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Mensagem: Quebrando a escrita Tião Martins - Jornal ´Hoje em Dia´ Cronistas diários (e mesmo os semanais) queixam-se com frequência do trabalho insano que é produzir textos e mais textos, que o jornal vai engolindo na espantosa velocidade com que o nosso tempo mastiga tudo que é vivo. Fácil não é, mas até na loucura diária há uma recompensa. A obrigatoriedade de oferecer ao leitor um estímulo que se renova a cada dia leva o escriba a refletir sobre temas que, não fosse isso, passariam em branco. Em outras palavras, a escrita obrigatória não só traduz reflexões anteriores, mas também abre a cabeça do próprio autor para outras realidades. O comentário vem a propósito de um texto recente da médica Mara Narciso, que vai cedendo cada vez mais à tentação do jornalismo e garimpa, nas ruas de sua cidade, Montes Claros, temas que são universais e despertam o interesse tanto de um japonês de Tóquio quanto de um baiano de Jequié. A doutora Mara, se vocês já não se lembram, voltou à escola para ser jornalista, sem deixar de lado o ofício no qual se especializou. Ela dá a impressão de que, entre um paciente e outro, encontra tempo para olhar em volta e, sem perder a ternura, analisar o que existe no fundo dessa fonte inesgotável de tolices que é o ser humano. Percebe-se que a opção pela escrita, como forma de expressão, vai ampliando a cada dia o seu interesse pelo mundo em volta e sua capacidade de retratar o ridículo de certas atitudes. No texto mais recente, a doutora critica o exibicionismo de indivíduos que, sendo vazios por dentro, dependuram títulos e diplomas no pescoço e no peito, como se fossem medalhas de honra. E assumem a postura que imaginam ser obrigatória em portadores de um “emibiei” ou de um “peagadê”. A simples visão de um desses indivíduos, apanhado em flagrante de exibicionismo ao atravessar a rua, no inverno escaldante de Montes Claros, leva a doutora Mara a refletir sobre a insuperável vaidade humana, as diferenças e os preconceitos de classe e a pobreza de certos “valores sociais” que encantam algumas pessoas. Amados e odiados quando aceitam integralmente esse papel, um dos primeiros deveres do jornalista, em qualquer sociedade, é desmistificar falsas autoridades, rasgar a fantasia dos poderosos do dia e revelar que tanto os reis quanto os nobres estão nus. O carinha enfeitado de diplomas que a doutora Mara viu passar em Montes Claros pertence à mesma família espiritual do mestre da Sorbonne que não conversa com os alunos, do general que sobe nas dragonas para humilhar o tenente e do filhinho do papai que pergunta ao policial se sabe com quem está falando. Todos eles são irmãos de alma dos políticos corruptos, dos delegados espancadores e dos leões-de-chácara das boates. Esses tipos humanos (humanos?) envergonham a humanidade e nos dão vontade de sermos um cão, um gato ou um sabiá, bichos mais bonitos e civilizados. Tomara que a doutora Mara continue a identificar e denunciar os babacas de Montes Claros, que são iguais aos de Brasília, Washington ou Paris. Escrever é quebrar essa escrita, que chegou ao Brasil há mais de 500 anos, imperou solta no regime militar e ainda é cultivada por idiotas de todas as idades, com ou sem diplomas, com ou sem cassetetes, com ou sem fuzis.
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