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montesclaros.com - Ano 25 - terça-feira, 24 de dezembro de 2024
 

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Mensagem: A MOEDA ÁRABE

Só vim a conhecer o Cônego Murta de perto, recentemente. Aconteceu em uma reunião do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros. Após a alegria do contato mais próximo pude me deliciar com seu bom humor, a sua verve, sua alma doce, muito característica dos piscianos e dos Mahatmas.
Ao terminar a seção solene da Academia, o chamei à parte solicitando a sua grata atenção. Propus conversarmos sobre a Divina Comédia de Dante Alhigiere, esse livro de cabeceira da humanidade, tomando como referência uma sua recente palestra abordando o tema.
No seu relato, confidenciou-me o tempo em que era noviço, quando mergulhou no estudo da obra do mestre italiano. Para que melhor se apercebesse da alma do escritor, aprendeu a ler, escrever e falar em dialeto sarraceno, visando a autenticidade do estudo que tencionava fazer sobre os originais da obra.
Já ordenado como padre, continuou os estudos da métrica dantesca e chegou mesmo a decorar a obra no original e na versão em português. (Declamou, na ocasião, os versos da abertura do livro primeiro, “O Inferno”). Disse-me que caminhando pelos corredores do convento ia declamando à baixa voz o primoroso texto.
Passou a visualizar num exercício mental, na tela da memória, o agitado cotidiano medieval, religioso e político do século XIII, em Florença. A sua alma desatrelada do ego viajava no místico universo intelectual e iniciático de Dante. Do Inferno, passando pelo Purgatório rumo ao Céu da divina Beatriz.
No seu relato, confidenciou-me que ficou tão maravilhado com a genial obra literária, principalmente pelo crescimento intelectual e mesmo espiritual que a mesma proporcionava, que os seus superiores, de tanto vê-lo constantemente debruçado sobre o texto, julgaram que o então noviço Murta estava padecendo de um desequilíbrio mental e chegaram, até, em pensar numa internação para tratamento...
Nessa jornada intelectiva o nosso saudoso Cônego Murta atravessou o Rio Letes a bordo do barco de Caronte, andou no bosque escuro com Dante, trocou idéias com o divino poeta Virgílio e teve a graça de contemplar Beatriz no céu superior!
Convidei-o para fazermos um “tête à tête”, um debate privado em que me daria a sua opinião como intelectual e como espiritualista, especificamente sobre uma passagem do Livro II, (O Purgatório), em que se trata da parábola da Moeda Árabe que, caída na lama, ao ser lavada volta ao seu estado de pureza original.
Nessa passagem, numa difícil fase dos estudos iniciáticos, Dante trata da “instrumentalidade da alma” como veículo para se fazer cumprir a Vontade Divina. Aparentei inocência ao fazer tal proposta, procurando extrair dele sua opinião e as suas conclusões sobre os “mistérios” da monumental e eterna obra de Dante.
Cônego Murta se afastou um pouco para melhor me observar por sobre seus óculos, me olhou fundo dentro dos meus olhos e respondeu:
- Sei, perfeitamente, até onde o senhor quer me conduzir! Faremos o debate, mas o advirto que não sairei dos preceitos teológicos da Igreja. O senhor anseia me levar a um raciocínio esotérico e iniciático. Serei católico, sem prejuízo de ser um intelectual e filósofo!

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