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montesclaros.com - Ano 25 - segunda-feira, 14 de outubro de 2024


Oswaldo Antunes   
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Por Oswaldo Antunes - 17/11/2011 20:10:58
O prefeito Luiz Tadeu Leite não está enganando ninguém: disse, bastante  claro, varias vezes, que vai vender da Praça de Esporte tantos metros quadrados quantos forem necessários, em troca de um estádio de futebol para l5 mil pessoas,  teatro poli mídia para 500 espectadores, terminal rodoviário urbano e mais alguns itens menores. Salvo seja, nem sequer o Ministério Publico, encarregado da vigilância sobre a propriedade e uso dos bens públicos, poderá alegar não ter tido ciencia, caso haja alegação de cessão se fazer em beneficio de candidatura política que se avizinha, de partido político ou alguma irregularidade que possa ser  apurada.
Diante disso, pode-se ter a certeza de que pelo menos metade do logradouro perderá sua finalidade inicial, necessária, e de características consideradas históricas e protegidas.
Mas vejamos, quanto custaria a construção de um estádio de futebol, o Moção: ele não será talvez, bastante menor e poderá custar a décima parte do preço da construção do estádio do Corintians paulista. Esse estádio foi  orçado em 500 milhões de reais, valor a ser reajustado. A décima parte, dez vezes menos, seria 50 milhões de reais o custo do Mocão. Um teatro multimídia para 500 espectadores, cujo preço está avaliado em 7 milhões e quinhentos mil reais, não ficará por menos de 10 milhões. Terminal rodoviário urbano que seja planejado para resolver problemas do transito, se bem estudado e planejado implicará em desapropriações que  podem chegar a um custo  igual ou maior.
Mas fiquemos  por enquanto nos 70 milhões de reais supostamente necessários. Será preciso, para obter tanto dinheiro, vender pelo menos 17.500 metros quadrados da Praça de Esportes, se o valor do metro quadrado, ali, for de 4.000 reais, como anunciado. A rua, a ser aberta ligando as duas avenidas do entorno e permitindo o funcionamento do shopping,  se for de 5 metros de largura, com mais 4 de passeio, tirará da área de lazer mais, aproximadamente, novecentos metros. Fazendo uma conta redonda: de 32 mil metros quadrados, que é a área total da Praça de Esportes, seriam retirados quase ( ou mais, ninguém pode saber) 19 mil metros quadrados.
Parece-me, entretanto, que O Prefeito Luiz Tadeu Leite não precisa abrir mão de mais esse sonho diante desses cálculos, que podem ser considerados pessimistas. Bastaria encontrar outra solução, e vejo uma, não só ao alcance, mas mais benéfica para a cidade e o povo montes-clarense. Porque não pensar em negociação com a Associação Desportiva Ateneu, para a cessão do seu estádio degradado, e transformação dele em um grande shopping, além da realização de outras miudezas. O que o Ateneu lucraria com essa iniciativa pode ser estudado sob vários modos de contrato judicial. Entre eles, a transferência do uso-fruto e administração do Mocão, por um determinado lapso de tempo, paara os atuais proprietários do estádio abadonado..
Os males causados pelo abandono do campo do Ateneu estão pedindo providencias urgentes e também criativas, como é a idéia do Prefeito Luiz Tadeu. O local virou valha couto e refugio de criminosos. Pasmem os que não conhecem o problema: o policiamento ali, quando necessário, apesar de ser pleno centro da cidade, somente pode ser feito de helicóptero. Por isso não é feito. .
Assim, os benefícios pretendidos com a cessão da Praça de Esportes seriam conseguidos com a eliminação de muitos problemas. E tudo poderia ser feito com a presteza necessária, sem correria, sem criticas, sem celeuma.
Só aplausos para um grande tento da Prefeiura.


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Por Oswaldo Antunes - 1/5/2011 10:16:30
Morte, estágio de energia

Oswaldo Antunes

A passagem do industrial mineiro José de Alencar pela vida publica foi curta: durou o tempo de se constatar no seu organismo uma enfermidade que o levaria à consumação. Antes, não participou de política partidária. Saiu, corajosamente, de cargos na classe empresarial, para eleger-se senador e logo depois Vice Presidente da Republica. Mereceu ser apontado como exemplo de vida produtiva, e sob os holofotes da curta vida publica, mostrou a possibilidade de viver sem temor. Esse aspecto predominou na admiração de seu comportamento. Mas, tão importante quanto não a temer foi a postura de falar da morte próxima com naturalidade e até bom humor. Não teve a preocupação de esconder a morte em um momento de justificável culto à beleza da juventude e suas esperanças de desfrutar a vida, principalmente com os avanços dos conhecimentos científicos. Talvez nunca antes na sociedade moderna se tenha evitado tanto o tema obrigatório da morte biológica. Evitado, ignorado e negado por uma equivocada cultura religiosa. E, por conseqüência, a velhice passou a ser, inclusive com leis especificas de proteção, um estado especial, um estagio a ser temido. Fomos ensinados a temer o após morte e sofremos as conseqüências. Todas, ou quase todas, as religiões apontam a inevitável fase terminal de mutação do ser vivo como possibilidade de outra vida de acerto de contas. O teólogo Leonardo Boff publicou no jornal O Tempo, não faz muito tempo, um artigo que, bem refletido, sugere o que vem a ser o desconhecido pós-morte. “Não existe matéria, tudo é energia” – mostrou como a ciência chegou ao átomo, do átomo às partículas subatômicas e aos feixes de onda, até encontrar a energia de fundo, o vácuo quântico, que os cientistas consideram a fonte e origem de todos os seres. A ser essa a imaginável e mais aceitável metáfora daquilo que significa Deus, a noção de como seria a presença e atuação de Deus no mundo está pedindo uma revisão. O que modificaria a visão do pos-morte e fariam mais benignos os conceitos e significados de morte, céu, inferno, juízo, culpa, pecado e outros da arquitetônica clássica da teologia. Não é suficiente constatar que esses conceitos são fruto de uma pura e simples metafísica aristotélica-tomista. Porque desde muitos séculos o remorso por culpas inexistentes, o medo de um juízo final mal entendido, com pagamento eterno pelo pecado de viver um átimo da eternidade, fazem o homem temer e evitar o tema final de sua volta à origem divina e absorção pela energia que tudo cria e renova. A noção mais benigna de Deus com aceitação, para a trajetória do homem, das leis que regem o universo cósmico, talvez seja o melhor caminho para se chegar ao inevitável que, ao ser escondido e negado, provoca medos e insegurança. E não há porque temer a volta ao ponto de partida.
Cidade: Montes Claros/MG
País:


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Por Oswaldo Antunes - 27/4/2011 10:43:26
A MIDIA E O CRIME

Oswaldo Antunes


Há alguns anos, os órgãos de comunicação constataram que o numero de suicídios estava ligado à divulgação dos casos ocorridos. Decidiram não fazer a divulgação desse tipo de morte e os suicídios diminuíram. Porque os suicidas eram simplesmente imitadores.
No crime imotivado essa capacidade de imitação é incontrolável. As chacinas são sempre sem motivo justificável; o seu fim ultimo é, também, o suicídio, acrescido geralmente do desejo de notoriedade pos-morte.
Massacre de crianças inocentes não tinha registro no Brasil. Chegou, e com sintomas de repetição que refletem influencia do noticiário sensacionalista e repetido.
Embora a sociologia criminal advirta que não se deve divulgar sequer o nome do individuo que comete esse tipo de crime, no caso de Realengo viu-se o contrario: o criminoso ficou famoso após a morte, até com repercussão mundial. E a iniciativa de atender o desejo criminoso foi da própria policia, com pericias técnicas que obtiveram e propagaram fotografias mórbidas e relatos macabros. Até filmes que ensinam matar e depois morrer foram mostrados.
Mas a policia não conseguiria esse mal sem a colaboração da imprensa. Longe a intenção de ferir a liberdade de informar, mas é preciso dizer que é agora o momento de encontrar o modo correto de noticiar casos como esse, caso venha a repetir-se. Encontrar o modo de dar a noticia sem causar conseqüências subliminares, aquelas que atingem indistintamente e se estratificam no inconsciente coletivo.
A midia, mais do que direito, tem o dever de ensinar. Mas não, ensinar a cometer crimes. Não, mostrar aos criminosos em potencial o caminho da justificação de delitos sem motivo. Não, incentivar a falta de controle, porque massacre de inocentes é ato incontrolável por ser também um ato de suicídio. É verdade que a internet foi envolvida; mas ela só não daria a desejada notoriedade após a morte que teve o monstro de Realengo.
Há ainda que pensar em uma possível concatenação dos alardeados e falsos motivos com o uso de drogas. Alguns dias após o massacre esteve em evidencia o pânico ocorrido na cidade mineira de Divinópolis, quando um adolescente de 17 anos, usuário de drogas, (a informação é de sua própria mãe), viu um programa de televisão que falava do assassinato coletivo e manifestou a intenção de praticar o mesmo crime na cidade onde mora. Ele repetiu exatamente o que viu e ouviu no noticiário: “Eu vou pegar um revolver, matar um tanto de gente e depois me suicidar”.
A sociologia criminal é ciência recente, nascida da influencia do meio social sobre a prática delitiva. Ela afirma, de modo até certo ponto pessimista, que não existe sociedade sem crime quando interesses sensacionalistas são acolhidos e propagados. A mídia ajuda a formar um viés coletivo de agir e pensar que deve ser bom, mas pode não ser a cada momento do tempo. Seu poder é imperativo e coercivo, maior do que se imagina ao ler uma noticia.


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Por Oswaldo Antunes - 10/3/2010 17:38:16
Do livro "A Tempo":

CALAR ANTES DO FIM

“Felizes por não sermos excessivamente felizes; no barrete da Fortuna, nós não somos o botão.” Shakespeare

Episódios mais poderiam ser relembrados se fosse prudente ampliar o espaço dos rascunhos e o tempo a ser cobrado de possíveis leitores. Prevaleceu o propósito de torná-lo menos enfadonho. A quem interessar, pode ser uma cozinha de jornal em que os assuntos são tratados sem muito raciocínio, ao sabor do tique-taque das máquinas, das conversas e interrupções costumeiras. Poderá satisfazer a curiosidade dos filhos, dos netos e de quem se interessar pela história da família e de sua influência na vida obscura de uma imprensa considerada menor. Resta dizer com findou o sonho de jornalismo quase utópico exercido pelo O JORNAL DE MONTES CLAROS - casa que abrigou a inconformidade dos homens e mulheres que precederam, acompanharam ou antecederam o jornalista, fora e dentro da cadeia dos relacionamentos de origem familiar. E dizer, no fim, o que seria mais apropriado no começo:
- Vim cumprir o meu destino, não vim mandado.
Vadim foi jornalista na conta imprevisível do tudo e do nada. Aceitou grande peso nos ombros mercê de um idealismo talvez insensato, mas também como animal ferido por obsessões ancestrais. Ao atender o pedido dos filhos, do modo como pôde, desaponta-se ao perceber que as brumas do Mistério não foram afastadas nem resolvidas.
A sabedoria mostra tempos de plantar e de colher; há também tempo de prosseguir, assim coma chega o tempo de parar. Fecunda estação da vida havia, circunstancialmente, chegado ao fim para o jornalista, na direção do seu JORNAL. Culpas pelo aparente insucesso? Se houve, não as procura. Sabe apenas que fluiu a quadra propícia, madurou o gesto de resignação. Era já impossível reter nos dedos, embora ainda firmes, a chuva ou a areia, agora soprada pela procela que mudou rumos e impediu a continuidade no velejar. Ante a vontade instintiva de prosseguir na vocação, restava o consolo de haver combatido sem pieguice - como fez o grande mensageiro -, acrescentando, entretanto, não ter a espada perdido o gume, pois apenas se embainhou.
Os sonhos passariam a ser lembranças, dariam vida a coisas inanimadas. À velha prensa Aluzet de Rui Barbosa, de êmbolos e roldanas diariamente lubrificadas que garantiu, durante anos, a circulação do Jornal. Tão submissa e eficiente, parecia velha amiga, adquiriu a personalidade das coisas que se animam na imaginação. Tinha alma feita de ferro e sangue. Mas se tornara obsoleta, por ser sua impressão em plano e o municiamento manual. Para agilizar a tiragem, o jornalista tentou um passo à frente e errou.
Em vez das máquinas em offset e composição pelo processo eletrônico, já recomendadas, optou por impressora tipográfica semi-automática, máquina insubmissa e sem alma; permaneceram também as muitas e pouco eficientes linotipos. A composição computadorizada, incipiente no interior do Estado, provocava o receio de faltar assistência técnica quando se fizesse necessária. Esse erro de diagnóstico levou ao agravamento da crise anginosa e ao sufoco. A feição gráfica, antes razoavelmente boa, perdeu-se no desconhecimento da regulagem de tinta e gravação da impressora insensível, que fora remontado sem a plastia correta, apesar de tempo e dinheiro gastos com técnicos e técnica já superada, de manutenção difícil.
Teria sido possível evitar a queda, buscando, após o erro, o sistema de impressão conveniente?
Sim, mas com necessidade de ajuda, em vão solicitada. O JORNAL, apesar de propriedade particular, era antes de tudo benevolência para com a cidade. O dinheiro, quando houve disponibilidade, fora empregado na aquisição da impressora e de compositoras de linhas e títulos. Proposta de abertura do capital da empresa para novos sócios, ninguém se moveu. Waldyr Senna Batista, auxiliar eficiente em tantos momentos difíceis, estava afastado da direção e fez falta nessa hora. O filho Márcio tentou ajudar, mas carecia, àquele tempo, de experiência maior.
O JORNAL se sustentara, sem ajuda da comunidade, durante 36 anos. Aos olhos de muitos a crise pareceu manha e embromação. Mal sabiam já estar a pequena renda da propriedade particular sacrificada na remuneração dos funcionários, compra de tinta e de papel.
Enquanto isso surgiram dois jornais de boa impressão, já no sistema offset, vindos quase como desaforo. Embora ambos carecessem, no nascedouro, de maior despojamento pessoal dos dirigentes, tinham nitidez de texto e estampas policromas de fazer inveja. Vozearam, ao mesmo tempo, várias estações de rádio e emissoras comunitárias; a televisão invadiu os lares com suas imagens, novelas, noticiário multicolorido. Os sites eletrônicos começaram a aparecer. Ante a representação dinâmica dos fatos e a voz empostada nos aparelhinhos de rádio, pareceu à gente parva que o JMC já não se fazia necessário e cumprira, sem ninguém pedir e por isso nada lhe deviam, o papel de reformador dos costumes quase bárbaros encontrados quando começou.
Faltou, na hora precisa, a compreensão - hoje já despontando, ante a necessidade de um órgão independente - de ser o jornalismo não um oficio meramente técnico, nunca repositório de vaidade, nem simples meio de diversão ou entretenimento, como é, em parte, a televisão. A imprensa escrita exige responsabilidade moral permanente, ao fazer trabalho que é, a cada dia, a edição de um documento; nela se levantam e fixam anseios de progresso individual ou coletivo, e são escriturados os problemas aflitivos que influenciam a evolução da comunidade. Esse jornalismo é, e possivelmente continuará sendo, de insubstituível função social. Mas precisa ser - principalmente agora quando a dubiedade moral apavora - eminentemente ético, apesar da urgência sempre pedida na veiculação da notícia, no comentário dos fatos.
Foi esse o jornalismo proposto ao menino pelo seu sangue e vigorante por mais de três décadas em Montes Claros.
Decidido o fechamento de O Jornal, o editorial de despedida afirmou, sem propósito de retórica, mas lastimosamente:

"Este será o último número do O JORNAL DE MONTES CLAROS, depois de trinta e oito anos de trabalho e bravura invejável. Nosso desejo inicial era calar também e deixar, como quis um grande homem, que o passado enterrasse seus mortos. Mas nos rendemos ao dever de dar aos leitores explicação, mesmo incompleta, das razões que levaram a interromper a circulação do jornal.
Entendemos não se justificar a existência de um órgão de imprensa, jornal, rádio ou televisão, pela ganância imoral do dinheiro, por benesses que possa encontrar junto ao poder ou pela facilidade de viver sob a tutela de grupos econômicos. Jornal e forma de criar e exercer consciência crítica, em face ao problema de comportamento social que faz a criatura, semelhança de Deus, revoltar-se contra a situação de submundo em que vive. Por isso mesmo, o órgão de imprensa, como os órgãos da emoção e da inteligência humana, não podem viver apenas para sobreviver. E quando essa sobrevivência somente seria possível com a mancha do dinheiro fácil, a ser conseguida no campo da corrupção e da submissão dos ideais, e melhor parar antes de sujar as mãos e a consciência.
Jornais se sujeitam a depender de situações que os obrigam a não ter idéias nem ideais. Ficam no hiato de sombra onde a liberdade de critica deixa de existir como luz, energia e motor de suas atividades. Nós sempre sustentamos, perante os leitores, a inclinação pela liberdade de expressão - sem a autocensura malandra dos vendidos - como parte inseparável das liberdades cívicas. Há algum tempo o JORNAL DE MONTES CLAROS chegou ao ponto crítico, além do qual, para sobreviver, precisaria abdicar de sua independência. Antes que o pior acontecesse, preferimos encerrar-lhe as atividades. Para um jornal que, durante trinta e oito anos viveu, honestamente, dos próprios recursos de pequena empresa, sem chafurdar-se em interesses mesquinhos, o melhor que decidimos foi calar com honra, em vez de falar sem dignidade e credibilidade. Ao silenciar, com o fechamento do jornal, algumas vozes destemidas que lhe dignificaram a existência, estamos convencidos de que esse silêncio, como o silencio da germinação da vida na História, vai dar ênfase a tudo que o Mais Lido fez em favor da coletividade montes-clarense e norte-mineira. Este jornal viverá enquanto forem lembradas suas lutas, enquanto aqueles rapazes e moças que passaram pela redação continuarem, em outros órgãos de imprensa, a exercer com bravura, independência e inquietação social, tudo que aprenderam nesta casa, que souberam honrar e amar mais do que a pequena remuneração que recebiam.
Durante esses trinta e oito anos, cometemos imprecisões, aqueles erros a que está sujeita a diuturna atividade de lidar com a versão dos fatos e os interesses das pessoas. Mas esses erros se deveram mais a limitações do que ao desejo de errar.
Não estamos nos despedindo, porque a esperança de uma imprensa livre não acaba. Queremos afirmar a certeza de que o JORNAL DE MONTES CLAROS deixa herança. Fomos, como aqueles que lidam com a esperança do povo, instrumento de revolução nos costumes e no progresso da sociedade montes-clarense, revolução forjada nas oficinas e na redação, sobre as máquinas e as mesas de trabalho. Cumprimos nossa parte no dever que é de todos.
Um jornal acaba menos por se calar com honra e mais por submeter-se a interesses que não sejam os da comunidade. Por isso mesmo, resolvemos calar antes do fim!"

***

Transcrito nos anais da Assembléia Legislativa de Minas Gerais a requerimento, do Deputado Cleuber Carneiro, ele nos enviou mensagem atenciosa junto à cópia do pedido; autoridades e pessoas do povo mandaram mensagens de conforto que mais pareciam condolências. Outras tantas, possivelmente, alegraram-se com o desfecho.
A edição final trouxe, ainda, a carta assinada pelo “discípulo, amigo e admirador Paulo Narciso”, dizendo:
“Os meios de comunicação, como o próprio homem, invariavelmente são a expressão de quem os faz ou de quem os recebe. Têm vida física e, só por isso, podem ter a morte decretada. Só assim desaparecem porque não há força conhecida capaz de sentenciar o fim de uma única idéia: que a resistência é o mais rijo valor de um homem".
E pedia:
"Gostaria de guardar comigo, emoldurados, os originais autografados do editorial de hoje, que não assinala o fim, mas traça os caminhos de um recomeço (...) e é relíquia moral do nosso jornalismo."
E lá, na Rádio 98, está, em local público, emoldurada, disse ele, para voltar à redação, tão logo o JMC volte a circular...
Outra carta, de Inilta com os filhos e netos, acariciando o pai como "ideal a ser seguido pelos filhos, ideal de princípios claros de honestidade, calcados na fé cristã e na vontade de bem servir. Todo fim implica renascimento e temos certeza de que seu ideal germinará em outros corações..."
Obrigado - diria ele -, pela tentativa de conforto moral e a lembrança amena de Charles Chaplin. A felicidade de tentar ajudar tornara-se maior do que a desventura, principalmente por possuir os amigos e a família que tem, aos quais, às vezes parecendo demonstrar menos, dedica imenso apego.


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Por Oswaldo Antunes - 10/3/2010 12:21:04
Paulo Narciso:

Vi, um outro dia, artigo de Alberto Senna Batista falando de O Jornal de Montes Claros. Agra você me telefona chamando atenção para o texto de Luiz Ribeiro, no Montes Claros.com. Lembrou-me o que nunca poderia ser esquecido: hoje, 10 de março, completam-se vinte anos de ausência do “Mais Lido”. Coloquei em um livro de recordações o que foi a experiência de fazer jornal de combate em um meio social que precisava urgentemente ser mudado. Era fazer jornal, só, sem ter quem ajudasse. Havia na redação apenas uma pessoa que sabia escrever, o José Prates que saiu assim que mudou a orientação da folha. Ninguém mais. Ele e eu fizemos tudo nos primeiros dias. Depois apareceu o Waldir Senna Batista. Não foi testado nem escolhido, porque isso não podia acontecer. Começou a trabalhar imediatamente e deu certo. Tinha um pouco de pratica, adquirida no jornalinho “O Operário”, que o professor Athos Braga fazia, vez por outra. Aprendeu o necessário e começou bem. Tanto que promovido a secretário do jornal. Qual a função do secretário? Repassar para outros jovens, que aos poucos ia chegando, as noções básicas do texto jornalístico objetivo, como lhe fora ensinado. Lembro-me ter-lhes dito: “Se Ciro dos Anjos chegasse aqui e escrevesse bem como escreve, sua matéria ainda assim teria de ser revisada, porque ele não é jornalista, faz literatura. Jornalista não faz literatura. Mostra em poucas palavras o que aconteceu, onde aconteceu, como, porque e quem se envolveu. Relata o que se verificou e é desconhecido dos que não viram, mas estão interessados em saber” Foram dezenas os rapazes, como você, Luiz Ribeiro, Robson Costa, Lucio Benquerer, Carlos Lindemberg, Wanderlino Arruda e Décio Gonçalves que começaram a trabalhar para ninguém, em benéfico da comunidade, em troca de quase nada. Alguns, os pais pediam que ficassem lá para aprender a escrever. O que em muitos casos não era fácil. E, assim, O Jornal de Montes Claros se tornou uma escola. Você, o Paulo Narciso que saiu da nossa redação para “O Estado de Minas” e ganhou vários prêmios Esso de reportagem, deve também relembrar aqueles tempos e escrever sobre isso. Que escrevam outrossim os outros, para que as novas gerações saibam que, além dos valores da técnica que hoje predominam, existem os valores humanísticos e culturais sem os quais não há imprensa honesta. No livro “A tempo” há muito a ser lido sobre o que foi a caminhada de todos nós, os perigos e percalços atravessados para chegar a 38 anos de existência. Se não foi uma existência gloriosa, foi profícua e muita gente e famílias de Montes Claros estão ligadas a ela.

Hoje, quando se lêem (ou não se lêem) os jornais editados na cidade, sente-se falta daquele outro a que Luiz Ribeiro se referiu: um órgão de imprensa que não tinha o propósito de ganhar dinheiro, mas de servir. Lembram-se os rapazes honestos que ali se tornaram homens de bem e de responsabilidade. Dá tristeza ver que o ideal de imprensa sadia às vezes não é seguido. Mas alegra verificar que o JMC deixou alunos que honram a profissão jornalística. A eles todos nós prestamos homenagens nesse dia, que deve ser de comemoração. Como dizia o meu professor, jornalista José Mendonça, o destino da imprensa está vinculado ao sempre incerto destino da liberdade humana. O jornalismo que o JMC ensinou foi mais do que a redação de noticias, na medida em que produziu e ainda produz conseqüências sociais. O Jornal de Montes Claros teve a visão de um futuro melhor e a propagou, tanto que dela se lembra e fala até hoje.

Oswaldo Antunes


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Por Oswaldo Antunes - 20/11/2009 12:12:51
TADEU E O TRÂNSITO

Oswaldo Antunes

Toda cidade tem problemas viários. Com Montes Claros não poderia ser diferente, a não ser por tornar-se mais agudo em conseqüência da estreiteza das ruas. O mais grave nessa confusão é a certeza de que ela tende a crescer. 50 milhões ou mais de carros novos passam a circular pelas ruas e estradas do País a cada ano. Com a decadência do sistema ferroviário, a capacidade de carga dos veículos rodoviários está aumentando: as jamantas, que já eram grandes mas de apenas um “trem”, passaram a ter dois ou três “trens” à semelhança de uma locomotiva. E são esses “trens” que atualmente tendem a circular dada vez mais nas ruas de uma cidade que é pólo de prestação de serviços.
Pedir a solução urgente em Montes Claros de outros problemas que não seja o do sistema viário é “nonsense”. Não que não existam vários outros, mas porque o viário é o principal. Esse vai se tornando crônico, em parte graças à falta de aplicação dos dispositivos legais coercitivos já existentes. Eterniza-se por esperar fiscalização e aplicação das leis. Uma dessas leis é a que proíbe comercio atacadista na zona central e nos bairros, isto é nas vias locais.
Há pouco tempo, em Belo Horizonte fui perguntado sobre a atual administração da cidade. Tive pelo titular desta administração, no período eleitoral, uma opinião que mantenho ainda. Basta o Sr. Luiz Tadeu Leite comprovar que não é o mau administrador citado pelos adversários durante a campanha política, e será um ótimo prefeito. Ele começou a administrar sem capinar grama, sem pressa de mostrar serviço de fachada, o que é bom, desde que esteja sendo feito algum planejamento. E pelo que consta, o seu pensamento principal para dar mais conforto e bem estar à população é arquitetar uma solução para ao sistema viário. Mas se as medidas a serem tomadas deixarem de lado algumas providencias que se fazem urgentemente necessárias, o sofrimento será grande.
Há uma urgente necessidade de retirar o transito pesado das vias locais e das que coletam o trafego nos bairros. E isso pode ser feito de imediato, com a simples aplicação das leis já existentes.


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Por Oswaldo Antunes - 14/7/2009 21:01:54
As carroças estão voltando
Oswaldo Antunes

Não vamos cometer a injustiça de dizer que o atual prefeito gosta de ver carroças puxadas a burro atrapalhando o trânsito, já confuso, da cidade de Montes Claros. O homem publico que foi prefeito duas vezes, secretário do governo estadual e deputado, sabe que as ruas estreitas são um e talvez o principal problema da cidade com referencia ao trânsito e ao conforto de quem é obrigado a andar pelas calçadas cheias de obstáculos, buracos e degraus. E sabe também que veículos de tração animal, carroça e carro de boi, são coisas do passado, depois da invenção da gasolina, do etanol, formula 1 e até foguetes que vão à lua. E porque sabe de tudo isso, mas as carroças estão voltando (eram no principio apenas duas, agora já são mais de dez apanhando detritos de construções no centro nevrálgico de MOC), é de se estranhar que essa irregularidade esteja sendo permitida. E somente se pode culpar por esse desmazelo à fiscalização, os secretários. O prefeito não pode ser o responsável, embora adversários contumazes estejam dizendo que sim. De muito tempo deixou se funcionar o serviço de fiscalização das diversas secretarias da Prefeitura. Há uma lei que proíbe comercio atacadista na zona residencial para evitar o trânsito central de caminhões. E, no entanto, ao passar pelos diversos bairros centrais se podem ver caminhões imensos, jamantas, carregando e descarregando toda espécie de mercadoria. E quando fazem isso, ocupam quase toda a pista de rolamento, estendem lonas imundas pelo chão, obstruem garagens, sujam as ruas, fazem algazarra, criam um pandemônio. E isso já vinha acontecendo antes de o atual prefeito assumir. O que está voltando agora são as benditas carroças do falecido padre Paulo Pimenta, e voltando para somar sua morosidade de atraso, de peso morto, ao abuso do comercio e depósitos abertos que trazem transito pesado para as ruas estreitas e a zona residencial. Se os chefes da fiscalização tiverem o cuidado de olhar os códigos e posturas municipais verão que estão, como responsáveis que são, cometendo o delito de prevaricação. Não é culpa do Prefeito, evidentemente...


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Por Oswaldo Antunes - 13/4/2009 15:33:13
O deus em que não creio

Oswaldo Antunes

Repetem-se as controvérsias e duvidas a propósito de ensinamentos e conceitos religiosos equivocados. Os leitores falam sobre esse assunto. Religiões combatem a filosofia consumista, mas vendem a misericórdia. Com isso acrescem dor ao sofrimento natural dos que não aceitam a figura de deus como é mostrada. O deus da conveniência de muitos é semelhante a eles próprios, um deus em figura humana. Gosta de prosperidade. Age como policial intransigente, tem fixação em genitália, delicia-se em castigar a fraqueza. Mostra-se irado e vingativo. Nem valem, para amenizar esses defeitos as qualidades de que lhe são atribuídas. Deus deve ser a perfeição e não necessita de qualidades.
Frei Matheus Rocha OP, que ajudou o agnóstico Darci Ribeiro a fundar a Universidade de Brasília, advertia sabiamente, que "Deus não é para o homem uma verdade evidente, mas problema que, para ser resolvido, exige coragem, lealdade e paciência"... chega a ser um tormento nascido “da necessidade do nosso coração, da insuficiência da razão e do desgoverno de nossa vida"
Para crer no deus da malandragem não é necessária essa coragem. A Constituição da Republica garante liberdade de crença, a lei garante venda e compra de milagres. Coragem e lealdade são necessárias, sim, mas para combater as superstições que amedrontam e exploram a idéia de Deus. Gandi seria massacrado pelos teólogos da Prosperidade, se dissesse aqui como disse, que Deus não tem religião. Não vende ilusões, não está nas imagens da vitrine. Sequer Se mostrou a alguém ou Se definiu.
E é exatamente nesse Deus que ninguém sabe como é que se deve crer. Embora seja bastante vendável, o outro deus não é fácil de viver já que não permite a utopia, único modo de suportar a vida. Sequer admite o fim biológico simplesmente como retorno à Substancia. Deve-se crer, mas no Deus que não tem o serviço especial de permitir ou negar as coisas. No que não acusa, não julga, não executa. Crer no que não admite punição eterna por erro passageiro. Crer no Deus que está em tudo, inclusive na esperança que vence a morte. No Deus que vive em nós e não nos cobra responsabilidade por ter vindo ao mundo sem pedir. Por termos vindo com um espírito que também não se explica.
A cobrança feita a esse espírito, negaria a vida de Deus em nós. Negaria a espontaneidade do sagrado necessária a cada ser, a todo instante. As estruturas que atribuem a Deus defeitos e qualidades humanas desconhecem “a quantidade quase ilimitada e consciente de seres vivos que são responsáveis pelo funcionamento do Universo”, os sintomas da presença de Deus.
Einstein disse que a simples palavra “deus” nada significa. Porque não alcança o que existe na infinitude incompreensível onde habita a louca misericórdia que Francisco de Assis e João de Deus experimentaram. A misericórdia que não faz exigências.


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Por Oswaldo Antunes - 13/2/2009 16:53:38
Atualidade de Marx
Oswaldo Antunes

Dois aspectos da crise no mundo: a especulação virtual de valores que a fez surgir, e os meios eminentemente financeiros empregados para dar-lhe cobro. São desumanidades que obrigam a pensar no que pareceu ter-se acabado com o bloco soviético: a atualidade de Marx. Ainda hoje é preciso dar-lhe razão quando afirmou que o feudalismo influencia as instituições e as idéias. E que o regime econômico sempre constituiu a base da estrutura política, motivo por que se dedicou ao estudo do Capital. O dinheiro, usado como mercadoria, não apenas oprime o trabalho; é um opressor injusto, porque ele próprio é criação do valor-trabalho. Não é justo o dinheiro explorar como mercadoria a força do trabalho.

Para entender esse argumento, é prudente esquecer a idéia do materialismo ateu que serviu como razão de combate do marxismo. E que suscitou no mundo civilizado a grande hostilidade contra Marx. Não porque faltasse verdade à afirmação de ser religião uma espécie de ópio do povo. Pode-se ver-se, hoje mais do que antes, a religião usada em proveito da renda de pessoas e instituições ou como lenimento para os desacertos sociais. Profundamente lamentável é ver o misticismo, tão necessário à elevação da vida espiritual, posto de lado por um tipo de “promessas morais, religiosas, políticas e sociais que escondem interesses de diversas classes”(Lênin). Inovou-se em matéria de luta de classes.

Em entrevista a Mirian Leitão, o presidente da Febraban, de modo quase zombeteiro, procurou justificar o ultimo aumento do spread bancário brasileiro, que já era o maior do mundo. Alegou que o aumento foi reação necessária à majoração do risco que a crise, marola no Brasil, está trazendo aos bancos. Mesmo o spread para empréstimos externos que são financiados pelo Banco Central. O quadro de quase zombaria demonstrou bem o quanto as instituições protegem os cifrões que nada produziriam, não fosse a presença do valor-trabalho. Esse valor que o noticiário demonstra, mais uma vez, estar sendo sacrificado: operários são obrigados a concordar em diminuir a jornada e o próprio salário, a fim de assegurar, em solidariedade, a manutenção do emprego dos seus companheiros.

Temos no Brasil, hoje, um Ministério especificamente de assuntos estratégicos. Talvez fosse momento de repensar Marx sem a radicalização de antes. Cuidar do caráter social da produção, a fim de diminuir a sua dependência dos juros. Para isso é preciso encontrar justa medida para a produção desenvolver-se com seus próprios recursos e resultados.

Infelizmente o mundo não venceu a resistência das classes que se apegam à filosófica do feudalismo. Um governo como o nosso, que tem a pretensão de ser popular, deve pensar em reorganizar os meios de produção e evitar a escravidão espiritual a que estão submetidos os beneficiados por bolsas e promessas.



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Por Oswaldo Antunes - 12/9/2008 08:47:23
Liberdade e imprensa


Oswaldo Antunes

Jornalista - osalan@uol.com.br

Quando se comemora o dia em que a imprensa nasceu no Brasil (10.9) às vésperas de escolha partidária marcada por influência da mídia no país inteiro, vale refletir sobre o dever de informações objetivas e moralmente corretas sobre política e políticos.

Se a prestação do serviço de informar acontece a partir de atos individuais, susceptíveis de influências, tais atos criam o subconsciente coletivo e influenciam também as decisões para o bem ou mal da comunidade. E não há possibilidade de assegurar de fato, muito menos de direito, a independência e imparcialidade dos meios de comunicação e dos jornalistas.
Assim como ocorre com o livre arbítrio, que seria responsável pelos crimes e pecados do homem, o trabalho do jornalista está sujeito à influência de fatores emocionais.

Ele responde a uma chefia pelos seus atos e obedece a diretrizes quando coleta, redige, veicula ou comenta os acontecimentos.

Sua própria inteligência emocional leva a tomadas de posição. Daí o motivo por que muitos entendem que independência e imparcialidade dos meios de comunicação e de quem os faz é objetivamente impossível, passando a apenas ideal próximo do mito.

Mas os ideais existem para ser seguidos e comportam análise. Assim como não deve haver imparcialidade entre o bem e o mal, o órgão de imprensa não pode calar-se diante do crime, nem deixar de posicionar-se em defesa do bem coletivo. Mesmo porque, para o jornal e o jornalista, a notícia e a interpretação correta dos fatos são contra-prestações por serviço pago pelo usuário. Por dever, não lhes é moralmente permitido compactuar com o atraso, a ignorância ou a corrupção.

Foi como jornalista que Karl Marx começou sua influência sobre o meio social e, ciente da obrigação de bem formar a opinião pública em benefício do ser humano, formulou idéias que influenciam ainda hoje a valorização do trabalho e a distribuição das riquezas.

O grande escritor e sociólogo inglês Chesterton disse uma vez que, se voltasse hoje ao mundo, em vez do apóstolo São Paulo, seria jornalista. E Paulo, o mais objetivo dos apóstolos, não foi imparcial quando pregou mudanças. Ao contrário, afrontou quem queria o reino dos céus somente para os privilegiados. E mostrou que a palavra, algumas vezes como o bisturi, deve cortar e ferir para extirpar o mal.

O mal não se extingue por si, como há um tipo de imprensa vergonhoso: aquele que os políticos conseguem do poder público para si e seus propósitos.

Vale apropriarmo-nos da informação de que meios de comunicação na Bahia são da família do senador Antônio Carlos Magalhães. No Sergipe, do ex-governador Albano Franco; em Alagoas, de Fernando Collor; no Rio Grande do Norte, do ex-ministro Aluízio Alves e da família do ex-presidente Sarney os do Maranhão.

E como estou escrevendo de Montes Claros, é importante lembrar que, aqui, um jornal e duas estações de rádio pertencem a deputados.


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Por Oswaldo Antunes - 8/5/2008 11:48:00
A MENINA DILMA

Oswaldo Antunes

O que comoveu e chamou a atenção dos que viram/ouviram e não se esquecerão do detalhe, não foi a poderosa ministra da casa civil do governo. Foi “a menina de 19 anos que, torturada, mentiu para não entregar companheiros e que, quando falou, exibiu o coração e a bravura”. Lembro-me bem de como assustavam os porões da ditadura nos anos de chumbo. Ao ser chamado perante um agente policial para dar esclarecimentos a propósito de noticias sobre mau gasto do dinheiro publico, fiquei, na mesa de interrogatório, em frente a uma metralhadora engatilhada. Depois, em Juiz de Fora, no tribunal militar, o interrogador pressionou com ameaças para saber quem havia feito a noticia simples, mas significativa, do espancamento de um sepultador de indigentes por soldados armados. Foi preciso, sim, coração e coragem para sofrer as conseqüências de não entregar os companheiros, tentando valer-me dos direitos que a lei assegurava mas a ignorância negava.

Quando, não faz muito tempo, foi sepultado em Montes Claros o torturado homem do povo Porfírio Francisco de Sousa, me lembrei de Bertold Brecht a propósito dos que lutam sem esperança de vitória. Uns lutam apenas um dia e podem ser considerados bons. Mas os que mantêm o espírito de luta a vida inteira, esses são imprescindíveis. Sem eles não teria havido, na ditadura armada, a luta clandestina contra a injustiça. Como não teria funcionado a lúcida, corajosa e desconhecida liderança legitimamente popular, na defesa de idéias sociais que, embora negadas, contribuíram para o reconhecimento de muitas injustiças.

É fácil verberar aparecendo no noticiário e na TV Senado, com as mordomias asseguradas. Difícil é viver e lutar anonimamente. É tentar, sem que a mídia saiba, acabar com o analfabetismo político que impede as pessoas de ouvir, falar e participar. É estar, até o último minuto, junto ao analfabeto político que morre de fome sem saber as razões do custo de vida; do pobre que, calado, engole o preço do feijão, da farinha, do remédio e das decisões políticas; dos que, com uma simples humanidade aparentemente conformada, lutam contra a injustiça; e por intuição buscam sentido para a vida.

O depoimento mostrou a coragem dos torturados. Ali estava também uma afirmação de impossibilidade de legitima defesa contra a tortura. Apareceu, ainda, o símbolo da integração masculino/feminino que, no poder, não esqueceu a utopia necessária às conquistas e capaz de levar ao patíbulo. A ministra mostrou, com veemente clareza, o significado de uma dignidade que vem sendo esquecida, a das vítimas. Mostrou que o valor de ser digno falta nos escaninhos da política, apesar de ser suporte da grandeza. Alguns senadores que tiveram a intenção de agredir foram vistos abaixando a cabeça com respeito. Vale lembrar a frase “compreender é perdoar” quando urge o resgate da consciência política contra a violência.


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Por Oswaldo Antunes - 10/3/2008 17:45:23
EMBRIAGUE-SE COM MODERAÇÃO

Oswaldo Antunes

A imprensa tende a resguardar-se mutuamente em sua liberdade. Mas quando veículos de informação assumem comportamento que pode levar a perigo social, a liberdade de imprensa deve ser criteriosamente analisada. Examinemos o aspecto da “fabricação” subliminar de clientela que hoje, em vez de educar, vicia. A característica principal da ajuda educativa é promover as pessoas, e o interesse de crescimento moral dificilmente combina com interesses financeiros. Vejamos: enquanto 240 milhões de reais foram gastos, ano passado, em publicidade para incentivar o publico infantil a comprar alguma coisa, apenas 24 milhões chegaram ao Programa Federal de Desenvolvimento da Educação Infantil. A força da mídia ocasionando o descaso moral é evidente.
O professor Waldemar Setzer afirmou que a televisão é a maior tragédia acontecida à humanidade, com capacidade de destruição maior do que a das guerras. Exagerou na similitude. A televisão, além de entretenimento já demonstrou ser veículo indispensável à educação e consequentemente ao progresso. Mas acerta ao ver que, se passam os horrores da guerra, os males da TV ficam. A guerra derrama sangue, destrói, mas ao termino pode deixar ensinamentos morais. A televisão, com a quebra de padrões que é seu contínuo reality show, destroe permanentemente alguns valores que dignificam a vida.
Millôr Fernandez disse que o ser humano, antes de aprender a amar o próximo inventou a televisão que ensina a desprezar o distante. A imagem televisada leva ao interior do País e para dentro dos lares, junto com alguns benefícios, males e vícios reais ou inventados. Tudo com excelente padrão de qualidade, um foco de luz condiciona a mente para obedecer a sugestões que deviam ter rejeição ativa e imediata, mas não têm porque a capacidade de análise está impedida. Mulheres exuberantes chamam para o consumo de bebida, mas como o álcool é uma droga, deve-se embriagar com moderação.
O “penso, logo existo”, é modificado para “quem não consome não existe”. Técnica simples de impedir pensamento e análise.Tanto que os analistas do sistema jurídico, e os profissionais pela educação não viram a lei contrariada. Sem os programas educativos determinados por lei, o “horário nobre” é reservado ao lucro. Tudo na TV visa ao melhor efeito do intervalo. As crianças, ao chegarem da escola, são atraídas por isso, o que levou o mineiro Darcy Ribeiro a desejar escola em tempo integral e evitar que o segundo turno seja o da deseducação.


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Por Oswaldo Antunes - 4/3/2008 12:46:22
Quatro pessoas, com seu trabalho, ajudaram a fundar o Jornal de Montes Claros. O redator “faz tudo” José Prates, o linotipista único Walter Andrezzo, o paginador também único e que às vezes escrevia alguma coisa sobre esporte, Antônio Meira da Silva e a também única encarregada de assinaturas e distribuição do Jornal, Maria de Oliveira a grande Dona Maria, prima de José Gomes, parente de Propércio e Wagner Gomes. Completamente esquecida hoje, era correta, trabalhadora, morava com a mãe nas proximidades do Cine Coronel Ribeiro; quando a mãe faleceu, passou a viver sozinha. Adoeceu, deixou de trabalhar e sozinha morreu. Foi substituída por José Alves Cruz, o Zé Branco e que tinha apenas um pulmão, pelo que fora “encostado” no jornal pelo Capitão Enéas. Esse “encostado” era quem mais pegava no pesado, derretendo e enformando lingotes de chumbo para as linotipos. Não me refiro a Zezinho Fonseca porque sempre achei eu ele apenas fazia figura...
Falo do Antonio Meira, pela sua seriedade e coragem, no livro “A Tempo” que publiquei recentemente. De José Prates também falo às paginas 160 e 163, Prates era jornalista autodidata, muito inteligente e inventivo. Deve continuar sendo, porque o modo como ele relata o episodio da Santa na mangueira, que é absolutamente verdadeiro, demonstra isso. Quando assumimos a direção de O Jornal, ele parece que se sentiu deslocado. Candidatou-se a vereador, depois pediu demissão e sumiu, literalmente. Fiquei sabendo agora que foi para o Rio, prestou concurso e se tornou oficial da Marinha, percorreu o mundo, se aposentou por idade, e mora atualmente em Nilópolis. A descrição que ele faz do jornal no seu tempo está também correta. Dona Maria, sempre fazia uma ficha dos assinantes, inclusive com a data de nascimento, e essas datas eram publicadas, por semana, assim que o jornal circulava. Era como se fazia a coluna social bem mais simples, e até mais autentica. Cinco pessoas fazerem um jornal noticioso era quase um milagre, mas faziam e para isso, sem as facilidades de coleta de informações que existem hoje, era realmente necessário ao redator a “fazer” a noticia..Talvez depois possamos acrescentar mais alguns detalhes a esse episódio.


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Por Oswaldo Antunes - 09/02/2008
PT COM LEITE OU CAFÈ?

Oswaldo Antunes

A pouca experiência de governo, ainda assim governo turbado por denuncia fundadas ou não de irregularidades, sugere que o Partido dos Trabalhadores tem dificuldade neste momento de encontrar candidato viável para as eleições presidenciais de 2010. Embora tenha sido desde o inicio governo de coalizão, os resultados desagradáveis à opinião publica repercutem no imaginário das classes mais esclarecidas como responsabilidade do partido cujas fileiras abrigaram o atual Presidente. Acresce que o PT já não é o mesmo da eleição de 2002. A elite intelectual do inicio desligou-se descontente com os rumos da administração, uns porque a pretendia mais ética, outros porque a queriam mais de esquerda.
O cronista político Carlos Castelo Branco, cuja objetividade e independência fazem falta ainda hoje, costumava dizer que o povo não leva ninguém ao poder, quem leva são os grupos que detêm o investimento. Se aparentemente essa afirmação não se confirmou na reeleição do atual Presidente, é porque prevaleceu o prestigio pessoal de quem, mantendo o poder o disputava com garantia de lucro para os investidores. E surgiu o quase fenômeno da força eleitoral dos beneficiados pela bolsa família. Mas, com referencia à primeira eleição, Lula venceu depois de duas derrotas com discurso de fundamento ideológico e somente se elegeu ao abrandar a oposição aos grupos que exploram o capital; e teve a ajuda involuntária de José Serra que, ao torpedear a candidatura Roseana, levou o PMDB, Sarney e a mídia descontente a apoiarem o candidato da oposição com sua nova estratégia.
Agora, se as denuncias de mau emprego do dinheiro publico não conseguem furar a blindagem do Presidente, atingem o Partido que não consegue livrar-se do alvoroço da mídia e do crivo da Justiça. E se Lula não tem no seu séqüito a quem chamar para a sucessão (a ministra da Casa Civil descartou o próprio nome), consequentemente sobram as forças que governaram anteriormente para uma possível fusão de interesses. É notada essa tendência em Belo Horizonte. Os governadores de Minas e São Paulo tratam o governo federal com carinho. É atribuída ao Ex-presidente Fernando Henrique a afirmação de ser maior do que se pensa a afinidade entre PT e PSDB. O PMDB continua como lastro que ocupa espaço e auxilia a estabilidade. Então, o imprevisível seria saber se na copa do Palácio da Alvorada prefere mais o leite, que o Presidente não experimentou inda, ou o café que enfrentou e conhece bem no Estado onde nasceu o trabalhismo partidário.


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Por Oswaldo Antunes - 2/2/2008 11:37:11
JOGAR A BOLA DA VIDA

Escrevemos sobre a seca e o artigo foi publicado quando começou a chover. Poderia parecer inoportunidade, mas o contraponto apenas demonstra que acontecimentos isolados não formam a realidade. Pancada de chuva é aparência, não é regularidade do período pluvial. Mas, como as aparências estão enganando mais hoje, quando a religião do progresso a qualquer preço ganha seguidores, alguns momentos de chuva podem nublar a lembrança de anos de estiagem. Seria o bom e pouco fazendo esquecer o mau e muito. Mal comparando, seria como esse assunto do cartão de credito corporativo. Coibir o erro da ministra da igualdade racial, que é negra e foi acusada de gasto pequeno, mas aético, não encobre o desacerto de pagamentos indevidos em outros setores e por outros governantes. 147 mil reais é muito pouco para encobrir só os bilhões que os bancos abocanham com cartões, sem falar dos casos de superfaturamento. Puniu-se com o afastamento uma pessoa possivelmente aética e politicamente despreparada, procurando esquecer o despreparo moral de milhares de pessoas que não foram preparadas para governar. Ninguém pensou na possibilidade de a ministra estar, inconscientemente, demonstrando que há igualdade racial inclusive nos erros com ou sem dinheiro.
Não é preciso forçar para passar dessas aparências ao aspecto da moralidade. Basta ligar assuntos. Faltando desapego material e espiritualidade na vida particular, vai faltar também na função publica. Aliás, é atribuída a Einstein a afirmação de que “viver é como jogar uma bola na parede”. Se jogarmos bola verde, ela volta verde; se a jogamos com força, volta com força; por isso, ao jogar a bola da vida devemos estar prontos para recebê-la de volta, porque “a vida não dá, nem empresta, não se comove nem se apieda, apenas retribui o que oferecemos”.
Não há moralidade sem espiritualidade. E espiritualidade começa com a consciência de o homem participar de um todo que é ligado pelo amor, que na prática é a solidariedade. E nossa pratica política investe muito e mal no lado material da vida e nada na subjetividade. Para sair do egoísmo para o ético e social é necessário o desenvolvimento natural do indivíduo, que começa na infância. E isso leva a pensar em educação, alargamento de horizontes, conquista do equilíbrio intelectual, afetivo e moral. No país que não deixou ainda de ser do futuro, cada brasileiro chegará à maturidade social quando tiver a certeza interior de pertencer à humanidade.


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Por Oswaldo Antunes - 29/1/2008 17:04:24
MINAS É NORDESTE
Oswaldo Antunes

O norte de Minas tem uma parte de terras diferente do sudeste do País. Tanto quanto à biodiversidade e escassez pluviométrica, mas principalmente e por conseqüência, pela dificuldade natural de desenvolvimento. Se Minas são muitas, há uma que sofre mais: está no mapa, dentro de uma linha poligonal fechada, o “polígono das secas”. Nas previsões de chuva mostradas pela televisão, esse pedaço de Minas aparece quase sempre com céu aberto. Durante anos, mesmo após a criação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste, essa parte, com algumas características do semi-árido para onde o governo federal está projetando levar as águas do São Francisco, ficou fora das providencias de combate dos efeitos das estiagens. Foi necessário intenso trabalho de convencimento, até o presidente da Câmara dos Deputados, sr. Raniere Mazilli, ao ocupar interinamente a Presidência da República, decretar o que devia ter mudado o mapa do Brasil: o Norte de Minas passou a fazer parte da região Nordeste do País.
Vale lembrar esses detalhes no momento em que a estiagem cíclica volta forte, caracterizando a chamada “seca verde”, quando chove apenas para brotação, mas não para reserva de água. A não ser o trabalho criterioso do Exercito, com pouco recurso na distribuição de água, o governo federal ou estadual, nada fez para minorar os efeitos danosos. E quando se diz nada, é porque não se consideram as promessas recorrentes, destituídas de esperanças. A captação de água do subsolo, que era feita pelo Departamento Nacional de Obras contra a Seca, cujos poucos poços tubulares ainda são usados, parou completamente quando o órgão foi extinto. A recriação da Sudene ainda é lastimável balela diante da sede das pessoas e da mortandade de animais.
Em vez de enviar graníferas para plantio que não pode ser colhido, o governo do Estado poderia planejar o redirecionamento da atividade rural para a produção de oleaginosas e fabricação de biodiesel, ou outra sustentação da economia regional. Porque nem mesmo em véspera de eleição o marketing oficial consegue iludir o sertanejo com a possibilidade de regar sua plantação com apenas suor e lágrimas. O problema passa de governo para governo desde o “ano da fumaça”, quando o incêndio da vegetação toldou o céu sem chuva e a população se alimentava de raízes de umbuzeiro. Talvez à mesa farta dos palácios não convenha a noticia de que essa alimentação costuma repetir-se ainda hoje.


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Por Oswaldo Antunes - 6/1/2008 11:23:28
GRATUIDADE DE DEUS

Oswaldo Antunes


É de um psiquiatra, Jung, a afirmação de que o homem é dotado de uma “função religiosa natural” e necessária à vida. Depois dele, a evolução das ciências humanas mostrou a ligação profunda da estabilidade psicossomática com essa função que está sendo explorada hoje de diversos modos. A ânsia do absoluto que o homem experimenta, o leva a cultivar a esperança de imortalidade do espírito e essa esperança ele cultiva escolhendo uma forma de ligação com o sobrenatural, a religião. Há religiões de estruturas milenares e outras recentes, a maioria delas, entretanto, sem aquela compreensão da necessidade de relacionamento do espírito com a indefinível “Origem sem origem” de que tudo provém: o que existe dentro, ao redor dele e no inefável que o ser humano sente.

Através dos tempos, grandes inteligências estudaram o assunto. Einstein relacionou três tipos de relacionamento religioso no homem primitivo: o inspirado pelo medo do desconhecido; o que demarcou a responsabilidade social do homem em face de um ser superior antropomorfo; e a que elevou a mente acima dos conceitos humanos limitados. Esse ultimo tipo intuiu a essência do que seria divino sem interferência dos desejos humanos. É a fé a partir da intuição, do “ser preciso crer para depois ver”, a forma essencial de religiosidade que “não conhece dogmas nem Deuses antropomorfos, é ilimitada, ampla e absoluta, estando além de qualquer idéia humana”.

A crítica mais contundente que hoje se faz à religião refere-se exatamente à afirmação de Deus teria feito o homem à sua semelhança, quando foi o homem que imaginou Deus semelhante a si próprio. E essa idéia de um Deus com qualidades e defeitos( defeitos e qualidades humanas de que Ele não precisa) O distancia das necessidades do homem e permite a mediação das religiões entre Ele e os homens.

E como Deus é um só, não há um Deus diferente para cada religião, falta às interpretações teológicas a idéia de Unidade que faria desaparecer as diversas formas de religiosidade e de mensagens dos seus fundadores. A variedade de “deuses” continua ainda hoje por falta de maturidade quanto à idéia de Deus. À estrutura que dirige as religiões não interessa mostrar que, antes da religiosidade interessada no proselitismo, é necessária uma espiritualidade que nasce da certeza da divindade que não pede vingança, não pune ofensas impossíveis à sua perfeição e não cobra dízimos. O apego humano aos bens, que hoje é visto impregnado de cerimonial, impede o entendimento da gratuidade da vida em si, que é, ela própria, a gratuidade de Deus.

Estamos tentando escrever um ensaio sobre esse tema. E temos a companhia de gente muito boa, como Joseph Moingt, jesuíta e teólogo católico francês, que, em obra intitulada “A mais bela História de Deus”, edições ASA, Porto. disse: “A religião (que ignora essa gratuidade) reduz-se às obrigações e às tradições com as quais se julga ter acesso ou contentar Deus (...) foi com essa concepção religiosa que Jesus rompeu.” Foi esse posicionamento “que produziu o ruptura e inexoravelmente conduziu ao processo de sua morte”.

E para terminar, o depoimento da psicóloga espiritual Ângela Maria de La Sala Bata: “Quando se chega a compreender isso (a diversidade de interpretações teológicas sem a Unidade e Gratuidade de Deus) cai por terra todo o dogmatismo, todo o fanatismo e se adquire a capacidade de ver a Verdade, sob qualquer símbolo e qualquer dogma, e de perceber a corrente espiritual, pura e autentica, que está além de qualquer cerimonial, de qualquer rito aparentemente incompreensível. Esta é a verdadeira maturidade religiosa (...) com desenvolvimento da intuição, a sensibilidade místicas, a superação das cristalizações, dos dogmatismos, dos preconceitos religiosos, dos fanatismos e das limitações mentais.”


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Por Oswaldo Antunes - 23/12/2007 09:41:51
NATAL


Oswaldo Antunes



A origem plantou uma árvore só
de raízes no alto, flor na terra.
O fruto nasceu em corola de sangue
e espalhou sementes,
doloridas à vezes,
em roteiro incerto, ao vento.


No vento, a voz e o mistério
que comandou as águas,
pôs o eterno nas grutas
e fincou aventuranças
um pouco acima do vale.
Com um sopro - não mais que um sopro -
compôs fraternas mensagens
e a poesia mais terna
escondeu dentro das flores
que vivem um dia só.



Podemos querer que Ele volte?
Não mais virá como a árvore
em forma de cruz.
Brilhará mais que uma estrela
Prender-se-á ao nosso corpo
para que os tolos entendam
e os cegos possam ver
a falsidade das luzes
que brilham como as moedas
que eram apenas quarenta
e agora já são milhões.


Mas talvez não venha mais,
ou virá só de tristeza
ao ver que bem sob a sombra
da árvore inconformada
nascem ainda crianças
para ser crucificadas
e que outras no alto morro
onde cruz é fantasia
morrem, e juntas morrerão
com uma granada na mão.


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Por Oswaldo Antunes - 27/10/2007 10:52:46
A NECESSIDADE DE UM HACKER

Oswaldo Antunes

Quando o cidadão entra em um estabelecimento comercial para fazer compra, paga com a pequena moeda física que chamamos de dinheiro. É o metal ou papel que carregamos no bolso ou na carteira, para o varejo. Essa moeda, a principio, tinha um lastro e era emitida e controlada por setor competente do governo. Ia da casa da moeda para os bancos, saia do caixa bancário, apanhada com a mão. Circulava de bolsa em bolso, às vezes era guardada debaixo do colchão. Os bancos foram criados para guardá-las, intermediar sua aplicação, com o ideal especifico de produção e consume de bens.
Essa moeda de circulação física teve seu controle foi feito, durante muito tempo, por escrituração manual. Depois vieram os cheques, ordens de pagamento por via telegráfica, máquinas de calcular e registrar. O maior salto ocorreu com a revolução eletrônica: a partir de então, a moeda física, de condução difícil, passou a ser evitada, sendo substituída pelo crédito, que é a forma virtual de moeda. Passou-se a comprar e pagar com pequenos cartões que evitam transporte. E os computadores armazenam, simbolicamente, bilhões e bilhões de moedas físicas que, em frações de segundos podem trocar de dono.
Assim, na macroeconomia a moeda física desapareceu. Ficou a moeda credito. E essa moeda-credito é emitida pelos bancos, não pelo governo. Dessa mudança de procedimento surgiram conseqüências que, percebidas pelos economistas, não chega ao entendimento do povo. Uma das conseqüências, a principal talvez, é que os bancos passaram a fazer o trabalho do governo na emissão de moedas e cobrar por isso. Os bancos, não o governo, controlam a moeda-crédito. Outra conseqüência: enquanto o governo continua falando em necessidade de poupança interna para evitar aumento dos preços, o banco aumenta, com taxas a seu favor, o valor e a circulação da moeda virtual. Ao mesmo tempo, para possibilitar maior lucro interno seu, dificulta a destinação ao setor produtivo.
O governo não entendeu que moeda escritural não precisa existir fisicamente para ser aplicada na produção. Pode ir, virtualmente, para as fábricas ou para o campo, e voltar, superavitariamente, para as finanças virtuais. Os bancos sabem disso e os banqueiros do governo fazem de conta que não sabem. E é interessante ver que os hacker praticam a moeda virtual com facilidade. Talvez fosse o caso de um deles, de boa índole, controlar o sistema financeiro e orienta-lo para a produção.


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Por Oswaldo Antunes - 7/10/2007 15:48:04
A IDÉIA DE DEUS

Na véspera do lançamento de nosso livro “A Tempo”, no próximo 07 de novembro, estamos preparando um outro, que, se nos sobrar tempo, pretendemos publicar: “A Idéia de Deus”. “A Tempo” fala de memórias. Desde a infância, passando pela formação jornalística, principalmente a luta que foi a manutenção de O Jornal de Montes Claros durante 38 anos. Quando falamos luta é porque foi luta mesmo. Na época em que O Jornal começou, abrindo caminho para a imprensa que hoje está aí, a bandidagem era grande perigosa e intimidante; a imoralidade não rendia dinheiro mas garantia o poder. Essa cidade que conhecemos hoje, populosa, a sexta de Minas, era apenas uma grande aldeia, chefiada por caciques. Alguns sem o menor escrúpulo. Não temos dúvida em afirmar que a atuação construtiva de O Jornal foi, antes de tudo, uma vitória moral. A moralidade de todos os jornalistas que, começando na Rua Dr. Santos 103, estiveram, ou continuam hoje, em outros endereços aqui na cidade, em grandes jornais de Minas, alguns em âmbito de Brasil. E a grande maioria deles, sem perder de vista o sentido do bem comum.

Estamos perguntando se existe correlação entre esse tipo de moralidade que garante o bem comum e a idéia que se possa fazer da existência de Deus. É tema aberto. Quando a televisão mostra cenas de devastação praticada pelos chamados “guerreiros de deus” (com d minúsculo nesse caso), é de perguntar-se que deus é esse em nome do qual se mata. Ou qual o deus, do outro lado, que justifica a religião da prosperidade, não apenas das pessoas que pisam na pobreza para subir, mas também das igrejas que, através de um proselitismo pos moderno, angariam dinheiro e poder.

Estamos pensando em solicitar ao Padre Henrique Munaiz a leitura antecipada do que estamos escrevendo. E um comentário, ou comentários dele, sobre as idéias que poderiam ser tidas como anti-clericais. Porque é difícil aceitar a idéia do deus vingador que é apresentado por diversas denominações religiosas, inclusive algumas do cristianismo, esse deus que pune com a condenação eterna quem, durante uma vida que não pediu e lhe foi dada sem consulta, comete o que é tido como erros. Parece-nos impiedoso qualquer uma religião negar à outra aspectos teologais, para dizer que ela é o único cominho da salvação, quando Deus é o mesmo para todos, e Cristo veio salvar todos os homens, os vivos então, os vindouros e até os mortos antes de sua vinda.

Pode-se negar a religiosidade popular? Apesar de reduzida a uma interpretação não cristã, na qual o cristianismo fica escondido atrás de santos e fetiches, é autêntica em suas raízes. E ela tem uma reconhecida moralidade baseada na humanidade e na comunhão de interesses. Diferentemente da religião dos convencidos de sua sabedoria que, orgulhosos, vão sempre à missa dominical, mas roubam, matam ou deixam matar, e, para isso, se isolam em castelos de arrogância. Algumas autoridades religiosas, com uma teologia que não leva em conta o desenvolvimento da mente humana e a mudança dos costumes, desconhecem que, atualmente, os sacramentos, o catecismo e as associações religiosas são obstáculos à evangelização verdadeira porque são ocasiões para o povo se confirmar na sua religião infra-cristã.

Parece-nos que a verdadeira evangelização, hoje, deve ser a denuncia da falsa idéia de Deus. É ela que leva à errôea interpretação da mensagem de fraternidade e misericórdia, conduzindo à falta de moralidade, tanto na vida particular quanto na v ida publica. Mas isso, também, é apenas uma idéia e aceita sugestões


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Por Oswaldo Antunes - 5/7/2007 16:53:15
Medalha Civitas

Oswaldo Antunes

A idéia de se homenagear 150 cidadãos considerados beneméritos, durante as comemorações do sesquicentenário da cidade, foi meritória apesar da dificuldade natural de se escolher poucos, quando são muitos os que merecem.

Acreditamos que o propósito do Secretário de Educação e Cultura João Rodrigues tenha sido simbólico, visando a despertar interesse educativo. Mas, ao que ficou parecendo, pessoas intervieram com a finalidade de aumentar o numero de homenageados e atender apelos eleitorais. A medalha que devia ser símbolo de um civismo construtivo, declinou do seu significado original e outros 150 nomes foram acrescentados, passando a homenagem a ter interesse político.

Entende-se que a medalha e o diploma tenham aparência modesta, como convem a uma Prefeitura sem muitos recursos. Mesmo que não se tenha entendido bem como apareceu, espalhafatosamente, como homenageada e homenageante, uma empresa estadual, a Cemig, que nada tem a ver com o nosso passado, em vez de a Prefeitura e a Câmara Municipal dos Montes Claros das formigas.

Ao contrário do que poderia parecer, estamos aqui mais para fazer um agradecimento do que crítica. Ali estavam para receber a insígnia, os descendentes de lustres benfeitores desaparecidos e lembrados para a honraria. E as famílias dos homenageados em vida, sentiam justo e indisfarçável orgulho. Parentes vieram de longe para a cerimônia, me disseram que até da Espanha. Pelas dificuldades naturais de um lugar onde se mostra, de quando em quando, como está a pecuária regional, é possível que muitos, ou quase todos, preferissem um local com outro simbolismo.

E não importa que os nomes de 150 cidadãos, os falecidos ou os ainda vivos, tenham sido misturados, sem justificativa, a outros tantos políticos e descontentes; que tenha sido inusitado, mas característico dos nossos costumes políticos, dezenas de pessoas receberem medalhas somente por estar na mesa de honra. Não importa, mesmo porque a homenagem foi recheada de discursos retumbantes e gestos aplaudidos.

O nome de quem está fazendo esse comentário foi um dos escolhidos para representar dezenas de pessoas que, na redação e nas oficinas de O JORNAL DE MONTES CLAROS, mudaram para melhor alguns dos nossos costumes. Depois de receber o significativo medalhão ao lado do querido Padre Henrique Munáiz, homem sempre feliz com uma batina só e muito mérito pelo que faz pela juventude, o comentarista saiu do recinto no momento em que parecia estar chegando o Secretário idealizador da homenagem que pode ter acontecido de modo diferente do que se poderia supor.

Em respeito às pessoas que escolheram o nome do diretor de O JORNAL DE MONTES CLAROS para honrar a imprensa sadia, vamos guardar a medalha. E a guardamos, também, como lição, aprendida ali, de como preservar o civismo apesar do que acontece hoje em dia no meio político. E porque homenageadas foram mais de dez pessoas ligadas a O JORNAL DE MONTES CLAROS: seu fundador, o primeiro diretor, o melhor secretário de redação, o cronista social falecido, excelentes repórteres e colunistas interessados no bem comum, além do leitor que, ainda hoje, sente falta do órgão de imprensa que vive na lembrança de muitos. E vive porque, entre outros feitos, levou à Prefeitura Antônio Lafetá Rebello, o nome mais aplaudido entre os agraciados com a inconfundível medalha Cívitas.


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Por Oswaldo Antunes - 17/6/2007 14:29:09
O MENINO ESCONDIDO



Todos pensaram ou falaram a propósito da tragédia que abateu covardemente o menino Sidnei, de dez anos. Do outro, o criminoso, nem sequer guardei o nome. Talvez o leitor também não se lembre do nome dele, mas devia. E devia lembrar com um certo remorso antes de acusar. Você se recorda que uma Pessoa muito especial disse:- “deixai vir a mim as criancinhas?” Foi Ele quem mandou dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus, esse grande e esquecido ensinamento. E Quem nos ensinou não fez mais do que olhar as duas faces de uma moeda: o lado que mostra o quanto ela vale para a sociedade e outro, mostrando a cara de pau de quem é responsável pela validade dessa convenção social,

Não temos regra pessoal nossa que tenha validade nesses casos. Todos vivemos sob uma suposta ordem constitucional. O Mestre Jesus gostava de usar parábolas para confundir essa ordem constitucional, já que Ele, como dizia Chacrinha, veio não para explicar mas para confundir o que era errado e se considerava certo. O caso da moeda foi muito especial e explicativo: mostrou uma regra que vale para todos os relacionamentos humanos: a sociedade é a responsável pelo valor das coisas é deve garanti-lo, porque se não garantir, não o pode cobrar. Assim, com muito mais razão, deve garantir o valor humano dos indivíduos que a compõem.

Uma criança de dez anos morreu brutalmente seviciada. Foi revoltante, e atos como esse não se justificam. Apesar de que, muitos leitores não vão gostar, protestarão até, pelo que vou dizer: nós colocamos a culpa somente no assassino e esse assassino era uma outra criança, um menino escondido. Quem matou foi um lavador de carros que muitos de nós víamos na rua. Mas dentro dele estava agindo, também, uma criança; aquela que aos nove anos foi brutalizada e seu caso, como centenas de milhares de outros, ficou escondido, não apareceu nos jornais e ninguém se solidarizou com seu sofrimento. Ajuda psicológica? Onde já se viu dar ajuda psicológica para um pretinho pobre, igual a todos os outros pretinhos pobres que passam por problemas de sodomia, trabalho forçado, fome, impossibilidade de estudos, ausência do pai e da mãe? Psicótico, o negrinho continuou vivendo sua vida marginal.

Assim como um doente não pode ser responsabilizado por ter febre, porque febre é apenas o sintoma da doença, o psicopata social, antes de ser criminoso, é sintoma de uma sociedade doente. A televisão mostrou recentemente imagens de meninos com menos de dez anos usados e ensinados pelos traficantes de drogas. E qual foi o resultado pratico daquele documentário? Que providencias foram tomadas pelo Governo ou pelos senhores deputados que tiram dinheiro do nariz como meleca? Nenhuma. E a imprensa que devia ser o grito social? Está acusando o boboca do Vavá, tentando atingir o menino pobre que chegou à Presidência do País. Se aqueles meninos do documentário agora aparecem como os próprios traficantes, usando armas, enfrentando e, atrás de muros, até zombando da policia blindada, porque não esperar que meninos drogados, dentro do corpo de adultos, matem outros meninos?

Queremos dizer que a morte do menino Sidnei não se justifica e foi revoltante. Mas tem uma explicação. E precisa ser entendida. Muitos meninos pobres vão morrer brutalmente enquanto as pessoas votadas pelo povo nada fazem para impedir. Querem apenas ganhar seu dinheiro fácil no fim do mês.


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Por Oswaldo Antunes - 8/6/2007 15:13:00
ECUMENISMO E BEM AVENTURANÇA

Oswaldo Antunes

O Arcebispo de Montes Claros, Dom José Alberto Moura vai chefiar a Comissão de relacionamento da Igreja Católica com outras confissões religiosas. Não é tarefa fácil quando o próprio Papa afirmou a jornalistas que muitos já não querem ouvir as mensagens da Igreja. Em momento de malversação dos costumes, pode ser que mensagens da Igreja estejam sendo confundidas com os movimentos que usam o cristianismo para obter bens e poder terreno.
É possível – a partir de entrevista que deu a um jornal local - que o responsável pelo Ecumenismo, vindo de Uberlândia, ainda não tenha experiência com seitas que dificultarão seu trabalho. Mas deve estar ciente, até por exigência da posição onde chegou, de que, para entender-se com confissões autenticas, há a necessidade de confirmação do ser católico na vida interna da Igreja. Pirâmide, na qual o Espírito Santo costuma agir imperceptivelmente a partir da base, A Igreja não é Igreja sem participação dos leigos. E muitos problemas sociais ligados à religiosidade se devem à uma centralização do Magistério que por muitos é vista como exagero.
A atual facilidade de comunicação em vez de ajudar a conversão forçada e maciça, fortaleceu a conversão individual livremente consentida. Passou o tempo da convicção religiosa pelo medo da condenação eterna. O deus temível, a quem faltava misericórdia, era negação do Deus do Sermão da Montanha. Hoje, a idéia de Deus nasce no sentimento de sua presença. Edith Stein, uma judia convertida, mostrou que não será a presumida perfeição humana, mas o desejo de seguir o exemplo de Cristo que caracteriza o cristão.
Quando nossos teólogos imaginaram liderar o trabalho de exclusão do homem latino americano da miséria, não tinham o propósito de contestar ensinamentos ou evitar o crescimento dos evangélicos. Mas a hierarquia caracterizou a Teologia da Libertação como inimigo interno a ser neutralizado. E essa hierarquia tem agora de lutar contra a exploração da crença em Deus desprovida do seu melhor trunfo, sua presença autêntica e influência junto aos mais pobres.
O Decreto Conciliar Unitatis Redintegratio, reconheceu que os católicos “não vivem com o fervor que seria conveniente”, e que “não há verdadeiro ecumenismo sem conversão interior. Os anseios de unidade nascem e amadurecem da renovação da mente, da abnegação de si mesmo e da libérrima efusão da caridade.”
Ante o avanço de perversas de doutrinas baseadas na Teologia da Prosperidade, o momento que antecede o trabalho ecumênico é primeiramente de reflexão. “Cristo não veio para ser servido, mas para servir” (Mt 20,28). Às crenças que defendem a riqueza e o poder político, a Igreja Católica, junto ao seu povo, deverá dar o exemplo da bem-aventurança. Afinal, o mundo continua com fome e sede de Justiça.


24416
Por Oswaldo Antunes - 7/6/2007 10:55:51
Paulo Narciso, sempre que pode e pode sempre, me cobra pelos textos que costumo ou costumava escrever aqui. É que me tem faltado assunto. O leitor poderá dizer, com certa razão: mas diante de tanta indecência solta por aí, tanta falcatrua, tanto roubo, ao ler o que a Policia Federal anda fazendo, alguém pode alegar falta de assunto para escrever? É justamente esse o problema: gosto de me considerar um jornalista à procura de “furo”, isto é, de
novidades. Daí que corrupção deixou de ser novidade há muito tempo. Por lá, por aqui, em qualquer lugar da santa terrinha. Antigamente era privilégio de um determinado tipo de gente chamada de bandidos. Hoje ninguém sabe exatamente quem é ou não é bandido. Li há muito tempo, quando costumava ler para encontrar assunto e escrever, que hospício é o lugar onde se colocam alguns poucos loucos, porque a maioria deles está nas ruas, dirigindo carros ou pulando na frente deles... Diga-se o mesmo, agora e com mais razão e propriedade, das cadeias e penitenciarias, onde ficam, apenas e aproximadamente, 0,002% dos criminosos. Os outros estão ocupando cargos públicos ou se colocam perto deles; muitos estão vendendo medicamentos, ambulâncias e saúde pública. Só alguns poucos vendem bebidas e cereais. E quantos, ocupando púlpitos e microfones, conseguem vender até a fé em Deus. HÁ grandes proprietários de veículos de comunicação que vendem de tudo, inclusive o patriotismo, a moralidade e a justiça social. Até os encarregados de fazer Justiça estão vendendo ‘”justiça”. Policiais estão se vendendo a granel. Quem pode, vende tudo. E o leitor vai perguntar: e os que não podem, os pobres, esses coitados vendem o que? Nada? Esses, não porque querem, mas porque são forçados, vendem o voto, vendem o suor o sangue, alguns vendem até as filhas menores de idade.
Mas o leitor não deve se importar muito com isso, porque estou escrevendo apenas por falta de assunto. Manoel Bandeira, dizendo das crônicas de Rubem Braga, escreveu: “Braga é o estilista cuja melhor performance ocorre sempre por escassez de assunto”. Mas Bandeira falava da poesia que Rubem punha em suas crônicas quando não achava o que escrever. E não há como colocar um pouco de poesia em crônica sobre corrupção. A não ser que se ponham os versos de Augusto dos Anjos. Se o leitor não teve contacto, ainda, com esse poeta pernambucano que faleceu em 1914, veja essa sua previsão em versos: O mundo resignava-se investido/nas forças principais do seu trabalho.../A gravidade era um principio falho,/a análise espectral tinha mentido!//O Estado, a Associação, os Municípios?eram mortos. De todo aquele mundo/restava um mecanismo moribundo/e uma teologia sem princípios// Eu queria correr, ir para o inferno,/para que da psiquê no oculto jogo,/morressem sufocadas pelo fogo/todas as impressões do mundo externo!//Mas a terra negava-me o equilíbrio.../Na natureza, uma mulher de tudo/Cantava, espiando as árvores sem fruto/a canção prostituta do ludibrio!. Um bom final de semana para quem como nós, você e eu, ainda estamos soltos....


23149
Por Oswaldo Antunes - 24/4/2007 10:11:18
Quem nos dera um Bazar Persa

Agradecendo a mensagem no Mural, vinda de Brasília DF, parabenizando a
Prefeitura, que, "ainda que tarde, iniciou o combate ao barulho em M. Claros". Esperamos que sejam merecidos os parabéns para o que, por enquanto, é apenas noticia. O missivista diz que a municipalidade precisa tomar a mesma providência em relação à poluição visual, que é gritante. Faz referencia a artigo nosso pedindo à Prefeitura intervir no assunto, antes que a poluição chegue a níveis insuportáveis. Níveis insuportáveis que, aliás, já foram alcançados. Diz que esteve em Montes Claros em um fim de semana recente e constatou que as avenidas e ruas estão virando um autêntico bazar persa. (Quem dera tivéssemos aqui um autêntico bazar persa...) E diz que, pelo andar da traquitana, vão pintar os pés-de-pau com propaganda, e até os passarinhos que lá pousarem... Realmente, falamos aqui algumas vezes do que chamamos publicidade de rua e pobreza de idéias. E fizemos referencia à determinação de uma juíza eleitoral (de outra cidade, fique bem claro), dando prazo aos candidatos que sujaram muros e paredes nas últimas eleições, para que mandem apagar todas as propagandas feitas. Dissemos da nova legislação paulistana que obriga empresas exploradoras de publicidade a retirarem, até 31 de dezembro, além de outdoors, painéis luminosos, empenas cegas, e telões eletrônicos, as propagandas em fachadas e cobertura de prédios. O texto também proíbe a distribuição de panfletos. O nome dos estabelecimentos comerciais será reduzido a um tamanho que cumpra sua finalidade, sem exagero. Montes Claros não é cidade bonita, por desleixo. E vem sendo enfeada, mais e
mais, com o passar do tempo e o crescimento desordenado do comercio em geral que tomou conta de sua parte central. Letreiros imensos nas paredes de cores berrantes, placas longitudinais e verticais de toda espécie que obstruem a visão da paisagem urbana e causam mal estar. Os prefeitos e vereadores, ao que parece, nunca viram esse abuso. Até ignoram o que seja espaço público e o malefício de sua ocupação pelo marketing desordenado. Geralmente se entende que espaço publico ocupado pela propaganda de rua é o lugar onde fica o letreiro, e que pertence ao imóvel. Assim, seria propriedade particular. Esse entendimento equivocado sempre permitiu e vai continuar permitindo o abuso. Por o espaço publico ocupado por publicidade escrita em fachadas, muros e paredes, tem uma amplitude muito maior: é o espaço que vai do lugar em que está o letreiro até o onde se situa o expectador. O espaço ocupado por um letreiro, e que é bem público, pode chegar a cem, duzentos metros ou mais em frente à base usada e ocupar toda a extensão de uma rua ou praça. A ocupação desse espaço devia render tributo para os cofres públicos. Mas rende apenas para os donos dos prédios que costumam alugar, e alugam caro, suas fachadas para a colocação de anúncios que são vistos a 500 metros de distancia. 500 metros de poluição visual gratuita. Por esse espaço longitudinal as pessoas e produtos beneficiados deviam pagar à Municipalidade uma taxa, o que não acontece. Pagam ao proprietário do prédio apenas o uso da base. O Prefeito de Montes Claros, no inicio de seu mandato, pediu sugestões e fizemos uma nesse sentido: proibir a poluição visual e, através do controle de uso permitido, aumentar a arrecadação da receita publica, em, possivelmente, alguns milhões por ano. Essa providencia seria tomada com aproveitamento do funcionalismo existente, sem outras despesas. O projeto de lei foi elaborado e seria dado ao conhecimento do Prefeito, que recebeu a sugestão com sua delicadeza habitual, mas, ao que parece não se interessou ou esqueceu. A Câmara Municipal nem ficou sabendo, porque projeto, por criar taxa, deve ser de autoria do Executivo. Enquanto isso a cidade quase parou por falta de arrecadação. A poluição visual, com seus imensos letreiros, as propaganda de candidatos escrita nos muros e paredes em eleições que já passaram continuam afrontando a Lei municipal, a Lei eleitoral e o bom gosto. Parece que a administração municipal (e até os responsáveis pela aplicação das leis eleitorais) está padecendo de lamentável pobreza: a de falta de idéias e contato pessoal com os problemas.


22858
Por Oswaldo Antunes - 14/4/2007 14:36:05
NÓS NÃO TEMOS RAZÃO
Oswaldo Antunes

Vi as considerações da crônica de Waldir Senna Batista sobre a contratação de mais sete jornalistas (salvo sejam), para a Secretaria de Comunicação da Prefeitura Municipal. Crônica objetiva e benigna, põe em dúvida o sucesso de tão grande numero de escrevedores, quanto ao propósito mais que evidente, de dizer o que a Prefeitura está fazendo e o povo ainda não sabe ou não viu. O povo é assim mesmo, não fica sabendo das coisas, não aprende nunca.
Os prefeitos do País inteiro foram a Brasília pedir mais dinheiro do Fundo de Participação para os municípios, E, mais uma vê,z está sendo noticiado que a Justiça reteve outra parcela dessa verba em Montes Claros, para pagamento de precatórios. Só o IPTU não dá para pagar funcionalismo e trabalhar. Em resumo: a Prefeitura está empregando mais gente, mas está sem dinheiro para obras. E essa deve ser a primeira noticia a ser propalada pelos profissionais contratados pela Secretaria de Comunicação, porque é a situação de fato.
A operação tapa buracos esmoreceu. As obras da Copasa, através de sua subsidiária Cowan, para a construção de uma estação de tratamento de esgotos, são frutos de um contrato da administração anterior, que aproveitou o que anteriormente já havia sido combinado, desde que a CAEMC passou o serviço ao Estado, uma campanha, aliás, que teve à frente O Jornal de Montes Claros. O mérito da Prefeitura no caso é bastante relativo, já que há muitos anos essa obrigação deveria ter sido cumprida. Atualmente se tem conhecimento de vedação para demolição de construções muito feias em uma área aberta do Mercado Municipal. O que vai ser ali, não se sabe ainda em detalhes. Mas evidentemente é exagero contratar tantos jornalistas por causa de um tapume.
As sugestões que foram feitas diretamente ao Prefeito logo após a eleição, e depois à sua assessoria, para coibir a poluição visual e, através de lei especifica, faturar alguns milhões em cima da limpeza da cidade, matando dois urubus com uma estilingada só, não mereceram atenção de ninguém. E isso não pode ser cobrado, também, somente da atual administração. Vem do tempo em que se amarava cachorro com lingüiça, no velho mercado da Praça Dr. Carlos.
Engraçado é que a pessoa que está lendo, ao acabar, vai achar que tenho razão no que digo. E que, ao pensar assim, ela também está certa. Mas a verdade é que nenhum do nós tem razão de reclamar. Afinal, elegemos o Prefeito e os Vereadores acreditando nas promessas que fizeram. E promessa é promessa, continua de pé, valeu na eleição passada e vai valer na próxima.


22097
Por Oswaldo Antunes - 17/3/2007 11:37:10
MOC E A REVOLUÇÃO DE MARÇO
Oswaldo Antunes

Ao aproximar-se o dia 31 de março, aniversário da tomada do governo por um grupo de militares, é bom para os mineiros lembrar o que aconteceu com a participação do povo. do governo de Minas e de pessoas de Montes Claros naquele ano de 1964. Foi a Policia Militar de Minas, representada pelo 10° Batalhão, que garantiu a continuidade do funcionamento do Congresso Nacional enquanto a crise se desenrolava. O movimento revolucionário fora arquitetado por um partido político, a União Democrática Nacional que tinha, então, como lideranças mais ativas o ex-governador do Rio Carlos Lacerda, e o banqueiro José de Magalhães Pinto udenista de quatro costados e Governador de Minas. Com inspiração e influencia de Minas a Revolução se fez. Não agrada a muitos mineiros a aparente contradição entre o equilíbrio democrático dos nossos homens públicos e o governo de exceção que se instaurou. Homens como Milton Campos, Pedro Aleixo, José Maria Alkimim e o próprio Magalhães Pinto eram ícones das virtudes democráticas. Deve-se ponderar, entretanto, que desde a queda da ditadura Vargas, anos antes, o País clamava por uma revisão institucional e a classe política estava radicalizada em torno de outros interesses. A própria UDN tentara impedir a posse de Juscelino Kubitschek. Foi um grupo de militares, chefiado pelo general Teixeira Lott, que possibilitou a volta do País à normalidade congressual. Em 1964 esse grupo moderado tinha à sua frente o general Humberto de Alencar Castelo Branco e se opunha à linha dura de outro conhecido como grupo dos coronéis. Para os que não sabem, a primeira esposa do general Castelo Branco era de Montes Claros, filha do professor João de Andrade Câmara e da profª. Cândida Câmara. Castelo Branco iniciou sua carreira militar no 12° RI de Belo Horizonte. Era, assim, muito ligado a Minas. Um intelectual dentro da farda, tinha pensamentos como esses, que deixou escritos: “As Forças Armadas não podem atraiçoar o Brasil. Defender privilégios de classes ricas está na mesma linha antidemocrática de servir a ditaduras fascistas ou sindico-comunistas.” O seu grupo se propunha um movimento que afastasse do poder o ranço getulista, acabasse com o comunismo, mas mantivesse as garantias e direitos constitucionais. Com esse propósito foi desfechado o golpe, arquitetado a partir do Palácio da Liberdade. A guarnição federal de Minas, sob o comando do General Mourão Filho, já previamente contatado, aderiu. Ele não queria, entretanto, que forças do Exercito lutassem entre si. Para uma possível linha de combate com forças do Exercito que se mantivessem fieis ao governo, foi enviada a força publica mineira (o 10° Batalhão da Policia Militar sediado em Montes Claros). A ordem partiu do então comandante da PM, Cel. José Geraldo de Oliveira (da minha turma na Faculdade de Direito, onde tinha o apelido de Zé Guerreiro), para que o Cel. Georgino Jorge de Sousa, comandante do nosso 10° BPM, ocupasse Brasília e cumprisse a estratégia de garantir o funcionamento do Congresso. Aliás, no dia 11 de abril O Jornal de Montes Claros publicava em manchete: “Comandante do 10° BI chefia tropa que guarnece o Congresso”. Se a UDN queria tomar o poder das mãos do PSD e do PTB, ambos getulistas, a vocação de Minas pedia com veemência uma correção de rumos que evitasse o comunismo e a repetição do recurso à força. Na liderança do grupo dos militares moderados, Castelo Branco foi escolhido para a Presidência, substituindo o Presidente da Câmara Ranieri Mazzilli que a ocupara interinamente. Castelo não a quis assumir como militar da ativa: transferiu-se antes para a reserva e no posto de marechal recebeu a faixa, tendo na Vice Presidência o bocaiuvense José Maria Alkimim. Queria que se fizesse a normalização institucional do movimento revolucionário e para isso colocou Milton Campos no Ministério da Justiça. O propósito era uma transição rápida, apenas um ano, para restabelecer em bases sólidas a ordem jurídica. Esse propósito não contrariava os sentimentos liberais, já que, apesar da troca forçada de governo, a Constituição seria e foi mantida. Mesmo assim, ao ser convidado para o Ministério da Justiça, Milton ponderara que cada prisão manu militari seria para ele um drama pessoal. Ao que o Presidente argumentou que desejava Minas à frente da Justiça como sua carta de intenção. Milton havia feito a ordenação do sistema jurídico no governo do Estado, após a ditadura Vargas, e com a virtude do equilíbrio conseguiu superar as dificuldades. Além do que, no plano federal, a radicalização já estava levando a um modo de corrupção. Milton entendia que a justiça social deve ser inspiração da ação política e que deixa de ser justa quando se radicaliza ou quando o bem estar deixa de ser geral. Ao paraninfar os bacharéis da Faculdade Mineira de Direito, dez anos antes, fizera pronunciamento afirmando haver uma “crise de dignidade” que sugeria a existência de uma endemia moral. E mostrou que o clamor do Brasil contra a corrupção “teve uma de suas revelações mais deprimentes no ultimo pleito eleitoral.” Pelos motivos e pelos homens que a iniciaram, a revolução de 64 não pretendeu o poder pelo poder. Há de lastimar-se o erro (vitória da linha radical) da prorrogação do mandato do Marechal Castelo Branco, que estreitou o caminho para as expansões normais do regime democrático, com as conseqüências posteriores, quando, nem a presença de Pedro Aleixo na Vice-Presidência impediu que nuvens escuras cobrissem o panorama político.
Por muitos aspectos curiosos Montes Claros participou ativamente do movimento revolucionário de 64. O montes-clarense Darcy Ribeiro, então chefe da casa civil de João Goulart, era um dos mentores do governo que caía. Intelectual de escol, Darcy não chegou a ser bom político por faltar-lhe jogo de cintura. Quis uma resistência armada ao levante militar. Jango não, preferiu refugiar-se no seu Estado natal. Uma semana antes de eclodir o levante, o então prefeito de Montes Claros, Pedro Santos estivera na capital federal com Darcy Ribeiro que o teria levado a Jango, a quem hipotecou apoio e solidariedade; mas no dia 1° de abril, o Cel. reformado José Coelho de Araújo, que era vereador e seu amigo, o convenceu a tornar-se revolucionário “histórico”. Foram cassados dois juizes de Direito: o montes-clarense Sidonio Paes Ferreira e o juiz titular da Comarca de MOC, Abílio Leite Barbosa Filho, o que foi recebido no meio forense como atitude correta..
Mas, no âmbito puramente da política municipal, a Revolução serviu de pretexto para pequenas brigas e perseguições. Depois veremos esse aspecto para que fique registrado na história de Montes Claros.
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(Acho que destrinquei a dúvida a respeito da mulher de Castelo Branco. Destrincar, como você sabe (ou não sabe?) é a mesma coisa que estrincar, isto é, torcer os dedos fazendo-os estalar... A mulher do marechal chamava-se Argentina Viana Castelo Branco, era irmã do Dr. João Viana, industrial em Belo Horizonte, que era casado com Maria Noeme Câmara, irmã de Abelard. Assim Castelo Branco era cunhado do cunhado de Abelard. )


21855
Por Oswaldo Antunes - 11/3/2007 09:14:29
A VIOLÊNCIA E A MEDIOCRIDADE
Oswaldo Antunes

Por falta de consenso foi adiada a diminuição da idade para responsabilidade penal. Constatou-se que a criminalidade tem outros e vários motivos, e que é também simplista o argumento de que a educação, por si só, diminuiria a violência. Até porque a educação que está faltando não pode ser a que se limita à alfabetização, sem cuidar da ética, da valorização pessoal e profissional o individuo, o que traria desenvolvimento. A educação que está aí, porque não atrai e não orienta, causa reprovações, repetências e desajustes perniciosos; pode produzir eleitores, mas não faz cidadãos. Veja-se que a maioria dos delitos contra a pessoa ou o patrimônio é praticada por pessoas que passaram por esse tipo de educação. E diplomas formais não impedem os crimes de colarinho branco, nem os de difamação escrita, transmitida radiofonicamente ou televisionada. Se ensino fosse impedimento, apenas os absolutamente analfabetos praticariam usurpação, receptação, desrespeito ao trabalho, estelionato, sem falar nos delitos de quem devia ser responsável pela educação, os administradores letrados e os parlamentares verbosos.
Em noticias e comentários objetivos, O TEMPO tem mostrado que é preciso sanar um dos principais fatores de criminalidade, a falta de oportunidade profissional e a humanização do individuo. Essa humanização deve iniciar-se com a administração federal assumindo, como função do Estado, a obrigatoriedade e universalidade também do ensino médio, principalmente o profissional, sem o que não há interesse na conclusão do primário.
A idéia de criminalidade só por falta da educação formal é tentativa, como tantas outras, de deixar tudo como está. Os que dominam sugerem liminarmente aos dominados que eles próprios são responsáveis. E acontece no momento em que a informática está disponível para o bem ou para o mal. Se o Presidente da Republica deseja a educação a distancia, via computador em cada uma das 4.600 escolas brasileiras, deprime saber que em alguns municípios ainda não há sequer telefone e eletricidade.
Realmente, convem pensar melhor em como dar à juventude o sentimento profundo e prático de dignidade, através de uma educação que moralize e dê emprego. Seria apropriado “educar” a própria Justiça para que seja menos preciosa e lenta para ser justa, tanto social como legalmente. E combater a burocracia que empurra o destino humano para a mediocridade e cria revolta.


20628
Por Oswaldo Antunes - 2/2/2007 12:07:58
O TORMENTO DE DEUS
Oswaldo Antunes
Não sei por onde anda Frei Mateus Rocha O.P. Mas está sempre perto, muito perto de mim, em um livrinho publicado em 1969, contendo quatro ensaios, os três primeiros sobre Dostoievski e o último sobre aspectos do ateísmo contemporâneo. Foi a primeira vez que vi um religioso dizer como é difícil acreditar em Deus: “A existência de Deus não é evidente. Entre pressentir e afirmar vai uma distância enorme: quase a mesma que há entre o instinto e a razão”.
E prossegue: se Deus não é evidente, é possível negar sua existência. Santo Tomás de Aquino afirmava que “o espírito humano é capaz de um conhecimento objetivo, propriamente cientifico, que atinge a verdade das coisas sem precisar recorrer a Deus (...) os fenômenos físicos são explicados pelas ciências da natureza e os morais pelas ciências humanas”. E se Deus é cientificamente inútil e moralmente impossível, a inteligência, por si só, pode concluir que Deus não existe.


Mas o coração é maior do que a inteligência, diz ele. Aliás, na mesma linha de pensamento, Pascal dizia que é o coração que sente Deus, e não a razão. E o educador Rubem Braga afirma que “Deus existe para tranqüilizar a saudade”. Porque saudade não é uma melancolia sem conseqüências. É o sentimento ativo, ligado ao nosso principio de vida no mundo e, por conseqüência, sentimento que pode imprimir novos rumos à vida interior e ao espírito, moldando o futuro e a esperança.

Essas verdades superam as aparências, brotam constantemente da nossa in-consciência. Verdades, aliás, que nem sempre ouvimos dos que pregam (muitas vezes querem impor) a religiosidade. Por que os bispos, padres, rabinos e pastores não se compenetram, quando falam, que as razões para não crer em Deus, por serem menos profundas, aparentemente são mais fortes? Porque sempre procuram justificar erros passados, como a pena de talião ou a inquisição, sem reconhecê-los publicamente como formas perversas de negação de Deus? Por que não deixar de lado a vaidade intelectual e reconhecer que somente o amor constrói para a eternidade?

É da necessidade do coração, da insuficiência da razão, do desgoverno de nossas vidas e dos erros ou maus exemplos de quem ensina que nasce o Tormento de Deus. Por isso Dostoievski foi um profeta. Sem ser teólogo ou moralista, debruçou-se sobre o futuro e anunciou à humanidade a existência de forças que tornam inquieto o coração do homem. Ele próprio foi, segundo André Suares, “o coração mais profundo, a maior consciência do mundo moderno”.

Meu apreço a frei Mateus Rocha, O.P., esteja onde estiver no mundo ou na profundeza de Deus.


20105
Por Oswaldo Antunes - 17/1/2007 16:42:47
NORTE DE MINAS E MATA SECA
Oswaldo Antunes
Às reclamações de prejuízos causados ao desenvolvimento por órgãos ligados à política de meio ambiente, surgem defesas geralmente ligadas ao setor criticado. São feitas por pessoas bem intencionadas e mal influenciadas. O desacerto entre desenvolvimento e meio ambiente passou a ser permanente no Norte de Minas. E o Conselho Estadual de Política Ambiental está agora com a responsabilidade de referendar a classificação dos biomas do ecossistema do serrado norte mineiro.
A região tem o maior rebanho bovino de Minas, embora seja o Polígono das Secas. E a confusão do bioma foi criada a partir da Constituição de 1988, quando órgãos públicos foram instruídos “a preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais.” Passou-se a entender, equivocadamente, que até o mato que cresce nas pastagens é considerado mata em regeneração e, por isso, deve receber proteção ambiental. E o equívoco aconteceu no momento em que a pecuária local entrava em crise de desorganização e falta de assistência do governo. Vieram projetos complementares de desenvolvimento que utilizam da terra para a produção de sementes e rações. Depois, com o incentivo da produção de álcool e biodiesel, ressurgiu a necessidade de desmate para plantio de cana, mamona e pião manso, que é uma espécie arbórea.
Apesar de cobranças feitas ao governo do Estado, mais enfaticamente ao Secretário de Meio Ambiente sr. José Carlos Carvalho, o confusão entre preservar e restaurar continua dificultando o desenvolvimento regional. E é para esta região, precisamente, que o segundo governo do sr. Aécio Neves diz estar voltando os olhos. Duas outras Secretarias deveriam estar interessadas em descomplicar a visão caolha que quer regenerar a Mata Atlântica onde ela nunca existiu: a secretaria da Agricultura, sob o comando do agro-pecuarista Gilman Viana, e a Secretaria Especial para Desenvolvimento da Região Norte e Vale do Jequitinhonha, dirigida pela sra. Elbe Brandão que nasceu na região do serrado e a conhece bem.
A Universidade de Lavras fez estudo e concluiu estar a mata seca do Norte de Minas fora do bioma da Mata Atlântica. O trabalho foi aprovado pela Câmara de Proteção à Biodiversidade do Copom, mas falta o referendum do plenário. A burocracia não deveria continuar vigorando, ainda que se invoquem as férias e se alegue que o Carnaval está chegando. A governo que queira desenvolver uma região não é permitido confundir trato produtivo com crime ambiental, nem querer que a floresta volte ao que era no tempo do descobrimento


19915
Por Oswaldo Antunes - 11/1/2007 10:05:49
A VIDA E A IDÉIA DE DEUS

Oswaldo Antunes

Uma afirmação de Leonardo Boff : a vida não é espírito nem matéria, é simplesmente eterna; a ciência demonstra que, antes de a vida começar em nosso planeta, antes do antes, já havia vida. É conjectura, cientificamente embasada, que, de certa forma, contesta, e confunde mais, o mistério com que se costuma envolver o inicio do universo. O big-bang foi precedido pelo que já havia. Raciocínio que levanta a questão das crenças fabulosas, não baseadas em dados científicos, como a do surgimento da vida humana no paraíso.
Muitos cientistas foram perseguidos, censurados e até condenados por se rebelarem em desfavor dessas crenças. O astrônomo Galileu Galilei escapou da fogueira por afirmar que a Terra gira ao redor do Sol. O cientista, teólogo, filósofo, astrônomo e matemático, Giordano Bruno, foi condenado à morte por suas teorias sobre o universo infinito e a multiplicidade dos sistemas siderais, por rejeitar a teoria geocêntrica tradicional e ultrapassar a teoria heliocêntrica de Copérnico, que mantinha o universo finito. Interessado na natureza das idéias e no processo associativo da mente humana, embora tais campos não existissem na ciência, Bruno foi tomado pelo fascínio de provar, com embasamento filosófico, os grandes conhecimentos científicos. E por ter usado a intuição nas suas descobertas - dir-se-ia que foi o predecessor de Einstein – pagou com a vida biológica a ousadia de fazer parte da vida e tentar explica-la.
Ainda hoje existe a obrigatoriedade religiosa da aceitação de preceitos que, na verdade, são fruto de ultrapassadas conveniências políticas. Essa obrigatoriedade existe para os que aceitam o deus que faz e desfaz, policia, julga e castiga; um deus que não é o Deus da origem das coisas e das idéias; existe para os que não sabem que religião é o modo de cultuar uma idéia de Deus. Em determinados momentos históricos, à falta de liberdade, a crença religiosa passou a ser desumana. Negou, como alguns dogmas ainda negam, a possibilidade de idéias que não convinham aos poderosos.
É a dúvida que cria a necessidade da Fé. Entendimento parecido, aliás, com o que está no Eclesiastes: “Na muita sabedoria há muito enfado; aumenta a ciência e também a tristeza”. Porque o conhecimento pode limitar a alegria da Verdade que o próprio Cristo se negou a dizer o que seja. Porque ninguém sabe a origem do que existe, fora e dentro de nós, uma parcela cientificamente explicável do que já existia antes do antes e não há como explicar.


19629
Por Oswaldo Antunes - 3/1/2007 16:37:52
DO CRIME TRANSPARENTE

Oswaldo Antunes

O assunto está na ordem do dia: alguns crimes deixam de ser crimes quando praticados à luz do dia. E pensar que tantos morreram no escuro em defesa da honestidade e da dignidade pessoal. No ano passado foi sepultado em Montes Claros o homem do povo Porfírio Francisco de Sousa que carregou discretamente várias marcas de torturas, praticadas quando sequer o ideal de liberdade podia ser transparente. Como ele, os belorizontinos vereador Orlando Bonfim e o estudante José Carlos da Mata Machado, torturados e assassinados entre paredes. Vale lembra-los agora pelo contraste. Morreram obscuramente, por uma moralidade clara. Estiveram nas catacumbas da nossa formação histórica, quando hoje a transparência ilumina a injustiça social, a malversação do poder e do dinheiro publico.

Passou a ser, no mínimo, curiosa a verificação de que a perversão publica é justificável desde que se faça às claras. À luz do dia, o delito passa a ser aceito. Mas não chega a ser novo esse tipo de moral política. Não fosse a falta de cultura de quem a pratica, poderia ser a continuidade do modo infinitivo de roubar a que aludiu o Padre Antônio Vieira no Sermão do Bom ladrão. Na verdade, muitos que se elegem para cargos públicos desconhecem o sermão famoso. Mas esse analfabetismo que não impede a esperteza. A manha, a astúcia que a politicagem ensina, é perpetrada em prejuízo do outro analfabeto político, o que morre de fome sem saber o porquê do custo de vida e o que engole calado o preço do feijão, da farinha e do remédio, de tudo que depende de decisões não muito transparentes.

É forçosa ainda a conclusão de que a corporificação nos órgãos de poder leva á vigência desse aproveitamento malicioso. À falta de um critério moral na escolha dos homens públicos, passa a vigorar a regra do desfrute, desde que feito à vista de todos, pela maioria. Até alguns órgãos e homens que deviam promover e garantir a Justiça entendem que esse suposto poder lhes é dado pelo povo.


19227
Por Oswaldo Antunes - 18/12/2006 16:36:19
MOMENTO

De Oswaldo Antunes,à memória de Ernane Antunes Pereira.


Quando o momento chegar

definitivamente

o relógio não será empecilho

à germinação fecunda

da semente.

Não se abrirá a porta sonhada.

E a esperança prometida

como fruta madura

cairá na terra.

A luz da manhã continuará solta

pendida levemente sobre a relva.

Entre flores e insetos,

estará a certeza de encontrar

o caminho de volta.

O silêncio dentro do silêncio

todo silêncio será meu.

Ninguém verá a nuvem

sem promessa de chuva

que cobrirá meu sono.

O descaso fechará as bocas

que falavam comendo.

E uma poeira de vozes

fechará os ouvidos ao desnecessário

para a curta viagem.

Só então se fará a revelação

da percepção clara das flores

da cadencia fluida das águas

da audição constante das pedras.

E como brisa fresca

a visão ampla dos cegos

não ficará surpresa

se o coração sentir frio

e a mente aproveitar-se

p´ra voar no céu vazio.

Porque a imagem futura

estará só e simplesmente

nos olhos fechados

enquanto os outros olhares,

afoitos, escancarados

procuram ver no finito

a doce e definitiva

visão de todas as coisas.


19216
Por Oswaldo Antunes - 18/12/2006 11:24:52
DO NATAL NÃO COMPREENDIDO

Jamais consegui sentir a azáfama da proximidade do Natal como tempo de alegria. Talvez por ter-me faltado na infância a compreensão do Natal barroco, apenas contemplativo, sem a agitação desse inventado agora.
Lembro-me, vagamente, de respeitosas, misteriosas e difíceis “missas do galo” a que nunca fui. Eram sempre à meia noite e as meias noites eram para o sono da infância e alguns poucos sonhos entre pesadelos atribuídos à ação das lombrigas. Depois, na juventude, o Natal se limitava a presépios feitos com caixotes cobertos por jornais amassados e colados, depois pintados com tinta preta, para ficar parecendo pedras. Quase todas as casas mantinham as portas escancaradas, para que fossem vistas as “lapinhas” artificiais, sempre repetidas, que desapareciam tão logo a noite chegava à cidadezinha onde não havia luz elétrica. Candeeiros de querosene, perto de papel pintado e capim seco, costumavam labaredar quando ventava e não eram aconselháveis. Velas não havia ou custavam caro.
Por isso, as desbotadas imagens de gesso representando o menino, seus pais, o burrinho e a vaca (a coitadinha sempre deitada), somente podiam ser vistas durante o dia. Havia o luxo de canteirinhos de terra feitos dentro de uma bacia e semeados no tempo certo com arroz para nascer a partir de 20 de dezembro; e um lago pequenininho, em que a água era representada pelo espelho redondo de bolso, dos que eram usados para se pentear os cabelos com brilhantina. A não ser isso, os presépios eram enfeitados com a fruta da época, a pitomba.
Pitombas enormes, que interessavam ao apetite da meninada; costumava-se pedir, umazinha só, à dona da casa, para sempre receber a mesma resposta: “Pode não! As pitombas são do menino Jesus”. E não havia alegria na constatação de que a gente era apenas menino de verdade, com vontade de comer pitomba, e as pitombas eram para o menino de gesso que nem as podia provar.
Mais tarde viria a explicação do porquê desse Natal simplezinho, e dos outros: devia ser a comemoração do nascimento do Salvador, representado por
aquela miniatura de menino. E essa versão, também, não trazia alegria, e explico: a gente começava a raciocinar e ficava intimamente entristecida pela inevitável ligação do Natal com a Paixão que viria logo a seguir. O nascimento era comemorado como festa, já sabendo de antemão que o Deus menino estava destinado a ser traído, torturado e assassinado lentamente em uma crucificação. E surgia a pergunta considerada atéia, mas inevitável: o Deus onipotente não poderia, Ele próprio, acabar com os pecados todos, fazendo um simples gesto de misericórdia, sem necessidade de morrer na cruz? À falta de resposta, restava a tristeza de não ter a explicação do inexplicável.
O tempo foi passando, as coisas pareceram mudar, o poeta até perguntou o Que havia mudado: se ele, ou o Natal. E milhares de bobocas, pelo País afora, repetiram, ano após ano, essa pergunta como se fora a solução do problema da insatisfação humana. O que em verdade interessava entender era porque o Natal ingênuo da manjedoura se havia transformado na festa de ostentação do Papai Noel barbudo e histriônico. E porque no lugar das pitombas, sempre negadas, se davam agora tantos presentes a todos. E porque alguns podiam comer e beber tanto quando, nas famílias pobres, as criancinhas choravam. Porque essa alegria da fartura possibilitada pelo dinheiro, e a tristeza dos sem Natal. Como poderia esse contraste ser o símbolo do nascimento, da vinda da salvação de todos.
Por certo, não havia mudado o Natal nem mudaram os homens. Não houvera transformação quanto ao desentendimento do essencial. Nessa noite de sinos, luzes e enfeites o que se comemorava, e na verdade se comemora, eram e são os bens do mundo, os prazeres do egoísmo; e a permanecia do tradicional esquecimento dos que sofrem.
Para nós, que estamos assentados em sofá macio, a televisão estará anunciando um fantástico Natal sem fome, o Natal dos Sonhos, falso descarrego de consciência. Um dia no ano com menos de miséria e outros 364 dias de esquecimento, de revolta, de marginalidade criminosa.
Eu não posso, sei que não devo - acho que ninguém pode e não deve - fugir dessa tristeza no Natal. A tristeza de reunir a família, os filhos e os netos em torno de uma mesa, de uma árvore com enfeites e luzes, cercada de presentes, fazer algumas orações da boca para fora, e sentir no artifício
das gargalhadas a falta da misericórdia que essa data devia simbolizar.
Quando nos falta, a todos, a certeza do verdadeiro espírito do Natal, está faltando o significado do advento que deve ser a preparação da Paixão e da Páscoa. Enquanto não houver o espírito de com-paixão, nenhuma festa será justificativa para a alegria. Anuncio e certeza da crucificação, o Natal precisa ser entendido como promessa de ressurreição da carne. A carne que é fraca e somente o espírito a pode fortalecer.


13666
Por Oswaldo Antunes - 3/6/2006 09:50:01
SAUDADE E FUTURO
A choradeira provocada pela demolição do prédio onde funcionou um colégio,
e depois esteve alugado para sede provisória da Prefeitura, é puro
sentimentalismo, respeitável mas injustificável. Vamos refletir sobre o
assunto. As decisões apenas baseadas em um sentimento não são o que se
costuma chamar de melhor caminho. Chega a ser ridículo alguém reclamar
porque uma velha mangueira, que não podia continuar dentro do prédio a ser
construído, foi cortada. Mangueiras, nos quintais de quase todas as casas
das cidade, é o que mais existe em Montes Claros. É basbaquice pura, espanto
por nada, lamentar pelo que pode ser substituído com vantagem e esquecer os
benefícios do progresso. E chega a ser impiedoso sobrepor o corte de uma
mangueira ao sofrimento e morte de tantas crianças por ai. A alta sociedade,
que se diverte e alimenta ilusões, também gosta de banalidades.
A história de uma cidade e sua trajetória urbanística não pode ser avaliada
ao sabor dos sentimentos pessoais. Isso porque o uso das tradições precisa
ter perspectivas que o justifiquem. Até o folclore, a cultura popular, se
normatiza na tradição. Haveria, por exemplo, interesse turístico na
manutenção de um prédio comum, somente porque serviu a um colégio onde
estudaram as pessoas que estão chorando? Qual a possibilidade teria aquela
construção de argamassa, e seu enorme quintal, de servirem à criação de um
espaço cultural, que justificasse o seu tombamento? Estaria a antiga sede do
seminário, que a própria Mitra resolveu vender, ligada à nossa história
arquitetônica, de modo a ajudar a entender a constituição do feio urbanismo
local? Esse urbanismo está resumido em alguns velhos sobrados abandonados e
milhares de casas comuns transformadas em um tipo de comercio de vilarejo
que tomou conta da cidade.
É difícil apontar outro aspecto, fora a saudade gostosa de tempos de
juventude, para justificar a permanência daquele imóvel em detrimento da
construção de um edifício comercial que vai gerar empregos e,
conseqüentemente, ajudar pessoas a viver melhor. Ali não havia imagem ou
forma que justificasse a preservação. Sequer a cidade, considerada como um
todo, tem aspecto colonial ou de outro tipo histórico a ser preservado. E se
o antigo seminário não tinha como justificar seu tombamento, só a saudade de
algumas pessoas não o justificaria, embora justifique as belas crônicas que
foram escritas a propósito. Mas não é com a saudade do passado que se
constrói o futuro.


11989
Por Oswaldo Antunes - 31/3/2006 09:35:34
INQUISIÇÃO NO SENADO

Oswaldo Antunes

Não dá para aceitar, sem aderir ao exagero, o procedimento de um senador da
República que ocupou a tribuna várias vezes, colérico, para exigir a saída
de um Ministro. E dois dias depois, quando aquela autoridade deixou o cargo,
o senador disse que havia derrubado o melhor Ministro da Fazenda que o
Brasil já teve. Assim mesmo. O inferno de Palocci foi uma espécie de jogo de
bingo. Povo, decência e honorabilidade parlamentar ficaram em segundo lugar.
Trata-se de ganhar eleição.
Exagero por exagero, digamos que esse tipo de campanha eleitoral era
inusitado: as crises nascidas em uma comissão de inquérito. Primeiro a dos
Correios: depois de 9 meses, 5.000 paginas e milhões de reais, está acabando
como começou: indicia pessoas por crimes eleitorais, enquanto outros
delitos são inventados e praticados nesse campo. Mas a outra, a dos bingos,
é particularmente curiosa: é comandada por senadores irados, entre eles, o
autor da frase referida,e ACM que renunciou ao mandato e à presidência da
casa por falta de lisura. Devia apurar irregularidades nos bingos, os de
verdade. Mas está cantando pedras. Até a pedra 90 já foi cantada. E leva o
jogo para o plenário do Senado marcar na cartela. Logo o Senado, cuja função
constitucional seria a de moderar crises.
Não se tem conhecimento de Inquisição parecida. As CPIs nasceram do clamor
popular contra fatos determinados. São convocadas para finalidade, nunca em
aberto ou para servir a interesses partidários. O jurista Pontes de Miranda
é preciso e exato ao dizer que não se pode abrir CPI para crises in
abstracto". E o que vem sendo feito, sob a alegação de depurar a
moralidade, é fabricar crises, muitas delas abstratas, visando a derrubar
um Presidente que o povo apóia.
Veja-se o caso curioso do caseiro que teve o sigilo bancário violado. O STF
impedira sua oitiva, que caminhava para a violação de outra garantia
constitucional, a da "intimidade, da vida privada, da honra e da imagem de
uma pessoa". Os senadores protestaram, culparam por isso o Presidente da
República e pediram a demissão do Ministro. Esqueceu-se que, tão importante
quanto salvaguardar segredo bancário, é a honra das pessoas.
O palavrório repercutiu na mídia ávida de escândalos, a ponto de um jornal
italiano publicar, em manchete, esse absurdo: "Brasil: sexo e evasivas
abalam o governo Lula". Parece estarem sendo desprezadas as convenções e a
justiça social. Esquecem-se, novamente, as crianças vítimas do trafico de
drogas, de quem o Congresso nem tomou conhecimento. E esse assunto sim,
devia merecer comissão de inquérito, se fosse possível, permanente. Porque
a CPI do Tráfico de Drogas acabou tão rapidamente que parecia estar com
medo. Nem deixou vestígios de punição, a não ser Fernandinho Beira Mar,
condenado a voar para conhecer prisões em diversos Estados.
Enquanto isso, a CPI dos bingos vai fazendo a função de tontear cabeças e
viciar a opinião pública. Põe à mostra velhos vícios e o preconceito de uma
parte da elite que, em dois partidos, domina a Inquisição pré-eleitoral.
Para atingir a popularidade de provável candidato à reeleição, vai
derrubando tudo ao redor para que a esperança prometida não volte a influir
nas urnas.


11614
Por Oswaldo Antunes - 16/3/2006 16:01:30
O CONFUSÓRIO

Oswaldo Antunes

Entre frases que demonstram a dificuldade de a gente escrever o que pensa, e
coletadas em provas vestibulares no Rio, vale reproduzir algumas como ponto
de partida para o comentário: "o Brasil é um País abastardo com um futuro
promissório parece que confusório e preocupatório também"; e, " precisamos
tirar as fendas dos olhos para enxergar com clareza o número de famigerados
que aumenta". As frases parecem mais absurdas do que realmente são, na
medida em que, além dos erros lingüísticos, denunciam uma incerteza que está
levando ao desentendimento quase generalizado, já que atinge a todos nós.
Com o respeito devido, vamos compara-las com outras, aparentemente bem
construídas, recentemente, ditas pelo Cardeal Presidente da CNBB. Mas,
antes, vale lembrar o que diz o brocado jurídico: ninguém pode possuir a
parte incerta de uma coisa. E está muito incerta no Brasil essa coisa que se
chama realidade.
Ao afirmar que pouco dinheiro não resolve o problema dos excluídos, que
precisam de emprego, o eminente Cardeal faz uma afirmação que parece certa a
principio, mas se torna incorreta em face da realidade. É certo que a ajuda
da bolsa família não resolve o problema de emprego, assim como o vestibular
não resolve o problema do ensino. Mas na realidade esse pouco dinheiro ajuda
a minorar a fome de milhões de pessoas. Posteriormente, desmentindo as
expressões "politicalha para garantir votos" e "governo mais submisso aos
banqueiros da história do País", o Cardeal colocou duas sentenças que, com a
devida vênia, também merecem exame: "-Reconheço que o Governo do Presidente
Luis Inácio Lula da Silva tem mostrado sensibilidade pelos mais pobres da
população, embora insistamos que a situação de desemprego estrutural no País
requer medidas também estruturais como condição para a sua estabilidade";
É acaciano que a correção do estrutural requer medidas estruturais, mesmo
quando há incerteza no conhecimento dessas estruturas. Mas pedir que medidas
venham estabilizar a situação de desemprego, na melhor das hipóteses é erro
de expressão. Além do que, do Governo, a grande estrutura, fazem parte os
três poderes, os meios de informação e a sociedade. A critica não deveria,
assim, ser dirigida, nominalmente ao Presidente da Republica. É erro de
entendimento.
Outra frase: "-Auguramos que o Bolsa Família, além de responder ao direito à
alimentação, como direito fundamental à vida, consiga solidificar as
mudanças qualitativas que favoreçam a uma real inclusão".
A bolsa família foi criada como tentativa de compensar a falta de
distribuição de renda e diminuir a fome de milhões de brasileiros sem
trabalho. E, evidentemente, não pode solidificar mudanças, nem de imediato,
como num passe de mágica, nem a médio prazo, porque as grandes mudanças
qualitativas, que devem vir para favorecer uma inclusão, serão fruto do
desenvolvimento. E fome não é fator de desenvolvimento.
Como se vê, os erros e acertos se interpelam. E os de baixo, que não têm
dono, respondem aos de cima. Sem dúvida, tudo muito confusório e
preocupatório, como diria Dadá Maravilha.


11021
Por Oswaldo Antunes - 18/2/2006 15:23:26
O BANCO LATIFUNDIÁRIO

OSWALDO ANTUNES

Fizemos aqui referencia à agiotagem do Banco do Nordeste, que está tomando a terra dos produtores rurais, sob a alegação de que eles não pagam o empréstimo tomado. De Janaúba, um leitor que tem os argumentos de bancário bem remunerado e mal preparado, contestou essa verdade e tentou argumentar que, para reaver o dinheiro emprestado, somente restava ao BNB o seqüestro dos bens do devedor. Acrescenta que esses bens seqüestrados são leiloados para quitação dos débitos. São argumentos falsos e descabidos. Primeiro, porque o BNB não empresta seu dinheiro e não subsidia como antigamente para ajudar o homem do campo. Hoje apenas repassa, agencia e faz agiotagem com dinheiro de fundos, o do Nordeste, o de amparo ao trabalhador e outros. Em segundo lugar, porque o BNB não está cobrando o que emprestou e que seriajusto: está cobrando especulação para lucro seus e dos fundos, especulação mais usura, TJLP mais juros, depois juros sobre juros calculados mensalmente e incorporados ao valor inicial da dívida. E essas taxas engordam tanto a divida que ela chega a ser maior do que o valor dos bens seqüestrados. E sobre esse valor absurdo, ainda incidem taxas de manutenção do debito, honorários dos seus advogados, que recebem do Banco e recebem também dos clientes. Em qualquer país civilizado, isso seria chamado de ladroeira, em vez de empréstimo bancário. Seria caso de cadeia. Aqui não chega a ser, sequer, crime de colarinho branco.E ainda há outro argumento: quando o imovel vai a leilão geralmente acarreta prejuizo ao Banco e, nas mãos de outro proprietário continuará improdutivo se não houver a ajuda, sem usura, para a qual o Banco do Nordeste foi criado. É possível que haja alguns desviadores do dinheiro tomado, mas esses sãzo os grandões, que foram protegidos pelo próprio Manco. A grande maioria, noventa e nove por cento, principalmente na região do semi-árido de Minas, não paga porque a atividade agrícola ou pecuária não permite sobra de dinheiro para pagar o impagável. O Banco do Nordeste foi criado como banco de fomento: para ajudar o homem do campo no desenvolvimento do semi-árido. E a região do Polígono das Secas de Minas ajudou muito na criação do Banco para esse propósito. Vale ressaltar, ao final, a mensagem que recebemos de Astério Itabayana Filho:. "Aqui em Januária nas margens da BR- 0135, saída para Itacarambi, tem um exemplo. A divida cobrada é maior que o patrimônio em terras e equipamentos. Foi área algodoeeira e, posteriormente, produtora de tomates para industria. Na colheita do algodão não houve preço compatível ao pagamento. Na colheita do tomate havia atraso do transporte da industria, estrada de cascalho e isto ocasionava perdas. Resultado.A divida (?) do empréstimo não pôde ser paga e hoje a área esta LOTADA DE "SEM TERRA". Recuperassem o antigo proprietário e o imóvel estaria gerando produção e emprego". É isso aí, o BNB está dificultando o que devia ajudar: a produção e os empregos no campo.


10997
Por Oswaldo Antunes - 17/2/2006 12:01:47
A REALIDADE E A SECA

Oswaldo Antunes

Recorro ao que já foi dito: existe uma verdade, que é a verdadeira, e outra de cada um, refletindo o modo de querer ou entender da pessoa que a expõe. Uma versão pode ser incorreta, sem ser mentirosa, quando mostra uma faceta da realidade por necessidade pessoal de criar ou recriar um fato. Psicologicamente, esse procedimento é natural no esforço de atuar dentro da limitação de cada um. Vi no jornal e transcrevo: "Embora reconheça que as medidas paliativas de combate aos efeitos da seca sejam necessárias, mas não resolvem o problema, o vereador Ildeu Maia, do PP, presidente da Câmara Municipal, criticou o governo federal pela falta de vontade política em adotar programa permanente para ensinar o povo a conviver com a falta de chuvas." Com o nome de tradicional família da região, e certamente bem intencionado, esse vereador chamou recentemente a atenção, pela iniciativa de construir uma nova sede para o Legislativo. Fala agora de uma realidade, a seca, depois de haver defendido uma faceta menos exata da realidade, a construção da nova sede para a nossa ativa vereança. O dois fatos dão oportunidade de avaliar o que seja verdadeiro e o menos exato. Começa pela contradição de medidas paliativas para os efeitos da seca. O que é paliativo, encobre com aparências. No caso, disfarçaria os fenômenos da natureza. A falta de chuvas é problema cíclico natural e verdadeiro. Sobre ele não influi a surrada vontade política. Se vontade política influísse, nos paises desenvolvidos não haveria terremotos, tufões e nevascas que causaram e vão ainda causar muitas mortes. O governo japonês ou norte-americano não conseguirá nunca ensinar o povo a conviver com os sismos. Para atender ao que o vereador sugeriu relativamente ao semi-árido do Nordeste, foi criada a Sudene. Via Departamento Nacional de Obras contra a Seca, esse órgão cumpria programa de reserva de águas pluviais e captação no subsolo, e ajudou no desenvolvimento. Mas foi corrompido com o mau emprego do dinheiro público, tal modo, que o Governo passado o extinguiu. O atual Governo prosseguiu na construção de poços, cisternas e reservatórios e está tentando reorganizar a Sudene para sua finalidade verdadeira. Como vontade política na Sudene, restou a agiotagem do Banco do Nordeste, que passou a cobrar o impagável e a tomar terras de quem deve, tornando-se o maior latifundiário improdutivo do País. O apelo do vereador devia ser para a correção desse abuso.


10494
Por Oswaldo Antunes - 31/1/2006 10:18:58
ESPIRITISMO E NOVELA

Oswaldo Antunes

Francisco Cândido Xavier foi a maior referência do Espiritismo nos últimos tempos. Autêntico em sua fé, convenceu pela pratica de duas virtudes muito próximas: bondade e caridade. E usou a publicação de suas obras com dois objetivos: difusão doutrinaria e renda para auxilio de pessoas carentes. Esteve dentro do cristianismo pela caridade, embora não tenha estado pela crença. Porque a comunicação entre espíritos, vivos e mortos, o desejo como força geradora do destino e a reencarnação, foram elaboradas de forma puramente humana. O astrofísico Alan Kardec, sem assistência filosófica ou teológica ao que parece, retomou o carma indiano para contabilizar os atos bons e maus praticados pelo homem. Em caso de saldo negativo o espírito fica obrigado a voltar à terra para aperfeiçoar-se em outro corpo.
Acredite-se ou não, o fato é que a mediunidade de Chico Xavier deixou um
enigma para os estudiosos: mais de quatrocentos volumes que escreveu e disse terem sido psicografados. Autodidata, tinha inegável cultura literária e um intelecto superdotado e criativo. Apesar do pequeno grau de aprendizado escolar, era ledor inveterado e obsessivo, a ponto de quase perder a visão nesse afã.
Nos livros que escreveu, fala do amor que habita o homem mas ultrapassa a dimensão do tempo para entrar no eterno. As pessoas não se sentem à vontade quando chamadas a refletir sobre eternidade por associa-la à idéia de morte. E nasce a questão: se uma parcela de eternidade, a que se acredita estar no espírito, habita a pessoa humana, a participação na divindade não existiria somente com a vida biológica, acompanharia o homem em novo nascimento após a morte.
E porque o homem, quando na vida terrena, necessita acreditar na continuação do seu intelecto, tende a crer também que voltará à sua origem eterna. Repetindo Leonardo Boff, a morte, em vez de ser ruptura, seria uma restauração da vida, a volta ao útero do grande Mistério que desafia a razão e a inteligência humana.
O homem inventou o tempo para marcar a duração das coisas e da vida biológica, mas a noção de espírito não em principio nem fim. O ser humano é condicionado às noções do "de onde vim, e para onde vou". Do nada para o nada? Ou do mistério para o mistério? Jesus Cristo - a única referência humana desse Deus cuja natureza desconhecemos - segundo o testemunho dos que escreveram a Bíblia afirmou sua divindade encarnada e a prevalência da vida sublimada após a morte. Quem acredita que Cristo voltou à essência de Deus depois de assumir a condição humana, deverá crer no regresso do homem ao estado anterior ao seu nascimento. E nessa crença poderia estar, inclusive, a noção do que possa ser o céu dos cristãos, o paraíso dos muçulmanos. Ao ensinar a oração do Pai Nosso, Jesus teria empregado o verbo ser onde a tradução e várias modificações colocaram o verbo estar. O certo seria "Pai nosso que és o céu", em vez de "Pai nosso que estás no céu".
O certo é que dentro desse Mistério vida e morte nasceu o desejo humano de entrar na eternidade ao sair do tempo. Chico Xavier teve essa noção de vida eterna. Embora sua crença negue a natureza divina do espírito ao sujeitá-lo, várias vezes, ao tempo e à matéria, o poder de convencimento desse homem singular está vivo ainda e a televisão está se aproveitando dele nas suas novelas. Embora as novelas sejam fonte de negação do amor, a única das virtudes teologais que acompanhará o ser humano na passagem do tempo para o eterno! E-mail:osalan@uol.com.br


10342
Por Oswaldo Antunes - 25/1/2006 12:20:28
SALÁRIO E PESQUISA

Oswaldo Antunes

Pesquisa inicial de intenção de votos indica pequena melhora do apoio ao
atual Governo. Se continuar, essa tendência estaria indicando que a oposição
exagerou ao tentar demonstrar a incapacidade, ética e funcional, de um
governo que, bem ou mal, nasceu na base popular. A muita gente pareceu, e
está parecendo, que se tenta convencer o povo de que ele sempre toma a
decisão errada e melhor seria deixar o País e seus problemas sob o
controle da elite, mais letrada e experiente. A classe média se sentiria
representada - é assim em todos os governos porque ela comanda a burocracia
e lidera o pagamento e gasto dos tributos. O povo, mantendo-se ignorado e
ignorante, continuaria carregando as pedras de penitente.
A pesquisa ainda reflete, predominantemente, a crise do mensalão. Mesmo
assim, pela primeira vez, parece mostrar uma opinião que se organiza: 60%
das intenções originárias do salário mínimo. Na antecipada e contínua
campanha eleitoral, a oposição não considerou esse fator, que começou a
pesar na ultima eleição e permanece ativo. Os ataques, ao incluir ameaças
físicas à pessoa do Presidente, o Lulinha paz e amor, exageram. O operário
que está no Governo tem uma presença coletiva. Ao criticar a política social
e tratar como novidade praticas seculares, criou-se um bumerangue que
ameaça voltar. Parlamentares, antes ameaçados de cassação, assumiram o papel
da policia de costumes, em favor de seus partidos, sem pensar que estavam
ameaçando mais de trinta milhões de brasileiros que vivem do pequeno ganho
das bolsas. Ao desmoralizar o governo tido como popular, usaram uma carga
teatral cansativa em três CPIs repetitivas. As casas do Congresso foram
usadas com simulação de ética e, por isso, quando os ataques entraram em
recesso duplamente remunerado, voltou-se contra os próprios acusadores o
mau emprego do dinheiro publico.
Uma só pesquisa evidentemente não mostra tendência, nem prevê os frutos da
campanha que virá. Mas o percentual dos mal remunerados que querem a
reeleição do atual Presidente mostra que quem ganha o mínimo começa a agir
para influenciar no emprego do dinheiro arrecadado. Mesmo sem o plano
fantasioso, sempre pedido e nunca aplicado pela oposição quando governo.
O Plano de Nação, ninguém conhece ou sabe o que seja, sabendo-se apenas que
é impossivel com trinta milhões de pessoas marginalizadas


10202
Por Oswaldo Antunes - 19/1/2006 11:34:02
A VINGANÇA ATUALIZADA

Oswaldo Antunes

Depois de caracterizar-se como desforra, a criminologia pretendeu dar ao castigo prisional o sentido de reeducação e reparação da tranqüilidade social. O crime suscita medo de repetir-se quando não há intimidação. E a sociedade, apesar de sua omissão ou egoísmo procura defender-se. Na verdade, reeducação do delinqüente nunca existiu, a não ser em casos particularíssimos. Ao contrário, as cadeias sempre funcionaram como escolas de graduação criminal. Enquanto tudo evolui, o modo de corrigir delitos permanece na forma antiquada das desigualdades sociais. Com o aumento do procedimento delituoso, cresce também a revolta coletiva. E sem poder punir a organização criminosa, a agressividade geral volta-se contra a pessoa do criminoso. E acontece o linchamento legalizado que se vê nas prisões, outra espécie de crime. Do modo como é executada, a pena passou a ser vingança. Vingança lenta, ineficaz e prejudicial aos cofres públicos. O leitor possivelmente nunca viu de perto o suplicio, tortura e promiscuidade existentes nos presídios superlotados. A falta de espaço para movimentar-se, e até para respirar, em milhares de celas por esse País afora, é crime hediondo, maior por estar muito ligado à exclusão social. Pena de morte que difere da convencional somente pela crueldade que transforma em sadismo o que devia ser aplicação da Justiça. Segundo Gustavo Barroso, entre os colonos que vieram para o Brasil com Mem de Sá, estava Ana Roiz, mulher do rabino Heitor Antunes que, por insistir, aqui, na pratica de sua crença religiosa, a Inquisição levou para Portugal e condenou. Morreu durante o processo mas, para cumprimento da pena, teve os restos mortais desenterrados e queimados. Esse tipo de punição vingativa criou raízes. Se fizermos a comparação com fatos passados, nos carandirús de hoje a diferença está na legalização da tortura que a televisão mostra diariamente. Antes, por ignorância, se punia a religiosidade. Hoje, o individuo paga por quinhentos anos de hipocrisia social. E não somente aqui. Um americano cego, surdo e doente, ao 76 anos foi executado 23 anos após a condenação. Sofreu parada cardíaca e foi ressuscitado para morrer legalmente no cumprimento da sentença. Em nossas prisões, o corredor da morte é substituído pela tortura moral e física, vícios, sodomia e enfermidades, tudo passivamente aceito como forma de cumprimento da lei.


10133
Por Oswaldo Antunes - 16/1/2006 11:37:03
A PALAVRA NO SILENCIO

Oswaldo Antunes

É de Jacques Maritain a afirmação surpreendente: o amor possui uma só palavra e, dizendo-a sempre, nunca a repete. Pode-se imaginar não ser essa palavra, a comum expressão gramatical e sim a manifestação intuitiva do silencio que fecunda. A comunicação pelos sons, que nasceu com no tempo e a evolução silenciosa, fez-se necessária, mas não necessariamente indispensável. Por ser arranjo verbal, costuma deturpar a essência do pensamento e seu efeito simbólico pode ser esquecido ou deletado. Só a comunicação feita dentro do silencio com a fonte da criação se preserva além dos limites do tempo. Em parte dependemos da emissão dos sons para transmitir imagens mentais e nos alegramos ou entristecemos com seus efeitos. Mas quem vive e trabalha na formulação das palavras, sabe que elas nem sempre são a essência dos sentimentos. Cecília Meireles se referia ao temor humano pela incapacidade de mostrar que nos acabamos todos os dias na tristeza, na dúvida, até no amor; assim como nos renovamos nos sentimentos. Para ser outro, somos sempre o mesmo e morremos por idades imensas, até perder o medo de morrer. As verdades imutáveis, as que independem de vocábulos, causam medo. Embora o ser humano se aproxime pela voz, é no silencio que se doa e é sempre verdadeiro. Na passagem em que Pilatos perguntou a Cristo o que é a Verdade, Ele permaneceu calado mostrando a inutilidade do que poderia ser dito. Assim também, na criação do mundo, o principio se confundiu com o nada, só o espírito pairou sobre as águas onde o verbo silencioso criou. Imaginemos então que assim tudo pode ter sido feito e assim poderá vir a ser com tudo e cada. E veremos que vale a intuição do que existe e não pode ser dito na mudez das coisas. Na predição silenciosa em que as flores se perpetuam e não se repetem. No movimento das águas, rios que sobem e nuvens que descem para os rios. Na mudez das pedras que permanecem enquanto as palavras passam. Muitas vezes nos vexamos por conversar quando estamos sós. Quando ouvimos o inaudível e dialogamos com o inconsciente. E nos incomodamos porque uma palavra inexata deu a essa manifestação do silencio um significado patológico. Mas foi dialogando assim consigo mesmo, intuitivamente, que Albert Einstein descobriu as leis elementares que mudaram o mundo. Para chegar ao imensurável a palavra não é necessária.


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Por Oswaldo Antunes - 10/1/2006 11:48:25
O POVO CONTRA O POVO

Oswaldo Antunes

Somos um país com desigualdade social e racial gritante, injusta e antiga, mas aceita e tida como inevitável. Pretos, pardos, mulatos, índios e pobres, na vida pratica, não são iguais aos outros. Essa desigualdade é explorada nas campanhas eleitorais, quando se busca o poder, não para mudar, mas para mantê-la. Brancos e ricos podem usar Caixa 2; mestiços e pobres, não. O Presidente do Superior Tribunal Eleitoral está confirmando a impossibilidade de acabar com o Caixa 2, que sempre existiu nas eleições. A desigualdade de tratamento é um tipo de violência que não usa força física, vale-se de uma convenção falsa de liberdade. Suas vitimas não reclamam, chegam até a formar opinião a favor do opressor. Mas quem está fora do País, vê. O filosofo italiano Antonio Negri, 72,professor titular da Universidade de Pádua e professor de filosofia do Colégio Internacional de Paris, escreveu recentemente: "Há vários meses, com doses a cada vez renovadas de hipocrisia e cinismo, o governo Lula está sendo praticamente linchado por toda a grande imprensa nacional. Em um país como o Brasil, a "criminalização" de apenas "dois anos" do único governo não oriundo elites, seria hilária se não fosse trágica. Apenas o preconceito de classe e até racial pode explicar tão leviana adesão a uma "verdade do poder" que - no Brasil - tem a mesma cara e a mesma violência da desigualdade social e racial da qual ela é uma triste representação." Já dissemos que a onda formada pela imprensa partidária está impedindo nossa primeira administração popular, que, aprendendo, acerta em muitos setores e erra muito politicamente. Essa onda, puramente eleitoral, prejudica, inclusive, a atuação dos bons jornalistas. Há poucos dias o jornalista Waldir Senna Batista, com imparcialidade e competência, criticou o modo darecepção ao Presidente em Montes Claros e disse que ele fez aqui campanha política. Quando há reeleição, como agora, o mal é esse: o que se faz em um período é tido como propaganda para o outro. E gera radicalização: da oposição e dos que defendem o governo. Sair hoje em defesa de um governo popular é ato de coragem. Porque a imprensa orienta a opinião púbica a negar o que está acontecendo de bom. Na economia, por exemplo. O projeto de criação de uma renda universal como a bolsa família, que o mundo vê com otimismo, o radicalismo classifica de demagogia. O aumento constatado da renda rural não interessa. Os recordes da balança comercial, a queda da inflação, o aumento do emprego formal, o menor risco Brasil de todos os tempos, tudo é esquecido. Lembra-se apenas, há quase dois anos, o deprimente episódio Delúbio-Marcus Valério. Cadê os confiscos do Plano Cruzado, a engabelação dos fiscais de Sarney com a hipócrita congelação de preços que acabou no dia seguinte à eleição? E as privatizações sub valorizadas do governo passado, o dinheiro publico para banqueiros, a compra da reeleição de FhC? Nada disso parece ter sido errado, simplesmente porque foi bem feito pela elite. A radicalização, até certo ponto, é necessária como conseqüência. Os que entendem que a imprensa já não é guardiã da verdade e alardeia o falso, não vêem outro caminho, senão o gueto ou a trincheira, para guardar o que é verdadeiro. E somente uma minoria, hoje, está vendo a tisuname da hipocrisia jogar o povo contra o povo.


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Por Oswaldo Antunes - 4/1/2006 11:28:16
A VIDA LEVE
Oswaldo Antunes

No ultimo dia do ano, o amigo, sobrevivente como eu, Konstantin Christoff, telefonou direto para a mesa em que escrevo. Insiste em que devo escrever crônicas mais leves. Usar isopor em vez de martelo. Depois, mandou-me um livro de Millôr Fernandes que ironiza outros dois: o empolado "Dependência e Desenvolvimento da América Latina", de Fernando Henrique Cardoso, e o intrincado "Brejal dos Javas", de José Sarney. Competir com Millôr ou imita-lo não convém. Culto e inteligente, ele escreve para quem tem o mínimo de entendimento do que seja a ironia, o elogio com segundo sentido. Mas o jornalista tem obrigação de se fazer entender por todos. Concordo que a crônica deve ser agradável e não estressante. Não obrigatoriamente humorística. Fazer a abordagem do cotidiano com um mínimo de poesia é bom caminho para o entendimento geral, porque poesia de verdade quem não entende sente. O que faz lembrar duas mulheres especiais: Cecília Meireles, que parece mediária entre o divino e o humano, e Cora Coralina, a poetisa da simplicidade. Conhecida pelo pseudônimo, Cora se chamava Ana Lins do Guimarães Peixoto Brêtas. Viveu no anonimato, e, já idosa, Carlos Drummond de Andrade leu suas crônicas e publicou esse recado: "Cora Coralina. Não tendo o seu endereço, lanço estas palavras ao vento, na esperança de que ele as deposite em suas mãos. Admiro e amo você como a alguém que vive em estado de graça com a poesia. Seu lirismo tem a força e a delicadeza das coisas naturais". Bastou essa fala simples do poeta federal para colocar na visão do Brasil todo a mulher que era tantas outras ao transformar em beleza o cotidiano. Moça, ela conheceu um advogado divorciado, fugiu, casou e teve seis filhos de sangue. Os outros filhos, seus livros, pouca gente conhece. Como desconhece o sensível e imaginário "Flor de Poemas" de Cecília. Reencontrei "Estórias da Casa Velha da Ponte", de Cora, em um sebo, na véspera do Natal. Tem o carimbo da biblioteca da Escola Estadual Dom Aristides Porto, mas foi parar na pechincha, a custo de vintém. Ao reler, revivi a emoção de Drummond: "Minha querida amiga Cora Coralina: ... sua poesia é das mais diretas e comunicativas que já tenho lido e amado. Que riqueza de experiência humana, que sensibilidade especial e que lirismo identificado com as fontes da vida!" A vida fica mais leve se, para começar o ano, o leitor sentir na própria experiência, nos momentos discordantes de tristeza e alegria, a poesia que ajuda a cavalgar até a origem do Mistério. Se toda gente cantar, porque o instante existe e a vida está completa. Se irmão das coisas fugidias, não ser alegre nem triste, ser poeta. Aceitar as noites, os dias, o vento. Cantar antes que venha o sono.




Selecione o Cronista abaixo:
Avay Miranda
Iara Tribuzi
Iara Tribuzzi
Ivana Ferrante Rebello
Manoel Hygino
Afonso Cláudio
Alberto Sena
Augusto Vieira
Avay Miranda
Carmen Netto
Dário Cotrim
Dário Teixeira Cotrim
Davidson Caldeira
Edes Barbosa
Efemérides - Nelson Vianna
Enoque Alves
Flavio Pinto
Genival Tourinho
Gustavo Mameluque
Haroldo Lívio
Haroldo Santos
Haroldo Tourinho Filho
Hoje em Dia
Iara Tribuzzi
Isaías
Isaias Caldeira
Isaías Caldeira Brant
Isaías Caldeira Veloso
Ivana Rebello
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Jorge Silveira
José Ponciano Neto
José Prates
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Luiz de Paula
Manoel Hygino
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