no pé do morro. Reciclar o lado espiritual do barato dessa vida doida e globalizada. Caiu na mão dos malandros baianos, filhos de santo e crias do axé. Na hora de subir aquela via crucis que leva ao Morro da Cruz, apareceu um cidadão o incentivando a andar ligeiro. Empurrava-o pelo traseiro o impulsionando rampa acima. O sujeito era um punguista do pedaço e bateu a carteira do Zé, barrufada de dinheiro, deixando-o na maior mão de calango! Olho vivo! A malandragem está monitorando tudo e a todos, em busca de bobeiras. Vacilou, nêgo velho, dançou...


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Por Raphael Reys - 15/9/2010 07:59:20
A BANDA FÔFA

Notícias recentes, alarmantes e oriundas do noticiário internacional, nos dão conta de aterrorizador vulcão, localizado ao norte dos States. O dito, um verdadeiro “big bam terrestre”, morada do Romãozinho, é um Cracatoa ampliado. O bicho papão vem apresentando constantes e super elevadas “pressões internas”.
Dizem os sismólogos, especialista em vulcões, que essa fera se manifesta, ou entra em erupção, expelindo tetra quintilhões de litros de lava incandescente num ciclo com intervalos de 600 a 800 anos. Atualmente, tem 670 anos que ele se mantém aparentemente em repouso. É pura chaveta. Olho vivo!
Quando explode, o mega gigante é tão terrível e planificador, que em uma das suas erupções na pré história o calor foi tanto que mudou a temperatura do solo terrestre! Em razão disso, os dinossauros e outros monstros congêneres gerados após o fenômeno, nasceram todos fêmeas. Daí, além daquela geração só nasceu mais uma, a seguinte, e não havendo machos para a cobertura e fertilização das fêmeas, extinguiu-se a espécie.
Na atual modernidade, estamos entrando em um estigma semelhante. Uma grande maioria dos machos atuais está deixando de ser espadas. Nada de culpar algum vulcão, pois é pura frescura!
Domingo último, na tradicional reunião dos Poetas Quase Mortos, que acontece todos os domingos pela manhã na Praça da Matriz, em frente ao Centro Cultural, o professor Sebastião, marido da poetiza Dóris relatou-nos que após a próxima e esperada erupção do gigante, o mundo vai partir-se em duas bandas distintas. Será o maior papoco da história!
Como se prevê que o globo se fragmentará em duas partes, uma delas já está sendo chamada de Banda Podre. Para lá, pretendemos enviar depois de caprichada seleção local, os chatos de galocha, os sofistas, cabos eleitorais, xexelentos, a galera do “bas fond”, posudos, marristas, botadores de banca. Adeptos do “American Way Of Life”, viciados em Internet, vendedores da palavra do Senhor, fusos e demais membros das galeras dos Hades aqui representadas.
Estou preparando a lista dos montes-clarenses que irão para a outra banda, para a “Banda Boa”, ou Banda dos Fofos, para onde só irão cabeceiras. O rol será afixado previamente na parede do Café Galo, do meu amigo Jadir Rodrigues (que só irá para a Banda Boa, por deferência especial de Geraldim Alcântara. Mas, precisa levar um verniz na cara de pau).
Nela, (a Banda Fofa), os utópicos, cabeceiras, gente do bem. Márcia Yellow irá com sua teleobjetiva digital. O arquiteto Cascão, lá estará para comer galinha caipira e para enriquecer o projeto arquitetônico “Obelisco”, em homenagem ao campeão dos espadas montes-clarenses, o muito saudoso Walduck Wanderley. Que Deus o tenha!
Dentre os muitos e muitos que lá certamente estarão, inclui o escritor Augustão Bala Doce, capitaneando os poetas, escritores e os puros de alma. Levaremos o cardiologista Noasses Diamantino, para cuidar dos nossos corações.
Tico Lopes e Virgínia de Paula irão para nos falarem de folclore e de modinhas, na companhia de Rui Queiroz a bater caixa e bongô. A acadêmica Yvonne Silveira irá para nos encantar a todos, com a sua presença, seu elevado estado de espírito e a sua nata e inata graça.
Traremos o querido escritor e poeta Felippe Prates do Rio de Janeiro, e ele, além de valorizar e compor nossa patota com sua verve e muito talento, tomará “scotch on the rocks”, declamando, a pedidos, seus maravilhosos sonetos. Levaremos os cabeceiras nota 10, Eustáquio Repórter, Nilo Pinto, Miguel de Ducho, Paulinho Relojoeiro, Peré e os seus sapos, Hermano Konstantino para tomar fubuia e Haroldo Cabaret, para nos ajudar a escrever as crônicas do novo Shangrilá. “Poretinha” não irá, nem pintado de ouro!
Pancho Silveira irá representando o Brejo das Almas e os machos que tomam cachaça, jogam baralho e têm quengas por conta.
Na frente, seguirão incomensuráveis frotas de transatlânticos carregados até na tampa de cachaça Viriatinha, Santa Rosa na rolha e Havana, farinha Morro Alto, pequi e carne de sol de Mirabela.
Será a maior e a melhor curraleiragem da História!


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Por Raphael Reys - 9/9/2010 14:23:28
CURRALEIRAGEM II

Nos bons 1954, o Hotel São José, do figuraça Juca de Chichico, hospedava Juscelino Kubistchek, então governador do Estado. A propósito, de certa feita, em campanha para Presidente da República, por não ter cumprido antigas promessas eleitoreiras, JK foi vaiado por estudantes locais, capitaneados pelo saudoso jornalista Lazinho Pimenta.
Ducho Mendes, o barbeiro/livreiro tinha o seu salão de luxo montado no interior do hotel. Seu Juca criava pássaros de todas as espécies e matizes, em um grande viveiro montado próximo à entrada lateral. Fazia a alegria dos visitantes e da garotada.
Era a maior felicidade as mães nos levarem para ver de perto o viveiro e para dar risadas com as brincadeiras de seu Juca. “Oi, seu Juca!” – “Que aperta e não machuca...”
Na ocasião nos contava histórias de uma viagem que fez a Israel, durante a Segunda Grande Guerra Mundial, numa época em que Israel ainda não existia, conduzindo um “tubo” contendo documentos secretos de Getúlio Vargas para serem entregues ao Serviço de Inteligência Britânica.
Em outra ocasião, seu Juca notou que alguns pássaros haviam sumido de dentro do alfobre. Não encontrando a causa e estando a estrutura preservada, ficou grilado. Próximo, havia a oficina de conserto de rádios, dos técnicos Chico Ornellas e Manuel Borba. Manuel era tido como muito inteligente e esperto para descobrir as coisas.
Esse último foi chamado e chegando ao local rondou o viveiro e matou a charada na hora. Apontando para o alto do criadouro disse: “Veja, compadre Juca! Lá está o motivo do sumiço dos pássaros! Um enorme gavião todo gorducho!”
Juca de Chichico, vendo a mancada que dera, relatou que comprara aquela ave grandona na mão de um capiau treiteiro. O mesmo afiançara que se tratava de uma espécie exótica, inofensiva, oriunda da fauna do Amazonas, uma moda recente, entre os criadores da Capital. Como seu Juca era de boa fé, fora passado para trás.
O esperto Manuel Borba era pai do nosso apreciado cronista e escritor Afonso Prates Borba e nessa ida para resolver o mistério do sumiço dos pássaros o rádio técnico levou o seu filho adolescente Marco Antônio, o Alemão, que era o galã da cidade e fazia as meninas de então suspirar e sonhar. Lá no hotel estavam hospedadas duas morenaças retratistas vindas das Alterosas e a ocasião propiciou o início de mais um grande e curraleiro romance de amor do rebento de Manuel Borba, o arrasador de corações.
E aqui fica relatada e registrada para a história de nossa urbe, mais uma romanceada curraleiragem montesclarense!


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Por Raphael Reys - 4/9/2010 10:16:34
FICÇÕES... E UM RESTO DE NOITE...

Encostado á parede do restaurante de luxo, marco com o pé, o ritmo quente e assovio “Greem With Envy Blues”. Recebo a última réstia de luz da tarde na Avenida Sanitária que já entra no lusco-fusco. Assume o céu, um tom cinzento.
Uma excitação quase mórbida, e no dizer do poeta um frenesi de dar bananas. O Garden-Party retoca o seu smoking. A dama de azul turquesa toma o rumo do ao Automóvel Clube. E o garçom, usa um Summer de S 120 branco.
Um fascínio, um desencanto, um aroma de perfume. E no dizer portenho: um resto de tango e um assovio.
Ela comprou um pequeno e famigerado vidro de perfume Francês/Paraguai. Agora passa pela avenida pisando a trilha dos seus próprios pensamentos. Na via da sua imaginação, buscando fugir do momento objetivo da realidade presente. Concreto, e determinante. Apanha um táxi!
Ernesto Van transita lentamente assoviando “Doralice”, Virgínia de Paula copia do seu livro de bruxa irlandesa, uma receita com infusão de folhas e ervas e a poetiza Dóris Araujo faz mais uma composição, cheia de amor para dar. A escritora Maria Luiza se encanta com o meu Alento e sublima a poesia da sua alma em comunhão.
A acadêmica Karle Celene e a sua alma gêmea Roberto tomam um scoth, under the rocs no restaurante Quintal. Um galo de Campina canta numa gaiola de arame. São milhões de trinados! Uma vitrine isolada e desgastada reflete os lumens da luminária,e o espelho francês mostra a beleza clássica do rosto de Conceição Melo.
No banco da frente, um manequim de plástico, estático. Surrealista! No tórax está escrito em letras grifais Sou do Tico Lopes. No banco de trás, Amiguinho, com seu sorriso amarelo e gelado, a Boneca de Leonel, vestida de chita, a pirata cabo de prata, de Virgínio Preto, e os óculos modelo Ronaldo de Neco Santa Maria.
Ruas transversais e, por toda noite a luz brilhante de lâmpadas de néon. Vejo as linhas da palma de minha mão. Nelas estão registradas as rotas do meu destino carmico! Boquiaberto, peco um café espumoso na birosca moderna.
Há um incesto, uma tentativa de homicídio e um streeking, na orla fluvial do Rio Vieira. Uma cama giratória com Baco e Vênus. Um triunvirato, trivial simples. Uma velha senhora pede uma fubuia no boteco. O menino degusta um picolé saia curta.
A dama de azul passa por mim, discreta, entretanto, o seu decote mostra um par de seios siliconados. Os seus olhos são de Vaca Pidona. Na esquina próxima, uma cena de Felline. Corações juvenis cheiram cola de sapateiro e vagam pelos tortuosos caminhos do inconsciente pavloviano pediátrico.
O mundo gira e a lusitana roda. Há um íncubus no quarto daquela viúva macumbeira. Felippe Prates declama Fromm Glicose após a sexta dose de Jack Daniels no Restaurante do Armand`os.
Elthomar Santoro solfejando Rapariga do Bonfim e rescendendo “oroma” de curraleira!
Há um To be or not to be, numa esquina próxima. Um compositor conclui que os instrumentos da felicidade são: uma escalera grande, otra chiquita. Um literato sentado à janela rococó do sobrado colonial; lê “Éramos Felizes e Sabíamos” e me acena. Uma dama da noite passa gingado sensualidade e cheirando a mistério e Madeiras do Oriente.
Ela veste uma calca jeans cocote, já formando um culote, anda balançando o seu Bumbum Pratibumbum Burugundum. Um veículo moderno circula pela via e através da janela sai um bolero de Benvenido Granda. Um pederasta ativo e passivo arranja uma briga com um cáften na esquina! Um sapato branco e marrom fica no meio fio. Um filete vermelho interliga o calçado, o piso do passeio, o meio fio e a pista de asfalto.
Há um sofrer sem compreender, e um dar de si, sem conta.


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Por Raphael Reys - 1/9/2010 08:03:06
CATOPEZADAS

Rolim, que era rolinha só no apelido, um dançante de catopé de antanho, motorista de caminhão Dodge caixa seca, morador da baixada, tomador de fubuia no bar de Tiano e habitual prevaricador nos anos 50, foi curtir uma tarde de alcova tropical com uma mariposa do Beco do Marimbondo.
No dizer do escudeiro Zé Paraíso: “ele, o Rolim, tem a torneira muito grande!” Aí, satisfeito terminado a função genésica o nosso herói tirou da algibeira uma boa nota de um cruzeiro – estávamos no tempo da Tabela Price – e pagou a dama da noite.
A filha de Eros e Afrodite, indignada, retrucou em cima da fatura: “serviço de cama para ferramenta do tamanho da sua é negócio para cinco cruzeiros, no mínimo, seu Rolim”!
Já Maneco de Dona Gregória, antigo dançante dos Caboclinhos, andava variado pelo centro da urbe. Foi parado por Tico Lopes, que lhe perguntou: “Cê tá andando variado, Maneco?” O interlocutor responde: “Tô aqui pensando no tempo antigo em que tudo era bom! Na época atual, tá tudo de cabeça para baixo! Moço, tô que nem arara sem cordão...”
Já Rui Queiroz, conhecido no trecho musical como Zé Rui, ou mesmo Rui do Bongô, foi ao Shopping e levou como seu acompanhante, para assuntos aleatórios, o também mestre do tambor Tico Lopes, que no dizer de Eduardo Lima, o Goiabão, só anda como um dândi.
Foram comprar um supimpa vaso de plástico para um arranjo com plantas artificiais. Escolhida a peça, Rui pede à atendente que preencha o vazio do interior do vaso com aquelas aparas próprias. Bota uma, tira. Bota areia, palha, tira. Bota pedrinhas e isopor, tira. Bota arranjos vegetais, tira. Bota o escambal, tira!
Extenuada, com expressão cansada, a moça lembrou o dito do escritor Lampedusa: “desenha-lhe no rosto emaciado uma melancolia metafísica...” Pergunta, então, ao Rui: “por que o senhor não gostou de nenhuma das arrumações que fiz?” Rui do Bongô responde, no ato: “Porque está tudo catopezado!”
A balconista que era de outra região do estado, desconhecedora da nossa linguagem, pergunta: “E o que é que é catopezado?” Rui apontando para o Tico diz: “Ele entende mais do que eu de folclore!” Tico dá as solicitadas explicações e a balconista, meneando a cabeça, fala: “Bestage, moço. Ele quer é que eu dê um tcham no vaso!
Como é um cidadão cheio de detalhes, minúcias e quizongas, próprios de artistas e de músicos, Rui conclui o diálogo com uma pergunta bastante pertinente, endereçada ao companheiro: “E você sabe o que é que é tcham, chefe?”
Esclarecimento aos meus caros leitores: o montesclarino é um ser com alma e estigma próprios. Um capiau diferenciado, pois bota panca de rico viajado, mas, a bem da verdade, nada mais é senão um chapadeiro “fiduna”. Domina-lhe a semântica libidinosa do pequi, o “rusarô” da cachaça, a subserviência religiosa. Nós andamos com um terço no bolso, mas, para garantir, também com uma fita benta de catopé na carteira de notas e, ainda, por via das dúvidas, um patuá de macumba na algibeira...
Para nós, o gado mija pra trás, mas nos põe para frente.
Na avaliação do saudoso Deca Rocha, “nós somos caboclos curraleiros, cheios de truques e alguma falsidade...”


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Por Raphael Reys - 26/8/2010 16:03:37
NOITE QUENTE NO KENTURA KENTE

Sábado 21 últimos, área reservada do Restaurante Kentura Kente, point da noite e oráculo dos tomadores de loura gelada. Chego às 19: hs e encontro, já instalado no átrio o jornalista Paulo Narciso, paramentado de discípulo do mestre Zanza e acompanhado de sua alma gêmea, a escritora Raquel Souto.
Logo, Nenzão Maurício adentrou a nave de Baco com sua alegre Patrícia. Trazia armas e bagagens e os exemplares do nosso livro “Éramos Felizes e Sabíamos”. Joselito, o secretário executivo de Virgínia de Paula comandou a venda.
Um a um foram chegando os componentes da galera de escritores tupiniquins, filhos diretos ou adotados de Figueira, com seus familiares e convidados. Nilo Pinto e Amália Drumond felizes com a organização nos trinques.
Virgínia de Paula com um penteado chique arrasou com seu charme, vestida de preto para matar. Segundo o cabeceira tupiniquim Eduardo Lima, ela parecia uma debutante.
A noite era de acadêmicos, jornalistas, músicos, escritores, convidados.
Yvonne Silveira, a presidenta da Academia Montesclarense de Letras foi ovacionado ao chegar. Presentes os escritores Petrônio Braz, presidente da Aclesia (Academia de Ciência e Artes do São Francisco) e Dário Cotrin, presidente do IHGMC (Instituo Histórico e Geográfico de Montes Claros).
A imprensa marcou comparecimento em massa, atendendo ao nosso apelo e engrandecendo o evento. Luiz Carlos Novaes, editor do Jornal de Notícias e sua esposa, Hermano Konstantino, editor do Gazeta do Norte de Minas, Paulo Narciso e Raquel, da rádios 98 AM e FM e do site www.montesclaros.com, Angelina Antunes, editora do Caderno Mulher, do Jornal de Notícias, Márcia Yellow fazendo a cobertura fotográfica para o seu Dzai, Felicidade Tupinambá, coordenando a equipe da TV Canal 20 e muitos outros que logo se misturaram a alegria da festa.
Ambiente naturalmente descontraído de almas afins.
Amália Drumond abriu a solenidade e foi seguido pelo sociólogo e líder da trupe, Geraldo Maurício que discursou sobre a obra e saudou a todos. A acadêmica Yvonne Silveira falou de improviso e como sempre abrilhantou o evento. Efusivamente aplaudida.
Velhos amigos, velhos amores, conhecidos que se reencontraram entre muitas lágrimas, amplexos e ósculos.
Ucho Ribeiro, o pai da idéia literária, leu uma recente crônica publicada com a alma cheia de contentamento. Seu irmão Fred e familiares eram só alegria e animação. Presença maciça das famílias: Deusdará, Narciso, a acadêmica Milene Coutinho, capitaneando os Maurício.
Juquita Queiroz e seu Grupo de Chorinho Geraldo Paulista (Tião, Wanderdayk, Raphael, Jonathan e Kollek) com um repertório de bossa nova e balanço violaram nossos corações com recordações do puro som do Beco das Garrafadas. Instrumentistas, cantores, performances se sucederam, solo, dupla e trio. Pura magia curraleira!
Haroldo Cabaret com Tiupas, lembrando Os Brucutus, Nenzão, Geraldo Carne Preta, um show popular e luxuriento mostrou panca de artista. Cantaram bossa nova, Valéria Mascarenhas e Juliana Peres. O músico Yuri Popoff fechou a noite com chave de ouro.
A animação tomou conta dos corações e Antonieta Fernandes que alem de cantar em dupla com Nenzão Maurício, dançou um pá de deux tropical com Ademir Fialho (sempre de fogo e penducando o equilíbrio). Outros casais animaram a pista.
Numa mesa só de capa de revista, o reflexo da luz dos spots nos cabelos louros de quatro beldades de fechar quarteirão. A charmosa jornalista Angelina Antunes, a beleza grega da artista plástica Conceição Melo, o charme quase fatal de Márcia Yellow e a graça da socialite Mirian.
Em virtude das festas de agosto e com a cidade cheia de turistas, visitas e parentes vindos de fora, muitos telefonaram e passaram e-mail comunicando a impossibilidade de estarem presentes fisicamente.
Aviso aos navegantes. O livro será lançado brevemente no Rio de Janeiro, sob a coordenação do cineasta Paulo Henrique Souto. Logo estaremos editando o segundo livro da turma. Vem coisa por aí!


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Por Raphael Reys - 24/8/2010 07:52:54
CADEADO

“Os cronistas escrevem o caráter oculto da sociedade.”

Conhecido comerciante do centro, biótipo mignone, alegre, divertido, embora do tipo tampa de binga é tirado a conquistador de suburbanas. Sua carreira de abatedor de lebres sempre termina em fechadura e cadeado. Quando ele nasceu era tão pequeno que os pais só o registraram aos dez anos esperando que o mesmo tomasse corpo. Daí ele já ter sessenta e cinco, mas aparenta ter só quarenta anos. Como ele tem muitos amigos de papo, copo e cruz, volta e meia enche o quengo de gole, fica estabanado e sai para paquerar na noite. Dia desses, levou uma gatíssima para o motel e como tem a ferramenta pequena, costuma compensar a arte de alcova com um bom e erótico papo ao pé do ouvido da parceira. Como é pão duro, estava em um quarto de motel de péssima qualidade e baixo preço. Ao lado da janela, um pequeno matagal, do qual, sem que eles vissem, saiu uma pequena jaracuçu que entrou pela janela e atraída pelo calor dos corpos dos amantes foi parar no meio do ato libidinoso. Certa altura da via de fato, a parceira levou a mão para engarguelar e acabou pegando mesmo na cabeça da cobra verdadeira, ou seja, o ofídio intruso. Assustada, acesa a luz para checar de quem era aquela coisa grande roliça e cabeçuda a suburbana deu o maior pití. O bafafá foi tamanho, que teve até que ser chamado os bombeiros para aparar o cavaco.
Como é costume nos Montes Claros, os amigos correram e abafaram o caso, evitando que a matriz, cobra de outro gênero, cortasse a cabeça dele enquanto dormia, conforme já prometido. Outra noite ele saiu novamente. Na ocasião telefonou para a ‘Zinha’ e a encomendou arrumar uma profissional do seu tamanho, pois queria curtir uma tarde de similaridades, além de fazer uma junção de côncavos e convexos compatíveis (ele é cheio de detalhes...)
Estava na alcova tropical na maior aplicação de Kama Sutra, quando a gatinha mignone deu o maior estrimilique. Se contorceu toda, revirou os olhos e ficou babando. Convencido como ele só, ficou pensando ter provocado aquele suposto apogeu genésico com efeito neurológico!
Ledo engano. A profissional estava tendo mesmo era um ataque epilético!
Como ele não sabia identificar o distúrbio, ficou grilado temendo que a profissional batesse a caçoleta e ele fosse acusado de “homicídio por indução de apogeu genésico múltiplo sem intenção de matar!”
Deu Samu na parada e os amigos, todos comerciantes e profissionais liberais barrufados, mais uma vez acorreram, aparando o novo pepino. Quem tem amigo, não morre pagão!
Um conhecido profissional liberal que lida com escrita na nossa city, deu conselho a ele de agora em diante para acertar a escrita com a patroa em casa, que é mais seguro. Afinal, está provado que o bicho não nasceu para prevaricar...
Esse mesmo bem sucedido profissional chegou a filosofar, citando: “Se um carroceiro, estando perto da carroça, ler a história da vida desse frustrado mini Dom Juan, dinâmico e alegre comerciante, o burro cai no choro...”
Haja cadeado e tranca.


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Por Raphael Reys - 20/8/2010 08:27:41
MONTESCLAREADAS XVII

Cidade pólo da região Norte de Minas, Montes Claros conta entre seus tipos folclóricos com os banqueiros informais, também conhecidos popularmente como agiotas. A sabedoria popular relata de forma hilária a atuação dos mesmos no exercício da profissão. Chamam os mesmos de coração de pedra, carrascos, unha de fome, fuinhas, medonhos e outros adjetivos desagradáveis.
Um deles ia diariamente à casa de um devedor para cobrar os juros, em pequenas parcelas, já que o principal houvera sido resgatado. O devedor se desfizera de todos os móveis e utensílios da casa para fazer jus a esse ressarcimento diário. Como chegou ao auge da penúria, a sua cachorrinha de estimação era só o couro e o osso, de pura inanição!
O “cash man” chegou, como de costume, para a cobrantina, dessa vez exigindo o pagamento total do atrasado. O devedor abriu as portas da casa para mostrar que só havia sobrado a cachorrinha amarrada no quintal do barraco. Ofereceu a mesma como pagamento do débito.
O agiota entrou e constatou a veracidade dos argumentos e ao ver a cadela magérrima, recusou-a e exigiu outros bens quaisquer, como paga. O devedor argumentou que só tinha a sua mulher, que estava deitada numa esteira, no chão do quarto. O banqueiro popular foi até o quarto, verificou a oferta e voltou cabisbaixo com o que viu.
E para concluir em definitivo o ressarcimento, sentenciou: vou levar a cachorra mesmo!
Douta feita, o homem estava no Bar do Edson, na Praça Doutor Carlos, no centro. Um invejoso o vendo como sempre mal vestido e com roupas rasgadas, falou: Você, um homem milionário e vestindo roupa rasgada! Tome jeito e compre roupas novas! Os seus filhos andam todos no maior luxo!
O financista tupiniquim, todo relax, respondeu sem mudar a inflexão da voz: eles andam bem vestidos porque têm pai rico! Não é o meu caso, pois nasci pobre, de pai e mãe pobres e não tenho privilégios.
Abordado certa feita na Galeria Ciosa, por um devedor executado e do qual tomara a casa, o mesmo estando descontrolado, pois fora abandonado pela mulher após o infausto acontecimento, aos gritos avançou sobre o agiota, agredindo-o e rasgando a sua camisa. Foi contido por populares.
O irado executado gritava a todos os pulmões: “rasguei a camisa dele!” Tranqüilo, numa “nice”, respondeu a vítima: “rasgou minha camisa, mas perdeu a sua casa de morada...”
Outro agiota, em 1962, com atuação em bairros pobres, buscava receber vinte cruzeiros de um seu compadre também morador e vizinho, nos ermos dos matos entre a Vila Brasília e o bairro Santos Reis. O devedor vivia de pequenas criações e da cata de mangas e pequis.
Como estava sem arranjar serviço, sabedor que o compadre credor era caído por sua mulher, uma bela morena roliça, propôs dá-la em pagamento, com aquiescência da mesma, para saldar o débito. O negócio foi feito por acordo das partes e o devedor ficou com a mulher do credor, na catira batida.
Recebeu ainda, como volta, cinqüenta cruzeiros, uma porca parida e um canivete Corneta na bainha, dado à plena satisfação do credor com a dupla transação: no bolso e na cama...... O delegado Miguel Abdo tomou conhecimento da catira batida, por denúncia de um vizinho das partes, que ficara invejoso.
Infelizmente, uma negociação tão original deu para trás, pois, em diligência, a autoridade foi até o local e anulou tudo, alegando “moralidade pública”...


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Por Raphael Reys - 12/8/2010 08:11:16
MONTESCLAREADAS XVI

“ essa crônica é dedicada a nossa leitora a Dra.Fabla Vasconcelos,
Filha do nosso grande amigo Gerinha Português”

Refletindo o dito de Lê Carré, em fazer excursões acadêmicas pelo ministério do conhecimento humano, veio à minha memória algumas curraleiragens próprias de montes-clarenses saudosos.
Zé Amorim no bar de Edson Barrão conversava com o próprio quando viu dele se aproximar um conhecido fazendeiro todo posudo. Vestido nos trinques, sapato de pelica, relógio e pulseira de ouro, anel de brilhante no dedo. Zé aponta para o recém chegado e diz maliciosamente: “Aí tem coisa!”.
O Zé conversava com o delegado Guedes quando passa um conhecido. Esse, bastante pálido e apresentando sinais de decrepitude. O homem das “Amorincianas” fala, na bucha: “Nesse ponto em que o traseiro murcha é sinal seguro que logo vai dar cemitério”.
O arquiteto Cascão, por telefone, solicita um encontro com o Zé no Café Galo. O motivo é pedir autorização para preparar um livro contando os causos e verve do Zé. Cascão chega, um gigante de tamanho e dado à fria aragem de junho vestido com uma camisa de lã, manga comprida, listras ao estilo rural americano.
Do outro lado da rua o Zé vendo o candidato a escritor fala: "pode atravessar a rua lenhador canadense F.D.P. O livro sobre minha vida, só depois de morto. Já imaginou a patroa lendo histórias das minhas estripulias”.
Logo chega o Dácio Cabeludo e o nosso herói, vendo o ex-bancário João Lima ao longe pergunta ao Dácio: “Você conhece esse sujeito barrigudo com a sacolinha de frutas?” Cabeludo retruca: “Esse “fiduma” me fez passar a maior vergonha recentemente! Acontece que fui ao Banco da Lavoura pagar uma conta com urgência! Como a fila estava dobrando o quarteirão e ao ver o João chegando à boca do caixa, fui de mansinho e falei aos seus ouvidos: “Paga esse pepino para mim que é uma urgência”. O último prazo é às quinze horas de hoje!”.
Prosseguiu relatando: “O homem deu o maior esparro! Gesticulou, como um louco e disse: Você está doido! O pessoal da fila vai me crucificar!” Entregou-me de bandeja!
Em uma crônica publicada em jornal local, o saudoso médico, seresteiro e poeta João Vale Maurício fala de um diálogo que teve com alguém sobre o vetor do Mal de Chagas. No diálogo, o popular disse: “Fui picado por um barbeiro!” Maurício, esclarecendo, responde: “Barbeiro não pica. Barbeiro chupa!” Foi o bastante para que os oficiais barbeiros da cidade dessem o maior chilique!


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Por Raphael Reys - 2/8/2010 08:30:31
A Turma do Gibi
Nos bons anos 60 e 70, o bar do Haroldo, fincado na esquina das ruas Corrêa Machado e Melo Viana era o “point” da rapaziada. Muita cachaça curraleira, cerveja casco verde e os famosos PFs e tira gostos de galinha caipira. Além do caprichado tempero, o “molho” e as mandingas do mestre cuca, sempre atraíram muitos clientes.
Lá no bar, a galera pulava e se assanhava como uma farândola de diabretes, quando havia jogo de futebol entre Cruzeiro e Atlético. As turmas de torcedores rivais se peiteavam, mostrando faixas e cartazes com “slogans” alusivos à contenda, cantando refrões provocativos. Era o maior auê!
Dentre os personagens mais animados, se destacava o Tipuka. Tipo exótico, conversa arrastada, mãos tortas, corpo torto, parecendo cavalo de umbanda incorporado na "Escora". A bem da verdade, era cobra criada, um servente de pedreiro da turma do mestre de obras Roberto Pimenta, o maior 171 do pedaço. Esse criou fama como o mais esperto de Moc City. Dava uma de menino de creche para poder sobreviver.
Bem próximo dali e no passeio em frente ao Cine Ypiranga, trabalhava uma grande turma de engraxates com suas caixas características. Dentre muitos, Geraldo dos Beiços, Nego Tó, Luiz Pinguelo, João Finin, Artur Cegão, Carlai, e o memorável Nau Faquir, morto tragicamente no mundo do crime.
Como ferramentas de trabalho, pastas Nugett, escovas, flanelas e a tinta Fenomenal, usada para mudar a cor dos sapatos.
Por qualquer alegria ou fraco motivo baixava o santo na galera. Aí todos enchiam a cara, engrossando a turma dos torcedores do Atlético, no Bar Destak da carnavalesca Dona Linda e dos cruzeirenses, no Bar do Haroldo.
A galera daqui sempre foi muito criativa, unida, e como a alfabetização não chegou para todos os moradores da comunidade, apesar do progresso da nossa urbe, nasceu entre os freqüentadores dos bares e do cinema, uma escola sui gêneris.
A “alfabetização” era feita através do manuseio de revistas em quadrinhos e pela leitura dos que eram alfabetizados, com a memorização das falas dos personagens, textos e imagens pelos demais, surgindo, então, entre os aficionados por revistas em quadrinhos, a Turma do Gibi.
Clubes idênticos funcionavam também à porta dos cines Fátima, Lafetá e Coronel Ribeiro.
Como a didática ministrada à porta do cinema se dava com os participantes em pé na calçada, desenvolveu-se somente a leitura e não a escrita. Nessa galera, figuravam alfaiates, aprendizes, serventes de pedreiro, operários, mestres de obra e serviço, artesões.
Nessa fase a bela professora Estelita Cardoso moradora da rua Melo Viana, matriculou uma boa parte da galera na distante Escola Vila Telma. Funcionava numa tapera com paredes de adobe, coberta de folhas de coqueiro a luz de gás e o sacrifício era irem a pé à noite com quase uma hora de percurso. Conseguiu alfabetizar centenas de jovens do Bairro Morrinhos e adjacências. A diretora do educandário coberto de palha era Maria da Glória Xavier.
Todo sacrifício em prol da educação dos jovens!
Dentre muitos, Pacuí, Pipiu, Lika Alfaiate, Cláudio, Aroldin, Lianão, Marquinho Kiko, Zé Maria, Eustáquio Perneta, Padeça, Hildebrando de Zefira, Zeca de Dona Linda, carregando o botijão na bicicleta cargueira. Lá estavam, além de muitos outros não citados, traídos pela memória e a nossa lembrança.


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Por Raphael Reys - 31/7/2010 09:24:32
Pradinho da Serra

Mirinha Maciel, essa adorável filha de Figueira, é ariana acelerada e de uma figa. Pura energia cabeça, intelecto e memória privilegiados, coração universal e solto. Platônica, por aderência filosófica e a Simone de Boveauoir, por opção doutrinária.
Inovadora como ela só, construiu a sua Pasárgada tropical e a chamou de Pradinho da Serra. Logo se chamará Agrovila Uka Uka.
Montou esse oráculo na Chapada da Lagoinha, onde, surgindo do acaso, abelhas arapuás que irão se enrolar nos fios do cabelo, silvestres e embriagadoras cagaitas, “oromas” de panãs maduros, marmelada de cachorro enramado nas cercas, colônias de carrapatos ruduleros, grudados nas folhas do araçá e que se alimentarão do sangue de um pequeno ginete cor de burro fugido, que servirá para dar voltas em torno de um eixo.
Lá se acorda com o sopro do vento frio vindo da Chapada dos Pimenta, escutando miríades de trinados dos canários da terra, umas notas como as de um prelúdio de valsa, outras tão altas com tons na escala acima do dó central. Aqui, nesse Éden porreta e curraleiro, ela e os amigos, curtirão, numa boa, a sua merecida aposentadoria. E como a vida é bipolar, há de ser do jeito que Deus pediu e da maneira que o diabo gosta. Será um viver de rédeas soltas nesse mundo doido e sem cancelas...
Dividiu a sua terra em algumas chácaras e chamou os melhores amigos para fazerem parte da egrégora tropical. Alexandre e Maria, Miguel e Tânia, Buteco e Danusa, Virgínia de Paula e Tico Lopes, o artista benzefala da terra do pequi, entre os privilegiados. Virgínia já teve uma revelação mística no local e a sua parte vai se chamar Por (ou Esplendor) do Sol. Tico batizou a sua de Chácara do Tico Tico e foi justo e frouxo ali que recentemente caiu um meteorito!
O objeto cósmico veio com um rasto de fogo do Canadá até Moc City. A NASA diz que o fragmento é oriundo do planeta Capela, da Constelação do Cocheiro.
A galera da “Nova Era” já pintou no pedaço e já taxou o” lance da transação” de Altas Energias.
A dita Agência Nacional de Aviação em sua sapiência e malandragem ofertou (para quando for desenterrado o meteorito) ao Tico Lopes a bagatela de 200 mil dólares pelo “barato estrelar”. O nobre Tico e para desencargo de consciência, pensa em passar 20 por cento da bufunfa para sua protetora Mirinha Maciel, a matriarca do pedaço.
Com o restante da grana que veio na maior moleza irá montar uma trupe de músicos, tocadores, cantores, sapateadores de lundu. Será a “Tico Tico Lundu Company”. Farão uma turnê pelas cidades similares do mundo. Entre armas levarão na bagagem várias caixas de cachaça Viritatinha, requeijão de Salinas, farinha do Morro Alto, carne de sol dois pelos de Mirabela, pequi de Coração de Jesus e de Bocaiúva, levarão raiz de carapiá para dar cheiro no cigarro de palha.
Como proteção astral levarão patuás de Oxossi pendurados em cordão feito na Roda de Aruanda.
Começarão a excursão pelas cidades similares: de París - Patís. Londres - Lontras. New York - Nova Iorque. Japon - Japonvar.
Farei parte da trupe como cronista, conselheiro, consultor e como sou pedólatra (admirador de pés femininos), farei um estudo libidinoso comparando os pés alvos e delicados das filhas da Rainha com os pés rachados e escolados das "tomadeiras" de água do rio de Lontras.
No repertório musical da companhia e como atração maior, a música Rapariga do Bonfim, do excêntrico roqueiro Eltomar Santoro, o único artista montes-clarense que já foi abduzido (e devolvido) por extraterrestres!
Motivo: Eles não agüentaram a fubuia que o homem toma!


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Por Raphael Reys - 18/7/2010 09:46:50
Dois Ursos

Aqui na nossa romântica e preconceituosa Montes Claros, acontecem coisas de que até a Divindade duvida. Luiz Carlos Novaes, o Peré, editor do competente Jornal de Notícias, em sua sapiência jornalística afirma que faço parte da turma da Mocmenia. Ou seja, dos apaixonados pela história da nossa aldeia.
João Montes Claros, um fiel leitor, envia por e-mail a lembrança de um causo de Zé Mário, ou Zé Amaro e que era contado pelo gordo bancário Quitú Rosa.
Certa feita, em 1955, chegou a nossa urbe, uma parte desmembrada do internacional Circo Burney, o mesmo em que fora filmado “O Maior Espetáculo da Terra”, tendo Burt Lancaster como ator. Trazia como atração principal um dócil urso pardo de terceira geração circense. Ficou instalado na Praça Coronel Ribeiro, na época um descampado sem urbanização.
Fez a alegria da garotada e da população em geral, pois eram tiradas como lembrança, fotos de conterrâneos abraçados ao gigante bípede. Virou o chamego da ordeira população local e passou a ser chamado de “Papa Mel”. A chapa fotográfica, obtida como lembrança, era batida pelo nosso fotógrafo Coriolano Guedes.
Zé Amaro, como era "entrão" e próprio do seu feitio, rompante e agitado, furou a fila.
O momento único, clicado por uma Kodak visor plano, captava o cidadão abraçado à enorme barriga do colossal urso. Zé era tampa de binga, igualmente pançudo, extremamente agitado, falava gesticulando, gritando com voz metálica, gutural e cheio de interjeições e grunhidos. Acabou que o animal o confundiu com uma possível fêmea na versão tupiniquim e lhe sapecou um abraço acochado, dando-lhe um bafo quente no cangote...
Ficando a boca escura, o nosso barulhento herói comerciante de secos e molhados pulou fora. O urso, preso por uma enorme corrente de aço, fez um sinal com a mão chamando o Zé de volta aos seus braços peludos... Zé respondeu com os braços num gesto de “banana descascada” e pronunciou a frase que acabou virando moda na época:
“É Bebé! Mamar na gata você não quer, não é?...”
Já o internacional artista, nosso querido globetroter Tico Lopes, conta que o comerciante corjesuense Pedrim de Araujo, estava participando de uma pescaria às margens do rio Pacuí e comia uma feijoada original, daquelas que tem até prego de tábua de chiqueiro dentro, enquanto o seu folclórico cavalo Fenomenal pastava um bom colonião.
Pedrim tomava como guia uma boa cachaça......, quando surge em cena um enorme urso guarado, solto na larga da chapada. Corajoso e resoluto, Pedrim orelhou o gigante e falou grosso no seu pé de ouvido:
“Aqui não é sua região, seu bichão besta! Portanto dê o fora antes que eu te pele o saco e encha essa bocona de chumbo quente!...”




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Por Raphael Reys - 14/7/2010 13:27:44
ZÉ SARUÊ

Notório dono de boteco desta terra de Figueira nos anos 50 e 60. Construiu a sua história e fama em uma espelunca fincada no antigo prédio rococó do Mercado Municipal, onde hoje se encontra instalado o Shopping Popular. Tipo caucasiano, barriga proeminente, nariz de turco, andar apressado, afobado, galegado, glutão, destemido, olhar de gavião. Esperto que nem coelho, dormia com um olho fechado e outro aberto. Não despachava para o bispo e a sua filosofia de vida era trabalho, dinheiro no bolso e estamos conversados...
A casa era, ao mesmo tempo, bar, restaurante popular, guarda volumes, ponto de jogo do bicho, catira de objetos e jóias e no estrado de madeira posto acima do piso, como mezanino, um depósito, além de um quarto de aluguel para casais inflamados pela semântica libidinosa da roça. Ele jogava nas dez e batia com pau de dois bicos!
O PF servido em suas mesas era famoso pela suculência em gordura e temperos. Pimenta malagueta à vontade. Como o fogão era de lenha, sempre caia algum “picumã” do teto nas panelas. O que potencializava a rusticidade do prato!
Na área havia sempre uma morena popozuda por perto para fazer companhia a freguês nas mesas de bebidas e distrair o passante que sorvia uma cerveja Teutônia ou mesmo uma Pilsem casco verde. A cachaça, servida na garrafa arrolhada, era curraleira e deixava o usuário com as parietais pegando fogo. Quase sempre algum desavisado estando chumbado pelo álcool ingerido, caia ao solo quando descia os quatro degraus íngremes da porta de entrada. O Zé carregava o bebum para dentro, molhava sua cabeça com água fria, dava um copo de consomê e o botava para descansar em um canto. Ele era despachado. O negócio era prestar serviços, ganhar dinheiro e pronto. Não tinha coré coré!
Era comum ter em estoque e para vender, balas de todos os calibres, uma boa carabina Papo Amarelo, uma espingarda polveira para matar mateiro ou mesmo um treisoitão que o cliente comprava para pipocar algum desafeto por perto. Tinha uma visão apurada do futuro e como sabia das coisas da vida e conhecia o mundo e o submundo, tornou-se um conselheiro nato. Arranjava, sob encomenda, um advogado dos bons, um macumbeiro supimpa e mesmo um parrudo guarda costas...
Num sábado de sorte em 1965, joguei na sua banca do bicho e acertei a milhar 2376 na cabeça. Me ingrupiu no papo e como o montante ganho era bastante expressivo, alegou pouco capital de giro e levou quinze dias me pagando em parcelas até completar o total do prêmio.
Zé Saruê, a bem da verdade, aproveitou a minha grana e ganhou juros em cima, trocando cheques de pequenos valores e prazo curto dos comerciantes do logradouro.
Tudo o que caia na rede, para ele, era peixe, pois não dava murro em ponta de faca!


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Por Raphael Reys - 10/7/2010 11:17:55
A BANDA ROLÔ

No nosso Morrinhos tem de tudo! No mínino uma versão diferenciada de quase tudo. Tem coisas por aqui que até o próprio Criador duvida! Embora eu tenha o meu imóvel residencial a trinta e seis anos por aqui, só neste dezembro é que fiquei sabendo que aqui rola a Banda Rolô!
Para o cidadão afeito ao seu cotidiano de trabalho, vendo novelas na TV, falando mal do vizinho, tomando fubúia desdobrada e gritando Galo e Cruzeiro, a tal banda é um estigma. Um verdadeiro estado de espírito da galera local. Para fazer parte da banda o cidadão tem que fazer de tudo, ou quase tudo em matéria de conjunção carnal. Tem que traçar o que aparecer (como um condenado) tem que comer homem, mulher, fruta e às vezes até trocar. Esse é a temática dominante dos participantes. Afora a banda rolô e sua fuleiragem tropical, tem os personagens que vivem criando situações exóticas e aprontando presepadas. O notável Gasta Bala dava uma de lutador Shaolin na esquina da Melo Viana e encarava o saudoso percursionista Cí Baixim. Vacilou e levou uma porrada tão doida que veio a perder todos os dentes! A galera do Destak Bar se cotizou e pagou um par de dentaduras para ele. Aí o Gasta Bala de boca nova encheu o "toba" de fubuia, comemorando um gol do Atlético e gritava na porta de dona Linda: Galo... galo...! As próteses caíram no chão e um cachorro vadio abocanhou as mesmas e gramou o beco pela rua Melo Viana abaixo!
Doutra feita, o mesmo Gasta Bala indo para uma pescaria com a turma e estando liso, leso e louco surrupiou uma garrafada da sua vizinha. A toda hora mostrava a garrafa para a turma e dizia: essa é minha, vou beber sozinho! Não deu outra! Pegou uma disenteria braba acompanhada de expurgo de lombrigas tênia que saiam pelo nariz, boca, canal da urina e pelo anûs! A garrafada era um abortivo!
Zeca do Destak cozinhava uma panela de pressão de bucho e joelho de porco no seu bar, atendendo a sugesta de um jerico palpiteiro fechou a válvula da dita panela com cadeado para apressar o tempo de cozimento. Estourou tudo e os tira-gostos ficaram pregados no teto da espelunca! Aí a galera chegava pedia uma desdobrada e ficava olhando para cima esperando cair um naco de bucho...
Cí Baixim, que era flor que não se cheira, aplicou o 171 no capilé da Raimunda Paraibana com quem namorava. Alisou a valentona e caiu na gandaia gastando a bufunfa! A paraibana botou um revolver de brinquedo dentro da blusa para fazer o agá e cercou o Cí, no Beco dos Carijós. Batia no peito e gritava: sou mulher paraibana... Sou mulher macho.. Devolve-me o meu dinheiro... De tanto bater no peito intimidando, cabo do revolver saiu para fora e Cí sacando a sugesta aplicou na mesma um telefonema internacional nas orelhas!
Aí o Zeca foi para o desfile de carnaval na avenida com o quengo cheio de goró. O repórter que fazia a cobertura do evento televisivo o entrevistou: Zeca! Qual é o tema da Escola Destak para esse ano? Zeca em cima do pedido respondeu: O teimoso aqui é o Marquinho! Como esse ano ele não desfila está tudo calmo! Já o Vivi Peixe pirulitava na esquina da Melo Viana com Correia Machado altas horas bagunçando com um grupo e cheio de mé. Uma patrulha policial chegou e desmanchou a rodinha mandando todos irem para suas casas. Vivi fez que foi, entrou no Bar do Paixão, tomou outra e mostrando o dedo em riste para os policiais falou: aqui pró cês, óia! O comandante da patrulha bateu o coturno com força no chão gritando: pega ele!
Vivi ficou uma semana desaparecido! Gramou o beco e se escondeu no Alto Severo!


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Por Raphael Reys - 4/7/2010 15:49:13
O VALENTE E O CANÁRIO CHAPINHA

Nos anos 50, Montes Claros era uma urbe dominada pelo preconceito, boçalidade, subserviência religiosa e o coronelismo. A métrica dominante na psicologia dos habitantes era o critério subjetivo. Qualquer roupagem ou padrão desconhecido era imediatamente condenado.
Numa manhã, o lendário investigador de polícia Zé Idálio, fazia campana de rotina no pátio da Rede Ferroviária Federal. Passava a vista em possíveis passageiros desconhecidos que desembarcavam no terminal. Logo viu um cidadão bem vestido, sapato de pelica, chapéu de feltro e vestindo um colete de veludo sobre a camisa de linho.
Como essa peça de vestuário não era habitual por aqui, o chegante foi interceptado. Preso e conduzido à Delegacia de Polícia, que à época situava-se na rua Camilo Prates onde hoje se ergue o Fórum de Pequenas Causas. O cidadão ficou uma semana trancafiado com marginais. O motivo da detenção era o indefectível colete.
Viera de São Paulo para regularizar os documentos de um veículo adquirido inicialmente em nossa cidade.
Em 1955, o então governador de Minas JK veio à nossa cidade para campanha política. Hospedou-se no Hotel São José de Juca de Chichico. Logo irrompeu na praça Coronel Ribeiro uma passeata de estudantes do Instituto Norte Mineiro de Educação, fazendo o enterro simbólico do governador em represália pelo mesmo não ter cumprido anteriores promessas de campanha. Reivindicavam a instalação de geradores móveis para fornecimento de energia elétrica a nossa urbe. Ameaçavam entrar com a urna funerária simbólica porta adentro do hotel.
A passeata era capitaneada por Lazinho Pimenta, João Luiz de Almeida Filho e tendo como porta voz de desaforadas palavras de ordem o gordo bancário Quitú Rosa. O cabo Zé Idálio, valente e destemido como sempre, peitou a turba, manobrou o fuzil Mauser e fez disparos por cima da cabeça da galera, impedindo a invasão do hotel.
O capitão Coelho, comandante do Destacamento Policial local, em seguida e como complemento, efetuou uma rajada de metralhadora Iná 45 contra a parede de adobe do imóvel dos Pereira, numa demonstração de força, assustando o jovem político Edgar Pereira o mais agitado e empolgado da turma.
Em pânico, na correria que houve, Quitú Rosa gramou o beco e foi se esconder dentro de um grande forno de assar biscoitos. Como era gordo, ficou entalado e com o traseiro de fora e só a muito custo o livraram da incômoda situação, puxado pelo cabo Zé Idálio e mais quatro soldados. Uma cena digna de Fellini!
O lendário policial, hoje com seus 88 anos, firme que nem aroeira preta na queimada é morador da rua Melo Viana e meu vizinho aqui no bairro Morrinhos. Volta e meia sentamos à sua porta para relembrar histórias e causos dos nossos Montes Claros. Ele é um arquivo vivo, pois participou da maioria das tragédias de antanho acompanhando tudo como chefe de investigação.
No seu currículo policial consta ter feito papel, entre outros, de delegado de polícia e chegou mesmo a chefiar equipe de investigação da Polícia Federal em Belo Horizonte, dado à sua competência e destemor como profissional.
Certa feita, o meu ex cunhado o jornalista Leonardo Campos ofertou dez mil pratas por um conhecido e cobiçado canário chapinha do criatório do Zé. O dito pássaro brigador e campeão era originário da Bolívia. Fora adquirido em Araçuaí onde tinha status de cabeceira e cantador.
O Zé não vendeu o espécime ao jornalista, emboramente a vultosa oferta, alegando que estando a gaiola do canário colocada no corredor ao lado do seu quarto de dormir, nas cálidas manhãs era acordado por miríades de decibéis do trinado. O maravilhoso som entrava casa adentro, repercutia pelas paredes, fazendo elevar a alma e o espírito, num enlevo de pura poesia... Portanto, não o vendeu, pois o exemplar que inspirava e propiciava tanto encantamento não tinha preço, alegou, com toda razão!
Comentou, em seguida, que nenhum dinheiro do mundo compraria aquela pássaro que ensejava, diáriamente, um momento único de puro romantismo em contato com a natureza...
Não vale a pena deixarmos pelo caminho pedaços de nós mesmos. Afinal, o dinheiro paga mas não apaga a enorme falta que nos faz, além da angustiante saudade que nos deixa, tantas coisas simples, partes da nossa vida e que, eternas, são infinitamente mais importantes do que alguns trocados a mais...


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Por Raphael Reys - 30/6/2010 07:53:26
MONTESCLAREADAS XV

Montes Claros, terra de Figueira, cidade pólo, com seu centro comercial, educacional e referência em atendimento médico hospitalar. Por aqui se encontram representados e refletidos, ao vivo, todos os tipos humanos característicos da região Norte Mineira.
Nesta nossa semi-urbanidade, o campesino que chega veste as primeiras roupagens psicológicas no seu ego da roça.
Ao garimpá-los e retratá-los eles se tornam universais, pois, por aqui, no dizer do saudoso Deca Rocha, encontram o murrão da roça e a nossa curraleiragem.
Este nosso universo em microcosmo, tem desde o jurão até o capiau com cara (somente a cara) de besta. Do Loqui de chapéu, ao malandro vendedor de relógio micha. O fumador de cigarro de palha, que nada mais faz do que ficar imaginado um golpe no vizinho.
E como relata o atleticano doente Evandro Canzil, “tem contra-agá e agá-do-contra-agá”!
Tem até um clube de Pedólatras, ou seja, admiradores, aficionados e apaixonados por pés femininos, do qual tenho a honra de participar como “hors concours”.
Seguindo, pois, o dito de Gabriel Garcia Marques: “procuro na escuridão daquele baú sem fundo suas miudezas dispersas”, num garimpo dos tipos todos eles imprescindíveis que por aqui afluem.
Informa-nos o indefectível galã e conquistador do Quarteirão do Povo, Paulinho Relojoeiro (que recentemente retornou a Moc City vindo do Maranhão onde está montando empresa), que nas cercanias da sua terra natal, Mato Verde, tem um político folclórico.
Discípulo da Escola Georgiana Curraleira e sendo candidato a um cargo eletivo, foi fazer um comício politiqueiro no povoado de nome Bonito. Lá chegando, não encontrou como era de se esperar o palanque armado, pois a oposição sabotara.
Seguindo linhas traçadas que levam ao uso do alheio, uma praxe na classe, apanhou na moral dois tambores metal de 200 litros que se encontravam em uma carroça de carregar água e sob a guarda de um filiado da Santa Federação dos Carroceiros Mato-verdenses.
Armou o seu palanque atravessando sobre os tambores uma tábua de bom tamanho servindo como piso e iniciou o seu discurso sofístico, cheio de Agamenon e picaretagem tropical. Não deu outra! A galera curiosa que havia chegado foi saindo de fininho. À francesa.
Ao terminar o seu papo furado coletivo, a platéia estava reduzida a uma só pessoa. Chateado com o ocorrido, o discípulo de Górgias comentou com esse paciente e único assistente “que aquele povo não sabia prestigiar quem merecia”.
Ato seguinte, agradeceu a “vítima” pela presença. Para sua surpresa, o recém elogiado ouvinte respondeu, calmamente: “eu estava era esperando terminar o seu papo furado para levar de volta os meus tambores de apanhar água que o senhor apanhou e usou sem pedir permissão.
E temos dito!


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Por Raphael Reys - 22/6/2010 07:59:15
MONTESCLAREADAS XIV

“Depois de escrita a história, vale pelo que parece e não pelo que foi...” - Rachel de Queiroz.

Falando ainda de mandingas, ebós e macumbarias, me vem à recordação certo sargento de milícias aposentado da nossa urbe, meu amigo. Filho de santo mal resolvido aproveita o que aprendeu de magia para aplicar o 171.
Ele faz as suas rezas bravas e engana de Raimunda a todo mundo, principalmente os comerciantes locais. Como sou conhecedor da malandragem no trecho e para provocá-lo, perguntei se ele ainda estava na ativa com as forças escusas do além.
Fingindo não ter me escutado convidou-me a lhe fazer companhia até um açougue próximo à Praça de Esportes. Lá chegando, instruiu-me a prestar atenção enquanto ele entrava e com rezas iria sumir da vista. Cegaria o açougueiro e daria o cano na casa. Abri bem os olhos e pude ver quando ele desaparecia como se houvera entrado por trás de uma porta invisível.
Levei o maior susto e me arrependi em ter feito a brincadeira de mau gosto. Suei frio pelo impacto em mim produzido. Passaram-se cinco longos minutos e ele, da mesma maneira como desapareceu, voltou ao meu campo visual dando uma risada de ironia e môfa!
Trazia nas mãos duas sacolas contendo carne bovina e algum dinheiro em espécie. Ato seguinte, falou: “Você duvidou de minhas rezas. Aí está uma sacola com cinco quilos de carne para você. De quebra, tomei do açougueiro zuretado cem reais. Vou te dar cinqüenta”.
Fiquei perplexo e constrangido ao mesmo tempo e pedi desculpas por minha ironia. Devolvi a carne e o dinheiro, já que aquilo contrariava os meus princípios cristãos. Em seguida, perguntou-me “se estava de bom tamanho”.
O Romãozinho tem os seus protegidos e afilhados. Não se pode confiar em nenhum marmanjo hoje em dia
Não demorou tempo e nos encontramos, dessa vez na Praça Doutor Carlos, quando ele me apresentou outro seu igual, que com ele andava. Um baiano que está sempre por aqui fazendo mandingas e sustentando “demandas” para políticos.
O dito para se divertir faz filtros de encantamento, ou filtros de amor como são chamados para conquistar e levar para a alcova beldades suburbanas da nossa cidade.
Daí o meu aviso de advertência aos maridos, namorados e amantes, vítimas dos Ricardões amigos do além. Antes de culpar a sua amada pela triangulação, procure averiguar se ela não é mais uma das vítimas dos encantamentos e filtros de amor do “pé de pano” macumbeiro.
Para encerrar a crônica com chave de ouro, vai aí o meu conselho de conhecedor e iniciado, pois sou mestre em ciências ocultas e letras mal traçadas: Sei de um feiticeiro que atende nas proximidades da Rocinha e que vende Flamalial a quem interessar possa.
Os pequenos e diminúsculos entes, usados para fazer magia, são fornecidos aos compradores acondicionados dentro de um pequeno vidrinho com tampa de borracha. Daqueles encontrados antigamente em farmácias contendo penicilina. Lembram-se deles?
Aviso aos meus fieis leitores: Se alguém chiar na rampa e botar em dúvidas a minha informação e dicas é só me falar que abrirei a caixa de segredos e darei nome aos bois, ou seja, os seus habituais compradores. A missão do cronista é ver e relatar.
Para se livrar da ação desses mandingueiros tupiniquins, faça preces de esconjuro e se apegue ao seu santo de estimação. Cruze os dedos e diga: “Signo de São Salomão três vezes me livre dos catimbozeiros”!




Selecione o Cronista abaixo:
Avay Miranda
Iara Tribuzi
Iara Tribuzzi
Ivana Ferrante Rebello
Manoel Hygino
Afonso Cláudio
Alberto Sena
Augusto Vieira
Avay Miranda
Carmen Netto
Dário Cotrim
Dário Teixeira Cotrim
Davidson Caldeira
Edes Barbosa
Efemérides - Nelson Vianna
Enoque Alves
Flavio Pinto
Genival Tourinho
Gustavo Mameluque
Haroldo Lívio
Haroldo Santos
Haroldo Tourinho Filho
Hoje em Dia
Iara Tribuzzi
Isaías
Isaias Caldeira
Isaías Caldeira Brant
Isaías Caldeira Veloso
Isaías veloso
Ivana Rebello
João Carlos Sobreira
Jorge Silveira
José Ponciano Neto
José Prates
Luiz Cunha Ortiga
Luiz de Paula
Manoel Hygino
Marcelo Eduardo Freitas
Marden Carvalho
Maria Luiza Silveira Teles
Maria Ribeiro Pires
Mário Genival Tourinho
montesclaros.com
Oswaldo Antunes
Paulo Braga
Paulo Narciso
Petronio Braz
Raphael Reys
Raquel Chaves
Roberto Elísio
Ruth Tupinambá
Saulo
Ucho Ribeiro
Virginia de Paula
Waldyr Senna
Walter Abreu
Wanderlino Arruda
Web - Chorografia
Web Outros
Yvonne Silveira