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montesclaros.com - Ano 25 - terça-feira, 24 de dezembro de 2024
 

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Mensagem: Texto lido por Ruth Tupinamba no final da missa, realizada na ultima sexta feira, e que, abriu as comemorações do centenário de sua irmã Felicidade Perpétua Tupinamba:

Felicidade Perpétua Tupynambá, nasceu em Montes Claros, no sobrado na Praça Dr. Chaves, ao lado do Centro Cultural Dr. Hermes de Paula. Lá ela passou parte da sua infância em casa dos avós.
Fez o Curso Primário no Grupo Escolar Gonçalves Chaves e o 2.º grau (curso de magistério) na Escola Normal Oficial de Montes Claros a 1.ª da nossa cidade.
Com o diploma nas mãos, começou sua vida de professora, lecionando pela 1.ª vez na cidade de Pedra Azul no Norte de Minas.
É estranho, que ela se desloque de Montes Claros, para tal fim, numa época em que não existiam estradas nem transportes confortáveis. O mais cômodo era a boléia do caminhão, era como ela viajava.
Este sacrifício ela fazia porque queria lecionar o que na nossa cidade era difícil. Só possuía um Grupo Escolar era o Gonçalves Chaves, as vagas eram difíceis. A cidade era governada pelo “Coronelismo”, e só nomeava a professora da sua política, isto dificultava para as outras que não “bajulavam” os coronéis.
Lá em Pedra Azul ela ficou durante 3 anos e voltando para Montes Claros, bem mais tarde, lecionando na Escola Normal Professor Plínio Ribeiro, Colégio Imaculada Conceição, Instituto Norte Mineiro, Colégio Diocesano, dando aulas de Educação Física, Artes e Sociologia, aposentando-se depois de 30 anos de magistério.
Felicidade era uma mulher extremamente bonita, muito educada, elegante uma perfeita “Lady”.
Era uma pessoa alegre, gostava de cantar, dançar, declamava muito bem, o que acontecia em todas as festas e reuniões onde ela estivesse presente.
Naquela época em que as mulheres eram totalmente submissas, com uma educação rigorosa acreditando que a única finalidade da mulher era apenas casar, criar filhos, cuidar da casa e do marido, a Felicidade já tinha outro pensamento, outra visão, sentindo que a vida não se resumia só nisto, queria galgar outros horizontes, com outras oportunidades. Por isto foi a primeira mulher aqui em nossa cidade que ocupou um cargo numa repartição pública. Admitida na Prefeitura Municipal de Montes Claros, ficou 30 anos como Secretária. Passou por 11 Prefeitos chegando até a “despachar pedidos e dar autorizações” quando os mesmos se ausentavam.
Além do seu cargo na Prefeitura coordenava todas as Escolas Municipais, orientando as professoras pois naquela época eram todas leigas (não possuíam diploma) e muitas sem traquejo social e sem prática de magistério.
Além disto era responsável por todos os eventos sociais e políticos da Prefeitura e também da cidade.
Não existiam os “bufês” particulares (que tanto facilitam) naquela época e a Felicidade tinha que “se virar” organizando as recepções do momento, banquetes para “200 ou mais talheres”.
Tudo isto ela fazia sem reclamar, com a maior boa vontade, esforçando-se para que tudo corresse maravilhosamente e que a nossa cidade (pobre, escura, e sem verbas governamentais) não decepcionasse as “visitas importantes” (políticos) que vinham a nossa cidade para aumentar o prestígio e angariar votos nas vésperas de eleições.
Felicidade se desdobrava, até hospedagem tinha que providenciar (não existiam bons hotéis) indo de casa em casa procurando alojamentos para as importantes comitivas.
Mas ela era carismática e com a sua educação e diplomacia tudo se arranjava.
A característica principal da sua personalidade era ajudar a quem precisasse, fazendo os maiores sacrifícios e assim ela viveu até os 90 anos.
Pertencia a Academia Montesclarense de Letras como sócia efetiva e secretária onde prestou relevantes serviços, sempre ao lado da Presidente Yvonne Silveira procurando resolver todos os problemas.
Escrevia para Jornais e Revistas de nossa cidade e da nossa Capital, com grande sucesso, ajudando e prestigiando várias entidades sociais da nossa cidade.
Nunca se casou, embora fosse muito cortejada , tendo vários namorados e até noivo, mas ela queria mais era ser livre.
Em casa era excelente filha, adorava sua família, ajudando em todos os problemas financeiros e sociais, e a melhor irmã que Deus já produziu, dando assistência constante a todos os sobrinhos como se fossem seus próprios filhos.
Confesso que ela tinha uma preferência por mim. Por ser eu a caçula sentia-se na obrigação de orientar-me e proteger-me e assim sob a sua sombra eu vivi muitos anos e desta convivência, tirei as melhores lições de vida, e jamais a esquecerei, em qualquer parte que eu esteja, ou melhor, que eu viva!
Se ela ainda vivesse completaria, hoje 100 anos; 100 anos de lutas e glórias!
Pena que ela aqui não esteja para ver a grandeza e o progresso desta cidade que ela tanto amou e a ela dedicou tantos anos de sua vida.
Resta-nos rezar por ela, única maneira de agradecê-la por tudo que fez durante sua existência.
Agradeço ao Colégio Imaculada Conceição na pessoa da Irmã Dulce que prontamente nos proporcionou esta missa nesta Capela e ao Padre João Batista que a celebrou.
Agradeço também ao Conservatório Lorenzo Fernandez, abrilhantando esta missa com o magnífico Coral.
Agradeço a presença de todos amigos e parentes de Felicidade Perpétua Tupynambá.

Poesia de Yolanda Fonseca lida no final da missa comemorativa do centenário de Felicidade Perpétua Tupynamba. Em vida, ela adorava declama-la.
Buena Dicha
Yolanda Fonseca
E a cigana falou
Fitando as minhas mãos:
“Tens um bom coração
Um coração capaz de sentimentos nobres
Que não faz distinção entre ricos e pobres,
Compreendes?”
Compreendo sim, pode continuar
Ela sorriu de leve e tornou a falar:
“És orgulhosa e, concentrada também
Não gostas de dizer o que sentes a ninguém.
Embora, tenha sempre um riso de prazer,
Vejo que em tua vida existe muita mágoa contida
Que ninguém pode ver
Gostas de divertir, gostas de distrair
Mas seu coração é sempre triste
Compreendes?”...

Ai de mim e compreendo sim,
Mas não diga o que eu sou
Porque o que sou bem sei
Dia o que eu serei?...

Ela fitou em mim
Os seus olhos misteriosos
Olhos maravilhosos
Inundados de luz
Nas sombras das olheiras.
E minhas mãos tremeram
Em suas mãos trigueiras
E de novo falou:
“Eu vejo , vejo alguém
Um bonito rapaz
Que te quer muito bem
Com ele ás de casar,
Terás honras, glórias, carinho
Tudo que a vida encerra de beleza
E terá cinco filhinhos
Nesta ventura sem par
À sombra deste amor viverás
E sorriu a dizer:
Sorte bonita ...”
Mas a cigana mentiu
Nunca amei ninguém
Nem nunca houve alguém
Que me quisesse bem
Por isso hei de viver sempre
Sem amor, sem glória , sem carinho
E quando for velhinha
Não terei netinhos
A quem contar histórias
Oh! Era uma tarde linda
Eu bem me lembro ainda
Havia uma cigana
Era uma cigana linda
Mas muito mentirosa...

(N. da Redação: Ruth Tupinambá Graça, de 94 anos, é atualmente a mais importante memorialista de M. Claros. Nasceu aqui, viveu aqui, e conta as histórias da cidade com uma leveza que a distingue de todos, ao mesmo tempo em que é reconhecida pelo rigor e pela qualidade da sua memória. Mantém-se extraordinariamente ativa, viajando por toda parte, cuidando de filhos, netos e bisnetos, sem descuidar dos escritos que invariavelmente contemplam a sua cidade de criança, um burgo de não mais que 3 mil habitantes, no início do século passado. É merecidamente reverenciada por muitos como a Cora Coralina de Montes Claros, pelo alto, limpo e espontâneo lirismo de suas narrativas).

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